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Marcos Avelino Martins - poemas

Pierre-Auguste Renoir -Picking Flowers 1875
 Marcos Avelino Martins, Poeta goiano. Engenheiro Eletricista pela Universidade de Brasília por formação, Analista de Sistemas por opção, proprietário de uma pequena software house há mais de 30 anos, casado, 2 filhos, 2 noras e 1 neto, apreciador de boa música, cinema, literatura, HQs,  seriados e amigos.



 Marcos Avelino Martins
OBRA POÉTICA DE MARCOS AVELINO MARTINS
Coletânea de poesias líricas, românticas, eróticas e fantásticas
:: Os oceanos entre nós[fotos e capa Marcos Avelino Martins; ilustrações Miriam Baêta]. 1ª vol. da série 'Olympus'. E-book. Goiânia: edição do autor, 2015.
:: Pássaro apedrejado[fotos e capa Marcos Avelino Martins; ilustrações Miriam Baêta]. 2ª vol. da série 'Olympus'. E-book. Goiânia: edição do autor, 2015.
:: Cabrália. [fotos e capa Marcos Avelino Martins; ilustrações Miriam Baêta]. 3ª vol. da série 'Olympus'. E-book. Goiânia: edição do autor, 2015.
:: Nunca te vi, mas nunca te esqueci[fotos e capa Marcos Avelino Martins; ilustrações Miriam Baêta]. 4ª vol. da série 'Olympus'. E-book. Goiânia: edição do autor, 2015.
:: Sob o olhar de netuno[fotos e capa Marcos Avelino Martins; ilustrações Miriam Baêta]. 5ª vol. da série 'Olympus'. E-book. Goiânia: edição do autor, 2015.
:: O tempo que se foi de repente[fotos e capa Marcos Avelino Martins; ilustrações Miriam Baêta]. 6ª vol. da série 'Olympus'. E-book. Goiânia: edição do autor, 2016.
:: Memórias de um futuro esquecido[fotos e capa Marcos Avelino Martins; ilustrações Miriam Baêta]. 7ª vol. da série 'Olympus'. E-book. Goiânia: edição do autor, 2016.
:: Até a última gota de sangue[fotos e capa Marcos Avelino Martins; ilustrações Miriam Baêta]. 8ª vol. da série 'Olympus'. E-book. Goiânia: edição do autor, maio/2016.

Coletânea de poemas eróticos e sensuais
:: Erótique[fotos e capa Marcos Avelino Martins; ilustrações Miriam Baêta]. 9ª vol. da série 'Olympus'. E-book, edição do autor, junho/2016.

Antologias (participação)
:: Declame para Drummond. Antologia. [Organização Marina Mara]. Rio de Janeiro, 2012.
:: Literatura Goyaz. Antologia. [organização Adalberto de Queiroz]. Goiânia: Kickante, 2015.


© Leonid Afremov
POEMAS SELECIONADOS DE MARCOS AVELINO MARTINS

PRÓLOGO 
Escalar incríveis montanhas, 
Viajar sem rumo entre estrelas inacessíveis, 
Jogar-se de aviões em chamas sem paraquedas ou escadas, 
Vencer corridas de carros, mesmo correndo de bicicleta, 
Abrir o peito até chegar às entranhas, 
Chorar por inexistentes amores impossíveis, 
Sonhar com anjos, duendes e fadas, 
Fazem parte do ofício de poeta…
- Marcos Avelino Martins, em "Os oceanos entre nós". 1ª vol. da série 'Olympus'. E-book. Goiânia: edição do autor, 2015.

§

OS OCEANOS ENTRE NÓS
Não sei mais como cruzar 
Os oceanos entre nós. 
Chego às vezes em frente ao seu mar 
E grito seu nome, sem ouvir a minha voz…

Não sei mais como explicar 
Tantos turbilhões em minha cabeça. 
Tento de seu lindo rosto me lembrar, 
Antes que você também me esqueça…

Não sei mais como enfrentar 
Os seus implacáveis maremotos, 
Imensas ondas de ira a devastar 

Meus sonhos em mares tão remotos…

Não sei mais como naufragar 
Essa tristeza em meu coração, 
Que loucamente insiste em navegar 
Contra essas correntes de solidão…

Não sei mais como expulsar 
Esse desespero, esses desenganos. 
São poucos metros a nos separar, 

Mas são tantos oceanos…
- Marcos Avelino Martins, em "Os oceanos entre nós". 1ª vol. da série 'Olympus'. E-book. Goiânia: edição do autor, 2015.

§

VELHAS FERIDAS 
Revirando velhos documentos guardados, 
Encontrei uma antiga e esquecida foto tua, 
Do tempo em que ainda éramos namorados,
 Deslumbrantemente linda e nua... 

Lembrei-me pesaroso dos belos dias 
Em que vivíamos somente para esse amor, 
Que hoje só resistem em poucas fotografias, 
Que ainda me avassalam com teu olhar sedutor... 

Amores do passado um dia sempre voltam 
Para assombrar os que sobrevivem no presente, 
Fantasmas que se foram, mas de repente retornam, 
Mesmo que estivessem presos nos abismos da mente… 

Velhos amores são como adormecidos vulcões 
Que subitamente ressuscitam suas chamas, 
Despertando ocultas e submersas paixões, 
Reacendendo antigos e esquecidos dramas... 

Antigas fotografias possuem a estranha propriedade 
De ressuscitar memórias aparentemente adormecidas, 
De reviver, como por mágica, amor, ternura e saudade, 
E também de reabrir velhas e escondidas feridas... 

