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Rachel de Queiroz - discurso de posse na Academia Brasileira de Letras (ABL)

Rachel de Queiroz - foto: ...
Rachel de Queiroz foi a primeira mulher a entrar para a Academia Brasileira de Letras, em 1977, ocupando a cadeira de número 5.


Sr. Presidente da Academia Brasileira de Letras,
Sr. Ministro da Educação e Cultura,
Representando o Sr. Presidente da República,
Sr. Ministro da Justiça,
Sr. Governador do Estado do Rio de Janeiro,
Sr. Governador do meu Estado do Ceará,
Demais autoridades presentes,
Meus senhores e minhas senhoras:

No oitão branco, batido de luar, da velha casa de fazenda, devagarinho vai-se abrindo uma janela, a que dá para o pequeno jardim fechado, onde há cravos, bogaris e uma laranjeira. A menina-moça, mais menina do que moça, debruça-se ao peitoril e procura a lua com os olhos. Logo a descobre, tão clara, daria para ler uma carta!

A menina assesta na lua, diretamente no disco da lua, os seus olhos que já são míopes. Suspira, mas é um suspiro diferente, satisfeito, consolado; a menina ainda não está na idade dos suspiros propriamente ditos, está na idade das imaginações e dos sonhos. E, de olhos fitos na lua, silenciosamente, mal movendo os lábios, vai murmurando para si uma reza, uma encantação – um poema? Um poema que é reza e encantação. Vai murmurando como se rezasse para a lua, e na verdade está rezando para a lua:

... Astro dos loucos, sol da demência
Vara, noctâmbula aparição!
Quantos, bebendo-te a refulgência
Quantos por isso, sol da demência,
Lua dos loucos, loucos estão!

Já reconhecestes na encantação rezada pela moça o poema inesquecível. E na adolescente que se tenta fazer bruxa daquele culto lunar, permiti que vos apresente a velha senhora de hoje tentando desvendar os seu laços antigos com o poema e com o altíssimo poeta.

...E assim fitando-a noites inteiras
Seu disco argênteo n'alma imprimi...
..........................................................

Passei fitando-a noites inteiras,
Fitei-a tanto que enlouqueci!

E a menina fitava a lua, fitava, esperando o transe, o rapto, o santo. Encandeava-se de lua, fechava os olhos, sentia sob as pálpebras o disco branco

...seu disco argênteo n'alma imprimi...
Argênteo... noctâmbulos... euros... caçoilas... flux... - e a própria palavra-chave do poema - plenilúnio - a menina as procurara diligentemente no dicionário, aquelas dificuldades parnasianas, traduzira-as, tirara-as do rol incompreensível de “abracadabra”, “abre-te Sésamo”... Incorpora-as todas à sua posse da língua, sentia-se rica e rara.

A noite branca era fria e a menina se envolvia toda no lençol, por sobre a camisola fina. E as cobertas arrastadas atrás de si davam-lhe o desejo de saltar a janela, descer pelo pátio claro onde, no areão vermelho, luziam chispas nas malacachetas.

... há pó de estrelas pelas estradas...
e ir seguindo o rumo do perfume dos aguapés na várzea

...eu sigo às tontas, cego de luz...
......................................................

...Por toda parte louco, arrastando,
O largo manto do meu luar...

Ficava assim até que cantasse o galo da meia-noite - os galos cantam cedo em noites de lua cheia - e então cerrava lentamente a janela e voltava à sua rede branca de varandas de renda, onde dormia e sonhava, os olhos brancos de lua, redizendo o poema até dormir com ele.

Foi essa a minha primeira e mais grave intoxicação poética. Tive outras depois, mais amenas, já vacinada pela leitura e pela experiência que aumentava.

O poema eu o descobrira por mim mesma, num volume já gasto por outra geração de moças - minhas tias. Naquela nossa casa onde se lia tanto, mas onde meu pai só gostava de Camões, Castro Alves e Guerra Junqueiro, e minha mãe sofria uma incompreensível falta de ouvido para os poetas - (o seu ídolo era Machado, mas na prosa!) - Raimundo ficou sendo o meu poeta particular, o meu misterioso, louco poeta particular.

Concentrei-me no plenilúnio. Acho que, como eu, há pessoas de um só poema, de um só poeta. Poetas, para elas, são como namorados, pode-se ter muitos, sucessivos, mas nunca muitos, simultâneos. Anos e anos fiquei fiel a Raimundo, até que descobri Manuel Bandeira e foi aquele alumbramento...

Depois - mas não estou aqui para vos contar os meus amores poéticos e sim a ligação íntima com que, milênios antes de sonhar com esta Casa e esta Cadeira, a menina-moça que eu era já se sentia presa ao seu Fundador.

Fundador e Patrono. Um escolhido pelo outro, o Patrono pelo Fundador. Alguns buscam o significado
dessa escolha na analogia do ofício, digamos oficial, de ambos, juízes um e outro. (Circunstância que também a eles ligaria a quinta ocupante da Cadeira nº 5, tão chegada a juízes, filha, neta, irmã de juiz que é; e os ligaria igualmente ao quarto ocupante, o juiz maior de todos, já que alcançou o Supremo)... mas isso são divagações.

Juízes os dois, seria por isso que Raimundo escolheu como patrono o romancista Bernardo Guimarães? Bem, talvez não fosse a toga propriamente o elemento de união, mas a maneira de exercê-la, os contrastes entre a personalidade dos dois juízes, suscitando a atração do pólo positivo pelo negativo. O Juiz Correia veria no Juiz Guimarães aquilo tudo que ele não era, mas gostaria de ser. O juiz escravo da lei, quase neuroticamente escrupuloso, quem sabe sonhava em ser como o outro, o seu antípoda, boêmio irreverente que desafiava autoridades, recebia partes tocando violão, dava despachos em versos picarescos; meritíssimo dr. juiz municipal de Catalão Goiás, que - o caso é célebre - ao assumir o cargo, apiedado da mísera situação dos onze presos que esperavam julgamento na péssima enxovia local, convocou imediatamente um júri e, em rito sumário e irregular, os fez “absolver por unanimidade e libertar incontinenti”.

O tímido colega apreciaria com inveja o confrade irreverente, desdenhoso de escândalos; e trai essa simpatia ao escolher, como padrinho da sua Cadeira, dentro da constelação de grandes nomes nacionais, precisamente aquele que seria o seu antípoda, símbolo de todas as suas insubmissões sufocadas.

Naquele tempo de Bernardo Guimarães, era o Brasil uma espécie de província perdida, cuja capital se situava em Paris.

Sem propriamente renegar a pátria, o brasileiro dado às letras sentia-se como uma espécie de cidadão da Europa; se o corpo, o coração, prendiam-se aqui, o espírito pairava ao pé da velha civilização, cuja seiva hauria, em cujas tradições se alimentava.

Os que liam inglês eram byronianos; os francófilos - a maioria - juravam por Lamartine, Chateaubriand e Victor Hugo, deles tirando inspiração e modelo.

Rachel de Queiroz - foto: ...
Bernardo Guimarães é verdade que tentou agir em área própria, usando cenários brasileiros, personagens brasileiros, discutindo problemas brasileiros. Mas não teve como fugir à onda romântica que, dentro dos debates sociais, proclamava obrigatoriamente a inocência dos humildes, defendia os fracos, anatematizava os vilões.

E, assim mesmo, combatendo embora a vergonha do cativeiro, ele não ousou enfrentar os tabus da época; fazia restrições racistas, como, aliás, as faziam todos os outros adversários da escravidão - piedosos, paternalistas, levados por sentimentos caritativos - mas nada igualitários. Por exemplo, no seu mais famoso romance A Escrava Isaura, escrito como libelo veemente contra a escravidão (e indiscutivelmente bastante superior ao célebre e lacrimogêneo Cabana do pai Tomás, de Mrs. Beecher Stowe), Bernardo Guimarães não ousa apresentar na heroína uma moça negra, como seria razoável. Razoável, talvez, mas inadmissível para o público de senhores e sinhás a que se dirigia. Isaura é branca, pelo menos na aparência, a sua pinta de sangue negro completamente disfarçada em sinais de beleza.

