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Yehuda Amichai - poeta israelense


  • Yehuda Amichai  - poeta israelense

Nota: Página em construção. 18.2.2024


CENTENÁRIO DE YEHUDA AMICHAI  (1924-2024) 


Ludwig Pfeuffer, mais conhecido pelo seu nome em hebraico, Yehuda Amichai, nasceu em Würzburg, Alemanha, em 3 de maio de 1924. Um dos poetas israelenses mais importantes do Século XX, está entre os primeiros autores de seu país a escrever em hebraico coloquial.

Nascido na Alemanha, em uma família judia ortodoxa, Amichai aprendeu a falar naturalmente alemão e hebraico. Em 1935, aos 12 anos, imigrou para Petah Tikva, no Mandato Britânico da Palestina, mudando-se de vez para Jerusalém. Além da formação extremamente religiosa, o poeta sempre esteve ligado às forças de ataque e defesa da comunidade judaica. Chegou a lutar, como soldado do Exército Britânico, durante Segunda Guerra Mundial, pela Brigada Judaica.

Dispensado do Exército, em 1946, a, Amichai passou a lecionar, tornando-se professor de Torá e literatura hebraica na cidade de Haifa. Neste período, ele também começou a aprofundar suas próprias obra literárias, publicando, em 1955, o seu primeiro livro de poesia, intitulado “Now and in Other Days”.

Descrito como um “poeta-filósofo em busca de um humanismo pós- teológico”, a poesia de Yehuda Amichai lida com questões do cotidiano, aprofundando  o significado da vida e da morte. Muitas vezes usa de uma suave ironia e imagens originais, para revelar mensagens surpreendentes. Como muitos poetas seculares israelenses, ele luta com a fé religiosa, utilizando sempre muitas referências a Deus.

Yehuda Amichai faleceu no dia 22 de setembro de 2000, aos 76 anos, em Jerusalém, Israel.
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Fonte:  Recanto do Poeta (acessado em 15.2.2024).


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  • Yehuda Amichai  - poeta israelense

YEHUDA AMICHAI - OBRA PUBLICADA EM PORTUGUÊS

No Brasil
:: Yehuda Amichai - terra e paz: antologia poética. [organização, apresentação e tradução Moacir Amâncio direto do hebraico; projeto gráfico Victor Burton]. Bazar do Tempo, 2018. Edição não bilíngue.

Em antologias e/ou livros de outros autores
:: Lira argenta - poesia em tradução. antologia [seleção e organização Vanderley Mendonça; tradutores Álvaro Faleiros, Augusto de Campos, Claudio Willer, Cide Piquet*, Danilo Bueno, Dirceu Villa, Fernando Klabin, Guilherme Gontijo Flores, Idalia Morejón López, Juliana Di Fiori Pondian, Larissa Peron, Maíra Mendes Galvão, Marcelo Ariel, Matheus Guménin, Monique Maion, Omar Pérez López, Piotr Kilanowski, Reynaldo Damazio, Ricardo Domeneck, Roberto Zular, Ruy Proença, Tatiana Lima Faria, Vanderley Mendonça, Walter Vetor e Willian Zeytounlian]. Edição bilíngue. São Paulo: Selo Demônio Negro, 2017. // {autores presentes: Étienne Dolet, David Lynch, Charles Bukowski, Heiner Müller, Joan Salvat-Papasseit, Hans Arp, Guido Cavalcanti, Ovídio, Basil Bunting, Paul Celan, Victor Hugo, Roberto Juarroz, Boris Vian, Peire Vidal, Sor Juana Inés de la Cruz, Alda Merini, Mina Loy, Arthur Cravan, François Rabelais, William Faulkner, Pier Paolo Pasolini, Vladimir Maiakóvski, Yehuda Amichai*, Ingeborg Bachmann, Mitoş Micleuşanu, Nara Mansur Cao, Derek Walcot, Denise Levertov, André Breton, Maria Mercè Marçal, Wisława Szymborska, Czesław Miłosz, Zbigniew Herbert, Paul Valéry, Emily Dickinson, E. E. Cummings, Meleagro de Gadara, Robert Desnos}
:: Crisantempo: no espaço curvo nasce umHaroldo de Campos. São Paulo: Perspectiva, 1998; 2ª ed., 2004. 
:: Poesia alheia. 124 poemas traduzidos. vários autores. [organização, tradução e prefácio Nelson Ascher; orelhas do livro Arthur Nestrovski]. Coleção Lazuli. Rio de Janeiro: Imago, 1998.
:: Antologia da poesia hebraica - Poesia Sempre [editor geral Antônio Carlos Secchin; organização da antologia hebraica Dan Miron; vários tradutores Nancy Rozenchan, Rifka Berezin, Berta Waldman, Roney Cytrynpwicz, Tal Goldfajn e outros]. Poesia Sempre, ano 5, n. 8. Rio de Janeiro: Fundação Biblioteca Nacional, 1997. {traduções do hebraico}.
:: Quatro mil anos de poesia {Hebraica}.. [organização Jacó Guinsburg e Zulmira Ribeiro Tavares]. Coleção Judaica, vol. 12. Edição bilíngue. São Paulo: Editora Perspectiva, 1969. {vários colaboradores - críticos e ensaístas Anatol Rosenfeld, Willem Flusser, Otto Maria Carpeaux, Zulmira Ribeiro Tavares, Bóris Schnaiderman, Meier Kutchinski; vários tradutores; projeto gráfico A. Wollner; ilustrações Rita Rosenmayer e Moysés Baumstein}.  
:: Antologia da Literatura Hebraica Moderna - Poesia e Prosa de Israel.. [orientação Henrique Iusim; traduções Ari Chen, Cecília Meireles, ...?]. Coleção Biblioteca de Cultura Judaica. Rio de Janeiro: Edições B'Nai B'Rith, 1969. {edição bilíngue}.
:: Antologia Poesia e Prosa de Israel - antologia. [organização Cecília Meireles; prefácio Ben Zion Tomer]. Edição especial Departamento Cultural da Embaixada de Israel, GB, Brasil, 1968.
:: Poesia de Israel. [seleção e tradução Cecília Meireles; apresentação Alexander Dothan; ilustrações Candido Portinari; desenho de capa Eugênio Hirsch]. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1962. {poemas de 23 poetas israelenses}

Em Portugal
Antologias portuguesas
:: Qual é a minha ou a tua língua?: Cem Poemas de Amor de Outras Línguas. {organização Jorge Sousa Braga; traduções de Jorge Sousa Braga, Eugénio de Andrade, Manuel António Pina e António Osório]. Coleção Documenta Poetica. Lisboa: Assírio & Alvim, 2003; 2ª ed., 2008. {Prémio Literário Fundação Inês de Castro}

Em revistas - Edição especial em língua portuguesa 
:: Yehuda Amichai - poemas. [seleção, apresentação, notas e tradução Clara Rosenberg]. In. Ariel - Revista de Artes e Letras de Israel, 1984.
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Nota: "Ariel: revista de artes y letras de Israel", publicação trimestral realizada durante algumas décadas pelo 'Jerusalén: Institute Central de Relaciones Culturales Israel-Iberoamérica, España y Portugal'. 

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Yehuda Amichai - arte ©Morag Kligvasser


iehudá amihai*

o velho poeta
que lutou junto aos
ingleses na
segunda guerra mundial
mostra-me o seu
poema sobre o qohélet

(olhos amortecidos de vida
azul-introspectiva 
– ou eram verdes?)

hoje nem mesmo há
escolhas –
amor e morte
paz e guerra
esperança desesperança

tudo se entre-
presenta

havel havalim
névoa-de-nadas
omar qohélet

falou
- Haroldo de Campos, no livro "Crisantempo: no espaço curvo nasce um" / Haroldo de Campos. Coleção Signos n. 24. Perspectiva, 2004, p 374. 
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* Poema escrito por Haroldo de Campos e dedicado ao poeta israelense. Sobre o poema acima escreve o autor: “Por outro lado, em Jerusalém, conheci pessoalmente Yehudá Amichai. Nascido na Alemanha, emigrado para Israel em 1936, é o mais famoso poeta vivo do país. Indicado para o Prêmio Nobel, é autor de uma poesia sutil, com toques metafísicos, que se deixa atravessar, frequentemente, por laivos de ceticismo irônico. De Amichai traduzi "Um Vale Imenso" ("'Êmeq rahav niftáh"). A ele dediquei também um poema de minha "Harpa Davídica", série de textos inspirados na visita ao "país da Bíblia", dos quais dou aqui uma breve mostra.”. (In. CAMPOS, Haroldo de.. A harpa davídica: a poesia de Israel. In: Folha de S. Paulo, +mais!, 14 de abril de 1996).

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  • Yehuda Amichai - illustration by  ©Riccardo Vecchio

SELETA DE POEMAS DO POETA ISRALENSE YEHUDA AMICHAI - EM EDIÇÃO BILÍNGUE / POESIA TRADUZIDA


Esta seleta apresenta alguns poemas repetidos, versados/traduzidos para o português por tradutores diversos. Seção em construção/buscando os originais! 

Meu Pai
A lembrança de meu pai embrulhado em papel branco
como a merenda para um dia de trabalho.
Como um mágico, a tirar de seu chapéu coelhos e palácios,
êle retirava de seu corpo miúdo - o amor.
Os rios seus braços
se projetavam em suas boas ações.

**

אבי
זכר אבי עטוף בניר לבן
.כפרוסות ליום עבודה
,כקוסם, המוציא מכובעו ארנבות ומגדלים
.הוציא מתוך גופו הקטן - אהבה
נהרות ידיו
.נשפכו לתוך מעשיו הטובים.
- Yehuda Amichai [tradução Cecília Meireles]. In: "Poesia de Israel". [seleção e tradução Cecília Meireles]. Civilização Brasileira, 1962.

§§

A morte de meu pai
Meu pai, de repente, de todos os aposentos
partiu para suas estranhas lonjuras.

Ele partiu para chamar seu Deus
para que nos viesse ajudar agora.

E Deus já chegou, como um operário, servente
e pendurou seu casaco num prego da lua.

Mas nosso pai, que foi buscá-lo,
Deus o guardará para sempre consigo.

**

מוֹת אָבִי

אָבִי פִּתְאֹם, מִכָּל הַחֲדָרים
יָצָא לְמֶרְחַקָּיו הַמּוּזָרִים. 

הָלוֹךְ הָלַךְ לִקְרֹא לֵאלֹהָיו,
שֶׁהוּא יָבוֹא לַעֲזֹר לָנוּ עַכְשָיו. 

וֵאלֹהִים כְּבָר בָּא, כְּמוֹ טוֹרֵחַ,
תָּלָה אֶת מְעִילוֹ עַל וַו-יָרֵחַ.

אַךְ אֶת אָבִינוּ, שֶׁיָּצָא לְהוֹבִילוֹ,
יַחֲזִיק הָאֱלֹהִים לָעַד אֶצְלוֹ. 
- Yehuda Amichai [tradução Cecília Meireles]. In: "Poesia de Israel". [seleção e tradução Cecília Meireles]. Civilização Brasileira, 1962.

§§

Tua vida e tua morte, meu pai
Tua vida e tua morte, meu pai,
estão pousadas nos meus ombros.
Minha mulher nos trará
água.

Vem e bebamos, meu pai,
às minhas flores, às ideias,
pois tu me esperavas
e já não sou mais esperado agora.

Tua boca entreaberta, meu pai,
cantava e eu não ouvi.
A árvore do pátio era profeta
e eu não o soube.

Só teu passo, meu pai,
continua a caminhar no meu sangue.
Outrora foste o meu acompanhante.
Sou eu que te acompanho agora.
**
- Yehuda Amichai [tradução Cecília Meireles]. In: "Poesia de Israel". [seleção e tradução Cecília Meireles]. Civilização Brasileira, 1962.

§§

De todos os vazios ...
De todos os vazios entre os tempos,
de todas as distâncias entre as filas de soldados,
das brechas do tapume,
das portas que fechamos mal,
das mãos que não juntamos bem,
do vazio entre os nossos corpos que não apertamos
um contra o outro —
nasce uma extensão vasta que se desdobra,
uma planície, um deserto,
por onde nossa alma irá sem esperança, depois da morte.
**
- Yehuda Amichai [tradução Cecília Meireles]. In: "Poesia de Israel". [seleção e tradução Cecília Meireles]. Civilização Brasileira, 1962.

§§

Lamentações aos mortos da guerra

........... 1

O senhor Beringuer — seu filho
caiu no canal que outros escavaram
para navios atravessarem o deserto —
atravessa o caminho da Porta Jafa, a meu lado:

ele emagreceu muito: perdeu
perdeu o peso do filho.
Assim, flutua leve pelas ruelas
e se prende ao meu coração feito finos galhos
desgarrados.

........... 2

Quando menino, fazia-lhe uma papa dourada
de batatas, que amassava.
Depois, morre-se.
É preciso limpar o mesmo vivo
quando volta da brincadeira.
Já para o homem morto,
terra e areia são águas claras,
em que o corpo se lava eternamente
e purifica.

........... 3

O monumento ao soldado desconhecido,
do outro lado. O lado inimigo.
Bom ponto de referência para os artilheiros
do futuro.

Ou então o monumento à guerra, em Londres,
esquina do Hyde Park, enfeitado com um bolo
incrementado e esplêndido: mais um soldado que levanta a cabeça
e um rifle. Mais um canhão, mais uma águia, mais
um anjo branco.
E um creme-bandeira de mármore enorme
entornado do alto
por mão de mestre.

As cerejas açucaradas
e vermelhas demais
já foram engolidas por um glutão de corações. Amém.

........... 4

Achei um velho livro sobre animais,
Brehm, volume II, pássaros:
numa linguagem adocicada, uma descrição da vida dos estorninhos,
tordos e andorinhas. Erros — muitos — uma escrita gótica
antiquada, mas com muito amor.
“Nossos amigos alados” “migra daqui para os países do calor”.
Ninho, ovo tigrado, fina plumagem, o rouxinol,
a cegonha, “os arautos da primavera”,
tordo de peito amarelo.

Data de publicação, 1913, Alemanha,
véspera da guerra, véspera das muitas guerras:
meu bom amigo, morto em meus braços, em seu sangue,
nas areias de Ashdod, 1948, junho.

Meu amigo,
tordo de peito vermelho.

........... 5

Dicky foi ferido
como a torre d´água em Yad Mordkhai.
Ferido. Um furo na barriga. Tudo
escorreu de dentro dele.

Mas ele ficou em pé, assim
no cenário de minha memória,
como a torre de água de Yad Modkhai.

Não muito longe dali, caiu
um tanto ao norte, junto a Hulaiqat.

........... 6

Tudo isso é sofrimento? Não sei.
Eu estava parado no cemitério,
camuflado de homem vivo:
calça marrom e blusa amarela como o sol.

Cemitérios são baratos, requerem pouco.
Até as lixeiras são pequenas, servem para conter
o papel fino que embrulhava as flores da loja.
Cemitérios são coisa polida e disciplinada.
“E jamais te esquecerei”, assim
numa pequena placa de cerâmica, em francês.
Não sei quem é aquele que não esquecerá
que é mais desconhecido do que o morto.

Tudo isso é sofrimento? Acho que sim.
“A construção da pátria será o vosso coração”.
Quanto tempo é preciso continuar construindo a pátria
para estar à frente desta terrível corrida triangular
entre consolo, construção e morte?

Sim, isto tudo é sofrimento. Ainda assim,
deixa um pouco de amor sempre aceso,
como uma pequena lâmpada, no quarto de um bebê dormindo,
sem que ele saiba o que é a luz
nem de onde ela vem, mas que lhe traz
alguma segurança e amor sereno.

........... 7

Dia de recordação dos mortos na guerra: junta
o luto de todas as tuas ao luto da perda deles,
 inclusive a perda da amada que te deixou; mistura
sofrimento com sofrimento, conforme faz à memória parcimoniosa,
ao contrair festa, sacrifício e dor, tudo num dia só,
data festiva e de fácil lembrança.

 Doce mundo, embebido feito pão
em leito doce para o Deus terrível e sem dentes
“Por trás disso tudo, uma grande felicidade oculta”.
De nada te serve chorar por dentro e gritar por fora.
Por trás disso tudo, uma grande felicidade se oculta, talvez.

Dia de recordação dos mortos. Sal amargo vestido de
menina pequena com flores.
Cordas disposta ao longo do caminho
de um desfile conjunto: vivos e mortos.
Crianças com passos de luto alheio,
como se andassem sobre cacos de vidro.

A boca da flautista permanecerá assim por muitos dias.
Um soldado morto nada por entre pequenas cabeças,
com braçadas de morto, no antigo equívoco que possuem os mortos
sobre o lugar da água viva.

Uma bandeira perde o contato com realidade e voa.
uma vitrine enfeitada com vestidos bonitos de mulher,
em azul e branco.  E tudo em
três línguas: hebraico, árabe e morte.