Queria não ter descoberto a tua fotografia, 
Mas agora infelizmente já é tarde demais, 
Para esquecer o quanto te amei um dia, 

Ou para te arquivar em minhas memórias uma vez mais...
- Marcos Avelino Martins, em "Os oceanos entre nós". 1ª vol. da série 'Olympus'. E-book. Goiânia: edição do autor, 2015.

§

SOU EU 
Sou eu quem procuras Pelas noites escuras, 
Por teus mares em revolta; 
Não importa com quem estejas, 
Sou eu quem desejas, 
Sou eu teu caminho sem volta... 

Estou marcado em teu fim, 
Teus passos conduzem a mim, 
Mesmo que não o saibas ainda. 
Em teus sonhos me fotografaste, 
Sou eu quem sempre esperaste, 
Sou eu tua esperança infinda... 

Não importa para onde corras, 
Nem em quais sombrias masmorras 
Escondas os teus sentimentos. 
Fomos marcados para nos amarmos, 
Para um dia nos encontrarmos, 
Para cruzarmos nossos caminhos sedentos... 

Pois sou eu com quem sonhas, 
Depois de noites medonhas, 
Depois de cada desilusão. 
São os meus teus caminhos, 
Escritos em velhos pergaminhos, 

E gravados em teu coração…
- Marcos Avelino Martins, em "Os oceanos entre nós". 1ª vol. da série 'Olympus'. E-book. Goiânia: edição do autor, 2015.

§

METAMORFOSE 
De teu riso cálido o amor se fez, 
Caudaloso e profundo como o oceano, 
Lírico, nostálgico e mágico, talvez 
Uma mescla inefável de divino e humano. 
De intenso êxtase foi nossa primeira vez, 
Levando-nos ao Nirvana num gozo profano... 

De repente, tua ausência se tornou saudade, 
Um vento cortante sobre minha pele nua, 
Um choque brutal de dura realidade, 
Uma tempestade insana devastando a rua, 
Mostrando-me a mais pura verdade: 
Que a minha alma se tornara tua... 

Então, minha paixão se tornou poesia, 
Ensinando rimas e sonhos ao luar, 
Derramando-se pela cidade até então tão fria, 
Convidando os solitários para sonhar, 
Até que a longa noite se tornasse dia, 

E eu pudesse enfim te reencontrar...
- Marcos Avelino Martins, em "Os oceanos entre nós". 1ª vol. da série 'Olympus'. E-book. Goiânia: edição do autor, 2015.

§

DICOTOMIA
Um poeta tem um pé no céu, e outro no inferno, 
Um no verão, e outro no inverno. 
Costuma ser um iludido, um sonhador, 
Sempre a fantasiar a paixão e o amor, 
E a cantar a divina beleza 
Da vida, dos sonhos, da Natureza. 
Se a inspiração por acaso lhe falta, 
O desespero logo entra em alta, 
Pois o que seria um poeta, 
Se não fosse um pobre esteta 
Tentando traduzir em versos 

Histórias de mil Universos?
- Marcos Avelino Martins, em "Os oceanos entre nós". 1ª vol. da série 'Olympus'. E-book. Goiânia: edição do autor, 2015.

§

MORFINA
Na dor de tua ausência, 
Nenhum remédio dá jeito! 
Fica essa estranha ardência 
Devastando o meu peito, 
Como se fosse uma praga 
Devorando a plantação, 
Como se fosse uma adaga 
Transpassando o coração... 
Tentei até usar morfina, 
Mas nem isto resolveu, 
E eis-me aqui, parado em tua esquina, 

Esperando em vão por um sorriso teu!
- Marcos Avelino Martins, em "Pássaro apedrejado". 2ª vol. da série 'Olympus'. E-book. Goiânia: edição do autor, 2015.

§

DELIRIUM
A garrafa de vinho esvazia-se devagar 
Diante de meus olhos soturnos, 
A contemplar o incrível balé etéreo 
De teu corpo nu e irreal a rodopiar
 Em meus alcoólicos sonhos noturnos, 
Embalados por teu canto que gravei em estéreo... 

Escondes o rosto atrás de uma negra máscara 
Mas é inútil, conheço cada pedaço de ti,
Todos eles gravados em minha indelével memória, 
Despertada cada vez que ouço o doce som de tua cítara, 
No belo concerto que mil vezes revi, 
E onde começou a nossa estranha história... 

Mostras-me de perto cada uma de tuas curvas, 
Fomentando as minhas necessidades insanas 
De teu amor que não tenho mais! 
E mesmo nessas minhas lembranças turvas, 
Meu coração por certo já não enganas, 
Mas, para meu desespero, não te esqueço jamais... 
- Marcos Avelino Martins, em "Pássaro apedrejado". 2ª vol. da série 'Olympus'. E-book. Goiânia: edição do autor, 2015.

§

REMINISCÊNCIAS 
Um dia, guardei meu coração em uma caixa, 
E te coloquei a chave, numa corrente, junto ao peito. 
Descrevi com paixão o meu amor em uma faixa, 
Para saberes que viver sem ti, não tinha jeito. 

Mas o tempo inclemente passou por cima de tudo, 
Como uma tsunami, arrastando o mundo em suas águas. 
O violão que cantava nosso amor jaz num canto, mudo, 
E o sentimento se afogou em nossas mágoas. 

Tanto amor não resistiu à ação de intempestivas chuvas, 
Que, insensatas, o mataram de desgosto. 
Bateste-me no rosto molhado de lágrimas, com tuas luvas, 
Deixando para sempre tuas marcas em meu rosto. 