Só um Castro Alves se atreveria a celebrar o que modernamente chamamos a negritude; esse falava no negro de igual para igual, proclamava os padrões de beleza negros:

Lá nas areias infindas
Das palmeiras no país
Nasceram crianças lindas
Viveram moças gentis...

Para a sociedade brasileira de então, filhos de negros não seriam jamais “crianças” - eram crias e moleques... E o que dizer das “moças gentis”?

Mas Castro Alves foi um gênio, e gênios não se bitolam por padrões correntes, por mais imperativos. E o corrente eram os preconceitos que nem mesmo o nosso Bernardo Guimarães, embora pessoalmente rebelde e provadamente compassivo, pôde, como romancista, desafiar.

De Osvaldo Cruz, sucessor de Raimundo Correia, diz-se que ele entrou nesta Casa em obediência ao critério de convocação de expoentes, já que na sua admirável vocação de cientista (ele próprio se dizia “um modesto homem de laboratório”), não teve tempo para dedicar-se à obra literária.

Em verdade, ele entrou aqui como expoente - mas dentro de uma categoria muito rara - na especialíssima categoria de herói.

Há os heróis que matam - aqueles que eu certa vez, num assomo de petulância juvenil, ousei chamar “os grandes carniceiros da História” - Alexandre, César, Napoleão - e há os heróis cuja luta não visa a morte, mas a vida dos homens; cujas batalhas são de salvar, não de matar. São os heróis mais altos, cuja pura auréola os deve colocar no círculo superior dos bem-aventurados, no Paraíso.

Osvaldo Cruz foi um desses heróis angélicos; sua vida curta e generosa foi um só combate contra o inimigo invisível, o infinitamente pequeno, imolador de homens. Seu terreno de campanha o Brasil, sua arena especial a cidade do Rio de Janeiro, bela sempre, então como agora, mas perigosa para quem nela vivia, mortífera para quem nela chegava, com a febre amarela devorando uma cota impressionante de vidas desde os primeiros bafejos do verão.

O que foi essa luta, outros, antes de mim, nesta mesma tribuna, já a narraram superiormente; basta reler as palavras de Afrânio Peixoto, ao receber Osvaldo na Academia.

E a briga do herói não era só contra a peste, mas contra os interesses contrariados, a inveja, a ignorância; meu Deus, há interesses contrariados até quando se trata da recuperação de uma cidade, de um país!

Mas, purificado o Rio, a cidade de novo aberta, liberada da sua permanente quarentena, Osvaldo Cruz se transportou à Amazônia, numa cruzada contra a malária que dizimava os operários construtores daquela estrada de ferro de terrível memória, a Madeira-Mamoré. De passagem, ele expulsou a febre amarela da cidade de Belém do Pará, porto de grande movimento das frotas internacionais.

O que ainda teria feito por nós esse homem, se a morte não o derrubasse ainda em quase mocidade, aos 45 anos de idade - dá um pouco de vertigem pensar.

Em todo o caso, Osvaldo conseguiu comprimir em sua curta vida os desempenhos de muitas vidas, como se tivesse pressa, como se adivinhasse que a contagem regressiva das suas horas já começara, quatorze anos atrás, no momento em que ele assumiu, sob o título despretensioso de Diretor-Geral da Saúde Pública, a tremenda tarefa que o cobriu de glória.

Mestre Aloysio de Castro, sucessor de Osvaldo Cruz, era um exemplar, já em segunda geração, de um muito importante grupo de médicos, dos quais o “anjo” foi, sem dúvida, o seu ilustre pai, o Dr. Francisco de Castro.

Extremavam-se esses doutores no cultivo das belas-letras, no manuseio dos clássicos, no trato requintado do idioma, num gosto parnasiano do termo raro, da construção preciosa. Nos seus compêndios de medicina, a par do ensinamento meramente profissional, está sempre visível a preocupação do autor em produzir igualmente trabalho de fino lavor literário, graças à qual transcendiam da sua condição original de manuais médicos e se colocavam entre as obras de literatura propriamente dita.

Tinham eles o seu epígono não em outro médico mas em Rui Barbosa - o padrão das formas clássicas revividas. Haviam, aliás, herdado esse pendor dos grandes mestres da medicina francesa do século passado, cujos requentes de prosa escrita eram notórios - os Trousseuau, os Jaccoud, os Dieulafoy.

Guardo, do professor Aloysio de Castro, uma lembrança bem de acordo com a aura meio romântica que o cercava. Levou-me à sua casa a minha querida e saudosa Lota de Macedo Soares, a acompanhá-la em postulado de já nem sei que cruzada artística em que então se empenhava.

Apanhado de improviso - creio que Lota era suficientemente íntima da casa para lá chegar assim - o mestre nos recebeu, no seu salão, sentado ao piano, vestido num robe de cetim cor de vinho. E, interrompendo docemente as veemências de Lota, quis saber quem eu era, sorriu satisfeito ao se inteirar do meu ofício, e começou a tocar um pouco, para me pôr à vontade, creio. Foi tudo extremamente gentil e, para mim, inesquecível: o piano de cauda, sobre o qual havia retratos em moldura de prata, o salão em penumbra e o amável cavalheiro dedilhando delicadamente o prelúdio de Chopin.

Se houve, neste país, um homem de letras a quem não se pudesse taxar de alienado, como é de gosto dizer-se agora, ou de encerrar-se em torre de marfim, como no tempo em que ele fez a sua opção na vida, será esse homem aquele cuja saudade ainda choramos, de cuja Cadeira me acerco, apesar do direito que me dais, meio receosa de ocupá-la.

Cândido Motta Filho. Numa vida que, em termos humanos, pode considerar-se longa – quase oitenta anos - esse paulista inquieto fez de tudo e tudo fez bem, quer no plano intelectual, quer no político, quer no social. E se em todas essas atividades saiu-se com singular felicidade, é que recebera de nascimento dotes acumulados, sobressaindo entre eles aquela clara inteligência a par de um largo e muito humano coração.

Acompanhando-o na sua rica biografia, vemo-lo, mal saído da Faculdade de Direito, na posse do seu canudo de bacharel, tratar logo de ir diversificando os seus interesses; e ei-lo advogado, jornalista, político, professor.

E curioso é que, durante a vida inteira, se manteve fiel a esse leque de vocações. Fiel, exímio e vitorioso: o advogado e jurista chegando a Ministro do Supremo Tribunal Federal; o jornalista que começara escrevendo uma coluna judiciária e simultaneamente dirigindo a página de literatura da mesma folha, prosseguindo jornalista e literato até os dias finais, morrendo como membro da Academia Brasileira de Letras.

Político: o moço que se fizera eleger juiz de paz do bairro paulistano de Santa Cecília, atingiu a presidência do seu partido, o Partido Republicano. Note-se que, nesse ramo da política, a sua fé de ofício bastaria para encher com lustro mais de uma biografia.

Moço, foi auxiliar da cúpula do governo quando os seus detinham o poder, foi deputado estadual constituinte. Entre uma atividade e outra sentou praça nas hostes dos que fizeram a revolução constitucionalista de 1932, opondo-se de armas na mão à primeira fase da ditadura de Vargas.

Com o governo Dutra chegou a Ministro do Trabalho. E no governo Café Filho ocupou outra pasta, esta bem consentânea com os seus interesses e atividades mais autênticos – a pasta da Educação e Cultura.

Professor, iniciou-se na carreira de mestre no Patronato Agrícola do Estado; e, de escola em escola, alcançou a cátedra de Direito Constitucional, na gloriosa Faculdade de Direito de São Paulo.