Um animal grande e majestoso agoniza durante a noite,
sob o jasmim, olhando o mundo incessantemente.
 Um homem anda na rua — seu filho morreu na guerra —
como uma mulher carregando um feto morto no ventre.
“Por trás disso tudo, uma grande felicidade se oculta.”
............................................ 1973
**
- Yehuda Amichai [tradução do hebraico de Berta Waldman, Roney Cytrynpwicz e Tal Goldfajn; organização Dan Miron]. In: Antologia da poesia hebraica - Poesia Sempre, ano 5, n. 8. Rio de Janeiro: Fundação Biblioteca Nacional, 1997. 

§§

O lugar em que temos razão
Do lugar em que temos razão
jamais crescerão
flores na primavera.

O lugar em que temos razão
está pisoteado e duro
como um pátio.

Mas dúvidas e amores
escavam o mundo
como uma toupeira, como a lavradura.
E um sussurro será ouvido no lugar
onde houve uma casa
que foi destruída.

**

המקום שבו אנו צודקים

מן המקום שבו אנו צודקים
לא יצמחו לעולם
פרחים באביב.

המקום שבו אנו צודקים
הוא רמוס וקשה
כמו חצר.

אבל ספקות ואהבות עושים
את העולם לתחוח
כמו חפרפרת, כמו חריש.

ולחישה תשמע במקום
שבו היה הבית
אשר נחרב.
כתובתינ
- Yehuda Amichai [tradução do hebraico de Nancy Rozenchan]. In: Antologia da poesia hebraica - Poesia Sempre, ano 5, n. 8. Rio de Janeiro: Fundação Biblioteca Nacional, 1997.

§§

uma espécie de apocalipse
O homem sob a figueira telefonou para o homem sob a videira.
“Esta noite eles realmente são capazes de vir.
Blinde as folhas, proteja bem a árvore,
chame os mortos de volta, e esteja pronto.”

O cordeiro branco disse para o lobo:
“Seres humanos balem e meu coração dói:
Eles chegarão lá através de baioneta.
No nosso próximo encontro, a questão será debatida.”

Todas as nações (unidas) fluirão para Jerusalém
para ver se a Torá saiu, e entrementes.

Como agora é primavera
colherão flores ao redor.

E baterão a espada em charrua e a charrua em espada
e assim por diante, sem cessar.

Talvez de tanto bater e afiar,
o ferro de guerra desapareça da terra. 
**
- Yehuda Amichai [tradução do hebraico de Nancy Rozenchan]. In: Antologia da poesia hebraica - Poesia Sempre, ano 5, n. 8. Rio de Janeiro: Fundação Biblioteca Nacional, 1997.

§§

O diâmetro da bomba
Trinta centímetros era o diâmetro da bomba
cujo raio efetivo de ação
—cerca de sete metros—
continha quatro mortos e onze feridos.
E ao seu redor, aqui e ali, num círculo
mais amplo de dor e tempo,
há dois hospitais e um cemitério.
Mas a jovem enterrada em seu
lugar de origem
a mais de cem quilômetros de distância
amplia consideravelmente o círculo.
E o homem solitário que, num canto remoto
de um país do além-mar, chora-lhe a morte
inclui no círculo o mundo inteiro.
Não vou sequer falar do pranto dos órfãos
que alcança o trono de Deus
e o ultrapassa, criando
um círculo sem fim nem Deus.

**

קוטר הפצצה
קוטר הפצצה היה שלושים סנטימטרים
וקוטר תחום פגיעתה כשבעה מטרים
ובו ארבעה הרוגים ואחד עשר פצועים
ומסביב לאלה, במעגל גדול יותר
של כאב וזמן, פזורים שני בתי חולים
ובית קברות אחד. אבל האשה
הצעירה, שנקברה במקום שממנו באה
במרחק של למעלה ממאה קילומטרים
מגדילה את המעגל מאוד מאוד
והאיש הבודד הבוכה על מותה
בירכתי אחת ממדינות הים הרחוקות
מכליל במעגל את כל העולם
ולא אדבר כלל על זעקת יתומים
המגיעה עד לכיסא האלוהים
ומשם והלאה ועושה את המעגל לאין סוף ואין אלוהים
- Yehuda Amichai [tradução Nelson Ascher]. In: "Poesia alheia. 124 poemas traduzidos". [organização, tradução e prefácio Nelson Ascher]. Coleção Lazuli. Imago, 1998.

§§

um vale imenso
“Abriu-se um vale imenso
ante o andarilho exausto” 
– li num livro do século passado.
Quanta esperança, amplidão na estreiteza, quase
um clarim, quase um sol, quanto amor, quanta morte que redime.

“E eles desapareceram atrás da casa”
– li no mesmo livro.
Desapareceram, mas estão
muito perto e não retornarão.
Pois um homem sai como um ator de cena
entra por trás de um bastidor de papelão
sobre o qual grafitaram casa ou árvore
mas desaparecidas de ti para sempre.

Como no vale imenso os desaparecidos
e sua última imagem incendiada de sol.
**
- Yehuda Amichai [tradução Haroldo de Campos]. In: "Crisantempo: no espaço curvo nasce um" / de  Haroldo de Campos. Coleção Signos, n. 24. Perspectiva, 2004.

§§

Poema temporário
A escrita hebraica e a escrita arábica vão do leste para o oeste, 
A escrita latina, do oeste para o leste.
Línguas são como gatos:
Não se deve alisar o pelo em direção contrária.
As nuvens vêm do mar, o vento quente do deserto, 
As árvores dobram-se ao vento,
E pedras voam dos quatro ventos
Aos quatro ventos. Eles jogam pedras,
Jogam esta terra, uns nos outros,
Mas a terra sempre cai de volta à terra.
Jogam a terra, querem livrar-se dela,
Suas pedras, seu solo, mas não podem se livrar dela. 
Jogam pedras, jogam pedras em mim
Em 1936, 1938, 1948, 1988,
Semitas jogam em semitas e antissemitas em antissemitas, 
Homens maus jogam e justos jogam,
Pecadores jogam e tentadores jogam,
Geólogos jogam e teólogos jogam,
Arqueólogos jogam e arqui-hooligans jogam,
Rins jogam pedras e bexigas jogam,
Pedras-cabeça e pedras-fronte e o coração de uma pedra, 
Pedras em forma de boca aos gritos
E pedras que cabem nos olhos
Como um par de óculos,
O passado joga pedras no futuro,
E todas elas caem no presente.
Pedras que choram e pedras risonhas de cascalho,
Até Deus na Bíblia jogou pedras,
Até o Urim e o Tumim foram jogados,
E ficaram presos na couraça da justiça,
E Herodes jogou pedras e disso nasceu um Templo. 
Oh, o poema da tristeza da pedra
Oh, o poema jogado nas pedras
Oh, o poema de pedras jogadas.
Haverá nesta terra
Uma pedra que nunca foi jogada
E nunca construída e nunca revirada
E nunca descoberta e nunca revelada
E nunca gritada de um muro e nunca descartada pelos construtores
E nunca colocada sobre uma tumba e nunca deitada sob dois amantes 
E nunca transformada em pedra angular?
Por favor, não joguem mais pedras, 
Vocês estão movendo a terra,
A terra sagrada, plena, aberta,
Vocês estão movendo a terra para o mar 
E o mar não a quer
O mar diz: em mim, não.
Por favor, joguem pedras pequenas,
Joguem fósseis de caramujo, joguem cascalho, 
Justiça ou injustiça das pedreiras de Migdal Tsedek, 
Joguem pedras macias, joguem doces torrões, 
Joguem limo, joguem lama,
Joguem areia da praia,
Joguem poeira do deserto, joguem crosta,
Joguem solo, joguem vento,
Joguem ar, joguem nada
Até que as mãos fiquem cansadas,
E a guerra fique cansada,
E mesmo a paz fique cansada e fique.
**
- Yehuda Amichai [tradução Cide Piquet / a partir das versões em inglês de Barbara e Benjamin Harshav / Chana Bloch e Stephen Mitchell]. In: Lira argenta - poesia em tradução. antologia. [seleção e organização Vanderley Mendonça]. Demônio Negro, 2017.

§§


esquecer alguém
Esquecer alguém é como
esquecer de apagar a luz do quintal
e deixá-la acesa também de dia:
mas isso é também lembrar
pela luz.

**

לשכוח אדם
לשכוח אדם הוא כמו
לשכוח לכבות את האור בחצר
ונשאר דולק גם ביום
אבל זה גם לזכור
על ידי האור.
- Yehuda Amichai, no livro "Terra e paz: antologia poética" / Yehuda Amichai. [tradução do hebraico por Moacir Amâncio]. Bazar do Tempo, 2018. 

§§

o homem não tem tempo
O homem não tem tempo
para tudo na vida.
Ele não tem uma época
para cada um de seus desejos.
O Eclesiastes não está certo.

O homem precisa odiar
e amar ao mesmo tempo,
com os mesmos olhos chorar
e com os mesmos olhos rir,
com a mesma mão atirar pedras
e com a mesma mão recolhê-las,
fazer amor na guerra e guerra no amor.

Odiar e perdoar, lembrar e esquecer,
organizar e confundir, comer e digerir
o que a história
faz ao longo de muitos e muitos anos.

O homem na vida não tem tempo.
Quando ele perde ele procura,
quando ele acha ele esquece,
quando ele esquece ele ama
e quando ele ama começa a esquecer.

A alma dele é preparada,
é bastante profissional,
somente o corpo é sempre
amador. Tenta e erra,
não aprende, confunde-se
bêbado, cego nos prazeres e nas dores.

A morte dos figos é no outono,
encarquilhados, cheios de si e doces,
as folhas secam sobre a terra,
os galhos nus já apontam
o lugar onde há tempo para tudo.

**

אדם בחייו אין לו זמן שיהיה לו
אדם בחייו אין לו זמן שיהיה לו 
זמן לכל.
ואין לו עת שתהיה לו עת
לכל חפץ. קהלת לא צדק כשאמר כך.

אדם צריך לשנוא ולאהוב בבת אחת,
באותן עיניים לבכות ובאותן עיניים לצחוק
באותן ידיים לזרוק אבנים
ובאותן ידיים לאסוף אותן,
לעשות אהבה במלחמה ומלחמה באהבה.

ולשנוא ולסלוח ולזכור ולשכוח
ולסדר ולבלבל ולאכול ולעכל
את מה שהיסטוריה ארוכה
עושה בשנים רבות מאוד.

אדם בחייו אין לו זמן. 
כשהוא מאבד הוא מחפש
כשהוא מוצא הוא שוכח,
כשהוא שוכח הוא אוהב
וכשהוא אוהב הוא מתחיל לשכוח.

ונפשו למודה,
ונפשו מקצועית מאוד
רק גופו נשאר חובב
תמיד. מנסה וטועה
לא לומד ומתבלבל
שיכור ועיוור בתענוגותיו ובמכאוביו.

מות תאנים ימות בסתיו
מצומק ומלא עצמו ומתוק,
העלים מתיבשים על האדמה, 
והענפים הערומים כבר מצביעים
אל המקום שבו זמן לכל.
- Yehuda Amichai, no livro "Terra e paz: antologia poética" / Yehuda Amichai. [tradução do hebraico por Moacir Amâncio]. Bazar do Tempo, 2018. 

§§

jerusalém
Num telhado da Cidade Velha,
a roupa no varal ilumina-se à última luz do dia:
o lençol branco de uma mulher inimiga,
a toalha de um homem inimigo
para enxugar o suor do seu rosto.

No céu da Cidade Velha
há uma pipa.
No fim da linha –
um menino,
que eu não vejo
por causa da muralha.

Hasteamos muitas bandeiras,
eles hastearam muitas bandeiras.
Para pensarmos que eles são felizes.
Para pensarem que nós somos felizes.

**

ירושלים
עַל גָּג בָּעִיר הָעַתִּיקָה,
כְּבִיסָה מוּאֶרֶת בְּאוֹר אַחֲרוֹן שֶׁל יוֹם:
סָדִין לָבָן שֶׁל אוֹיֶבֶת,
מַגֶבֶת שֶׁל אוֹיֶב
לְנַגֵּב בָּה אֶת זֵעַת אַפּוֹ.

וּבִּשְׁמֵי הָעִיר הָעַתִיקָה
עֲפִיפוֹן.
וּבִקְצֵה הַחוּט –
יֶלֶד,
שֶׁלֹּא רָאִיתִי אוֹתוֹ,
בִּגְלַל הַחוֹמָה.

הֶעֱלֵינוּ הַרְבֵּה דְּגָלִים,
הֶעֱלוּ הַרְבֵּה דְּגָלִים.
כְּדֵי שׁנַּחְשֹב שֶׁהֵם שְׂמֵחִים
כְּדֵי שֶׁיַּחְשְׁבוּ שֶׁאַנַחְנוּ שְׂמֵחִים.
- Yehuda Amichai, no livro "Terra e paz: antologia poética" / Yehuda Amichai. [tradução do hebraico por Moacir Amâncio]. Bazar do Tempo, 2018. 

§§

um pastor árabe procura um cabrito no monte sion
Um pastor árabe procura um cabrito no Monte Sion,
e no monte à frente eu procuro meu filho pequeno.
Um pastor árabe e um pai judeu
nos seus fracassos temporários.
As nossas vozes se encontram por cima
do Tanque do Sultão no vale entre nós.
Nós dois queremos que eles não entrem,
o filho e o cabritinho, na engrenagem
da terrível máquina do Had Gadiá.

Depois nós os encontramos entre os arbustos,
as nossas vozes retornaram a nós
choraram e riram por dentro.

A procura pelo cabrito ou pelo filho
sempre foi
o começo de uma nova religião nesses montes.

**

רועה ערבי מחפש גדי
רועה ערבי מחפש גדי בהר ציון,
ובהר ממול אני מחפש את בני הקטן.
רועה ערבי ואב יהודי
בכשלונם הזמני.
קולות שנינו נפגשים מעל
לבריכת השולטן בעמק באמצע.

שנינו רוצים שלא יכנסו
הבן והגדי לתוך תהליך
המכונה הנוראה של חד גדיא.

אחר כך מצאנו אותם בין השיחים,
וקולותינו חזרו אלינו ובכו וצחקו בפנים.
החיפושים אחר גדי או אחר בן
היו תמיד
- Yehuda Amichai, no livro "Terra e paz: antologia poética" / Yehuda Amichai. [tradução do hebraico por Moacir Amâncio]. Bazar do Tempo, 2018. 
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N. do T.: Had Gadiá: canção infantil de Pessach (a Páscoa judaica) sobre a compra de um cabritinho que é devorado por um gato e este por um cão, num ciclo de vida e morte que se renova.

§§

nas montanhas de jerusalém
Aqui, no lugar onde a ruína quer ser outra vez
uma nova casa, sua vontade junta-se à nossa.
Até os espinhos se cansaram de ferir e querem confortar,
uma lápide, arrancada de um túmulo violado,
colocado numa nova parede com o seu nome, suas datas.
Ela está contente porque não a esquecerão.
Os meninos, que só com a força deles tudo teria mudado,
brincam entre pedras e ruína.
Eles não querem mudar coisa alguma.

O cancelamento e uma noite de amor no Nêguev
faz os lírios crescerem nos montes de Jerusalém,
coisas se esvaziam e se enchem,
nem sempre tu estás com as cheias.
Uma planta que se chama sálvia não salva,
mas rasga uma ferida profunda no esquecimento,
lembrança de uma sede antiga.

Tudo se ocupa aqui do trabalho de lembrar:
a ruína lembra, o pomar lembra,
o poço lembra de suas águas, e o pomar plantado
lembra no quadro de mármore um holocausto distante
ou mesmo só o nome de um benfeitor morto
que será um pouco mais lembrado que os nomes de outras pessoas.

Mas nomes não são importantes nessas montanhas,
como no cinema, quando a lista dos créditos sobe na tela
antes do filme se tornar interessante e no fim do filme –
nada mais. Luz acesa, as letras empalidecem,
baixa a cortina ondulada, portas abertas, é noite lá fora.
Nessas montanhas, importantes são somente o verão e o inverno,
somente a secura e a humidade: as pessoas também
não são senão depósitos de água dispersos por tudo,
como poços, buracos e as fontes das profundezas.
- Yehuda Amichai, no livro "Terra e paz: antologia poética" / Yehuda Amichai. [tradução do hebraico por Moacir Amâncio]. Bazar do Tempo, 2018. 
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N. do T.: Nêguev: deserto israelense.