Pergunto-me onde andará agora aquela caixa, 
Cuja chave sei que jogaste pela janela... 
Meus sentimentos andam hoje tão em baixa, 
Que te compus esta cantiga tão singela. 

Quem sabe, quando a leres sozinha na penumbra, 
Relembres que um dia nos amamos tanto, 
E se ilumine num sorriso teu rosto, que ainda me deslumbra, 
E reacenda em ti, todo aquele mágico encanto... 

Quem sabe, se um dia desses me ligasses, 
Poderíamos ter, talvez, uma segunda chance, 
Se nos abraçássemos, com o perdão exposto em nossas faces, 

E nos amássemos com sofreguidão, em novo romance...
- Marcos Avelino Martins, em "Pássaro apedrejado". 2ª vol. da série 'Olympus'. E-book. Goiânia: edição do autor, 2015.

§

MÃE 
Em tua barriga sofrida, 
Um dia carregaste um fardo, 
Doce fardo que encheste de carinho,
Vendo-o crescer, mexer-se, chutá-la, 
E encher teu coração de ternura... 

Ternura que transbordou quando ele nasceu; 
E em seu lento processo de crescer, 
Deste-lhe dedicação, atenção, e um amor infindo. 
Fazendo-o dormir acalentado em teus braços, 
As mãos a acariciar seus cabelos tão finos... 

Choraste quando ele chorava, 
Riste sofregamente junto com seu riso, 
Zelaste por seu sono nas madrugadas, 
Medicaste-o em suas doenças, 
Ensinaste-o enquanto crescia... 

Arrumaste em silêncio a bagunça de seu quarto, 
Dando-lhe o exemplo baseado na vida, 
Sonhando que um dia traga-te flores, 
E um cartão dedicado com afeto, 
Agradecendo-te pela linda jornada... 

E pela vida continuas a zelar por ele, 
Mesmo adulto, continua a ser teu filhinho, 
E vais sofrendo por suas dores de amores, 
Chorando pelas palavras mal proferidas, 

Ajudando-o sempre em seu caminho... 

Deus te abençoe, anjo da guarda chamado mãe, 
E te recompense pelas noites em claro, 
Pelo desprendimento de teu carinho eterno, 
Pela beleza de tua alma tão pura, 

E pelo amor que em teu peito se encerra…
- Marcos Avelino Martins, em "Pássaro apedrejado". 2ª vol. da série 'Olympus'. E-book. Goiânia: edição do autor, 2015.

§

FEITICEIRA
Voas livre pelos ares, 
Enfeitiçando todas as criaturas, 
Por entre as nuvens te elevas, 
Espalhando pelos céus as tuas trevas, 
Sem nem te lembrares 
Desse amor cuja saudade é a maior das torturas…
- Marcos Avelino Martins, em "Pássaro apedrejado". 2ª vol. da série 'Olympus'. E-book. Goiânia: edição do autor, 2015.

§

PÁSSARO  
Singrava, livre, pelo infinito azul do firmamento; 
Sobre as nuvens, extasiava-me com o sol poente, 
Abria as asas, e deixava-me levar pelo vento, 
Para, de madrugada, ver o sol nascer lentamente. 

Voava alegremente, junto de minha amada, 
Juntando folhas para rechear nosso ninho, 
E cheio de encanto, via crescer a ninhada, 
Motivo de orgulho de qualquer passarinho. 

Quando as folhas das árvores caíam, ao findar do outono, 
Voava com meus amigos para longe do inverno, 
Deixando meu ninho em completo abandono, 
Pois um pássaro nada tem de eterno... 

Tempos depois, ao despertar da primavera, 
Voltávamos ao lar, celebrando com nosso canto, 
Essa linguagem de amor que Deus nos dera: 
O verde que sobre a terra estendia o manto... 

Hoje, eis-me prisioneiro de uma gaiola dourada, 
Tudo que me circunda são essas quatro paredes, 
Não sei que destino levou a minha amada, 
O que me resta é essa tristeza que vedes. 

Por isto, amigo que, ao passar pela rua, 
De meu destino infeliz tivestes piedade, 
Soltai-me, para eu poder brindar à Lua, 
O maior dom que Deus me deu: Liberdade!
- Marcos Avelino Martins, em "Pássaro apedrejado". 2ª vol. da série 'Olympus'. E-book. Goiânia: edição do autor, 2015.

§

VIOLINO
Teu violino toca suavemente 
Tirando belos acordes 
Na mística desse poente. 
Como é linda essa música, 
Mais do que um dia recordes. 
Pelo céu espalhas a tua mágica, 
Mesmo que não concordes, 

Mesmo que seja para mim somente…
- Marcos Avelino Martins, em "Pássaro apedrejado". 2ª vol. da série 'Olympus'. E-book. Goiânia: edição do autor, 2015.

§

CABRÁLIA 
Navegava entre as estrelas, 
Ao som melancólico da lua cheia, 
Velas soltas aos ventos solares, 
Tomando chuva de tempestades cósmicas, 
Quando aportei em tua praia. 
E teu mar era tão belo e profundo, 
De águas transparentes e calmas, 
Que, quando dei por mim, Já havia nele mergulhado. 
Surfei entre tuas ondas, 
Matei a sede com teu líquido agridoce; 
Vi a mim mesmo refletido, 
No fundo de tuas águas claras. 
Adormeci em tuas areias brancas, 
E aplacaste-me o frio com teu vento cálido, 
Embalaste-me o sono com a música de tuas ondas, 
E, quando acordei, vi que era feliz: 
Tranquila, dormias ao meu lado, 
Esplêndida, em tua majestade eterna.
- Marcos Avelino Martins, em "Cabrália". 3ª vol. da série 'Olympus'. E-book. Goiânia: edição do autor, 2015.