Um outro apaixonado interesse de Cândido Motta Filho foi o problema, ou antes, o drama do menor abandonado. Aquele humano e grande coração em que falei acima muito cedo se voltou para esse tema angustiante, manifestando-se quer em estudos muito acurados, quer em ação direta. Na prática, envolveu-se de modo nada platônico, tendo chegado a Diretor do Serviço de Proteção de Menores do seu Estado.

Na teoria, além de vários escritos dispersos, publicados na imprensa, foi o autor de um livro importante, A defesa da infância contra o crime.

Mas não foi como jurista, nem como sociólogo, nem como homem de Estado, nem como jornalista de longo tirocínio - não foi por nenhum desses títulos exponenciais que Cândido Motta Filho entrou nesta Casa. Títulos que sobejamente lhe garantiriam o ingresso aqui – como a vários outros ilustres companheiros.

Cândido Motta Filho ocupou esta Cadeira n& ordm; 5, na Casa de Machado de Assis, graças à sua essencial condição de homem de letras, atividade que, a par das outras, exerceu com fidelidade, constância e talento. Caracterizava-se como escritor, além da lucidez e da originalidade do enfoque nos temas abordados, pela exposição clara e bem informada, aliada à preocupação estética da forma.

E, circunstância singular, esse escritor que se interessava indisfarçavelmente pelo dizer lapidar, pela boa linhagem vernácula da sua escrita, formou entretanto no bando iconoclasta da Semana de Arte Moderna, “representante da insubordinada geração de 1922” no dizer de Cassiano Ricardo, sendo mesmo um dos seus elementos mais atuantes, dentro do núcleo central do grupo, com voz na imprensa diária.

Muito já se tem dito sobre a Semana de Arte Moderna. Aqui desejamos apenas assinalar um aspecto curioso do movimento, que funcionou com muito mais ruído e conseqüências a posteriori; no momento da sua promoção, quase se reduziu às rodas inquietas da intelligenzia da capital paulista.

É o próprio Cândido Motta quem nos confessa a sua defasagem com a trilha revolucionária do movimento modernista, quando diz que “não sabia o que significava, em 1922, o modernismo, porque o movimento de renovação era feito com a cumplicidade de muitos que nunca saíram das regras acadêmicas”.

Mas, modernista ou não, sua obra de escritor não se interrompeu nunc; e, se a não podemos chamar de copiosa, é surpreendentemente variada, confirmando a condição básica de polígrafo que define o seu autor.

Ele fez biografias e comentários biográficos: a história da vida daquela fascinante personagem do Brasil da belle époque, que foi Eduardo Prado, teve em Cândido Motta Filho o seu biógrafo definitivo.

Os estudos sociais, a interpretação de temas políticos receberam também a sua abordagem atenta, quer fosse a obra de Alberto Torres, quer a tentativa de explicação de Rui Barbosa, quer a singular mistura representada por O caminho das três agonias, estudo interpretativo de três entidades tão diversas entre si: o duro e fascinante homem de Estado que foi Feijó; o suposto maldito e na realidade o menino pateticamente genial, Álvares de Azevedo; e os mistérios do temperamento e vida da indecifrada esfinge do Cosme Velho - aquele que é o deus desta Casa - Machado.

Na crítica literária, que cultivou desde os verdes anos, através de uma ininterrupta atividade jornalística, e onde operou mais na postura de apreciador diletamente que na do árbitro e pontífice, temos o belo volume de anotações inteligentes, de descobertas muito pessoais e avaliação equilibrada, que são as Notas de um constante leitor.

Mas se eu tivesse que marcar uma preferência pessoal na obra de Cândido Motta Filho, indiscutivelmente me inclinaria pelos seus dois livros de memórias. O primeiro, Contagem regressiva cujo título é um achado tão feliz que por si só já valeria um volume; o segundo, de publicação póstuma. Dias lidos e vividos. “Dias lidos”, em vez de “idos” apenas, não valendo como simples trocadilho, mas depoimento confessional de uma realidade.

Esses dois meio desordenados depoimentos, escritos sem preocupação cronológica nem ligação formal de episódios, neles está o retrato do homem, sua essência particular, seus sentimentos íntimos em simbiose com as lembranças.

A própria seleção das memórias, o espírito que preside à sua escolha, o que o memorialista conta e omite, o que recorda e o que esquece - deliberada ou involuntariamente - dão com largura para se fazer uma ideia da persona, da criatura, que nos é tão viva e às vezes adoravelmente ressuscitada pelas recordações.

Livros feitos sem método preestabelecido, indo e vindo do menino ao homem, do velho ao rapaz, e que nos revelam, de forma positiva e esclarecedora, o que seriam os ideais humanos, as concepções filosóficas e sociais de Cândido Motta Filho - a par de suas preferências artísticas, literárias, estéticas. E tem-se ali igualmente uma galeria preciosa de contemporâneos seus, retratos feitos às vezes num traço único - grandes figuras do Brasil, flagrantes de personalidades mundiais com quem o narrador teve contacto.

Na verdade, pode-se dizer que Cândido Motta Filho não se conta muito, conta mais os outros; e é através dos outros que com freqüência se revela. Até mesmo nas lembranças de infância, a gente enxerga o mundo do seu tempo através dos olhos do menino; e é essa visão do mundo, nos voltando em ricochete, que traduz e explica o garotinho tímido, canhoto e de frágil saúde, perseguido pela solicitude inquieta dos seus, sempre receosos de que o garoto “não vingasse”.

Vingaria sim, vingaria magnificamente, conforme o testemunho de sua bela vida, que afinal logrou alcançar quase oito décadas. Vingaria; vingou.

Fui conhecer melhor Cândido Motta Filho depois que ele, aposentado do Supremo, deixou Brasília e veio se fixar no Rio. Nosso ponto de encontro era a sala do escritório de nosso irmão José Olympio, editor de nós ambos. Motta, sempre discreto, falava e sorria - aliás mais sorria que falava, quando a roda era grande. Nos grupos de dois e três é que se expandia, brincava, contava casos e defendia pontos de vista.

Certa vez, eu saía apressada de um dos almoços na Editora para a sessão do Conselho Federal de Cultura, que começa às duas horas, e o Ministro Motta filho ofereceu levar-me no seu carro. Dávamos a volta pelo Parque do Flamengo, quando veio à nossa conversa o assunto netos, meus e dele, todos maravilhosos, claro. E de repente ele se pôs a explicar, meio complicado, a vocação profissional do seu neto Nélson, o Nelsinho.

- Adora música, principalmente a popular, desde pequeno, é queda irresistível...

Rachel de Queiroz - foto: ...
Tive a impressão de que, de certa maneira, o avô justificava o rapaz ante os possíveis preconceitos elitistas da senhora literata. E protestei com veemência:

- Mas eu sou fã do Nelsinho! Fã de firma reconhecida! Tenho os discos com as músicas, não perco a coluna dele no jornal, e sempre que posso o vejo na TV! É um doutor em música popular. E, além disso, Ministro, ele é lindo!

O Ministro visivelmente inchou o peito naquele orgulho inocente que só os avós conhecem; os seus olhos luziram, seu sorriso clareou mais, e ele acabou concordando, beatífico:

- Sim, é lindo!

E a concordância em torno daquele neto e daquele adjetivo selou uma cumplicidade afetuosa entre nós. Daí por diante, mal me via, ele abria o sorriso, adiantava-se para me apertar a mão e, assim que apanhávamos um local para conversar sossegados, íamos discutir, conspiratoriamente, não de inquietações políticas ou novidades das letras - mas, doce e consoladamente, de netos.

4/11/1977

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* Fonte: ABL

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Página atualizada em 27.8.2016.