§§

no dia do nascimento da minha filha nenhuma pessoa morreu
No dia do nascimento da minha filha não morreu
nenhuma pessoa no hospital e no portão de entrada
estava escrito: “Hoje é permitida a entrada de cohanim.”*
E isso foi no dia mais longo do ano
de tanta alegria
viajei com meu amigo à colina do Shaar Hagai.**

Vimos um pinheiro doente e nu coberto somente de incontáveis
pinhos. Tsvi disse que as árvores prestes a morrer produzem mais
pinhas do que as vivas. E eu lhe disse: isso foi um poema e não sabias.
Embora sejas um homem das ciências exatas, fizeste um poema. Ele
me respondeu: embora sejas um homem dos sonhos, fizeste uma
menina exata com todos os dispositivos exatos para a vida dela.

**

בַּיּוֹם שֶׁבּוֹ נוֹלְדָה בִּתִּי לֹא מֵת אַף אִישׁ
בַּיּוֹם שֶׁבּוֹ נוֹלְדָה בִּתִּי לֹא מֵת
אַף אִישׁ בְּבֵית־הַחוֹלִים וְעַל שַׁעַר הַכְּנִיסָה
הָיָה כָּתוּב: “הַיּוֹם הַכְּנִיסָה לַכֹּהֲנִים מֻתֶּרֶת".
וְזֶה הָיָה בַּיּוֹם הָאָרֹךְ בְּיוֹתֵר שֶׁל הַשָּׁנָה.
וּמֵרבֹ שִׂמְחָה
נָסַעְתִּי עִם יְדִידִי אֶל גִּבְעוֹת שַׁעַר הַגַּיְא.

רָאִינוּ עֵץ אֹרֶן חוֹלֶה וְחָשׂוּף מְכֻסֶּה רַק אִצְטְרֻבָּלִים אֵין סְפֹר. וּצְבִי אָמַר שֶׁעֵצִים
הָעוֹמְדִים לָמוּת מַצְמִיחִים יוֹתֵר אִצְטְרֻבָּלִים מִן הַחַיִּים. וְאָמַרְתִּי לוֹ: זֶה הָיָה שִׁיר וְלֹא
יָדַעְתָּ. אַף עַל פִּי שֶׁאַתָּה אִישׁ הַמַּדָּעִים הַמְּדֻיָּקִים, עָשִׂיתָ שִׁיר. וְהֵשִׁיב לִי: וְאַתָּה, אַף
עַל פִּי שֶׁאַתָּה אִישׁ חֲלוֹמוֹת עָשִׂיתָ יַלְדָּה מְדֻיֶּקֶת עִם כָּל הַמִּתְקָנִים הַמְּדֻיָּקִים לְחַיֶּיהָ.
- Yehuda Amichai, no livro "Terra e paz: antologia poética" / Yehuda Amichai. [tradução do hebraico por Moacir Amâncio]. Bazar do Tempo, 2018. 
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*N. do T. – Cohen (plural, cohanim): sacerdotes em hebraico, destinados a servir no Templo e
que não podem se aproximar dos mortos.
** N. do T. – Shaar Hagai, Portão do Vale: local nas proximidades de Jerusalém, que lembra os
soldados que morreram em combate.

§§

não igual cipreste
Não igual cipreste,
não de uma vez, não todo eu,
mas igual grama, em milhões de brotos verdes-discretos
estar escondido como muitas crianças brincando
e uma procurando.

Não como um só homem,
como o filho de Kish, que muitos o encontraram
e fizeram dele um rei.
Mas como a chuva em muitos lugares
de muitas nuvens, estremecer, ser bebido
por muitas bocas, ser respirado
como o ar o ano inteiro e disperso qual coração na primavera.

Não o tilintar agudo, que desperta
no portão do médico de plantão,
mas batendo em muitas janelas,
nas entradas laterais, com muitas batidas de coração.

E depois a saída silenciosa, de fumaça,
sem cornetas, sem ministro renunciando,
crianças cansadas de brincar,
pedra em seus últimos giros
rumo à encosta íngreme
até onde começa a planície
da grande renúncia e da qual,
como orações aprovadas,
sobe a poeira em milhões de grãos.

**

לא כברוש
לֹא כַּבְּרוֹשׁ,
לֹא בְּבַת אַחַת, לֹא כֻּלִּי,
אֶלָּא כַּדֶּשֶׁא, בְּאַלְפֵי יְצִיאוֹת זְהִירוֹת־יְרֻקּוֹת,
לִהְיוֹת מֻסְתָּר כְּהַרְבֵּה יְלָדִים בַּמִּשְׂחָק
וְאֶחָד מְחַפֵּשׂ.

וְלֹא כַּגֶּבֶר הַיָּחִיד,
כְּבֶן־קִישׁ, שֶׁמְּצָאוּהוּ רַבִּים
וְעָשׂוּ אוֹתוֹ לְמֶּלֶךְ.
אֶלָּא כַּגֶּשֶׁם בְּהַרְבֵּה מְקוֹמוֹת
מֵעֲנָנִים רַבִּים, לְהִתְחַלְחֵל, לִהְיוֹת שְׁתוּי
פִּיּוֹת רַבִּים, לִהְיוֹת נָשׁוּם
כַּאֲוִיר בַּשָּׁנָה וּמְפֻזָּר כִּפְרִיחָה בָּאָבִיב.

לֹא הַצִּלְצוּל הַחַד, הַמְּעוֹרֵר
בְּשַׁעַר הָרוֹפֵא הַתּוֹרָן,
אֶלָּא בִּדְפִיקוֹת, בְּהַרְבֵּה אֶשְׁנַבִּים
בִּכְנִיסוֹת צְדָדִיּוֹת, בְּהַרְבֵּה דְּפִיקוֹת לֵב.

וְאַחַר־כָּךְ הַיְּצִיאָה הַשְּׁקֵטָה, כֶּעָשָׁן
בְּלִי תְּרוּעָה, שַׂר מִתְפַּטֵּר,
יְלָדִים עֲיֵפִים מִמִּשְׂחָק,
אֶבֶן בַּגִּלְגּוּלִים הָאַחֲרוֹנִים
לְאַחַר הַמּוֹרָד הַתָּלוּל, בַּמָּקוֹם שֶׁמַּתְחִיל
מִישׁוֹר הַוִּתּוּר הַגָּדוֹל, אֲשֶׁר מִמֶּנּוּ,
כַּתְּפִלּוֹת הַמִּתְקַבְּלוֹת,
עוֹלֵה אָבָק בְּהַרְבֵּה רִבּוֹא גַּרְגִּירִים.
- Yehuda Amichai, no livro "Terra e paz: antologia poética" / Yehuda Amichai. [tradução do hebraico por Moacir Amâncio]. Bazar do Tempo, 2018. 

§§

pena. éramos uma boa invenção
Eles amputaram
as tuas coxas dos meus quadris.
Para mim eles são sempre
médicos. Todos.
Eles nos separaram,
um do outro. Para mim eles são engenheiros.
Pena. Éramos uma boa invenção
de amar: um avião feito de homem e mulher,
asas e tudo:
nós nos elevamos um pouco do chão,
voamos um pouco.

**

חבל. היינו אמצאה טובה
הֵם קָטְעוּ
אֶת יְרֵכַיִךְ מִמָּתְנַי.
לְגַבַּי הֵם תָּמִיד
רוֹפְאִים. כֻּלָּם.
הֵם פֵּרְקוּ אוֹתָנוּ
זֶה מִזּוֹ. לְגַבַּי הֵם מְהַנְדְּסִים.
חֲבָל, הָיִינוּ אַמְצָאָה טוֹבָה
וְאוֹהֶבֶת: אֲוִירוֹן עָשׂוּי מְאִישׁ וְאִשָּׁה,
כְּנָפַיִם וְהַכֹּל:
מְעַט הִתְרוֹמַמְנוּ מִן הָאָרֶץ,
מְעַט עַפְנוּ.
- Yehuda Amichai, no livro "Terra e paz: antologia poética" / Yehuda Amichai. [tradução do hebraico por Moacir Amâncio]. Bazar do Tempo, 2018. 

§§

de três ou quatro numa sala
De três ou quatro numa sala
sempre um se coloca junto à janela.
Levado a ver o mal entre os espinhos
e os incêndios na colina.
E como pessoas que saíram inteiras
são devolvidas de noite às suas casas feito moedas de troco.

De três ou quatro numa sala
sempre um se coloca junto à janela.
Seus cabelos escuros sobre os pensamentos.
Atrás dele, as palavras.
Diante dele as vozes que vagam sem mochila,
corações sem um farnel, profecias sem água
e grandes pedras devolvidas
que permaneceram fechadas como cartas sem
endereço, sem ninguém para recebê-las.

**

משלושה או ארבעה בחדר 
משלושה או ארבעה בחדר
תמיד אחד עומד ליד החלון.
מוכרח לראות את העוול בין קוצים
ואת השרפות בגבעה.
וכיצד אנשים שיצאו שלמים 
מוחזרים בערב כמטבעות עודף לביתם.

משלושה או ארבעה בחדר
תמיד אחד עומד ליד החלון.
שערו האפל מעל למחשבותיו.
מאחוריו המילים.
ולפניו הקולות הנודדים בלי תרמיל,
לבבות בלי צידה, נבואות בלי מים
ואבנים גדולות שהושבו
ונשארו סגורים כמכתבים שאין
להם כתובת ואין מקבל
- Yehuda Amichai, no livro "Terra e paz: antologia poética" / Yehuda Amichai. [tradução do hebraico por Moacir Amâncio]. Bazar do Tempo, 2018. 

§§

jacó e o anjo
Antes do amanhecer ela suspirou e o prendeu
daquele jeito, e o venceu.
Ele a prendeu daquele jeito, e a venceu,
ambos sabiam que o prender
traz a morte.
E evitaram pronunciar um o nome do outro.
Mas à primeira luz da manhã
ele viu o corpo dela.
Que permanecia branco,
nos pontos cobertos ontem
pelo maiô.
Depois chamaram-na de repente lá de cima,
duas vezes.
Como se chama uma menina
que brinca no pátio.
Ele soube o nome dela e a deixou partir.
**
- Yehuda Amichai, no livro "Terra e paz: antologia poética" / Yehuda Amichai. [tradução do hebraico por Moacir Amâncio]. Bazar do Tempo, 2018. 

§§

a pequena ruth
Às vezes eu me lembro de ti, pequena Ruth,
que nos separamos na infância longínqua, que te queimaram nos campos.
Se estivesses viva agora, serias uma mulher de sessenta e cinco anos,
mulher à beira da velhice. Aos vinte foste queimada,
eu não sei o que aconteceu na tua vida curta
desde que nos separamos. O que conseguiste, que condecorações
colaram nos teus ombros, nas tuas mangas, na
tua alma corajosa, que estrelas brilhantes
pregaram em ti, que sinais de bravura, que
medalhas de amor penduraram no teu pescoço,
em que paz descansas, que estejas em paz.
O que aconteceu nos teus anos de vida não usados?
Acaso eles ainda estão embrulhados como pacotes bonitos,
acaso somaram-se à minha vida? Acaso me transformaste
no banco do teu amor como os bancos da Suíça
onde o tesouro fica guardado após a morte de seus proprietários?
Acaso eu deixarei tudo isso de herança aos meus filhos
que jamais viste?

Tu me deste a tua vida, como um vendedor de vinho
embriagador – mas ele permanece sóbrio,

tu, sóbria na morte, lúcida na treva, deste
a um bêbado de vida como eu, chafurdando no seu esquecimento.

Às vezes eu me lembro de ti em momentos
imprevistos e em locais que não se destinaram à lembrança,
mas para o que não dura, vai embora, não permanece,
como no aeroporto quando os viajantes que chegam
param cansados ao lado da esteira rolante que gira
com as bagagens, os pacotes deles,
e eles descobrem o que lhes pertence com gritos de alegria
como na ressurreição dos mortos, e saem rumo às vidas deles.
Aquela mala que volta de novo desaparece
e retorna, lentamente, no salão que se esvazia,
de novo, de novo ela passa.
Assim passa a tua imagem tranquila por mim,
assim eu me lembro de ti,
até que a esteira pare de girar. E fique imóvel, assim seja.
**
- Yehuda Amichai, no livro "Terra e paz: antologia poética" / Yehuda Amichai. [tradução do hebraico por Moacir Amâncio]. Bazar do Tempo, 2018. 

§§

o moinho de yemin moshê
Esse moinho nunca moeu farinha.
Ele moeu o ar sagrado e os pássaros
da saudade de Bialik, ele moeu
palavras e o tempo picado, ele moeu
a chuva e até morteiros,
mas ele nunca moeu farinha.
Agora ele nos descobriu
e mói nossa vida dia a dia,
para fazer de nós a farinha da paz
e fazer de nós o pão da paz
para as futuras gerações.

**

הַטַּחֲנָה בימין משה
הטחנה הַזֹּאת מֵעוֹלָם לֹא טָחֲנָה קֶמָח.
הִיא טָחֲנָה אֲוִיר קָדוֹש וְצִפֳּרֵי
גַעְגּוּעִים שֶל בְּיַאלִיק. הִיא טָחֲנָה
מִילִּים וּזְמַן טָחוּן, הִיא טָחֲנָה
גֶּשֶם וַאֲפִילוּ פְּגָזִים,
אֲבָל הִיא לֹא טָחֲנָה קֶמַח מֵעוֹלָם.

עַכְשָו הִיא גִּלְּתָה אוֹתָנוּ,
וְטוֹחֶנֶת אֶת חֲיֵּינוּ יוֹם יוֹם,
לַעֲשוֹת מֵאִתָּנוּ קֶמַח שָלוֹם
לֶאֱפוֹת מֵאִתָנוּ אֶת לֶחֶם הָשָּלוֹם
לַדּוֹרוֹת הַבָּאִים.
- Yehuda Amichai, no livro "Terra e paz: antologia poética" / Yehuda Amichai. [tradução do hebraico por Moacir Amâncio]. Bazar do Tempo, 2018. 
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N. do T.: No bairro onde Amichai viveu, chamado Yemin Moshê, em Jerusalém, existe um moinho simbólico construído em 1857 pelo filantropo britânico Moisés Montefiore (1784-1885), como símbolo do sonho de um futuro país de Israel na Palestina.

N. do T.: Hayim Nachman Bialik (Rússia 1873-Áustria 1934): poeta que deu início à modernização da poesia hebraica, considerado o poeta nacional de Israel.

§§

eu quero bagunçar a Bíblia
Um avião passa sobre a figueira
que está sobre o homem embaixo de sua figueira.
O aviador sou eu e eu sou o homem sob a figueira.
Eu quero bagunçar a Bíblia.
Eu quero tanto bagunçar a Bíblia.

Eu creio nas árvores, não como uma vez acreditaram,
minha crença é fragmentada e abreviada
até a próxima primavera, até o próximo inverno,
eu creio na vinda da chuva e na vinda do sol.
A ordem e a justiça estão bagunçadas: bem e mal
estão na mesa diante de mim como o sal e a pimenta,
os frascos são tão iguais. Eu quero
tanto bagunçar a Bíblia. O mundo
é cheio de ideias boas e más, o mundo está cheio de aprendizado:
as aves aprendem com o vento que sopra,
os aviões aprendem com as aves,
os seres humanos aprendem com tudo e esquecem.
A terra não fica triste porque os mortos estão enterrados nela.
Como o vestido da minha amada não está alegre
porque ela vive dentro dele.

Crianças são nuvens
e o Ararat* é um vale profundo.
Eu não quero voltar para casa
porque todas as más notícias chegam até lá,
como no Livro de Jó.

Abel matou Cain, Moisés entrou
na Terra Prometida e os israelitas ficaram no deserto.
Eu viajo na carruagem de Ezequiel
e Ezequiel dança como Miriam a profetisa
no Vale dos Ossos Secos.
Sodoma e Gomorra se desenvolvem
e a mulher de Ló é uma coluna de açúcar e mel
David Rei de Israel está forte e rijo.
Eu quero tanto
bagunçar a Bíblia.