§

O ÚLTIMO BEIJO 
Às vezes, quedo-me perplexo e pasmo 
A admirar essa tua infinita beleza, 
Maior ainda quando tens um orgasmo. 
És meu oásis, nesses tempos de incerteza!

E quando estiver perto do fim, eu prevejo 
Que, ao brotar dos céus o definitivo amanhecer, 
Ao partir, será por certo meu derradeiro desejo 
Dar-te um último beijo, e depois morrer…
- Marcos Avelino Martins, em "Cabrália". 3ª vol. da série 'Olympus'. E-book. Goiânia: edição do autor, 2015.

§

RÉQUIEM 
Depois que eu me for desta vida, 
Não temas, de onde estiver, não vou te abandonar... 
Quando uma leve brisa soprar em teus ouvidos, 
Ouvirás a minha voz, a sussurrar: “Te amo”! 
Se vires um bando de borboletas a esvoaçar pelo céu, 
Sua dança exuberante será ao som de minha música... 
Cada pássaro a singrar os ares à tua volta, 
Deixará para ti uma mensagem cifrada em sua trilha; 
Ao olhares para o céu noturno nublado e cinzento, 
A única estrela a piscar para ti será a minha... 
No escuro da noite, disfarçados de pirilampos, 
Meus olhos brilharão para iluminar teu caminho. 
Quando sentires um arrepio em tua nuca, 
Terá sido um beijo que te enviei com o vento. 
E se uma suave chuva molhar os teus cabelos, 
Sentirás o gosto de minhas lágrimas escorrerem em tua face. 
Ao dormires, velarei a teu lado o teu sono, 
Minha mão invisível a afagar teus cabelos, 
Minha lembrança cálida a acalentar os teus sonhos, 

Onde viverei em paz para sempre contigo!
- Marcos Avelino Martins, em "Cabrália". 3ª vol. da série 'Olympus'. E-book. Goiânia: edição do autor, 2015.

§

FÊNIX 
Um dia, na calada da noite, eles virão, 
E tentarão calar minha lira, 
De tantos e tão sentidos versos, 
Colocando-lhe uma infame mordaça. 
Tentarão em seguida comprar-me, 
Mas não podem pagar meu preço. 
Depois, tentarão quebrar meu espírito, 
Mas este, é mais forte do que eu, 
E não se alquebra tão fácil quanto meu corpo. 
Por último, tentarão jogar-me na lama, 
Difamando meu nome e maldizendo meus versos; 
Mas no fundo, sabem que isto de nada adianta, 
Pois quanto mais tentam subjugar-me, 
Mais forte fico, e ressurjo sempre das cinzas, 
Qual uma fênix incansável e imortal. 
Por fim, um dia, as armas silenciam, 
Os canhões se calam, e vão-se embora em silêncio, 
E de sua passagem restam apenas tristes memórias, 
Arquivos queimados, fotos destruídas, 
Sangue inocente derramado pelas ruas, 
Lembranças ruins de um sonho que passou, 
E o brado heroico de minha resistência…
- Marcos Avelino Martins, em "Cabrália". 3ª vol. da série 'Olympus'. E-book. Goiânia: edição do autor, 2015.

§

EMBALANDO ESTRELAS
Sonhei que estavas entre bilhões de estrelas, 
Com tua voz suave a cantar... 
Entre galáxias, embalando estrelas, 
Entoando cantigas sem parar... 
Na noite mágica, inspirando estrelas, 
Com teu canto macio a ecoar... 
Como é possível que até mesmo estrelas 
Consigas tão simplesmente encantar? 
Tão inspirada estavas, distraindo estrelas, 
Que, de tanto enlevo, paravam de piscar... 
A noite passava, derramando estrelas, 
Em teu lindo vestido de luar... 
E eu mais te amava, eu e as estrelas, 
Aproveitando a noite para sonhar... 
Até que acordei, te procurando de novo sob as estrelas, 

Tão distantes quanto estou de te olvidar…
- Marcos Avelino Martins, em "Cabrália". 3ª vol. da série 'Olympus'. E-book. Goiânia: edição do autor, 2015.

§

LIVRO
Vivi milhares de aventuras 
Em tuas páginas desbotadas, 
Contra monstros, bruxas e dragões. 
Alegrias, amores e desventuras 
Pelos mares, céus e estradas, 
Em carros, navios ou aviões. 
Por mais de 1001 noites, 
Distribuindo beijos, socos e balas, 
Debaixo de chicotes, chibatas e açoites, 
Convencendo as damas a deixarem-me amá-las. 
Fadas, deusas, princesas, foram tantas escolhas, 
E eu as amei através de tuas folhas! 
Obrigado, livro amigo, 
Por tantos sonhos vividos junto contigo…
- Marcos Avelino Martins, em "Cabrália". 3ª vol. da série 'Olympus'. E-book. Goiânia: edição do autor, 2015.

§

SOLIDÃO
Nesse mundo sem graça, 
A vida não passa, 
Nem há mais primavera, 
Somente o inverno, 
Aqui tão perto do inferno! 
Manda-me de volta a quimera 
Que tu me levaste 
Quando juraste que virias 
E sozinho aqui me deixaste, 
Entre essas paredes vazias…
- Marcos Avelino Martins, em "Cabrália". 3ª vol. da série 'Olympus'. E-book. Goiânia: edição do autor, 2015.