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João Bernardo de Miranda - uma simbiose de palavras entre ficção realidade

João Bernardo de Miranda - foto: Clemente Santos|ANGOP
João Bernardo de Miranda nasceu a 18 de Julho de 1953 em Caxito-Dande, província do Bengo. Licenciado em Direito é jornalista, embaixador de carreira, escritor e político.
Desempenhou já as funções de Deputado do MPLA e Ministro das Relações Exteriores da República de Angola, de 1999 a 2008. João Bernardo de Miranda é membro fundador da União dos Jornalistas Angolanos (UJA). É ainda membro da União dos Escritores Angolanos (UEA). Jurista, e actual governador da província do Bengo, exerceu a função de enviado especial da União Africana na Guiné Bissau, e teve como missão, a nível desta organização, instaurar a reconciliação para as eleições presidenciais e reforma da defesa e segurança. Enquanto jurista e jornalista, João Miranda exerceu ainda os cargos de vice-ministro da Comunicação Social, e vice-ministro das Relações Exteriores. É membro da Ordem dos Advogados de Angola. 
Publicou Nambuangongo (1998), um romance sobre a guerra povoação do norte de Angola, na província do Bengo, ocupada pelos nacionalistas angolanos no início da guerra anti-colonial, em 1961. Nambuangongo só veio a ser retomada pelo exército português em Agosto, ainda deste ano, porém, a guerra durou mais treze anos. Os escritores portugueses: Manuel Alegre, Fernando Assis Pacheco e José Cardoso Pires, foram soldados em Nambuangongo. João Miranda publicou também, “Pathelo-a-Kuma”, o menino de inteligente (2003), levada à cena em Portugal, Porto, pelo encenador João Luiz.

"O país começava assim a chover em abundância. Além de molhar a terra e florescer os campos, também iniciava a lavagem dos corações dos ódios acumulados…"
- João Miranda, no livro "Hebo". Luanda: Texto Editores, 2012.

João Bernardo de Miranda - foto: Clemente Santos|ANGOP
OBRAS DE JOÃO BERNARDO DE MIRANDA
Narrativas (romance histórico)
:: Nambuangongo. [prefácio Domingos Van-Dúnem]. Colecção Autores de língua portuguesa. Lisboa: Dom Quixote, 1998; 2ª ed., Luanda: Texto Editores, 2012.
:: HeboLuanda: Texto Editores, 2012.

Conto (infanto-juvenil)
:: Pathelo-a-Kuma - o menino inteligenteLisboa: Dom Quixote, 2003; 2ª ed., Colecção Tenda das Letras. Luanda: Edição do Ministério da Cultura e do Instituto Nacional das Indústrias Culturais (INIC), 2013.


"João Miranda deixa expressa uma situação ainda ignorada que gera conflitos e divisionismos. Encaremos realisticamente as potencialidades de João Miranda, que tem todas as qualidades para movimentar ideias e abrir diálogo saudável e construtivo.
Os seus personagens são criaturas de corpo e alma. Estão connosco e reclamam o enquadramento social que todos nós ansiamos para a glorificação da nossa Terra-Mãe. O estender das mãos para a fraternidade universal."
- Domingos Van-Dúnem, em "Prefácio" do livro "Nambuangongo", de João Miranda. Luanda: Texto Editores, 2012.


"Na verdade, a impiedosa vara metálica da guerra civil de Angola tinha batido forte no tecido social de todas as famílias. Daí que, no quadro da história geral da mesma guerra, cada família angolana tem a sua, em particular, para contar…"
- João Miranda, no livro "Hebo". Luanda: Texto Editores, 2012.

João Bernardo de Miranda - foto: Clemente Santos|ANGOP
FORTUNA CRÍTICA DE JOÃO BERNARDO DE MIRANDA
ANGOLA.Autores. João Bernardo de Miranda. in: Angola: Obras, Autores e Escritores, 20 de julho de 2016. Disponível no link. (acessado em 25.8.2016).
FORTUNATO, Jomo. "Hebo" novo romance de João Miranda. in: Jornal Cultura/Angola, 9 de agosto de 2012. Disponível no link. (acessado em 25.8.2016).
MIRANDA, João. Operações de paz em Angola: cooperação. in: Angola| Portugal: negócios.- nº 26 (Jul./Set. 1995), p. 32, 34-35.
NAMBUANGONGO - Miranda, João Bernardo - Publicações Dom Quixote-1998. in: O Quitexe de Literatura, 17.6.2007. Disponível no link. (acessado em 25.8.2016).
PORTAL ANGOP. João Miranda nomeado enviado especial do presidente da Comissão de UA para a Guiné Bissau. in: Portal Angop, 6 de abril de 2009. Disponível no link. (acessado em 25.8.2016).


"– Como sabes Massanga, a guerra contra os brancos já começou. Em Kibaxe, lá nos Ndembos, em Nambuangongo, no Kitexi e em muitos sítios aí em cima, mataram todos os brancos. Outros fugiram para Luanda. O Mbuta Muntu, o grande chefe que está a dirigir tudo isso, mandou também matar todos os filhos dos brancos com pretas. Por isso é que o teu tio Pianga devia matar-te. A ordem de Mbuta Muntu diz que os filhos dos brancos com pretas devem ser mortos pelos seus tios. (…)"
- João Miranda, no livro "Nambuangongo". [prefácio Domingos Van-Dúnem]. Colecção Autores de língua portuguesa. Lisboa: Dom Quixote, 1998.


***
“ O nosso querido chefe supremo Tata Holden determina para que doravante jamais se molestem os mestiços nem os assimilados. Os mestiços são nossos sobrinhos, são nossos filhos. Os assimilados são nossos irmãos. O nosso querido chefe supremo nunca ordenou que se matassem os nossos sobrinhos. Nunca mandou prender ou matar os nossos irmãos assimilados. Tudo o que aconteceu foi obra dos delegados, traidores da pátria.”
- João Miranda, no livro "Nambuangongo". [prefácio Domingos Van-Dúnem]. Colecção Autores de língua portuguesa. Lisboa: Dom Quixote, 1998.


***
“ Enquanto isso, o comboio da revolução foi rasgando a densa nuvem preta que ensombrou o país. Prosseguiu a sua marcha que se julgava inexorável. Anos depois do trajecto o comboio parou por avaria num apeadeiro, e todos os ocupantes saídos incólumes de temporal de Maio desertaram-no. Apanharam um outro que vinha em sentido contrário, do Planeta Nova Era:
- Estão a dizer que cabemos neste comboio?!
- Sim, meu filho, neste, aqui, cabemos todos…
- Mas todos quem?
- Todos nós, os filhos desta terra que se chama Angola.
- Também os lacaios do imperialismo ou fantoches, os fraccionistas, etc…viajarão connosco?
- Meu filho, eu já não me lembrava desses epítetos. Olhe para os meus cabelos brancos. Eu já vivi tanta coisa desde que começamos. Por tudo quanto já passamos o melhor é amnistiarmo-nos mutuamente. Esquecer…”
- João Miranda, no livro "Nambuangongo". [prefácio Domingos Van-Dúnem]. Colecção Autores de língua portuguesa. Lisboa: Dom Quixote, 1998.




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Yeda Prates Bernis - artesã da palavra

Yeda Prates Bernis - foto: Jair Amaral/EM/D.A Press Amanhã
Yeda Prates Bernis escritora mineira, diplomada em Letras Neolatinas (PUC-MG), cursou também Canto e Piano no Conservatório Mineiro de Música e membro da Academia Mineira de Letras. Tem poemas musicados por Camargo Guarnieri e traduções para o Italiano, Inglês, Espanhol, Francês e Húngaro. Prêmio Olavo Bilac da Academia Brasileira de Letras e inúmeras distinções por sua produção artística e cultural e eleita, por unanimidade, Sócia-Correspondente da Academia Lusíada de Ciências, Letras e Artes.
:: fonte: Caleidoscopio - Yeda Prates Bernis (acessado em 12.8.2016)


O tempo é a imagem móvel
da eternidade imóvel. 
- Yeda Prates Bernis, no livro "Entressombras". Belo Horizonte: Rona Editora, 2013.