**

יהודה עמיחי, אני רוצה לבלבל את התנ"ך
מָטוֹס עוֹבֵר מֵעַל לַתְּאֵנָה
אֲשֶׁר מֵעַל לָאִישׁ אֲשֶׁר תַּחַת תְּאֵנָתוֹ
הַטַּיָּס הוּא אֲנִי וְהָאִישׁ תַּחַת הַתְּאֵנָה הוּא אֲנִי
אֲנִי רוֹצֶה לְבַלְבֵּל אֶת התנ"ך
אֲנִי כָּל כָּךְ רוֹצֶה לְבַלְבֵּל אֶת הַתַּנַ"ךְ

אֲנִי מַאֲמִין בָּאִילָנוֹת, לֹא כְּמוֹ שֶׁפַּעַם הֶאֱמִינוּ
אֱמוּנָתִי קְטוּעָה וְקִצְרַת מוֹעֵד
עַד הָאָבִיב הַבָּא, עַד הַחֹרֶף הַבָּא
אֲנִי מַאֲמִין בְּבִיאַת הַגֶּשֶׁם וּבְבוֹא הַשֶּׁמֶשׁ
הַסֵּדֶר וְהַצֶּדֶק מְבֻלְבָּלִים: טוֹב וָרָע
עַל הַשֻּׁלְחָן לְפָנַי כְּמֶלַח וּכְפִלְפֵּל
הַכֵּלִים כָּל כָּךְ דּוֹמִים. אֲנִי כָּל כָּךְ
רוֹצֶה לְבַלְבֵּל אֶת הַתַּנַ"ךְ. הָעוֹלָם
מָלֵא דַּעַת טוֹב וָרָע, הָעוֹלָם מָלֵא לִמּוּד
צִפֳּרִים לוֹמְדוֹת מִן הָרוּחַ הַנּוֹשֶׁבֶת
וּמְטוֹסִים לוֹמְדִים מִן הַצִּפֳּרִים
וּבְנֵי אָדָם לוֹמְדִים מִכֻּלָּם וְשׁוֹכְחִים
הָאֲדָמָה אֵינָהּ עֲצוּבָה מִשּׁוּם שֶׁמֵּתִים קְבוּרִים בָּהּ
כְּשֵׁם שֶׁשִּׂמְלַת אֲהוּבָתִי אֵינָהּ שְׂמֵחָה
שֶׁהִיא חַיָּה בְּתוֹכָהּ

יַלְדֵי בְּנֵי אָדָם הֵם עֲנָנִים
וַאֲרָרָט הוּא עֵמֶק עֲמֹק
וַאֲנִי לֹא רוֹצֶה לַחְזֹר אֶל בֵּיתִי
כִּי אֶל הַבַּיִת מַגִּיעוֹת כָּל הַבְּשׂוֹרוֹת הָרָעוֹת
כְּמוֹ בְּסֵפֶר אִיּוֹב

הֶבֶל הָרַג אֶת קַיִן וּמֹשֶׁה נִכְנַס
לָאָרֶץ הַמֻּבְטַחַת וּבְנֵי יִשְׂרָאֵל נִשְׁאֲרוּ בַּמִּדְבָּר
אֲנִי נוֹסֵעַ בְּמַעֲשֵׂי הַמֶּרְכָּבָה שֶׁל יְחֶזְקֵאל
וִיחֶזְקֵאל עַצְמוֹ רוֹקֵד כְּמִרְיָם הַנְּבִיאָה
בְּגֵיא הָעֲצָמוֹת הַיְּבֵשׁוֹת
סְדֹם וַעֲמֹרָה מִתְפַּתְּחוֹת
וְאֵשֶׁת לוֹט הָיְתָה לִנְצִיב סֻכָּר וּדְבַשׁ
וְדָוִיד מֶלֶךְ יִשְׂרָאֵל חַי וְקַיָּם
אֲנִי כָּל כָּךְ
רוֹצֶה לְבַלְבֵּל אֶת הַתַּנַ"ךְ
- Yehuda Amichai, no livro "Terra e paz: antologia poética" / Yehuda Amichai. [tradução do hebraico por Moacir Amâncio]. Bazar do Tempo, 2018. 
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N. do T. – Ararat: o monte onde Noé atracou a arca.
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Do tradutor:
Por que Yehuda Amichai quer transformar a Bíblia em conversa fiada?
Neste poema em particular, o poeta expressa a sua frustração com a contínua afirmação e influência da Bíblia na língua e na cultura modernas. Como poeta, ele é apaixonado pela língua. Ele quer libertá-lo de suas restrições para que ele voe e cante novas canções em novas formas orientadas para o futuro e não para o passado. Mas tal tarefa no que diz respeito à linguagem moderna não é tarefa fácil, porque a linguagem está repleta de ecos do texto Ur que a informa e continuamente a ouve ao seu passado. Como o termo "לבלבל" "confundir, confundir ou misturar" que está enraizado na história bíblica da torre de Babel e no termo "בלל". Num certo sentido, a linguagem moderna não abandonará o seu primeiro amor. A Bíblia é agora o monólito cultural que deve ser espalhado e confundido para que a linguagem seja libertada. Mas tal feito é realmente divino. Somente um poeta poderia tentar isso. Não se pode contar com os humanos porque estão presos no jogo da linguagem e sempre se esquecem. O poema funciona para servir à realização do desejo do poeta e, como na canção de Dolly Parton, ele tem que fingir que o oposto é verdadeiro.

Traduzi o termo "לבלבל" como "balbucio" porque preserva a denotação, conotação e onomatopeia da palavra usada por Amichai.

Crianças são nuvens יַלְדֵי בְּנֵי אָדָם הֵם עֲנָנִים :
As crianças são um tema comum na poesia de Amichai. É uma referência ao fato de as crianças serem um presságio e símbolo do futuro. Eles ainda são maleáveis e podem aprender uma nova língua e uma nova música, em contraste com os humanos adultos. Em outro poema ele diz, como holofotes, as crianças iluminam o próximo século
 ילדי מאירים את המאה הבאה כמו זרקורים .

§§

nós juntos e cada um à parte
“Eles dois juntos e cada um à parte”
– de um contrato de aluguel

Querida minha, outro verão já
se foi e meu pai não veio ao parque.
Os balanços continuam a oscilar.
Nós dois juntos e cada um à parte.

O horizonte marinho perde os barcos –
Difícil manter qualquer coisa agora.
Atrás do monte esperam os guerreiros.
O quanto precisamos de piedade.
Nós dois juntos e cada um à parte.

A lua divide as nuvens em dois –
vem, sigamos para o amor intermediado.
Juntos nós dois diante dos acampamentos.
Talvez ainda se possa mudar tudo.
Nós dois juntos e cada um à parte.

O amor inverteu tudo em mim, parece,
sal do mar em doce chuva precoce;
trazido lentamente até ti eu caio,
caí. Aceita-me, o anjo não vem.
Nós dois juntos. E cada um à parte.

**

שנינו ביחד וכל אחד לחוד
יַלְדָּה שֶׁלִּי, עוֹד קַיִץ עָבַר
וְאָבִי לֹא בָּא לַלּוּנָה-פַּרְק.
הַנַּדְנֵדוֹת מוֹסִיפוֹת לָנוּד.
שְׁנֵינוּ בְּיַחַד וְכָל אֶחָד לְחוּד.

אֹפֶק הַיָּם מְאַבֵּד סְפִינוֹתָיו -
קָשֶׁה לִשְׁמֹר עַל מַשֶּׁהוּ עַכְשָׁו.
מֵאֲחוֹרֵי הָהָר חִכּוּ הַלּוֹחֲמִים.
כַּמָּה זְקוּקִים אָנוּ לְרַחֲמִים.
שְׁנֵינוּ בְּיַחַד וְכָל אֶחָד לְחוּד.

יָרֵחַ מְנַסֵּר אֶת הֶעָבִים לִשְׁנַיִם -
בּוֹאִי וְנֵצֵא לְאַהֲבַת בֵּינַיִם.
רַק שְׁנֵינוּ נֹאהַב לִפְנֵי הַמַּחֲנוֹת.
אוּלַי אֶפְשָׁר עוֹד הַכֹּל לְשַׁנּוֹת.
שְׁנֵינוּ בְּיַחַד וְכָל אֶחָד לְחוּד.

אַהֲבָתִי הָפְכָה אוֹתִי כַּנִּרְאֶה
כְּיָם מָלוּחַ לְטִפּוֹת מְתוּקוֹת שֶׁל יוֹרֶה;
אֲנִי מוּבָא אֵלַיִךְ לְאַט וְנוֹפֵל.
קַבְּלִינִי. אֵין לָנוּ מַלְאָךְ גּוֹאֵל.
כִּי שְׁנֵינוּ בְּיַחַד. כָּל אֶחָד לְחוּד.
- Yehuda Amichai, no livro "Terra e paz: antologia poética" / Yehuda Amichai. [tradução do hebraico por Moacir Amâncio]. Bazar do Tempo, 2018. 

§§

amargo e abrupto
Amargo e abrupto veio o fim,
mas lento e doce era o tempo entre nós,
lentas e doces eram as noites,
quando minhas mãos não se tocavam em desespero
mas com amor, o teu corpo, que separava as duas.
Quando eu entrava em ti, esta era a possibilidade única
da grande felicidade ser medida
com a exatidão de uma dor aguda. Amargo e abrupto.
Lentas e doces eram as noites,
amargo e rangente feito areia é o tempo de agora.
“Sejamos inteligentes”, e pragas semelhantes a isso.
Quanto mais nos distanciamos do amor,
mais precisamos conversar,
palavras, frases longas e arrumadas.
Se estivéssemos juntos,
poderíamos
**
- Yehuda Amichai, no livro "Terra e paz: antologia poética" / Yehuda Amichai. [tradução do hebraico por Moacir Amâncio]. Bazar do Tempo, 2018. 

§§

a morte do meu pai
Meu pai, de repente, de todos os lados
se foi para as suas lonjuras estranhas.

Foi embora pedir ao seu Deus,
Senhor, vinde em nosso socorro.

Deus já vinha, e como se esforçando,
pendurou o casaco no chifre da lua.

Mas o nosso pai, que saiu para trazê-Lo,
Deus prenderá com Ele para sempre.

**

מוֹת אָבִי
אָבִי פִּתְאֹם, מִכָּל הַחֲדָרים
יָצָא לְמֶרְחַקָּיו הַמּוּזָרִים. 

הָלוֹךְ הָלַךְ לִקְרֹא לֵאלֹהָיו,
שֶׁהוּא יָבוֹא לַעֲזֹר לָנוּ עַכְשָיו. 

וֵאלֹהִים כְּבָר בָּא, כְּמוֹ טוֹרֵחַ,
תָּלָה אֶת מְעִילוֹ עַל וַו-יָרֵחַ.

אַךְ אֶת אָבִינוּ, שֶׁיָּצָא לְהוֹבִילוֹ,
יַחֲזִיק הָאֱלֹהִים לָעַד אֶצְלוֹ. 
- Yehuda Amichai, no livro "Terra e paz: antologia poética" / Yehuda Amichai. [tradução do hebraico por Moacir Amâncio]. Bazar do Tempo, 2018. 

§§

deus cheio de misericórdia
Deus cheio de misericórdia,
se Deus não fosse cheio de misericórdia
a misericórdia estaria neste mundo e não somente nele.
Eu, que colhi flores na montanha
e contemplei todos os vales,
eu, que trouxe cadáveres das colinas,
posso dizer que o mundo está vazio de misericórdia.

Eu, que fui o rei do sal à beira-mar,
que fiquei indeciso na minha janela,
que contei os passos dos anjos,
que meu coração ergueu os pesos da aflição
em contendas terríveis.
Eu, que lido somente com pequena parte
das palavras no dicionário.

Eu, obrigado a resolver enigmas contra a minha vontade
sei que não fosse Deus cheio de misericórdia
a misericórdia estaria no mundo
e não somente Nele.

**
אֶל מָלֵא רַחֲמִים
אֶל מָלֵא רַחֲמִים,
אִלְמָלֵא הָאֵל מְלֵא רַחֲמִים
הָיוּ הָרַחֲמִים בָּעוֹלָם וְלֹא רַק בּוֹ.
אֲנִי, שֶׁקָּטַפְתִּי פְּרָחִים בָּהָר
וְהִסְתַּכַּלְתִּי אֶל כָּל הָעֲמָקִים,
אֲנִי, שֶׁהֵבֵאתִי גְוִיּוֹת מִן הַגְּבָעוֹת,
יוֹדֵעַ לְסַפֵּר שֶׁהָעוֹלָם רֵיק מֵרַחֲמִים.

אֲנִי שֶׁהָיִיתִי מֶלֶךְ הַמֶּלַח לְיַד הַיָּם,
שֶׁעָמַדְתִּי בְּלִי הַחְלָטָה לְיַד חַלּוֹנִי,
שֶׁסָּפַרְתִּי צַעֲדֵי מַלְאָכִים,
שֶׁלִּבִּי הֵרִים מִשְׁקְלוֹת כְּאֵב
בַּתַּחֲרֻיּוֹת הַנּוֹרָאוֹת.
אֲנִי שֶׁמִּשְׁתַּמֵּשׁ רַק בְּחֵלֶק קָטָן
מִן הַמִּלִּים שֶׁבַּמִּלּוֹן.

אֲנִי, שֶׁמֻּכְרָח לִפְתּוֹר חִידוֹת בְּעַל כָּרְחִי
יוֹדֵעַ כִּי אִלְמָלֵא הָאֵל מָלֵא רַחֲמִים
הָיוּ הָרַחֲמִים בָּעוֹלָם
וְלֹא רַק בּוֹ.
- Yehuda Amichai, no livro "Terra e paz: antologia poética" / Yehuda Amichai. [tradução do hebraico por Moacir Amâncio]. Bazar do Tempo, 2018. 

§§

do lugar onde sempre estamos certos
nunca brotarão
flores na primavera.

O lugar onde sempre estamos certos
É batido e duro
Como um pátio.

Mas dúvidas e amores
esfarelam o mundo
Como uma toupeira, um arado.

E o murmúrio será ouvido no lugar
onde havia uma casa –
destruída.

**

המקום שבו אנו צודקים
מן המקום שבו אנו צודקים
לא יצמחו לעולם
פרחים באביב.

המקום שבו אנו צודקים
הוא רמוס וקשה
כמו חצר.

אבל ספקות ואהבות עושים
את העולם לתחוח
כמו חפרפרת, כמו חריש.

ולחישה תשמע במקום
שבו היה הבית
אשר נחרב.
כתובתינ
- Yehuda Amichai, no livro "Terra e paz: antologia poética" / Yehuda Amichai. [tradução do hebraico por Moacir Amâncio]. Bazar do Tempo, 2018. 

§§

o diâmetro da bomba
O diâmetro da bomba media trinta centímetros
e o diâmetro da destruição, cerca de sete metros,
nele, quatro mortos e onze feridos.
Ao redor, num círculo mais largo
de dor e tempo há dois hospitais
e um cemitério. Mas a jovem mulher,
enterrada no local de onde viera
à distância de mais de cem quilômetros,
aumentou muito o círculo
e o homem solitário que chora pela morte da moça
no litoral de um país distante
inclui o mundo inteiro no círculo.
Não direi nada sobre o grito dos órfãos
que chega ao trono divino,
e de lá abre o círculo
até o infinito e o nada de Deus.

**

קוטר הפצצה
קוטר הפצצה היה שלושים סנטימטרים
וקוטר תחום פגיעתה כשבעה מטרים
ובו ארבעה הרוגים ואחד עשר פצועים
ומסביב לאלה, במעגל גדול יותר
של כאב וזמן, פזורים שני בתי חולים
ובית קברות אחד. אבל האשה
הצעירה, שנקברה במקום שממנו באה
במרחק של למעלה ממאה קילומטרים
מגדילה את המעגל מאוד מאוד
והאיש הבודד הבוכה על מותה
בירכתי אחת ממדינות הים הרחוקות
מכליל במעגל את כל העולם
ולא אדבר כלל על זעקת יתומים
המגיעה עד לכיסא האלוהים
ומשם והלאה ועושה את המעגל לאין סוף ואין אלוהים
- Yehuda Amichai, no livro "Terra e paz: antologia poética" / Yehuda Amichai. [tradução do hebraico por Moacir Amâncio]. Bazar do Tempo, 2018. 

§§

chuva no campo de batalha
............... À memória de Dicky

A chuva cai no rosto dos meus companheiros
no rosto dos meus companheiros vivos que
cobrem a cabeça com o cobertor
cai no rosto dos meus companheiros mortos que
não se cobrem mais.

**

גשם בשדה קרב.
לזכר דיקי

גשם יורד על פני רעי;
על פני רעי החיים, אשר 
מכסים פניהם בשמיכה –
ועל פני רעי המתים,
אשר אינם מכסים עוד.
- Yehuda Amichai, no livro "Terra e paz: antologia poética" / Yehuda Amichai. [tradução do hebraico por Moacir Amâncio]. Bazar do Tempo, 2018. 

§§

depois de auschwitz
Depois de Auschwitz não há teologia:
das chaminés do Vaticano sai fumaça branca,
sinal de que os cardeais elegeram o seu papa.
Dos crematórios de Auschwitz sobe uma fumaça negra,
sinal de que Deus ainda não decidiu sobre a escolha
do povo eleito. Depois de Auschwitz não há teologia:
os números nos antebraços dos prisioneiros do extermínio
são os números do telefone de Deus,
números dos quais não há resposta,
agora eles estão cortados, um por um.
Depois de Auschwitz há uma nova teologia:
os judeus que morreram na Shoá
tornaram-se semelhantes ao seu Deus
que não tem forma nem corpo.
Eles não têm imagem nem corpo.
- Yehuda Amichai, no livro "Terra e paz: antologia poética" / Yehuda Amichai. [tradução do hebraico por Moacir Amâncio]. Bazar do Tempo, 2018. 
----------------
N. do T.: “que não tem forma nem corpo”: citação do poema-hino “Igdal Elohim” (Exaltemos Deus), o qual apresenta os treze princípios da fé judaica segundo Maimônides. Tradução baseada em versão do rabino Meir Matsliah Melamed.