§

DÚVIDA
Não sei se te encontro no inverno, 
Ou se no início da primavera. 
Não sei se me aguardas no inferno, 
Ou no fundo de alguma quimera...

Não sei se flutuas ou se danças, 
Mas pela vida busquei alguém como tu. 
Porém, não sei onde guardei tuas lembranças, 
No fundo esquecido de algum baú...

Não sei se te encontro no céu, 
Ou se no leito do mar. 
Não sei se teus lábios têm mel, 
Ou se apenas o fundo de teu olhar...

Não sei se teus olhos são claros, 
Ou se somente lampejam no escuro. 
Não sei se teus beijos são raros, 
Ou se no fundo do bar te procuro...

Não sei se te encontro na bruma, 
Ou se dentro do nevoeiro. 
Não sei se me aprontas alguma, 
No fundo de algum pardieiro...

Não sei se és boa de cama, 
Ou se devo ensinar-te sozinho. 
Não sei se és apenas um holograma, 
Brilhando no fundo do meu caminho...

Não sei se te encontro nesta vida, 
Ou somente em antigas histórias. 
Não sei se és alguma amante perdida 

No fundo de minhas memórias…
- Marcos Avelino Martins, em "Nunca te vi, mas nunca te esqueci". 4ª vol. da série 'Olympus'. E-book. Goiânia: edição do autor, 2015.

§

SHERLOCK
Coloquei um chapéu igual ao do Sherlock, 
E saí por aí, a investigar um mistério: 
Como pode você, com um simples toque 
Tirar-me tanto assim do sério?

Como pode ser que você me provoque 
Tantas emoções, tantos desatinos, 
Deixando meu indefeso coração em choque, 
Sem saber como juntar nossos destinos?

Como pode ser que você simplesmente troque
Meu suave coração, batendo ao som de um lindo jazz, 
Por outro que retumbe ao som de uma banda de hard rock, 
Deixando-me aqui prostrado, ajoelhado aos seus pés?

Como pode ser que você me coloque 
Tantos sentimentos à flor da pele, 
E me trate como um descartável berloque, 

Esperando por você até que o Sol congele?
- Marcos Avelino Martins, em "Nunca te vi, mas nunca te esqueci". 4ª vol. da série 'Olympus'. E-book. Goiânia: edição do autor, 2015.

§

ESCOLHAS
Entre viver ou não viver, 
Fico com a vida. 
Entre trabalhar ou descansar, 
Fico com a lida.

Entre sonhar ou não sonhar, 
Fico com o tapete mágico. 
Entre amar ou não amar, 
Fico com o menos trágico.

Entre ferir ou não ferir, 
Fico com a ferida. 
Entre partir ou não partir, 
Fico com a despedida. 

Entre ler ou não ler, 
Fico com a poesia. 
Entre sofrer ou não sofrer, 
Fico com a alegria. 

Entre gostar ou não gostar, 
Fico com o sentimento. 
Entre ficar ou não ficar, 
Vou ficando cada momento.

No livro de minha vida, vou preenchendo as folhas, 
Desenhando o mapa de onde agora estou, 
Pois sou eu que faço minhas escolhas, 

Mas são elas que fazem quem eu sou...
- Marcos Avelino Martins, em "Nunca te vi, mas nunca te esqueci". 4ª vol. da série 'Olympus'. E-book. Goiânia: edição do autor, 2015.

§

FLANANDO
Não sei onde foi parar minha inspiração, 
Depois que saiu flanando atrás de você, 
Mas de que adianta mesmo tanta paixão, 
Se você faz de conta que nem me vê?

Fiz um curso online com a Poesia, 
Mas parece que não tem mais jeito: 
Tento escrever seu nome no papel todo dia, 
Mas você deixou um buraco em meu peito!

E nesse vazio que a saudade encobre, 
Só que o vejo é a sua ausência, 
Sem você, minha poesia é tão pobre!
E para a falta de amor, não existe ciência, 
Somente a solidão que a noite descobre, 

Essa noite sem fim de minha existência...
- Marcos Avelino Martins, em "Nunca te vi, mas nunca te esqueci". 4ª vol. da série 'Olympus'. E-book. Goiânia: edição do autor, 2015.

§

XEQUE-MATE
A vida é mesmo uma estranha fiandeira! 
Olhando para teu lindo sorriso, ainda apaixonado, 
Percebo que tudo que procurei a vida inteira 
Sempre esteve aqui, bem do meu lado...
- Marcos Avelino Martins, em "Nunca te vi, mas nunca te esqueci". 4ª vol. da série 'Olympus'. E-book. Goiânia: edição do autor, 2015.

§

NECROLÓGIO
Minha mais profunda melancolia 
É por não ser sido possível te reter, 
Não por um instante ou por um dia, 
Mas até o próprio tempo desaparecer…

Eu te perdi em alguma curva do caminho, 
Quando partiste sem dizer nada, em silêncio, 
Deixando-me nessa longa estrada sozinho, 
Meu coração partido e esse vazio imenso!

Olho para o passado, para rever teu sorriso, 
E espero o futuro, olhando o maldito relógio, 
Que, lento e angustiante, não traz o que preciso! 
“Morreu de saudade”, dirá o meu necrológio…
- Marcos Avelino Martins, em "Nunca te vi, mas nunca te esqueci". 4ª vol. da série 'Olympus'. E-book. Goiânia: edição do autor, 2015.