OBRA POÉTICA DE YEDA PRATES BERNIS
Poesia
Yeda Prates Bernis - foto: (...)
:: Entre o rosa e o azul. [prefácio de Mário Matos; posfácio de Martins de Oliveira; ilustrações de Sara Ávila]. Rio de Janeiro: Editora O Cruzeiro, 1967.
:: Enquanto é noite. [prefácio de Henriqueta Lisboa]. Belo Horizonte: Imprensa Oficial, 1974.
:: Palavra ferida. [prefácio de Alphonsus de Guimarães Filho; 'orelhas' de Edgar da Mata
Machado; ilustrações de Sara Ávila]. Belo Horizonte: Editora Veja, 1979.
:: Pêndula. ['orelhas' de Audemaro Taranto Goulart]. São Paulo: Editora Massao Ohno, 1983; 2ª ed., Belo Horizonte: Editora Itatiaia, 1986.
:: Grão de arroz. [prefácio Oswaldino Marques]. Belo Horizonte: Editora Itatiaia, 1986.
:: O rosto do silêncio. [prefácio Lacyr Schettino; ilustrações de Sara Ávila]. Belo Horizonte: Editora Cuatiara, 1992.
:: À beira do outono. Belo Horizonte: Editora Phrasis, 1994.
:: Encostada na paisagem. Belo Horizonte: Editora Phrasis, 1998.
:: Cantata - "Antologia poética - não cronológica". [prefácio Bartolomeu Campos de Queirós]. Belo Horizonte: Edição da Autora, 2004.
:: ViandanteBelo Horizonte: Edição da Autora, 2006.
:: Entressombras. [apresentação Maria Lúcia Simões; prefácio Lina Tâmega Peixoto; capa de Marconi Drummond; projeto editorial de Paschoal Motta]. Belo Horizonte: Rona Editora, 2013.

Ensaio
:: Anotações sobre Zen e Hai-Cais. Belo Horizonte: Editora RHJ, 1996.


Claude Monet - The garden of Monet at Argenteuil, 1873
Poemas de Yeda Prates Bernis

De "Entre o rosa e o azul"

Oferenda
Se eu pudesse fazer um poema
meigo como a brisa das manhãs,
doce como pássaro submisso,
lírico como a flor que desabrocha,

se eu pudesse fazer um poema
onde as palavras perdessem seu sentido
e se transformassem em etéreas formas
em música suave
ou em volátil perfume
que inebriasse,

levar-te-ia, amor,
em oferenda,
este mágico poema
- Yeda Prates Bernis, no livro "Entre o rosa e o azul". Rio de Janeiro: Editora O Cruzeiro, 1967.

§

Saudade
Saudade, flor de ternura
que nasce dentro da gente.

Saudade, lágrima quente

que rola dentro da gente.

Saudade, canto tristonho
que canta dentro da gente.

Saudade, balé de sombras
que dançam dentro da gente.

Saudade, flor de ternura
que morre dentro da gente.
- Yeda Prates Bernis, no livro "Entre o rosa e o azul". Rio de Janeiro: Editora O Cruzeiro, 1967.

§
De "Enquanto é noite"

Bem-aventurança
Não a estrela mais brilhante
mas o simples vagalume.

Não a pedra mais preciosa
mas o seixo pequenino.

Não a orgulhosa orquídea
mas a modesta violeta.

Não o pensamento sábio
mas o puro, de criança.

Não a força do comando
mas a força da humildade.

Não a coroa de ouro,
mas a mais tosca, de espinhos
- Yeda Prates Bernis, no livro "Enquanto é noite". Belo Horizonte: Imprensa Oficial, 1974.

§
De "Palavra ferida"

Autorretrato
Vocacional estrabismo divergente:
um olho na terra, outro no céu.
Nadadora, vai singrando em largas
ou tímidas braçadas
oceanos, rios e lagos de emoção.
Solfeja alguns idiomas
para ler poemas,
cantar canções
e esconder, neles,
sua ternura pela humanidade.
Acredita em sereia, fada,
Iemanjá, Saci Pererê e outras coisas
mágicas com que depara, desavisadamente.
Acha o livre arbítrio tão discutível
quanto a verdade,
e o bem e o mal, faces da mesma moeda.
Vive com Vivaldi no coração
e Debussy na ponta dos dedos.
Borda, com fios insólitos do tempo,
pacientes pontos de esperança.
Traz a alma na boca,
abraça e beija muito,
e vive sorrindo
para mostrar atávica
alegria infeliz.
- Yeda Prates Bernis, no livro "Palavra ferida". Belo Horizonte: Editora Veja, 1979.

§

Do sonho
O que escorre, do sonho,
é este líquen de fascínio
e mistério, seiva de cactos,
sumo de transcendentes pétalas.

O que vive, no sonho,
é este frêmito de asas
peregrinas, esta música sutil
descortinando auroras.

O que morre, no sonho,
é esta flor deixada no deserto,
esta luz se desmanchando em sombras,
esta sombra se esgarçando em nadas.
- Yeda Prates Bernis, no livro "Palavra ferida". Belo Horizonte: Editora Veja, 1979.

§

Libertação
Tenho a palavra ferida
e a mente amordaçada,
o pé plantado em raiz,
o olho posto na treva.
sou pedra de asa cortada
e anjo atirado ao chão.
Desta urdidura me evado
se a vida, fluindo heráclita
na trama inquieta do tempo
- passando por sobre escombros
pousando em trigais de luz -
tecer-me toda de amor.
- Yeda Prates Bernis, no livro "Palavra ferida". Belo Horizonte: Editora Veja, 1979.

§

Rosa dos ventos
Sejam teus pés a minha senda exata
seja tua voz o meu falar isento
sejam teus olhos minha aurora intata
seja teu respirar o meu alento
sejam teus músculos minha carne em sangue
sejam tuas mãos meu infinito porto
seja tua dor o meu viver exangue
sejam tuas rugas meu andar absorto
seja teu desalento meu cansaço
seja tua paisagem meu azul
sejam teus sonhos todo o meu espaço
seja teu norte-sul meu norte-sul.
- Yeda Prates Bernis, no livro "Palavra ferida". Belo Horizonte: Editora Veja, 1979.

§
De "Pêndula"

Consciência
Faço e desfaço
o largo laço
do sentimento.
Mordo ou remordo
o alimento
que a vida doa à toa,
Rosto e desRosto de mel e fel.
Rompo ou corrompo a simetria
do dia.
Consinto, sinto
a insuficiência
na só regência
do coração,
mordido cão.
Relevo. E levo
alta alquimia
sobre meus ombros: poesia
e escombros.
- Yeda Prates Bernis, no livro "Pêndula". 2ª ed., Belo Horizonte: Editora Itatiaia, 1986.


§
De "Grão de arroz"

HAICAIS

Na poça dágua
o gato lambe
a gota de lua.
- Yeda Prates Bernis, no livro "Grão de arroz". Belo Horizonte: Editora Itatiaia, 1986.

§

Neblina sobre o rio,
poeira de água
sobre água.
- Yeda Prates Bernis, no livro "Grão de arroz". Belo Horizonte: Editora Itatiaia, 1986.

§

Pássaros em silêncio.
Noturna chave
tranca o dia.
- Yeda Prates Bernis, no livro "Grão de arroz". Belo Horizonte: Editora Itatiaia, 1986.

§


Inútil. A gaiola
nunca aprisiona
as penas do canto.
- Yeda Prates Bernis, no livro "Grão de arroz". Belo Horizonte: Editora Itatiaia, 1986.

§

Ângelus. Dedos da brisa
nas teclas das folhas
adormecem os pássaros.
- Yeda Prates Bernis, no livro "Grão de arroz". Belo Horizonte: Editora Itatiaia, 1986.

§

Lavadeiras de beira-rio.
nas águas, boiando,
cores e cantos.
- Yeda Prates Bernis, no livro "Grão de arroz". Belo Horizonte: Editora Itatiaia, 1986.