§§

poema infinito
Dentro do museu novo em folha
uma sinagoga antiga.
Dentro da sinagoga
eu.
Dentro de mim
meu coração.
Dentro do meu coração
um museu.
Dentro do museu
uma sinagoga,
dentro dela
eu,
dentro de mim
meu coração,
dentro do meu coração
museu.

**

שיר אינסופי  
בתוך מוזיאון חדיש
בית כנסת ישן,
בתוך בית הכנסת
אני,
בתוכי
לבי,
בתוך לבי
מוזיאון,
בתוך המוזיאון
בית כנסת,
בתוכו אני,
בתוכי
לבי,
בתוך לבי
מוזיאון 
- Yehuda Amichai, no livro "Terra e paz: antologia poética" / Yehuda Amichai. [tradução do hebraico por Moacir Amâncio]. Bazar do Tempo, 2018. 


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  • Yehuda Amichai  - poeta israelense

YEHUDA AMICHAI - EM OUTROS CANTOS: JORNAIS, REVISTAS, PÁGINAS & AFINS 

O que eu aprendi nas guerras
O que eu aprendi nas guerras
A marchar no ritmo de braços e pernas
Como bombas bombeando um poço vazio.

A marchar numa fila e sozinho no meio,
A enterrar em travesseiros,
Colchões de penas,
O corpo de uma mulher amada.
E a gritar “mamãe”
Quando ela não pode ouvir,
E a gritar por “deus”
Quando eu não creio nele,
E mesmo que acreditasse nele,
Eu não lhe falaria sobre a guerra,
Como a uma criança não se fala
Dos horrores adultos.

Que mais eu aprendi…
Aprendi
A reservar um caminho para a retirada.
Em terras estrangeiras,
Alugar um quarto em hotel
Perto do aeroporto ou da estação de trem.
E mesmo em cerimônias nupciais
Ficar sempre de olho na pequena porta
Com o sinal “exit” em letras vermelhas.

Uma batalha começa
Como tambores rítmicos para dança e termina
Com uma “retirada ao amanhecer”.
Amor proibido
Algumas vezes também começa e acaba assim.

Mas acima de tudo,
Aprendi a sabedoria da camuflagem,
Não ficar visível, não ser reconhecido,
Não me distinguir daquilo que me cerca,
Nem mesmo de quem amo.
Que pensem que sou uma moita
Ou um carneiro,
Uma árvore, a sombra de uma árvore,
Uma cerca viva, uma pedra morta,
Uma casa, o canto de uma casa.

Se eu fosse um profeta
Teria diminuído o brilho da visão
Escurecido minha fé com papel negro

E quando chegar meu tempo,
Endossarei a camuflagem de gala do meu fim:
Com branco de nuvens, bastante azul de céu
E estrelas infinitas.
- Yehuda Amichai [tradução Millôr Fernandes]. In: Millôr Fernandes. O Estado de São Paulo - 1 de agosto de 1999 / republicado na Revista Piauí, edição 10, Julho 2007.

§§

O raio da bomba
O raio da bomba era trinta centímetros
E o raio de seu alcance efetivo sete metros
Contendo quatro mortos e onze feridos.
E ao redor deles, num círculo maior
De dor e tempo, estão espalhados dois hospitais
E um cemitério. Mas a rapariga,
Enterrada no lugar de onde veio,
Há uns cem quilômetros daqui,
Aumenta bem o círculo.
E o homem solitário chorando essa morte
Nas províncias de uma terra do Mediterrâneo,
Inclui no círculo o mundo todo.
E vou omitir o prantear de órfãos
Que alcança o trono de Deus
E vai além, e amplia o círculo
Pro sem fim e pro sem Deus.

**

קוטר הפצצה
קוטר הפצצה היה שלושים סנטימטרים
וקוטר תחום פגיעתה כשבעה מטרים
ובו ארבעה הרוגים ואחד עשר פצועים
ומסביב לאלה, במעגל גדול יותר
של כאב וזמן, פזורים שני בתי חולים
ובית קברות אחד. אבל האשה
הצעירה, שנקברה במקום שממנו באה
במרחק של למעלה ממאה קילומטרים
מגדילה את המעגל מאוד מאוד
והאיש הבודד הבוכה על מותה
בירכתי אחת ממדינות הים הרחוקות
מכליל במעגל את כל העולם
ולא אדבר כלל על זעקת יתומים
המגיעה עד לכיסא האלוהים
ומשם והלאה ועושה את המעגל לאין סוף ואין אלוהים
- Yehuda Amichai [tradução Millôr Fernandes]. In: Millôr Fernandes. O Estado de São Paulo - 1 de agosto de 1999 / republicado: MILLÔRPoesia é um milésimo do que se publica como poesia. Folha de S. Paulo, +mais!, 1 de outubro de 2000. 

§§

Homem com mochila
Homem com mochila no mercado, Irmão,
Como você, sou homem burro, homem camelo,
Homem anjo. Sou como você.
Nossos braços são livres como asas.
Comparados conosco, todos os que carregam cestas
São escravos de escravos, sujeitos e humilhados.
Nós trocamos moedas por verduras frescas,
E para o esquecimento de nossas vidas compramos
Frutas e suas memórias, memória de campo e jardim,
Memória de cheiro da terra e do zumbir de abelhas em dia de calor.
Nós vimos uma mulher num vestido leve de verão
Antes de um amor longo e intenso,
Que determinará a sua vida. Ela não sabe ainda.
Nós sabemos. Em nossas costas
Carregamos o fruto da árvore da conhecimento.
Homem com mochila, você vive onde?
Eu sou como você, vivemos nas distâncias
Entre o prêmio e a punição.
E como nós vivemos? E como à noite nós dormimos,
Em que sonhamos? Os que você ama,
Ainda vivem nos mesmos lugares?

Nossas mochilas, como pára-quedas fechados
Em nossas costas, abrem de noite
pra podermos saltar, e pairar
Sobre a fragrância de lembrar e de esquecer.
- Yehuda Amichai [tradução Millôr Fernandes]. In: MILLÔRPoesia é um milésimo do que se publica como poesia. Folha de S. Paulo, +mais!, 1 de outubro de 2000. 

§§

Na história de nosso amor
Na história de nosso amor, um foi sempre
Uma tribo nômade, outro uma nação em seu próprio solo.
Quando trocamos de lugar, tudo tinha acabado.
O tempo passará por nós, como paisagens
Passam por trás de atores parados em suas marcas
Quando se roda um filme.
As palavras
Passarão por nossos lábios, até as lágrimas
Passarão por nossos olhos.
O tempo passará
Por cada um em seu lugar.
E na geografia do resto de nossas vidas,
Quem será uma ilha e quem uma península
Ficará claro pra cada um de nós no resto de nossas vidas
Em noites de amor com outros.
- Yehuda Amichai [tradução Millôr Fernandes]. In: MILLÔRPoesia é um milésimo do que se publica como poesia. Folha de S. Paulo, +mais!, 1 de outubro de 2000. 

§§

A vida junto da morte
A vida junto da morte
Na carcassa de um carro à beira da estrada
Você ouve as gotas de chuva na lata enferrujada
Antes de senti-las cair na pele do rosto.
Cai a chuva, salvação depois da morte.
Ferrugem mais eterna do que sangue,
Mas bonita do que cor de labaredas.
O vento que é tempo, alterna
Com o vento que é lugar.
E Deus
Permanece na terra como um homem que sabe
Que esqueceu alguma coisa
E fica
Até lembrar.
E à noite você pode ouvir
Como maravilhosa melodia,
O homem e a máquina,
No seu lento caminho, do fogo rubro
Para a paz negra
E daí para a história
E daí para a arqueologia,
E daí para um belo estrato de geologia.
Isso também é eternidade

Como o sacrifício humano que virou
Sacrifício animal e depois oração em voz alta
E depois oração dentro do peito
E afinal nem oração.
- Yehuda Amichai [tradução Millôr Fernandes]. In: MILLÔRPoesia é um milésimo do que se publica como poesia. Folha de S. Paulo, +mais!, 1 de outubro de 2000. 

§§

Deus cheio de misericórdia 
Deus cheio de misericórdia se não fosse por Deus ser cheio de misericórdia haveria misericórdia no mundo, não só nele eu, que colhi flores nas montanhas contemplando os vales eu, que carreguei corpos montanhas abaixo, posso lhes dizer que o mundo não é vazio de misericórdia.
- Yehuda Amichai [tradução Millôr Fernandes]. In: MILLÔR. Folha de S. Paulo, +mais!, São Paulo, 22 de outubro de 2000.

§§

Eu, que eu possa descansar em paz
Eu, que eu possa descansar em paz
eu, que ainda estou vivo, digo;
que eu possa ter paz no que tenho de vida.
eu quero paz agora mesmo, enquanto ainda estou vivo.
não quero esperar como aquele piedoso que almejava
uma perna do trono de ouro do Paraíso. Quero uma cadeira
de quatro pernas, aqui mesmo, uma cadeira simples de madeira.
Quero o resto de minha paz agora.
Vivi minha vida em guerras de toda espécie: batalhas dentro e fora,
combate cara a cara, a cara sempre a minha mesmo,
minha cara de amante, minha cara de inimigo
Guerras com velhas armas, paus e pedras, machado enferrujado, palavras,
rasgão de faca cega, amor e ódio,
e guerra com armas de último forno, metralha, míssil,
palavras, minas terrestres explodindo, amor e ódio.
Não quero cumprir a profecia de meus pais
de que vida é guerra
Eu quero paz com todo meu corpo e em toda minha alma.
Descansem-me em paz...
- Yehuda Amichai [tradução Millôr Fernandes]. In: MILLÔR. Folha de S. Paulo, +mais!, São Paulo, 22 de outubro de 2000.
----------------
Nota: "eu, que eu possa descansar em paz" - se refere a primeira estrofe do poema "Deus cheio de misericórdia"- que está logo acima em tradução completa do professor Moacir AmâncioMillôr traduziu somente a primeira parte do poema, usando a referência da publicação no jornal New Yorker, edição de 2.10.2000.

§§

Assim a glória passa
Assim a glória passa, como um comprido trem sem
princípio nem fim, sem causa ou intenção. Eu sempre
fico num lado do cruzamento - a cancela está fechada -
e verifico tudo: vagões de passageiros e história, vagões
entulhados de guerra, vagões transbordantes de seres humanos
para extermínio, janelas com caras de homens e mulheres
de partida, exaltação de viajantes, aniversários
e mortes, súplicas e piedades,
e quantidades de vagões vazios chacoalhando.
Assim meus filhos passam a seu futuro,
Assim o Senhor passou sobre Moisés no Grande Deserto,
E Moisés não viu Sua Face, só gritou; 
"Senhor, O' Senhor, misericordioso e gracioso, abundante
em bondade e verdade." Assim a glória passa,
assim a cancela fica fechada
até o fim de meus dias.
- Yehuda Amichai [tradução Millôr Fernandes]. In: Quatro poemas de Yehuda Amichai traduzidos por Millôr Fernandes. revista 7faces, 17 de janeiro de 2013.  {Publicado originalmente no Jornal do Brasil - Opinião, 1 de setembro de 2001}.

§§

Depois de Auschwitz
Depois de Auschwitz, nenhuma teologia. 
Das chaminés do Vaticano sobe fumaça branca,
Sinal de que os cardeais escolheram seu Papa.
Do crematório de Auschwitz sobe fumaça negra
Sinal de que o conclave dos Deuses ainda não elegeu
O Povo Eleito. Depois de Auschwitz, nenhuma teologia.
Os números nos punhos
Dos internos para exterminação
São os números dos telefones de Deus
números que não respondem e agora são desligados,
um a um.
Depois de Auschwitz, uma nova teologia;
Os judeus que morreram no Shoah
Agora ficaram semelhantes a seu Deus
Que não tem semelhança com um corpo e não tem corpo
Eles não têm semelhança com um corpo e não tem corpo.
- Yehuda Amichai [tradução Millôr Fernandes]. In: Quatro poemas de Yehuda Amichai traduzidos por Millôr Fernandes. revista 7faces, 17 de janeiro de 2013. {Publicado originalmente no jornal O Estado de S. Paulo, 1999}.

§§

Amantes deixam impressões digitais um no outro
Amantes deixam impressões digitais um no outro,
cheias de evidências físicas, palavras sem fim, testemunhos,
um par de calças vincadas, um jornal com a data exata,
e dois relógios, o dele e o dela.
Toda manhã eles traçam o contorno um do outro
como a polícia marca com giz a posição do corpo na estrada.
Amantes rendem um o outro,
amantes reservam o direito de manter silêncio.
Se e quando se separam,
compõem um esboço policial de suas caras
e um contorno pra que possam dizer:
E esse! E essa!
- Yehuda Amichai [tradução Millôr Fernandes]. In: Quatro poemas de Yehuda Amichai traduzidos por Millôr Fernandes. revista 7faces, 17 de janeiro de 2013. 

§§ 

Dois trens 
Relembro um problema num livro de matemática 
Sobre um trem que sai do local A e outro trem 
Que sai do local B. Quando vão se encontrar? 
Ninguém jamais perguntou o que acontece quando se encontram:
Param? Passam um pelo outro? Colidem? 
Nenhum dos problemas era sobre um homem que sai do local A 
E de uma mulher que deixa o local B. 
Quando vão se encontrar?
Será que vão se encontrar? e por quanto tempo? 
Quanto ao livro de matemática: agora cheguei 
Às páginas finais com as respostas. 
Na época era proibido olhar. 
Agora é permitido. 
Agora eu verifico
Onde acertava e onde errava, 
Onde fui bem e onde não fui.
- Yehuda Amichai [tradução Millôr Fernandes]. / Publicado originalmente em sua coluna no Jornal do Brasil ?. 

§§

Meu filho cheira a paz
Meu filho cheira a paz.
Quando eu me inclino sobre ele
Não há só o cheiro do sabonete.

Todo mundo foi uma vez a criança com o cheiro a paz.
(E não há em toda a terra um só
Moinho que ainda gira)

Ó moinhos despedaçados como roupas
que não se pode remendar.
Duros, solitários patricarcas na tumba de Hebron
Sem filho algum em seus silêncios.

Meu filho cheira a paz.
O ventre de sua mãe o prometeu
Aquilo que deus não pode
Nos prometer.

**

My child wafts peace
My child wafts peace.
When I lean over him,
It is not just the smell of soap.

All the people were children wafting peace.
(And in the whole land, not even one
Millstone remained that still turned).

Oh, the land torn like clothes
That can't be mended.
Hard, lonely fathers even in the cave of the Makhpela*
Childless silence.

My child wafts peace.
His mother's womb promised him
What God cannot
Promise us.
- Yehuda Amichai [tradução de Sebastião Edson Macedo a partir da versão em língua inglesa]. In: MACEDO, Sebastião Edson (trad.) 13 canções de guerra e de paz, de Yehuda Amichai. revista dEsEnrEdoS, ano II, n. 4, 2010.
----------------------
* The traditional burial place in Hebron of Abraham and the other Patriarchs and Matriarchs of Israel / Translated by Benjamin and Barbara Harshav.

§§

Os Judeus
Os judeus são como fotografias exibidas em uma vitrine
todos juntos em alturas diferentes, vivos e mortos
noivos e noivas, jovens de bar-mitzva com bebês.

E há imagens reconstituídas de fotografias antigas que amarelaram.
E às vezes eles vem e quebram a vitrine
e queimam as fotos. E então começa-se
a fotografar novamente e revelar novamente
e as exibir novamente com dor e sorrindo.

Rembrandt os pintou com chapéus
turcos com belezas de ouro desbotado
Chagall os pintou flutuando no ar
e eu os pinto como meu pai e como minha mãe.

Os judeus são uma reserva florestal eterna
onde suas árvores estão de pé juntinhas, e até mesmo os mortos
não podem se deitar. Eles se encostam, ficam de pé, contra os vivos
e não se pode distinguir entre eles. Apenas o fogo
queima os mortos mais rapidamente.

E quanto a Deus? Deus permanece
como o perfume de uma bela mulher que passou certa vez
frente a eles e sua face eles não viram,
apenas seu aroma permanece, tipos de perfumes,
criador dos tipos de perfumes.

Um homem judeu se lembra da suká na casa de seu avô.
E a suká lembra por ele
a caminhada no deserto que lembra
a bondade da juventude e as pedras das tábuas da lei
e o ouro do bezerro de ouro e a sede e a fome
que lembram o Egito.

E quanto a Deus? De acordo com o contrato
de divórcio do Jardim do Éden e do Templo
Deus vê seus filhos apenas uma
vez por ano, em Yom Kipur.