§

MARIANA
Quantas tragédias como a de Mariana 
Teremos afinal de calados suportar 
Para acordarmos dessa letargia profana? 
Diga-me, cidadão, quantos Brasis 
Teremos de assistir o governo dinamitar 
Para nos revoltarmos como se fosse em Paris?
- Marcos Avelino Martins, em "Nunca te vi, mas nunca te esqueci". 4ª vol. da série 'Olympus'. E-book. Goiânia: edição do autor, 2015.

§

SOB O OLHAR DE NETUNO
Eu e você nadamos no Lago da Alegria, 
Descemos de canoa no Rio da Magia, 
Tomamos banho nas Cataratas da Ilusão, 
E nos atiramos das Corredeiras do Sentimento. 
Enfim nos amamos na Enseada dos Apaixonados, 
Mas naufragamos no Mar do Esquecimento, 
E nos perdemos na Baía dos Desesperados, 

Quando mergulhei no Oceano da Desilusão...
- Marcos Avelino Martins, em "Sob o olhar de netuno". 5ª vol. da série 'Olympus'. E-book. Goiânia: edição do autor, 2015.

§

REPOSITÓRIO
Arquivei todas as dores do mundo 
Dentro de meu sofrido violão 
Embalei e guardei lá no fundo 
Junto aos acordes de uma triste canção

Queria fazer o mesmo com as tristezas 
Mas elas são por demais arredias 
Fazem questão de ficar sobre as mesas 
Escancarando as suas faces sombrias

Mas meu violão ficou com muitas toneladas 
E nunca mais emitiu sequer uma nota 
As suas pobres cordas ficaram trincadas
E esta limpeza selou a sua última quota 
De doces melodias que foram trocadas 

Por guardar a dor desse mundo idiota 
- Marcos Avelino Martins, em "Sob o olhar de netuno". 5ª vol. da série 'Olympus'. E-book. Goiânia: edição do autor, 2015.

§

BENDITA PEDRA!
Caro poeta Drummond, 
Lembra-se da pedra que estava no meio do seu caminho? 
Pois é, agora a danada plantou-se no meio do meu, 
E não dá sinais de querer ir embora! 
E o pior, essa é uma bendita pedra-bumerangue, 
E se eu a jogo longe, ela volta, 
E cai bem sobre a minha cabeça, 
Que já está cheia de cortes e hematomas! 
Onde é que eu posso encontrar 
Uma outra pedra que se limite a ficar 
Quietinha, simplesmente parada aqui 

Bem no meio do meu caminho?
- Marcos Avelino Martins, em "Sob o olhar de netuno". 5ª vol. da série 'Olympus'. E-book. Goiânia: edição do autor, 2015.

§

ETERNO
Nosso amor é daqueles sentimentos eternos, 
Que o próprio tempo se esqueceu de apagar, 
Quando me olhas com esses olhos tão ternos, 
Percebo porque para sempre irei te amar.

Desde o momento em que te conheci, 
Quando pela primeira vez vi teu sorriso, 
Lindo como nem sei se algum dia mereci, 
Invadiste meu coração sem prévio aviso!

Desde então, te tornaste inesquecível, 
Sem ti, minha vida não teria sabor, 
Sem teu amor, ser feliz seria inconcebível,

E, quando pela última vez o Sol se pôr, 
A morte será o único epílogo possível 

Para essa nossa linda história de amor!
- Marcos Avelino Martins, em "Sob o olhar de netuno". 5ª vol. da série 'Olympus'. E-book. Goiânia: edição do autor, 2015.

§

DOIS NÓS
Restaram apenas sobras de nós, 
Dispersadas como cinzas ao vento,
 Antes entrelaçadas como nós, 
E hoje, espalhadas ao relento.

O desamor foi nosso triste algoz, 
E o desejo se desfez no ar, 
A desilusão calou nossa voz 
Como navios perdidos no mar,

Desataram-se os nossos destinos, 
Restou um sentimento dilacerado, 
Resultado de tantos desatinos,

Que me deixaram ainda marcado. 
Antes ligados por fios tão finos, 

E depois, indo cada um por um lado!
- Marcos Avelino Martins, em "Sob o olhar de netuno". 5ª vol. da série 'Olympus'. E-book. Goiânia: edição do autor, 2015.

§

OS SONS DO SILÊNCIO
Sussurrei o teu lindo nome nos ouvidos do vento, 
Confessando como era grande o meu sentimento, 
Mas o fofoqueiro se encarregou de esparramar 
O meu grande segredo até que pudesses escutar!

Quando olhaste então bem lá no fundo de meu olhar, 
E em tuas pupilas vi um ponto de interrogação, 
Mergulhei mansamente no fundo de teu profundo mar 
Para mostrar que eu era apenas fogo e paixão!

Compartilhei em silêncio minhas doces memórias, 
De amor e esperança no que um dia há de vir, 
Lembrando cada uma das diversas trajetórias,

Que algum dia os nossos corações poderão seguir, 
Pois o silêncio pode contar-nos lindas histórias 

Que nenhuma palavra algum dia poderá traduzir!
- Marcos Avelino Martins, em "O tempo que se foi de repente". 6ª vol. da série 'Olympus'. E-book. Goiânia: edição do autor, 2016.

§

AD ETERNUM
O amor é uma estrada sinuosa, 
Cheia de curvas e voltas, 
É uma armadilha perigosa, 
Sujeita a mil reviravoltas.

Você se joga do espaço sem paraquedas, 
Esperando cair na segurança do mar, 
Reservando para Caronte duas moedas, 
Uma para a travessia, outra para voltar!