§

Cai da folha
a gota dágua. Lá longe
o oceano aguarda.
- Yeda Prates Bernis, no livro "Grão de arroz". Belo Horizonte: Editora Itatiaia, 1986.

§
De "O rosto do silêncio"

Alquimia
Enterrei meu canarinho
junto à roseira.
Agora, a primeira rosa
vai amanhecer
cantando.
- Yeda Prates Bernis, no livro "O rosto do silêncio". Belo Horizonte: Editora Cuatiara, 1992.

§

Aquelas palavras
Nódoas na alvura
do linho.

Sobre a pedra
do olvido
deixá-las
em água e vento.

Para sempre
alcem vôo.
- Yeda Prates Bernis, no livro "O rosto do silêncio". Belo Horizonte: Editora Cuatiara, 1992.

§

Eclesiastes
      para Oswaldino Marques

A tarde levita.
Um sino de cristal
irisa o peito.

Bordo lírios
em pura
seda.

Uma voz aporta
com sua bagagem
de lembranças,

estilhaça o cristal,
tinge de vermelho
os lírios do bordado.
- Yeda Prates Bernis, no livro "O rosto do silêncio". Belo Horizonte: Editora Cuatiara, 1992.

§

Fogueira
Espio à beira
do que chamam de minha alma.
Fingindo calma,
vejo no poço uma fogueira
queimando o já tão pouco
do muito edificado.
Não como um louco
mas como quem não presta
atenção, despejo gasolina.
Tudo o que resta
é um choro de menina.
- Yeda Prates Bernis, no livro "O rosto do silêncio". Belo Horizonte: Editora Cuatiara, 1992.

§

Impasse
Vida trancada a sete chagas
aprisionada em quarto escuro.
Fantasmas deslizam sua dança
nas paredes e há pedaços de mágoa pelo chão.
Rubro fio de seda escorre, lento,
do coração,
cada centímetro, puro
desalento.
Impossível tentar frestas na esperança,
inútil fazer concha com a mão.
- Yeda Prates Bernis, no livro "O rosto do silêncio". Belo Horizonte: Editora Cuatiara, 1992.

§

Junto a um templo
Tardinha.
Jardim em Kioto.
O tempo dormia nas coisas.
A um canto um monge
zentranquilo, sorriso de nuvem,
meditava.
Pedras oravam silêncios,
Flores celebravam lago e lótus.
O lago, quase céu.
O lótus, quase lua.
Deus estava lá, descansando.
- Yeda Prates Bernis, no livro "O rosto do silêncio". Belo Horizonte: Editora Cuatiara, 1992.

§

Véspera
Um cio
antiquíssimo
engravida sons e cores.

Polens de luz
inseminam
a corola do dia.

Levita
de leve
a seiva das coisas

E busca o apelo
do que será
esplendor.

(pise de leve
para não assustar
setembro.)
- Yeda Prates Bernis, no livro "O rosto do silêncio". Belo Horizonte: Editora Cuatiara, 1992.

§
De "À beira do outono"

Dúvida
O que tocou de leve
na pele de meu desejo
foi um floco de neve
ou foi teu beijo?
- Yeda Prates Bernis, no livro "À beira do outono". Belo Horizonte: Editora Phrasis, 1994.

§

Ritmos
Pêndulos do relógio
e do coração
ritmos díspares
de emoção e mecânica
não marcam juntos
o canto da minha partitura:
entre os dois por vezes pairo
num tempo suspenso
indissolúvel         imóvel.
- Yeda Prates Bernis, no livro "À beira do outono". Belo Horizonte: Editora Phrasis, 1994.

§



Quase haicai
Do beiral dos dias
cai sobre mim
tênue chuva de estrelas,
estou molhada de luz
- Yeda Prates Bernis, no livro "À beira do outono". Belo Horizonte: Editora Phrasis, 1994.

§

Variações em tom maior
A noite, trémula,
com seu fardo de sombras
nos ombros.

Ponteiros invisíveis giram,
esgarçam, pouco a pouco,
um fado de opaca tristeza.

Um galo, voz claríssima,
chameja em prata
espaço entre as trevas.

Borboletas brincam de roda:
sobre um sino,
acordam o silêncio de bronze.

Uma azaleia
molhada de cristal
ensaia voo.

Asas de andorinhas
salpicam no céu
claridades e levezas.
- Yeda Prates Bernis, no livro "À beira do outono". Belo Horizonte: Editora Phrasis, 1994.



§

De "Encostada na paisagem"



Vem o beija-flor
do horizonte
molhado de arco-íris.
- Yeda Prates Bernis, no livro "Encostada na paisagem". Belo Horizonte: Editora Phrasis, 1998.

§

Neblina.
Papel de seda embrulha
a paisagem.
- Yeda Prates Bernis, no livro "Encostada na paisagem". Belo Horizonte: Editora Phrasis, 1998.

§

O estrume do boi
a seiva do lírio:
alquimia.
- Yeda Prates Bernis, no livro "Encostada na paisagem". Belo Horizonte: Editora Phrasis, 1998.

§

Não retire
de seus olhos
este fiapo de sol.
- Yeda Prates Bernis, no livro "Encostada na paisagem". Belo Horizonte: Editora Phrasis, 1998.

§

Prece em silêncio,
verde inocência:
louva-deus.
- Yeda Prates Bernis, no livro "Encostada na paisagem". Belo Horizonte: Editora Phrasis, 1998.

§

A água do lago:
pranto dos chorões
que moram ao lado?
- Yeda Prates Bernis, no livro "Encostada na paisagem". Belo Horizonte: Editora Phrasis, 1998.

§


Percurso
Ao Homem,
grão de areia,
o Cristal do Tempo
seu percurso traça.
Inútil lutar
por glória e poder.
Tudo escoa:
um grão a mais
que passa.

- Yeda Prates Bernis, no livro "Encostada na paisagem". Belo Horizonte: Editora Phrasis, 1998.

§


Receita para um haicai
Se você quer compor um haicai,
à moda de Bashô,
mesmo imperfeito, verifique primeiro
se já viveu inúmeras vidas.
Comece por despojar-se do supérfluo
das vestes da alma:
paletó de esnobismo,
camisas de inquietude,
agasalhos de orgulho,
meias de apegos.
Deixe o espírito, em síntese, aquietar-se,
desnudo.
Perceba o cintilar da essência de tudo
que o rodeia,
Veja o mundo com o olhar dos anjos.
Faça de seus ouvidos concha de
inocência,
imite o Poeta Francisco
- Yeda Prates Bernis, no livro "Encostada na paisagem". Belo Horizonte: Editora Phrasis, 1998.

§
De "Cantata"
Francisco
Teu gesto,
sagrada
vitória
da loucura.
Teus passos,
pegadas
de luz
pelos tempos.
Teu espírito,
leveza
de voo
de teus pássaros.
Teu amor,
reflexo
do olhar
divino
- Yeda Prates Bernis, no livro "Cantata - 'Antologia poética - não cronológica'". Belo Horizonte: Edição da Autora, 2004.


§



Improviso
Dom maior é canto
de arcanjos - semibreve.
No princípio, um jubilato
arrebata aleluias.

Pouco e pouco, a escala
se despeja em decrescendo
de afiados bemóis
e rasga os dias.
Até que o solo de um clarim
- antes novelo de lã,
fio de aço agora -
estrangula o amanhã

- Yeda Prates Bernis, no livro "Cantata - 'Antologia poética - não cronológica'". Belo Horizonte: Edição da Autora, 2004.

§


Prece em silêncio,
verde inocência;
louva-a-deus.
- Yeda Prates Bernis, no livro "Cantata - 'Antologia poética - não cronológica'". Belo Horizonte: Edição da Autora, 2004.

§

O coração da aranha
se desfaz em geometria
de seda e mandala
- Yeda Prates Bernis, no livro "Cantata - 'Antologia poética - não cronológica'". Belo Horizonte: Edição da Autora, 2004.