Os judeus não são um povo histórico
e nem mesmo um povo arqueológico, os judeus
são um povo geológico com rachaduras
e colapsos e camadas e lava ardente.

Sua história deve ser medida
em uma outra escala.
Os judeus são lixados pelo sofrimento e polidos pelos tormentos
como pedras lisas na praia.

Os judeus são superiores apenas em sua morte
como são superiores as pedras lisas às outras pedras:
quando a mão forte as joga
elas pulam duas vezes ou três
na superfície da água, antes de afundar.

Há algum tempo encontrei uma bela mulher,
cujo avô me fez a circuncisão
muito tempo antes que ela nascesse. Eu lhe disse,
você não me conhece e eu não a conheço,
mas nós somos o povo judeu,
o seu avô que está morto e eu o circuncisado e você a bela neta
de cabelo dourado: Nós somos o povo judeu.

E quanto a Deus? Outrora cantávamos
“não existe Deus como o nosso”, agora cantamos “não existe o nosso Deus”,
mas nós cantamos, nós ainda cantamos.

**

היהודים
היהודים הם כמו תצלומים מוצגים בחלון ראוה
כולם יחדיו בגבהים שונים, חיים ומתים
חתנים וכלות נערי בר-מצווה עם תינוקות.
ויש תמונות משוחזרות מתצלומים ישנים
שהצהיבו.
ולפעמים באים ושוברים את החלון
ושורפים את התמונות. ואז מתחילים
לצלם מחדש ולפתח מחדש
ולהציג אותם שוב כואבים ומחייכים.
רמברנדט צייר אותם חבושי תרבושים
טורקיים ביפי זהב מועם.
שגאל צייר אותם מרחפים באוויר
ואני מצייר אותם כאבי וכאמי.
היהודים הם שמורת יער עד
שהעצים בה עומדים צפופים, ואפילו המתים
לא יוכלו לשכב. הם נשענים, עומדים, על החיים
ואין מבדיל ביניהם. רק האש
תשרוף את המתים מהר יותר.
ומה בדבר האלוהים? אלוהים נשאר
כמו בושם אישה יפה שעברה פעם
על פניהם ואת פניה לא ראו,
אך בשמה נשאר, מיני בשמים,
בורא מיני בשמים.
אדם יהודי זוכר את הסוכה בבית סבו.
והסוכה זוכרת במקומו
את ההליכה במדבר שזוכרת
את חסד הנעורים ואת אבני לוחות הברית
ואת זהב עגל הזהב ואת הצמא ואת הרעב
שזוכרים את מצרים.
ומה בדבר האלוהים? לפי הסכם
הגירושין מגן עדן ומבית המקדש
אלוהים רואה את בניו רק פעם
אחת בשנה, ביום הכיפורים.
היהודים הם לא עם היסטורי
ואפילו לא עם ארכיאולוגי, היהודים
הם עם גיאולוגי עם שברים
והתמוטטויות ושכבות וגעש לוהט.
את תולדותיהם צריכים למדוד
בסולם מדידה אחרת.
היהודים משויפי סבל ומלוטשי ייסורים,
כמו חלוקי אבן לחוף הים.
מותר היהודים רק במותם
כמותר חלוקי אבן על שאר האבנים:
כשהיד החזקה משליכה אותם
הם קופצים שתי פעמים או שלוש
על פני המים, לפני שהם טובעים.
לפני זמן מה פגשתי אישה יפה,
שסבה עשה לי ברית מילה
זמן רב לפני שנולדה. אמרתי לה,
את לא מכירה אותי ואני לא מכיר אותך,
אבל אנחנו העם היהודי,
סבך המת ואני הנימול ואת הנכדה היפה
זהובת השיער: אנחנו העם היהודי.
ומה בדבר האלוהים? פעם שרנו
"אין כאלוהינו" עכשיו אנו שרים, "אין
אלוהינו",
אבל אנו שרים, אנחנו עדין שרים.
- Yehuda Amichai [tradução Yair Mau]. In: Conexão Israel / Os Judeus de Yehuda Amichai. por Yair Mau, 8 de julho de 2013.

§§

1924
Nasci em 1924. Se eu fosse um violino da minha idade
não seria dos melhores. Como vinho seria um cinco estrelas
ou vinagre. Como cachorro estaria morto. Como um livro
estaria me tornando caro, ou estaria abandonado num sebo qualquer.
Como uma floresta eu seria jovem; como uma máquina, ridículo.
Como uma criatura humana, estou cansado, muito cansado.

Nasci em 1924. Quando penso em criaturas humanas,
vejo apenas as que nasceram no ano em que nasci,
cujas mães trabalharam lado a lado com a minha
onde quer que estivessem, em hospitais ou casas escuras.

Hoje, no meu aniversário, gostaria de recitar
uma prece solene para vocês
cujas vidas já se curvaram sob o peso
das esperanças e das frustrações,
cujos feitos se apequenam, e cujos deuses se multiplicam –
vocês são todos irmãos da minha fé, companheiros
de meu desespero.

talvez vocês encontrem a paz duradoura,
os vivos em suas vidas, os mortos
em estarem mortos.

E quem quer que lembre melhor de sua infância
é o vencedor,
se é que há vencedores.

**

1924
נולדתי ב-1924; אילו הייתי כינור בן גילי
לא הייתי מן הטובים. כיין הייתי טוב מאוד
או חמוץ לגמרי. ככלב הייתי מת. כספר
הייתי מתחיל להיות יקר או כבר זרוק.
כיער הייתי צעיר, כמכונה הייתי מגוחך
וכאדם אני עייף מאוד.

נולדתי ב-1924. כשאני חושב על האנושות
אני חושב רק על אלה שנולדו בשנה אחת איתי,
אשר אימותיהם כרעו ללדת עם אמי
באשר הן, בבתי-חולים או בדירות אפלות.

ביום הזה, יום הולדתי, אני רוצה
לומר עליכם תפילה גדולה,
אשר כובד תקוות ואכזבות כבר
מושך את חייכם למטה,
אשר מעשיכם מתמעטים
ואלוהיכם מתרבים והולכים,
כולכם אחי תקוותי וידידי יאושי.

ותמצאו מנוחה נכונה,
החיים בחייהם והמתים במותם.

ומי שזוכר את ילדותו יותר
מן האחרים הוא המנצח,
אם בכלל יש מנצחים.
- Yehuda Amichai. [tradução Pedro Gonzaga]. In: Poesia em Casa - Versos vertidos para o português – por Pedro Gonzaga, 24.2.2012. 

§§

O corpo é a causa do amor
O corpo é a causa do amor
depois disso, a fortaleza que o protege;
depois disso, a prisão do amor.
Mas quando o corpo morre, o amor se liberta
em violenta abundância,
como um caça-níqueis em pane
que a um ressoar furioso cospe de uma só vez
todas as moedas de
todas as gerações da sorte.

**

הַגּוּף הוּא הַסִּבָּה לְאַהֲבָה
הַגּוּף הוּא הַסִּבָּה לְאַהֲבָה
אַחַר-כָּךְ הוּא הַמִּבְצָר הַשּׁוֹמֵר עָלֶיהָ
אַחַר-כָּךְ הוּא הַכֶּלֶא שֶׁל הָאַהֲבָה.

אֲבָל כְּשֶׁהַגּוּף מֵת, הָאַהֲבָה יוֹצֵאת חָפְשִׁית מִתּוֹכוֹ
וּבְשֶׁפַע גָּדוֹל,
כְּמוֹ מְכוֹנַת מַזָּל שֶׁנִּשְׁבְּרָה
וּבְבַת-אַחַת שׁוֹפֶכֶת מִתּוֹכָהּ
בְּצִלְצוּל רוֹעֵם אֶת כָּל הַמַּטְבְּעוֹת
שֶׁל כָּל דּוֹרוֹת הַמַּזָּל
- Yehuda Amichai. [tradução Pedro Gonzaga]. In: Poesia em Casa - Versos vertidos para o português – por Pedro Gonzaga, 24.2.2012. 

§§

Rápido e amargo
O fim foi rápido e amargo
Lento e doce era o tempo entre nós,
lentas e doces eram as noites
quando minhas mãos não se tocavam em desespero mais sim em amor
a teu corpo interposto
entre elas.

E quando eu entrava em ti
era como se essa grande alegria
pudesse ser medida com a precisão
de uma dor aguda. Rápida e amarga.

Lentas e doces eram as noites.
O agora é amargo e tormentoso como areia –
“Vamos ser sensatos” e semelhantes maldições.

À medida que nos extraviamos mais e mais do amor
multiplicamos as palavras,
palavras e frases tão longas e ordenadas.
Tivéssemos ficado juntos
quiçá nos tornássemos um só silêncio.
- Yehuda Amichai [tradução Pedro Gonzaga]. In: Poesia em Casa - Versos vertidos para o português – por Pedro Gonzaga, 24.2.2012. 

§§

Tente se lembrar de alguns detalhes
Tente se lembrar de alguns detalhes. Lembre das roupas
da pessoa amada
de modo que no dia do disastre você possa dizer: vista
pela última vez usando isso e aquilo, uma jaqueta marrom, um chapéu branco.

Tente se lembrar de alguns detalhes. Porque eles não têm face
e suas almas estão escondidas e o modo como choram
é o mesmo modo como riem,
e seus silêncios e seus gritos erguem-se à mesma altura
e a temperatura de seus corpos varia entre 36,5 e 40 graus
e eles não têm nenhuma vida além deste espaço exíguo
e eles não têm nenhuma imagem esculpida, nenhuma forma, nenhuma memória
e têm copos de papel para os dias de júbilo
e pratos descartáveis de papel.

Tente se lembrar de alguns detalhes. Porque o mundo
está cheio de pessoas que foram arrancadas do sono
sem ninguém para remendar o que está rasgado,
e diferentemente das feras elas vivem
cada qual em seu esconderijo solitário e morrem
juntas em campos de batalha
e nos hospitais.
E a terra engolirá a todas,
boas e más de uma só vez, como os seguidores de Corá,
todos em rebelião contra a morte,
as bocas escancaradas até o último momento,
louvando e praguejando em um só
uivo. Tente, tente se
lembrar de alguns detalhes.
- Yehuda Amichai [tradução Pedro Gonzaga]. In: Poesia em Casa - Versos vertidos para o português – por Pedro Gonzaga, 24.2.2012. 

§§

Não feito um cipreste 
Não feito um cipreste,
não todo de uma vez, não tudo de mim,
mas feito a grama, em milhares de cautelosas saídas verdes,
para estar escondido como muitas crianças
enquanto uma só delas procura.
E não feito o homem solitário,
como Saul, a quem a multidão encontrou
e fez rei.

Mas feito a chuva em muitos lugares
de muitas nuvens, para ser absorvida, para ser bebida
por muitas bocas, para ser inalada 
feito o ar do ano todo
e ser espalhada em botões na primavera.

Não o toque do telefone que acorda 
o médico em seu plantão,
mas percutindo, em tantas e pequenas janelas
de portas laterais, ao compasso dos corações.

E, depois de tudo, a saída silenciosa, feito a fumaça
sem grandes fanfarras, um estadista que se resigna do cargo,
crianças cansadas de brincar,
uma pedra no justo instante em que quase acaba de rolar
da íngreme colina, para o lugar
onde começa a planície da grande renúncia,
da qual, feito preces atendidas,
o pó se ergue em miríades de grãos.

 **

לא כברוש
לא כברוש,
לא בבת אחת, לא כולי,
אלא כדשא, באלפי יציאות זהירות-ירוקות,
להיות מוסתר כהרבה ילדים במשחק
ואחד מחפש.

לא כגבר יחיד,
כבן-קיש, שמצאוהו רבים
ועשו אותו למלך.
אלא כגשם בהרבה מקומות
מעננים רבים, להתחלחל, להיות שתוי
פיות רבים להיות נשום
כאוויר בשנה ומפוזר כפריחה באביב.

לא הצלצול החד, המעורר
בשער רופא התורן,
אלא בדפיקות, בהרבה אנשבים
בכניסות צדדיות, בהרבה דפיקות לב.

ואחר כך היציאה השקטה, כעשן
בלי תרועה, שר מתפטר,
ילדים עייפים ממשחק,
אבן בגלגולים האחרונים
לאחר המורד התלול, במקום שמתחיל
מישור הוויתור הגדול, אשר ממנו,
כתפילות המתקבלות,
עולה אבק בהרבה ריבוא גרגרים
- Yehuda Amichai [tradução Pedro Gonzaga]. In: Pedro Gonzaga/Facebook, 26.4.2019

§§

Memória do amor - Abrindo o testamento
Ainda estou dentro do quarto. Daqui a dois dias
Vou vê-lo apenas de fora,
As persianas fechadas do teu quarto onde amamos um ao outro
E não a toda humanidade.

E devemos nos voltar para nossas novas vidas
Do modo reservado aos prestimosos preparativos
Para a morte, voltados para a parede
Como na Bíblia. 

O Deus acima do ar que respiramos,
O Deus que nos fez dois olhos e duas pernas
Fez-nos duas almas também.

E devemos abrir esses dias
Num dia bem distante daqui, como quem abre
Um testamento
Anos depois que alguém morreu.
 **
- Yehuda Amichai [tradução Pedro Gonzaga]. In: Pedro Gonzaga/Facebook, 9.9.2022

§§

Milagres
De longe tudo parece um milagre
mas de perto mesmo um milagre não se parece com um.  
Mesmo quem atravessou o Mar Vermelho quando ele se dividiu 
viu apenas as costas suadas 
do homem que ia à frente 
e o balançar de suas coxas grandes, 
ou no melhor dos casos, em um olhar apressado para o lado, 
peixes em uma profusão de cores dentro da parede de água, 
como em um observatório marinho atrás de painéis de vidro.  

Os verdadeiros milagres acontecem na mesa ao lado 
de um restaurante em Albuquerque: 
duas mulheres estavam sentadas ali, uma com zíper 
diagonal, tudo lindo, 
e a outra disse: “Eu me segurei 
e não chorei”.  
E depois nos corredores vermelhos 
do hotel estrangeiro eu vi 
meninos e meninas que seguravam em seus braços 

pequenas crianças nascidas deles, 
e elas seguravam 
bonequinhas adoráveis.
**
- Yehuda Amichai [tradução Pedro Gonzaga]. In: Pedro Gonzaga/Facebook, 26.10.2022.

§§

Todos precisam de um jardim abandonado em suas vidas
Todos precisam de um jardim abandonado em suas vidas
ou de uma casa antiga com paredes a descascar
todos precisam de um outro mundo esquecido.
Pessoas olham com grande anseio
para uma paisagem e a nomeiam com partes do corpo:
costa da montanha, pé da montanha, face da montanha.
Homens de guerra, também, designam alvos de artilharia pesada
com palavras ternas:
o seio, o coração, o núcleo, o ponto de encontro.
Porque todos precisam de um jardim abandonado em suas vidas
(Adão e Eva sabiam que todos precisam de um jardim assim)
ou de uma casa antiga,
ou ao menos de uma porta fechada
que nunca mais voltará a se abrir.

**

ל אחד בחייו צריך גן נטוש
ל אחד בחייו צריך גן נטוש
או בית ישן שקירותיו מתקלפים,
כל אחד צריך עולם אחר שכוח.

בגעגועים גדולים מביטים בני אדם
בנוף וקוראים לו בשמות גוף
גב ההרף רגלי ההר, כתפי ההר.
גם אנשי מלחמה מצינים מטרות
לפגיעה קשה במילים רכות,
הפטמה, השקע, המפסעה, המפגש.

כי כל אחד בחייו צריך גן נטוש
אדם וחוה ידעו שכל אחד צריך גן כזה
בו בית ישן,
או לפחות דלת נעולה אחת
שלעולם לא ישוב לפתוח
- Yehuda Amichai [tradução Pedro Gonzaga]. In: Pedro Gonzaga/Facebook, 6.2.2023

§§

O corpo é a causa do amor
Primeiro o corpo é a causa do amor
depois a fortaleza que o protege
por fim seu cárcere.
E quando o corpo morre, o amor jorra
caudalosamente 
como de um caça-níqueis clandestino quebrado
jorram de súbito
com estrondo todas as moedas de gerações
e gerações entregues à própria sorte.

**

הַגּוּף הוּא הַסִּבָּה לְאַהֲבָה
הַגּוּף הוּא הַסִּבָּה לְאַהֲבָה
אַחַר-כָּךְ הוּא הַמִּבְצָר הַשּׁוֹמֵר עָלֶיהָ
אַחַר-כָּךְ הוּא הַכֶּלֶא שֶׁל הָאַהֲבָה.