Mas sem que se espere, então aparece 
Um abismo infinito à frente, 
E a separação de repente acontece, 
Viramos náufragos, contra a corrente…

Entre nós dois, aconteceu algo assim: 
Não entendeste o quanto eu te quis, 
E deixaste nossa paixão chegar ao fim, 
Deixando em seu lugar essa incurável cicatriz.

Hoje, não sei se teu amor mereci, 
Mas para sempre espero, 
Que entendas que o amor que te ofereci 

Era sincero!
- Marcos Avelino Martins, em "O tempo que se foi de repente". 6ª vol. da série 'Olympus'. E-book. Goiânia: edição do autor, 2016.

§

AMIGOS
Quanto mais velhos ficamos, 
Mais valor damos a nossas amizades, 
Mais saudosistas nos tornamos, 
Mais enxergamos eternas verdades!

Muitas pessoas passam por nossas vidas, 
E nos deixam um pouco de suas histórias, 
E sempre fazem parte das lembranças queridas, 
Que carregamos em nossas memórias...

Há os velhos amigos e companheiros 
Que foram nossos colegas de escola, 
Há os que sempre foram cachaceiros, 
E os nossos parceiros de seresta e viola.

Há os amigos que chegam dando porrada, 
Quando nos veem envolvidos em uma briga, 
Os que choram conosco até de madrugada, 
Quando juntos perdemos alguma pessoa amiga.

Há os que nos oferecem os ombros 
Para chorarmos, quando perdemos o rumo, 
Quando tudo que nos restou foram escombros, 
E nos ajudam a recuperar o prumo.

Hoje são comuns os amigos virtuais, 
Que não conhecemos, mas nos identificamos demais. 
Há os que só vemos nos eventos culturais, 
E os que só vimos uma vez, e depois nunca mais.
Há os amigos que são sempre austeros, 
Os brincalhões que nos fazem rir, 
Mas meus preferidos são os sinceros 
Que nos amam desde a 1ª vez que nos viram sorrir…
Mando por esses versos meu abraço apertado 
Para os grandes amigos que passaram por minha vida, 
Quero que saibam que os amo um bocado, 

E que por eles sempre estarei na torcida.
- Marcos Avelino Martins, em "O tempo que se foi de repente". 6ª vol. da série 'Olympus'. E-book. Goiânia: edição do autor, 2016.

§

CICATRIZES
Olhando para minha imagem no espelho 
Percebo que as rugas que o tempo 
Espalhou pelo meu rosto 
Não dizem nem metade das coisas 
Do que as inúmeras cicatrizes 
Que deixou em meu coração!
- Marcos Avelino Martins, em "O tempo que se foi de repente". 6ª vol. da série 'Olympus'. E-book. Goiânia: edição do autor, 2016.

§

DIVAGANDO
O poeta vive a divagar, 
Devagar, 
E de repente 
Derrapa nas curvas 
Turvas 
Da mente. 
- Marcos Avelino Martins, em "O tempo que se foi de repente". 6ª vol. da série 'Olympus'. E-book. Goiânia: edição do autor, 2016.

§

O VENTO 
Descobri que o vento ouve meus pensamentos: 
Sopra forte, quando estou solitário, 
E se cala, quando cultivo o silêncio…
- Marcos Avelino Martins, em "O tempo que se foi de repente". 6ª vol. da série 'Olympus'. E-book. Goiânia: edição do autor, 2016.

§

PASSAGEIROS
Desta vida, somos passageiros 
Em uma estrada longa ou curta, 
Nossos pés no início são ligeiros, 
Na juventude, se o tempo não a furta.

E vamos navegando por essa estrada, 
Para onde for que o vento nos leve, 
Fazendo festa e amor até de madrugada, 
Enquanto dura essa vida tão breve...

Sempre em busca da tal felicidade, 
Que às vezes passa e nem percebemos, 
Sofrendo por amor, desejo ou saudade,

Buscando coisas que sempre tivemos, 
Ou então trocando um amor de verdade 
Por promessas que jamais alcançaremos.
- Marcos Avelino Martins, em "O tempo que se foi de repente". 6ª vol. da série 'Olympus'. E-book. Goiânia: edição do autor, 2016.

§

MEMÓRIAS DE UM FUTURO ESQUECIDO

(I)

Num dispositivo do tempo arrojado, 
Projetado por um cientista pirado, 
Num verdadeiro salto no escuro, 
Mergulhei de encontro ao futuro!

Queria deixar teu amor no passado, 
Mas tua lembrança seguiu ao meu lado, 
E o que era meu sonho de consumo, 
Tornou-se mais uma viagem sem rumo!

Eu, pobre viajante do tempo apaixonado, 
Perdido nas dobras do tempo, nessas brumas 
Que me deixam cada vez mais angustiado,

Entre as maravilhas desse futuro enevoado, 
Sem conseguir me esquecer de algumas 
Que eternizei quando estava ao teu lado!

(II)
Finalmente, aprendi a me manter disfarçado, 
Fazendo de conta que não era anacrônico, 
Aos poucos, esquecendo-me do passado, 
Acostumando-me a esse futuro irônico,

De tantas novas invenções maravilhosas, 
Da cura para todas as antigas doenças, 
Mas que não se livrou de rixas poderosas 
Entre raças e religiões, eternas desavenças!