§

Migração
Chegas do poema de Prévert
impregnado de sortilégios.
Não te batizo
de canário ou pintassilgo:
pouco importa teu nome
se qualquer substantivo pesa sobre tua
leveza de pensamento puro,
estás acima de todas as palavras.
E te enfeitiço com manhãs de abril,
te ilumino em ouro e canto,
te celebro a inocência.
Viajo em teu enigma,
vislumbro o azul em teus andares,
te alimento com sementes de amplidão,
e te pouso, com cuidado,
na gaiola aberta
deste poema.
- Yeda Prates Bernis, no livro "Cantata - 'Antologia poética - não cronológica'". Belo Horizonte: Edição da Autora, 2004.

§
De "Viandante"
para Ney Octaviano Bernis

Teu silêncio acorda em mim palavras antigas.
- Yeda Prates Bernis, no livro "Viandante". Belo Horizonte: Edição da Autora, 2006.

§

Teu perfume no travesseiro beija meu rosto molhado.
- Yeda Prates Bernis, no livro "Viandante". Belo Horizonte: Edição da Autora, 2006.

§

No silêncio manso deste poente, de minhas mãos
faço berço para minar a tristeza.
- Yeda Prates Bernis, no livro "Viandante". Belo Horizonte: Edição da Autora, 2006.

§

Não esperaste pelo nascer das rosas, tão adivinhadas.
Vou-te levar o perfume delas.
- Yeda Prates Bernis, no livro "Viandante". Belo Horizonte: Edição da Autora, 2006.

§

Tua caneta, ainda morna de tuas mãos,
Aguarda tua assinatura.
Em vão
- Yeda Prates Bernis, no livro "Viandante". Belo Horizonte: Edição da Autora, 2006.

§
De "Entressombras"

O rio de Heráclito
O rio de Heráclito
inexiste no mapa.
Atroz geografia
carrega em seu leito
tanto flor de laranjeira
como rastros de sangue
e corre em artérias
e seivas e nadas.
O rio de Heráclito
navega entre luzes
e sombras e ódios
e amores, impávido.
Inútil a barragem
de sonhos, coragem:
deságua nas águas
do eterno. Sem mágoas.
- Yeda Prates Bernis, no livro "Entressombras". Belo Horizonte: Rona Editora, 2013.

§

Fluvial
Mítico relógio
não se importa com dezembro ou janeiro.

As horas
deslizam sem apelo
entre flores, pedras, sargaços.

O que foi, passou.
O que virá, incógnita.
Resta navegar nas águas deste Agora
até desaguar
na imensidão de um mar.
- Yeda Prates Bernis, no livro "Entressombras". Belo Horizonte: Rona Editora, 2013.

§

Momento
Depois da chuva,
a penumbra visita a sala.
Um mistério sobrevoa o ambiente.

Não é tarde nem é noite,
avisam os vidros das janelas.

O silêncio se esconde
entre móveis e lembranças.

A alma desce os degraus dos dias,
procura a infância,
quer abraçar, dar carinho esquecido.
E um véu de espessas brumas
oculta o que hoje
é um claro esquecimento.
- Yeda Prates Bernis, no livro "Entressombras". Belo Horizonte: Rona Editora, 2013.

§

Sabedoria
O sol a lua as estrelas
as montanhas as colinas
a orquídea a rosa a camélia
o jardim a gota d’água
- quietude zen -
aprenderam desde sempre
e rnais que os homens
a eloquência do silêncio
- Yeda Prates Bernis, no livro "Entressombras". Belo Horizonte: Rona Editora, 2013.

§
Yeda Prates Bernis - foto: Jair Amaral/EM/D.A Press Amanhã
FORTUNA CRÍTICA DE YEDA PRATES BERNIS
BRASIL, Assis (org). A poesia mineira do século XX: Antologia. Rio de Janeiro: Editora Imago, 1998.
COELHO, Nelly Novaes (org.). Dicionário crítico de escritoras brasileiras: 1711-2001. São Paulo: Escrituras Editora, 2002.
COUTINHO, Afrânio; SOUSA, J. Galante de (org). Enciclopédia de literatura brasileira. Rio de Janeiro: MEC/FAE, 1990.
DUARTE, Constância Lima (org). Escritoras mineiras - poesia, ficção, memóriaColeção Viva Voz. Belo Horizonte: FALE/UFMG, 2010. Disponível no link. (acessado em 12.8.2016).
FLORES, Hilda Agnes Hubner (org). Dicionário de Mulheres. Belo Horizonte: Editora Nova Dimensão, 1999.
GOULART, Audemaro Taranto. A palavra do resgate. in: PUC Minas, publicações. Disponível no link. (acessado em 12.8.2016).
LEÃO, Ângela Vaz. A poesia de Yeda Prates Bernis. in: SCRIPTA, Belo Horizonte, v. 19, n. 37, p. 267-290, 2º sem. 2015. Disponível no link. (acessado em 12.8.2016).
LOPES, Carlos Herculano. Yeda Prates Bernis lança livro de poemas Entressombras. in: Divirta-se uai, em Cultura, 27.12.2013. Disponível no link. (acessado em 12.8.2016).
MARRECO, Maria Inês de Moraes. As horas da alma: reflexões sobre a poesia de Yeda Prates Bernis. VI Colóquio Mulheres em Letras, UFMG/Belo Horizonte, 2014.
VERHAALEN, Marion. Camargo Guarnieri: expressões de uma vida. [tradução Vera Silvia Camargo Guarnieri]. São Paulo: Imprensa Oficial; EdUsp, 2001



Vincent Van Gogh - Vase with Oleanders and Books
Depoimentos sobre a obra e a poeta

                                       Yeda Prates Bernis

(fonte: Caleidoscopio - Yeda Prates Bernis)

Grão de arroz merece em tudo por tudo a linda e rara edição em que aparece: sem dúvida, a poesia de Yeda, que sempre amei, adquiriu novas raízes e nova expressão. Yeda a viu e sentiu em muitas coisas nas quais nenhum poeta encontrara ainda.
Abgar Renault


...Abri seu livro e a primeira poesia restituiu-me a serenidade, deu-me novamente a visão das coisas belas e imutáveis. Tive a sensação que havia tocado a ternura e a pureza......
Yeda diz tudo o que tinha a dizer em perfeita unidade de forma e essência - alma e corpo na vida do poema.
Mas alma que não transborda, que não excede o continente de dimensões rigorosamente exatas para a substância nele contida. Para encerrar, direi que a poesia de Yeda é tão imperecível como o sentimento que mora no coração de cada ser humano - forma e substância da vida.
Adalgisa Nery


Que lindo livro o Grão de Arroz.
Como você avançou e avança, cada vez mais, em contenção e beleza. Invejável, grego, moderno. Mediterrâneo, além, além de Minas.
Affonso Romano de Sant'anna


Depois de ler seu livro fiquei com os olhos deslumbrados, pela visão de rastro de luz deixado no espaço por estréia cadente. Seus versos ao filho evocam Valmore e ficam em nossa lembrança como perfume de flor oculta em parque noturno...
Agripa Vasconcelos


O canto suave está nas côres do título. Mais cicios que gorjeios, ouve-se em paz umbrosa. Ainda quando se aprofunda, é poesia de superfície, no doce recorte tagoriano.
As palavras adejam levemente, sem crispações nem angústias. Querem só expressar a poesia da hora. Conseguem-no, com a graça alada que distingue a sensibilidade feminina.
Quem escreve O Sorriso de Meu Filho e Oferenda, além de tantos poemas, reúne a sua voz pessoal às outras da poesia brasileira. Acresce que a nítida apresentação dos temas descansa de uma escrita poética de segundas e terceiras intenções, hoje demasiado freqüente.
Aires da Mata Machado Filho


Tenho lido e relido Grão de Arroz com o maior encantamento. É dos tais livros que deixamos à mão para poder abri-los quando vem o desejo de uma experiência poética que redima-o correr do dia. Afino muito com sua poesia, cujo convívio é para mim cheio de graça. Este livro, me parece, alcançou o limite admirável onde a poesia diz o máximo, o maior dos máximos, com o menor e mais perfeito dos mínimos.
Antônio Cândido