אֲבָל כְּשֶׁהַגּוּף מֵת, הָאַהֲבָה יוֹצֵאת חָפְשִׁית מִתּוֹכוֹ
וּבְשֶׁפַע גָּדוֹל,
כְּמוֹ מְכוֹנַת מַזָּל שֶׁנִּשְׁבְּרָה
וּבְבַת-אַחַת שׁוֹפֶכֶת מִתּוֹכָהּ
בְּצִלְצוּל רוֹעֵם אֶת כָּל הַמַּטְבְּעוֹת
שֶׁל כָּל דּוֹרוֹת הַמַּזָּל.
- Yehuda Amichai. [tradução Carlito Azevedo]. In: Carlito Azevedo/Facebook. 4.1.2016.

§§

Janelas e túmulos 
Em minha vida há muitas janelas
e muitos túmulos.
Às vezes trocam
de papel
e então há uma janela que se fecha para sempre,
e então, através da lápide,
consigo ver
a distância.
- Yehuda Amichai. [tradução Carlito Azevedo]. In: Carlito Azevedo/Facebook, 18.7.2016.

§§

Outra vez o amor terminou
Outra vez o amor terminou, como uma boa safra de laranjas,
ou como uma boa temporada de escavações, que extraiu das profundezas
coisas comovidas que buscavam o esquecimento.
Outra vez o amor terminou. E como depois de se demolir
uma casa grande e retirar os escombros, visitamos
o terreno vazio e quadrado e dizemos: como era pequeno
o lugar onde ficava a casa
com tantos andares e tantas pessoas.
E dos vales distantes chega
o som de um trator solitário,
e do passado distante chega o bater
do garfo no prato de porcelana, misturando
e batendo gema de ovo com açúcar para o menino,
e bate e bate.
**
- Yehuda Amichai. [tradução Carlito Azevedo]. In: Carlito Azevedo/Facebook, 29.12.2016.

§§

O touro
O touro retornou de seu trabalho diário na arena,
depois de tomar um cafezinho com os toureiros.
Deixou-lhes, num pedaço de papel, seu endereço
correto e o lugar da capa vermelha.
A espada está cravada em sua dura cerviz.
E quando chega em casa?
Agora está na cama
com seus pesados olhos judaicos.
Compreende que também ao aço
lhe dói penetrar a carne.
Em sua reencarnação pedirá para ser espada,
pelo menos a dor permanecerá.
(" A porta fica sempre aberta, se não,
a chave estará sob o umbral")
Conhece a graça noturna
e a graça verdadeira.
Na Bíblia, figura entre os animais puros.
É muito puro, é ruminante
e seu coração está partido e dividido
como suas unhas.
Em seu peito estalam as tormentas,
acres, secas,
como se brotassem de um colchão arrebentado.
**
- Yehuda Amichai. [tradução coletiva dos editores da Editora 7Letras]. In: Ando a Pé /Veronika Paulics, 18 de abril de 2017.

§§ 

Na metade deste século 
Na metade deste século, voltamo-nos um para o outro
Com meias caras e olhos inteiros
Como um antigo quadro egípcio
E por um tempo curto.
Eu acariciei os seus cabelos
Na direção oposta à sua viagem,
Nós nos chamamos um ao outro,
Como quem diz o nome das cidades
Que ninguém visita
Ao longo do caminho.
Encantador é o mundo que amanhece para o mal,
Encantador é o mundo que adormece para o pecado e a compaixão,
Na mistura de nós mesmos, você e eu,
O mundo é encantador.
A terra bebe os homens e seus amores
Feito vinho,
Para esquecer.
Mas não pode.
E como os contornos das colinas da Judéia,
Nunca encontraremos paz.
Na metade deste século, voltamo-nos um para o outro,
Eu vi seu corpo, projetando sombra, esperando por mim,
As tiras de couro para uma longa jornada
Já me apertando o peito.
Eu disse coisas em louvor aos seus quadris mortais,
Você disse algo belo sobre o meu rosto de passagem,
Eu acariciei seus cabelos na direção da sua viagem,
Eu toquei sua carne, profeta do seu fim,
Eu toquei sua mão que nunca repousou,
Eu toquei sua boca que ainda pode cantar.
A poeira do deserto cobriu a mesa
Na qual não comemos
Mas com os dedos escrevi sobre ela 
As letras do seu nome.
**
- Yehuda Amichai [tradução de Laura Erber a partir da versão inglesa de Assia Gutmann]. In: Laura Erber/Facebook, 1 de janeiro de 2023.

§§

No lugar onde nunca estive
No lugar onde nunca estive,
Nunca estarei.
No lugar onde estive, é como se
Nunca tivesse estado lá. Os homens erram
Bem longe do lugar onde nasceram,
Bem longe das palavras que saíram
Das suas próprias bocas
E não mais dentro das promessas,
Que foram prometidas.
Eles comem de pé, morrem sentados
E se lembram deitados.
Aquilo que jamais vou ver de novo,
Devo amar para sempre.
Apenas um estranho volta ao meu lugar.
Mas vou anotar tudo uma outra vez, como Moisés,
Depois de ter quebrado as primeiras tábuas.
**
- Yehuda Amichai [tradução Vinicius Torres Freire com Rivka Halevy] / fevereiro de 2013. In: Vinicius Torres Freire/ Facebook 15.12.2015

§§

Poemas para uma mulher
1.

Teu corpo é branco como areia
onde nunca brincou criança nenhuma.

Teus olhos são tristes e formosos
como imagens de flores num livro didático.

Teu cabelo solto,
como a fumaça do altar de Caim:

Preciso matar meu irmão.
Meu irmão precisa me matar.

2.

Todos os milagres da Bíblia e todas as lendas
aconteceram entre nós enquanto estávamos juntos.

Na calma colina de Deus
pudemos descansar um pouco.

O vento da matriz soprava para nós em todo lugar
Sempre tínhamos tempo.

3.

Minha vida é triste como o perambular
dos errantes.

Meus pensamentos são viúvas,
minhas chances não casarão nunca,
jamais.

Nossos amores vestem os uniformes dos órfãos
do orfanato.

As bolas de borracha voltam à suas mãos
após bater na parede.

O sol não volta.
Nós dois somos uma ilusão.

4.

A noite toda teus sapatos desabitados
uivavam ao lado da cama.

Tua mão direita alcança desde teu sonho
Teu cabelo estuda “noitês”
de um manual de vento
rasgado.

As cortinas que se movimentam:
embaixadoras de superpotências estrangeiras.

5.

Se você abrir teu casaco,
Terei que dar o dobro de amor.

Se você vestir o chapéu redondo e branco,
Terei que exagerar meu sangue.

Da sala onde você faz amor,
terão que tirar todos os móveis

todas as árvores, todas as montanhas, todos os oceanos.
O mundo é estreito demais.

6.

A lua, aferrolhada com uma corrente,
fica quietinha lá fora.
A lua, aprisionada nos galhos da oliveira
não consegue libertar-se.

A lua de esperanças roliças
roda entre as nuvens.

7.

Quando você sorri
As idéias serias se exaurem.

De noite as montanhas ficam quietas ao teu lado,
de manhã a areia te acompanha os passos até a praia.

Quando você me faz coisas agradáveis,
todas as indústrias pesadas encerram atividades.

8.

As montanhas têm vales
e eu tenho pensamentos.

Estendem -se até a neblina e até
a ausência de estradas.

Atrás da cidade portuária
impunham-se os mastros.

Atrás de mim começa Deus
com cordas e escadas,
com caixas e guinchos,
com sempre e para sempres.

A primavera nos encontrou;
todas as montanhas ao nosso redor
são pesos de pedra
para pesar o quanto amamos.

A grama afiada chorava aos prantos
no nosso esconderijo escuro,
a primavera nos encontrou.
**
- Yehuda Amichai [tradução /versão Miriam Adelman e Claudia Borio a partir da versão em inglês de Chana Bloch e Stephen Mitchell]. In: Sibila - Revista de Poesia e Cultura, 21 de agosto de 2009.




  • Yehuda Amichai - illustration  ©?


YEHUDA AMICHAI - TRADUÇÕES PORTUGUESAS / POESIA TRADUZIDA


QUE PENA,
ÉRAMOS UMA INVENÇÃO TÃO BOA
Eles amputaram
As tuas coxas das minhas ancas.
Tanto quanto sei
São todos cirurgiões. Todos eles.

Eles desmantelaram-nos
Um ao outro.
Tanto quanto sei
São todos engenheiros. Todos eles.

Que pena. Éramos uma invenção 
Tão boa e amável. 
Um aeroplano feito de um homem e de uma mulher.
Com asas e tudo.
Pairávamos ligeiramente por cima da terra.

Até voávamos um pouco.

**

חבל. היינו אמצאה טובה
הֵם קָטְעוּ
אֶת יְרֵכַיִךְ מִמָּתְנַי.
לְגַבַּי הֵם תָּמִיד
רוֹפְאִים. כֻּלָּם.

הֵם פֵּרְקוּ אוֹתָנוּ
זֶה מִזּוֹ. לְגַבַּי הֵם מְהַנְדְּסִים.
חֲבָל, הָיִינוּ אַמְצָאָה טוֹבָה

וְאוֹהֶבֶת: אֲוִירוֹן עָשׂוּי מְאִישׁ וְאִשָּׁה,
כְּנָפַיִם וְהַכֹּל:
מְעַט הִתְרוֹמַמְנוּ מִן הָאָרֶץ,

מְעַט עַפְנוּ.
- Yehuda Amichai [tradução Jorge Sousa Braga]. In: Qual é a minha ou a tua língua?: Cem Poemas de Amor de Outras Línguas. {organização Jorge Sousa Braga]. Coleção Documenta Poetica. Lisboa: Assírio & Alvim, 2003.

§§

Nos montes de Jerusalém 
Aqui onde a ruína anseia reerguer-se,
Seu desejo é agregado ao nosso.
Mesmo os espinhos, cansados de ferir,
Querem consolar.
E a lápide, arrancada de uma sepultura profanada,
Foi colocada na nova muralha, com seu nome e suas datas.
E alegra-se, porque não será esquecida.
E as crianças, as únicas que poderiam tudo mudar,
Brincam entre rochas e ruínas.
Elas nada querem modificar.

O cancelamento de uma noite de amor no Neguev
Faz nascer uma flor nos montes de Jerusalém.
Coisas se esvaziam e se enchem,
E nem sempre você está entre as que se enchem.
E o tomilho, nem sempre cura,
Mas rasga uma profunda ferida no esquecimento,
Recordação de uma sede antiga.

Todos aqui se ocupam da tarefa de lembrar.
A ruína se lembra, se lembra o jardim,
O poço recorda suas águas e o bosque, que o plantaram,
Lembra-se, na laje de mármore, um holocausto distante
Ou mesmo, somente o nome de um doador morto,
Para que seja lembrado um pouco mais que os outros.

Mas nomes não são importantes nestes montes.
Como no cinema, quando da lista de participantes na tela
Antes do filme, ela ainda não é interessante; e no fim do filme -
Já não o é mais. Acendem-se as luzes, as letras se dissolvem
E desce a ondulada cortina, as portas são abertas e do lado de fora é noite.

Para esses montes somente o verão e o inverno são importantes,
Somente o seco e o molhado: e até mesmo as pessoas
São meros receptáculos da água dispersa em volta,
Como poços e cisternas e fontes.
**
- Yehuda Amichai  [tradução Clara Rosenberg]. In. Ariel - Revista de Artes e Letras de Israel, 1984. {edição especial em língua portuguesa}.

§§

Nas largas escadas -  a postos à espera da felicidade
Nas largas escadas que descem para o Muro das Lamentações
Uma linda mulher me apareceu: "Você não se lembra de mim,
Eu sou Shoshana, em hebraico. Sou outra em outras línguas.
É tudo futilidade".
Assim disse ela na hora do crepúsculo, de pé entre o destruído
E o em construção, entre a luz e a escuridão.
Pássaros negros e pássaros brancos trocavam lugares
Ao compasso intenso da respiração.
A luz das câmeras dos turistas iluminou também a minha memória:
O que faz você aqui entre o prometido e o esquecido,
Entre o esperado e o imaginário?
O que faz você aqui à espera da felicidade,
Com seu lindo rosto de garota-propaganda do turismo de Deus,
E sua alma dilacerada e rasgada como a minha?

Ela me respondeu: Minha alma está dilacerada e rasgada como a sua
E é isso que a faz bonita,
Como uma fina renda.
**
- Yehuda Amichai  [tradução Clara Rosenberg]. In. Ariel - Revista de Artes e Letras de Israel, 1984. {edição especial em língua portuguesa}.

§§

O moinho em Yemin Moshe
Este moinho jamais moeu farinha.
Ele moeu ar santo e os pássaros
da saudade de Bialik, ele moeu
palavras e tempo triturado, ele moeu
chuva e até mesmo bombas,
mas ele jamais moeu farinha.

Agora ele nos descobriu,
E mói a nossa vida, dia a dia,
fazendo de nós farinha da paz,
fazendo de nós o pão da paz
para as gerações futuras.

**

הַטַּחֲנָה בימין משה
הטחנה הַזֹּאת מֵעוֹלָם לֹא טָחֲנָה קֶמָח.
הִיא טָחֲנָה אֲוִיר קָדוֹש וְצִפֳּרֵי
גַעְגּוּעִים שֶל בְּיַאלִיק. הִיא טָחֲנָה
מִילִּים וּזְמַן טָחוּן, הִיא טָחֲנָה
גֶּשֶם וַאֲפִילוּ פְּגָזִים,
אֲבָל הִיא לֹא טָחֲנָה קֶמַח מֵעוֹלָם.

עַכְשָו הִיא גִּלְּתָה אוֹתָנוּ,
וְטוֹחֶנֶת אֶת חֲיֵּינוּ יוֹם יוֹם,
לַעֲשוֹת מֵאִתָּנוּ קֶמַח שָלוֹם
לֶאֱפוֹת מֵאִתָנוּ אֶת לֶחֶם הָשָּלוֹם
לַדּוֹרוֹת הַבָּאִים.
- Yehuda Amichai  [tradução Clara Rosenberg]. In. Ariel - Revista de Artes e Letras de Israel, 1984. {edição especial em língua portuguesa}.

§§

Um pastor árabe procura um cabrito no Monte Sion
Um pastor árabe procura um cabrito no Monte Sion,
E no monte em frente eu procuro por meu filho pequeno.
Um pastor árabe e um pai judeu
Ambos no seu temporário fracasso.
Nossas vozes se encontram sobre
A piscina do Sultão, no vale entre nós.
Nenhum de nós quer que o filho e o cabrito
Entrem no terrível processo
Da música da Páscoa "Um Cabrito".*

Depois achámo-los entre os arbustos,
E nossas vozes retornaram a nós
E choraram e riram por dentro.

As buscas de um cabrito ou de um filho
Foram sempre
Começo de uma nova religião nestes montes.

**

רועה ערבי מחפש גדי
רועה ערבי מחפש גדי בהר ציון,
ובהר ממול אני מחפש את בני הקטן.
רועה ערבי ואב יהודי
בכשלונם הזמני.
קולות שנינו נפגשים מעל
לבריכת השולטן בעמק באמצע.

שנינו רוצים שלא יכנסו
הבן והגדי לתוך תהליך
המכונה הנוראה של חד גדיא.

אחר כך מצאנו אותם בין השיחים,
וקולותינו חזרו אלינו ובכו וצחקו בפנים.
החיפושים אחר גדי או אחר בן
היו תמיד
- Yehuda Amichai  [tradução Clara Rosenberg]. In. Ariel - Revista de Artes e Letras de Israel, 1984. {edição especial em língua portuguesa}.

§§

Eu não sei se a história se repete
Eu não sei se a história se repete
Mas eu sei que você - não.

Lembro-me que a cidade estava dividida
Não somente entre judeus e árabes,
Mas também entre você e eu,
Quando juntos lá estávamos.

Dos perigos, fizemo-nos um ventre,
Da guerra mortal, construímo-nos um lar,
Como o homem do norte distante
Que do gelo mortal,
Constrói para si uma casa
Protectora e aconchegante.

Reunificou-se a cidade,
Porém, juntos, lá não estávamos mais.
Sei eu, agora,
Que a história não se repete,
Assim como eu sempre soube que você - não.
**
- Yehuda Amichai [tradução Clara Rosenberg]. In. Ariel - Revista de Artes e Letras de Israel, 1984. {edição especial em língua portuguesa}.

§§

A escola onde estudei
Passei pela escola onde estudei enquanto rapaz
e disse do fundo do coração: aqui aprendi certas coisas
e não aprendi outras. Toda a minha vida amei em vão
as coisas que não aprendi. Estou coberto de conhecimento,
sei tudo sobre o crescimento da árvore do conhecimento,
a forma das suas folhas, a função do seu sistema de raízes, os seus insectos parasitas.
Sou um especialista na botânica do bem e do mal,
e ainda estou a estudá-la, e continuarei a estudá-la até ao dia em que morrer.
De frente para o edifício, olhei para o seu interior. Esta é a sala
onde nos sentámos e aprendemos. As janelas de uma sala de aulas sempre
abertas
para o futuro, mas na nossa inocência pensávamos que era apenas paisagem aquilo que víamos da janela.
O recreio era estreito, pavimentado com pedras largas.
Relembro o breve tumulto de nós os dois
junto dos frágeis degraus, o tumulto
que era o início de um primeiro grande amor.
Agora ele existe para além de nós, como num museu,
como tudo o resto em Jerusalém.
- Yehuda Amichai [tradução de Miguel Gonçalves a partir da versão inglesa de Chana Bloch e Chana Kronfeld]. In: Quartzo, Feldspato & Mica. Post Scriptum #90, 2.12.2003.