...Belo livro de Poemas.
Eles são Poesia.
Augusto de Lima Júnior


Seu Grão de Arroz é das criações poéticas mais delicadas que já se fizeram entre nós. Nada lhe falta, em emoção contida e limpidez de forma. Cada uma das pequenas composições cintila como pedra preciosa e ressoa como inefável melodia.
Carlos Drummond de Andrade


Que beleza os seus hai-cais! É a poesia reduzida à sua essência. Você domina o gênero como ninguém.
Cyro dos Anjos


... Os poemas de "Entre o Rosa e o Azul", libertando-se do virtuosismo afetado da forma, significam uma expressão livre e apaixonante. Neles a gente encontra o mais vivo e humano documento espiritual de um poeta...
Dídimo Paiva


... Yeda Prates Bernis sabe como ninguém prender um claro pensamento na trama sutil da poesia...
Djalma Andrade


Yeda trabalha desde a juventude o território da poesia, sem, no entanto, nunca publicar. Agora ela surge de corpo inteiro, num livro excelente, cuja poesia, embora feminina, traz a marca forte da originalidade e da verdadeira vocação poética.
Édison Moreira


...Os poemas de "Entre o Rosa e o Azul", de Yeda Prates Bernis, andam em nossa emoção como água a correr. Com a mesma simplicidade, a mesma fluidez e o mesmo embalo natural porque extremamente simples. Esta a virtude maior de Yeda Prates, cantar num ritmo sem alardes, sem preciosismos formais...
Euclides Marques Andrade


Que coisa boa surgir um novo livro de autêntica (e inspirada) poesia! Li de uma só vez, reconfortado ao descobrir que Minas ainda produz grandes poetas.
Fernando Sabino


Yeda foi minha aluna há muitos anos. Desde então pude notar sua sensibilidade, sua finura de espírito, seu harmonioso estilo de vida. Por isso não me surpreendeu quando me apresentou esta coletânea de versos de sua autoria: "Entre o Rosa e o Azul".
Henriqueta Lisboa


Yeda: Poesia para habitar corações!
Henriqueta Lisboa


Poucas vezes, na lírica feminina brasileira, terão alcançado a pureza, a depuração, a simplicidade, que Yeda Prates Bernis conseguiu em "Entre e Rosa e o Azul". Ela é autêntica poetisa. Não tem rebuscamentos, nem adjetivo burlado. Escoa, como água cristalina, de uma pureza de fazer inveja.
João Etienne Filho


Li, reli, com o prazer de contemplar uma preciosidade e de possuí-la aos poucos. Impregnei-me de seus haicaiyedas.
Pendula é o ponto alto de uma obra, e poesia da melhor, da mais pura!
João Luiz Lafetá


A poesia tão feminina e sensível de Yeda lembra flor: simples, espontânea e pura, nítida em seus contornos, sem hermetismo nem mistério aparente. Flor, Poesia sempre...
Lúcia Machado de Almeida


Ler a poesia de Yeda é como estar em estado de graça.
Maria do Pilar Barbosa Ferreira


...Ao lermos Yeda verificamos a impressão boa de que a inocência de intuitos e de inspiração é a compreensão cristã do mundo. Seu livro nos demonstra esta verdade esquecida por este nosso mundo louco: - O lar iluminado pelo amor é a casa da poesia...
Mário Matos


Quem, de olhos tranqüilos, ler, porventura, o livro "Entre o Rosa e o Azul", de Yeda Prates Bernis, será, logo de inicio, levado às regiões do encantamento puro, à esfera em que reina a alta poesia. E é certo que o encantamento irá crescendo em doçura e graça, à medida em que os temas se enriquecem das cousas sagradas, das que falam à alma e ao coração. E mais. Pela simplicidade, levesa, diafaneidade de pensamento, o leitor perceberá que se encontra em esfera diferente, num mundo docemente estranho, dominado pela tonalidade suavíssima dos versos, como se penetrasse a região da alegria plena, de que fala Dante, l´ombra del beato regno.
Martins de OliveiraDante


Foi uma grande dádiva de seu espírito, que lemos com real encanto. Sua poesia tem beleza e ternura que afagam o coração e a sensibilidade do leitor.
É rara, hoje, essa delicadeza do sentimento poético que, entretanto, não exclue a beleza da expressão. Lembramo-nos, diante de seu livro e de seu título, de um admirável trecho de Carlos Drummond de Andrade:
"De cor de rosa e de azul claro ele pintou sua casa. De azul claro e de rosa devíamos, todos, revestir uma fração de nossa vida, já que não é possível pintá-la completamente de cores tão puras."
Creio que no seu caso a vida, e não uma fração dela, está toda pintada dessas cores puras. Daí o fino prazer que nos deu a leitura dos seus poemas."
Milton Campos


A presença da inspiração da autora começa no título de seu livro "Entre o Rosa e o Azul" - polarização de matizes impregnados de suavidade e doçura - é um milagre de adequação do titulo à obra. Porque são de ternura, amor, carinho, enternecimento, de dores sem revolta, de preces, de recordação e de fé as belas mensagens da poetisa, destinadas a todos que têm sensibilidade.
Moacir Andrade


Numa época em que a poesia se f echa num hermetismo obtuso, que, corta toda possibilidade de comunicação com o leitor, não lhe trazendo nenhuma mensagem de emoção e beleza, ou se apalhaça em malabarismos circenses, jogando com as palavras, idiotamente, é um prazer, sem dúvida, encontrar uma poesia, pura e cristalina, simples e delicada, como a dos versos de Yeda Prates Bernis, em que há cristalino frescor de fonte murmura e gorjeios canoros de passarinhos.
Oscar Mendes


Para ter-se idéia da impregnação expressiva, num gênero, a que chegou a artista mineira, basta dizer que, conquanto já houvesse conquistado invejável nomeada como autora de obras poéticas do quilate de Palavra Ferida e de Pêndula, ela renunciou à prática da arte verbal segundo os módulos ocidentais, a fim de dar-se de corpo e alma ao magistério do bruxedo de Bashô, plasmando jóias a que assentaria como luvaadenominaçãohaicaiyedas.
Oswaldino Marques


Ao ler a coletânea de poesias de Yeda Prates Bernis acorreu-me de imediato uma consideração de Baudelaire sôbre a essência da poesia:
"...nenhum poema será tão grande, tão nobre, tão verdadeiramente digno do nome de poema, quanto aquêle que fôr escrito unicamente pelo prazer de escrever um poema". Os de Yeda seguramente possuem esta virtude que implica, a meu ver, noutra que exclui tôda a idéia de gratuidade, de mero passatempo, a necessidade de se comunicar com o próprio mundo interior. Daí o acento de sinceridade, a transparência e limpidez de sua expressão poética.
...Sempre me preocupei com a poesia da realidade. Encontro-a em grau intenso no livro de Yeda. De ponta a ponta ressuma, sem nunca se alienar num mundo estranho, a essência lírica do cotidiano. Soube captar com rara sensibilidade toda a ternura de ser mãe, a mulher sublimada pelo amor e o encantamento do universo mágico da criança.
Rui Flôres



Yeda Prates Bernis - foto: Jair Amaral/EM/
D.A Press Amanhã
OUTRAS FONTES E REFERÊNCIAS DE PESQUISA
:: Antonio Miranda - Yeda Prates Bernis
:: Caleidoscopio - Yeda Prates Bernis
:: Mulheres em letras (grupo de pesquisa Letras em Minas/UFMG)

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Como citar:
FENSKE, Elfi Kürten (pesquisa, seleção e organização). Yeda Prates Bernis - artesã da palavra. Templo Cultural Delfos, agosto/2016. Disponível no link. (acessado em .../.../...).
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** Página atualizada em 12.8.2016.




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