§§

Paz Selvagem
Não a paz de um cessar-fogo
nem mesmo a visão do lobo e do cordeiro,
Mas antes
como no coração quando acaba a excitação
e não se consegue falar a não ser do susto.
Eu sei que sei matar, isso faz de mim um adulto.
E o meu filho brinca com uma pistola de plástico
e sabe abrir e fechar os olhos e dizer mamã.

Uma paz
sem o grande barulho de fazer das espadas arados
Sem palavras, sem
o ruído surdo de um pesado carimbo:
que seja leve, flutuante, como preguiçosa espuma branca.
Um pequeno descanso para as feridas – quem fala de cura?
(E o grito dos órfãos é passado de uma geração
para outra, como uma corrida de estafetas:
o testemunho nunca cai.)

Deixem-na vir
como flores do campo, selvagens,
abruptamente, porque o campo
precisa delas: paz selvagem.
- Yehuda Amichai. [tradução Nuno Guerreiro Josué]. In: Rua da Judiaria, 6 de maio de 2004.

§§

Um homem e a sua vida
Um homem não tem tempo na sua vida
para ter tempo para tudo.
Não tem momentos que cheguem para ter
momentos para todos os propósitos. Eclesiastes
está enganado acerca disto.

Um homem precisa de amar e odiar no mesmo instante,
de rir e chorar com os mesmos olhos,
com as mesmas mãos atirar e juntar pedras,
de fazer amor durante a guerra e guerra durante o amor.
E de odiar e perdoar e lembrar e esquecer,
de planear e confundir, de comer e digerir
que história
leva anos e anos a fazer.

Um homem não tem tempo.
Quando perde procura, quando encontra
esquece, quando esquece ama, quando ama
começa a esquecer.

E a sua alma é erudita, a sua alma
é profissional.
Só o seu corpo permanece sempre
um amador. Tenta e falha,
fica confuso, não aprende nada,
embriagado e cego nos seus prazeres
e nas suas mágoas.

Morrerá como um figo morre no Outono,
Enrugado e cheio de si e doce,
as folhas secando no chão,
os ramos nus apontando para o lugar
onde há tempo para tudo.

**

אדם בחייו אין לו זמן שיהיה לו
אדם בחייו אין לו זמן שיהיה לו 
זמן לכל.
ואין לו עת שתהיה לו עת
לכל חפץ. קהלת לא צדק כשאמר כך.

אדם צריך לשנוא ולאהוב בבת אחת,
באותן עיניים לבכות ובאותן עיניים לצחוק
באותן ידיים לזרוק אבנים
ובאותן ידיים לאסוף אותן,
לעשות אהבה במלחמה ומלחמה באהבה.

ולשנוא ולסלוח ולזכור ולשכוח
ולסדר ולבלבל ולאכול ולעכל
את מה שהיסטוריה ארוכה
עושה בשנים רבות מאוד.

אדם בחייו אין לו זמן. 
כשהוא מאבד הוא מחפש
כשהוא מוצא הוא שוכח,
כשהוא שוכח הוא אוהב
וכשהוא אוהב הוא מתחיל לשכוח.

ונפשו למודה,
ונפשו מקצועית מאוד
רק גופו נשאר חובב
תמיד. מנסה וטועה
לא לומד ומתבלבל
שיכור ועיוור בתענוגותיו ובמכאוביו.

מות תאנים ימות בסתיו
מצומק ומלא עצמו ומתוק,
העלים מתיבשים על האדמה, 
והענפים הערומים כבר מצביעים
אל המקום שבו זמן לכל.
- Yehuda Amichai. [tradução Shlomit Keren Stein e Nuno Guerreiro]. In: Poesia Judaica, 5.11.2009.

§§

Uma pena. Nós éramos uma invenção tão boa
Eles amputaram
As tuas coxas das minhas ancas.
A meu ver
São todos cirurgiões. Todos eles.
 
Eles desmantelaram-nos
Um do outro.
A meu ver
São todos engenheiros. Todos eles.
 
Uma pena. Nós éramos uma invenção
Tão boa e terna.
Um avião feito de homem e mulher.
Asas e tudo.
Pairávamos um pouco sobre a terra.
 
Nós até voávamos um pouco.

**

חבל. היינו אמצאה טובה
הֵם קָטְעוּ
אֶת יְרֵכַיִךְ מִמָּתְנַי.
לְגַבַּי הֵם תָּמִיד
רוֹפְאִים. כֻּלָּם.

הֵם פֵּרְקוּ אוֹתָנוּ
זֶה מִזּוֹ. לְגַבַּי הֵם מְהַנְדְּסִים.
חֲבָל, הָיִינוּ אַמְצָאָה טוֹבָה

וְאוֹהֶבֶת: אֲוִירוֹן עָשׂוּי מְאִישׁ וְאִשָּׁה,
כְּנָפַיִם וְהַכֹּל:
מְעַט הִתְרוֹמַמְנוּ מִן הָאָרֶץ,

מְעַט עַפְנוּ.
- Yehuda Amichai [tradução Bruno M. Silva]. In: Manual de Prestidigitação - Poesia | Literatura, 20.10.2020.
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Obs.: Sites, jornais e revistas acessados entre 13/2 a 17.2. 2024.

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  • Yehuda Amichai  - illustration by  © Olivia Wise Studio

FORTUNA CRÍTICA DE YEHUDA AMICHAI

AMÂNCIO, Moacir. Para bagunçar a Bíblia: Yehuda Amichai e a reinvenção da tradição. In: Bazar do Tempo, s/data. Disponível no link. (acessado em 14.2.2024).
AMÂNCIO, Moacir. Isto é um panóptico? Ou notas sobre tradução e traduzir. In: Relicário Edições, 26 de março de 2021. Disponível no link. (acessado em 14.2.2024).
ASCHER, Nelson. Sionismo renovou a cultura judaica.  In: Folha de S. Paulo - especial, 23 de abril 1998. Disponível no link. (acessado em 15.2.2024)
BALBUENA, Monique Rodrigues. A linguagem do amor por intermédioda língua hebraica: lendo “Layla” de Amichai. In: Arquivo Maaravi - Revista  Digital de Estudos Judaicos da  UFMG. Belo Horizonte, v. 10, n. 18, p. 216–224, maio 2016. Disponível no link. (acessado em 15.2.2024).
BOQNEWS. O mais celebrado poeta de Israel agora em português. In: Boq News, 12 de julho 2019. Disponível no link. (acessado em 14.2.2024).
CAETANO, Adauto Lúcio Caetano. As (in)visibilidades dos tradutores sombra, vestígio e imagem. (Dissertação Mestrado em Lingüística / Teoria da Tradução). Universidade Estadual de Campinas, Unicamp, 2001. Disponível no link e link. (acessado em 14.2.2024).
CAMPOS, Haroldo de.. A harpa davídica: a poesia de Israel. In: Folha de S. Paulo, +mais!, 14 de abril de 1996. Disponível no link. (acessado em 14.2.2024). 
CONY, Carlos Heitor. Poesia sempre. In: Folha de São Paulo - Opinião, 9 de julho de 1997. Disponível no link. (acessado em 17.2.2024).
CORREIA, Donny. Poemas de Yehuda Amichai são reunidos no Brasil pela primeira vez. In: Estadão, 8.4.2019. Disponível no link. (acessado em 14.2.2024)
DIAS, Edney Cielici. O chão estéril das certezas: uma tradução livre de Yehuda Amichai. In: Ventilador Literário, 3 de maio de 2023. Disponível no link. (acessado em 14.2.2024) 
ERBER, Laura. Poeta Yehuda Amichai é ao mesmo tempo moderno e atemporal. In: Folha de S. Paulo, Ilustrada - São Paulo, 5 jan. 2019. Disponível no link. (acessado em 14.2.2024).
FREITAS JR., Osmar. Cidade das muralhas - Jerusalém é o ponto mais difícil das discórdias entre judeus e palestinos na mesa de negociações. In: Istoé, 19.7.2000. Disponível no link. (acessado em 14.2.2024).
GARCÍA LOZANO, Raquel. La poesía de Yehudah Amichai - VOL. 1. [Lá esperanza siempre está en el medio - Estudio sobre la obra poética de Y. Amijai, 1948-1989].. (tesis doctoral). Universidad Complutense de Madrid, Facultad de Filología, Departamento de Hebreo y Arameo, 1997. Disponível no link. (acessado em 15.2.2024). 
GARCÍA LOZANO, Raquel. Hacia un nuevo nosotros: Análisis de la poesía de Yehudah Amichai. In: Jewish studies at the turn of the twentieth century ; 2: Judaism from the Renaissance to modern times, 1999. 
GLASMAN, Jane Bichmacher. A poesia hebraica moderna. In; Revista Confraria - Arte e Literatura, n. 19, mar/abr 2008. Disponível no link e link. (acessado em 14.2.2024).
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MEIRELES, Cecília (sel./trad). Poesia de Israel. [seleção e tradução Cecília Meireles; apresentação Alexander Dothan; ilustrações Candido Portinari; desenho de capa Eugênio Hirsch. Civilização Brasileira, 1962 {poemas de 23 poetas israelenses}
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POEMAS de Yehuda Amichai. [versão Miriam Adelman e Claudia Borio]. In: Sibila - revista de Poesia e Cultura, 21 de agosto de 2009. Disponível no link. (acessado em 14.2.2024) 
POESIA. Quatro poemas de Yehuda Amichai traduzidos por Millôr Fernandes. In: 7faces, 17 de janeiro de 2013. Disponível no link. (acessado em 15.2.2024). 
POESIA. A passagem do tempo, a guerra de Israel e a morte em paz - Yehuda Amichai. In: Revista Piauí, edição n. 10, Julho 2007. Disponível no link. (acessado em 15.2.2024).
BEREZIN, Jaffa Rifka. Dicionário Hebraico-Português. São Paulo: EdUSP, 2003.
RÓNAI, Cora. Yehuda Amichai é, enfim, publicado no Brasil. In: O Globo, 9.1.2019. Disponível no link. (15.2.2024). 
ROZENCHAN, Nancy. Literatura hebraica: vertentes do século XX. São Paulo: Associação Editorial Humanitas, 2004.
SABOGAL, Winston Manrique. Primera antología en español del poeta israelí Yehuda Amijai. In: El País, 28 de abril de 1998.  Disponível no link. (acessado em 14.2.2024) 
SCHAANAN, Avraham. A moderna literatura hebraica e suas correntes. São Paulo: USP/Centro de Estudos Judaicos, 1998.
SCHLESINGER, Vivian. Antologia traz ao Brasil a produção de um dos maiores poetas de Israel. In: Gazeta do Povo, 10.10.2019. Disponível no link. (acessado em 14.2.2024).
SCHLESINGER, Vivian. Dor ancestral - A antologia Terra e paz, de Yehuda Amichai, traz ao Brasil a produção de um dos mais notórios poetas de Israel. In: Rascunhos, setembro/2019. Disponível no link. (acessado em 14.2.2024).
SCLIAR, Moacyr. A prosa judaica entre dois pólos. In: Folha de S. Paulo, 14 de abril de 1996.  Disponível no link. (acessado em 14.2.2024)
SENA, Andre.Yehuda Amichai ou a poesia do sussurro.. In: Humanismo judaico na literatura, na história e na ciência. 1ª ed., Rio de Janeiro: Centro de História e Cultura Judaica (CHCJ)/ Editora Jaguatirica, 2017, v. 4, p. 113-130.  Disponível no link. (acessado em 14.2.2024).
VALLE, Marina Della. Poeta israelense Yehuda Amichai tem primeira coletânea lançada no país. In: Valor Econômico, 6.9.2019. Disponível no link. (acessado em 14.2.2024)
WALDMAN, Berta. Linhas de força: escritos sobre literatura hebraica. São Paulo: Humanitas, 2004.
WALDMAN, Berta; KIRSCHBAUM, Saul (orgs.) Ensaios sobre literatura israelense contemporânea. São Paulo: Humanitas, 2011.
WEINTRAUB, Fabio. Notícias de outras ilhas. In: Revista Cult, 22 de maio de 2020. Disponível no link. (acessado em 15.2.2024)
ZONA PAZ. En la mirada de Claudia Kerik. In: Zona Paz, s/data. Disponível no link. (acessado em 17.2.2024). 

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Yehuda Amichai  - poeta israelense

TEATRO / PEÇA INÉDITA

:: VOZ - Millôr Fernandes – Esta peça é dedicada ao poeta israelense Yehuda Amichai (o c é mudo) e ao biofísico italiano Ruggero Pierantoni.
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Fonte: CLB Millôr Fernandes by Instituto Moreira Salles (acessado em 17.2.2024)

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  • Yehuda Amichai - foto © Lois Shelton

OBRA DE YEHUDA AMICHAI EM ESPANHOL / CASTELHANO

Poesia - livros
:: Mira, tuvimos más que lá vida (Nuevos poemas escogidos)Amijai Yehuda.[selección, traducción del hebreo y prólogo Claudia Kerik; investigación iconográfica Hugo R. Miranda]. Colección Poesía.  Ciudad de México: Elefanta Editorial, 2019. {Incluye fotos y testimonios de Paul Celan, Assia Gutmann, Ted Hughes, Cynthia Ozick, Amos Oz, Octavio Paz y Homero Aridjis} 
:: Los viajes del último Benjamín de TudelaAmijai Yehuda. [traducción y notas de Alberto Huberman; introducción y versión de Angelina Muñiz-Huberman]. México: Ediciones Sin Nombre, 2009.
:: Gran tranquilidad: preguntas y respuestas. Amijai Yehuda. [traducción del hebreo, introducción y notas de Raquel García Lozano]. Colección Poesía / Cátedra. Madrid: Ediciones Cátedra (Grupo Anaya S.A.), 2004. 
:: Detras de todo esto se oculta una gran felicidad / "Meajorei kol ze mistatter osher gadol"Amijai Yehuda. [traducción, prólogo y notas Raquel García Lozano]. Barcelona: Señor Hidalgo La Poesia, 2004 {publicación bilíngue Hebreo / Español}.
:: Un idioma, un paisaje. Antología poética 1948-1989Amijai Yehuda.[Selección, traducción y notas de Raquel García Lozano]. Colección Poesía Hiperión. Madrid/Espanha: Ediciones Hiperión, 1997. {traducido del hebreo}.
:: Amikhai. Quedait Amb MiAmikhai Iehuda. [pròleg i traducció Manuel Forcano]. Barcelona/Espanha: Columna Edicions, 1995.
:: Yehuda Amijai: ahora y en otros días. [selección Manuela Mata Amaro]. Granada/Espanha: Universidad de Granada, 1994.
:: Poemas escogidos. Yehuda Amijai. [selección, traducción, prólogo y notas de Claudia Kerik]. Segunda edición corregida y aumentada. México D.F., Editorial Vuelta, 1990.
:: Poemas escogidos. Yehuda Amijai. [selección y traducción directa del hebreo de Claudia Kerik]. Jerusalén, Israel: La Semana Publicaciones, 1986. {edición bilingüe}

Em antologias espanholas / castelhanas
:: Poesía hebrea contemporánea - antología [traducción e introducción de Teresa Martínez]. Coleção Poesía Hiperión. Madrid/Espanha: Ediciones Hiperión, 1994. {edición bilingüe}
:: Antología de la literatura hebrea contemporánea [selección Maria Encarnacion Varela]. Barcelona: Ediciones Octaedro, 1992.
:: Poesía hebrea moderna: antologia [compilada y traducida por  Arie Comey]. Jerusalén, Israel:  La semana publicaciones, 1987. {edición bilingüe}
:: Antologia de la poesia hebrea moderna. [selección, traducción, introducción y notas de Ramón Díaz]. Madrid/ES: Aguilar Ediciones, 1970.


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© Pesquisa, seleção, edição e organização: Elfi Kürten Fenske
© Seleção e organização dos poemas: José Alexandre da Silva


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FENSKE, Elfi Kürten; SILVA, José Alexandre da.. (pesquisa, seleção, organização e edição). Yehuda Amichai - poeta israelense. In: Templo Cultural Delfos, fevereiro/2024. Disponível no link. (acessado em .../.../...).
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** Página atualizada em 24.2.2024.
Postagem original de FEVEREIRO 2024


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