As memórias aos poucos vão se apagando, 
Mas de algumas delas eu nunca me esqueci, 
De nossa paixão que devagar foi definhando,

De todas as canções que um dia cantei para ti, 
Das tristezas que no coração fui guardando, 
De todos os versos que nunca mais te escrevi!
- Marcos Avelino Martins, em "Memórias de um futuro esquecido". 7ª vol. da série 'Olympus'. E-book. Goiânia: edição do autor, 2016.

§

CHAGAS
Nessas chagas deixadas pelo amor, 
Não tem nenhum remédio que dê jeito, 
Nem um bom cirurgião consertador, 
Pois não basta somente abrir seu peito,

E tentar remendar o coração, 
Para deixá-lo de novo perfeito, 
À procura de uma nova ilusão, 
Ou de alguém deitada nua no teu leito!

Mas algumas chamas, nunca as apagas, 
Ficam ali na penumbra aguardando, 
Um adeus as converte em novas chagas,

Que não te deixam em paz, até quando 
Outro amor acaba com essas pragas, 
E assim mesmo, ficam ali espreitando...
- Marcos Avelino Martins, em "Memórias de um futuro esquecido". 7ª vol. da série 'Olympus'. E-book. Goiânia: edição do autor, 2016.

§

AMOR ETERNO
O mundo nada tem de eterno 
Exceto talvez nosso amor, 
Forte, compassivo e terno, 
Que me seguirá por onde for…

Não sei o que a vida nos reservou, 
Talvez só nos restem tristezas, 
Mas só de saber que tanto me amou, 
Acabam-se todas as incertezas…

Tanta paixão e ternura, as duas, 
Habitam para sempre nossa casa, 
Fugindo da violência das ruas,

Com seu legado de pássaros sem asa. 
Entrelaçamos nossas almas nuas 
Nesse imenso amor que extravasa!
- Marcos Avelino Martins, em "Memórias de um futuro esquecido". 7ª vol. da série 'Olympus'. E-book. Goiânia: edição do autor, 2016.

§

SONETO TRÍSSILABO
É demais 
Se te vais 
E desfaz 
Minha paz

Sem razão 
Teu perdão 
Eu te peço 
E começo

Por teu rosto 
Tão perfeito 
Predisposto

Desse jeito 
Bem exposto 
Em meu leito
- Marcos Avelino Martins, em "Memórias de um futuro esquecido". 7ª vol. da série 'Olympus'. E-book. Goiânia: edição do autor, 2016.

§

ESQUINAS
O vento passa, vem soprando forte 
Pelas antigas esquinas da vida, 
Deixando-nos as suas tristes canções 
Ecoando no vil silêncio da tarde!

Às vezes, no ar fica um cheiro de morte, 
Entra em nossa mente desprevenida 
E cansada após tantas estações 
E por tantas tristezas sem alarde!

O tempo é um velho amigo do vento, 
Um e outro dividem velhas memórias 
De nossas derrotas e vãs vitórias,

E escarnecem de tanto sofrimento 
Contido nas nossas velhas histórias 
Murmuradas em segredo ao relento!
- Marcos Avelino Martins, em "Memórias de um futuro esquecido". 7ª vol. da série 'Olympus'. E-book. Goiânia: edição do autor, 2016.

§

ARQUITETOS DE SONHOS
Poetas são grandes arquitetos aéreos 
Sempre construindo castelos no ar 
Feitos com imensos pilares etéreos 
Moldados com a essência do sonhar

Poetas podem ser jardineiros funéreos 
Plantando jardins com flores mortas 
Distribuídas com canhões antiaéreos 
De amor descrito por linhas tortas

Poetas são escritores maquiavélicos 
Buscando amores em becos sombrios 
Fugindo de sinistros sonhos bélicos

Com suas rimas quentes e corações frios 
Sonhando com falsos amores angélicos 
Mas sinuosos como as curvas dos rios
- Marcos Avelino Martins, em "Memórias de um futuro esquecido". 7ª vol. da série 'Olympus'. E-book. Goiânia: edição do autor, 2016.

§

O BURACO DA AGULHA
Diz a lenda que é mais fácil um camelo 
Passar pelo buraco da agulha 
Do que um rico entrar no paraíso. 
Mas parece que algum pulha, 
Saído de algum pesadelo, 
Já deu no primeiro um jeito, 
Arrancando-me um contrafeito sorriso: 
Em vez de um buraco onde mal passa um cabelo, 
Construiu uma agulha gigante, 
Por onde passa até um enorme elefante, 
Muito maior do que um camelo! 
Agora que o paradoxo foi extinto, 
Certamente, esse infame sujeito 
Ao morrer tentará arrombar o cadeado 
Que veda a entrada do pecado 
Naquele divino recinto… 
- Marcos Avelino Martins, em "Até a última gota de sangue". 8ª vol. da série 'Olympus'. E-book. Goiânia: edição do autor, maio/2016.

§

NAU DOS INSENSATOS
A vida é um livro mal documentado, 
Cheia de perigos e armadilhas 
Em suas perversas sendas e trilhas! 
É difícil escapar de tantos pecados 
Que te esperam bem na porta ao lado… 
Luxúria, ira, inveja, são forças ocultas, 
Que o demônio deixa bem disfarçados 
Em belas faces e mentes incultas… 
E ameaças ficam por aí espalhadas:
Atrás do sorriso da linda moça da esquina, 
Com suas curtas roupas assanhadas, 
Pode se esconder uma feroz assassina, 
Aguardando um incauto em sua teia, 
Como se fosse uma linda sereia, 
Que com seus cantos de diversos formatos 
Atraísse vítimas para serem seus escravos 
Em profanos barcos escandinavos, 
Navegando nesse moderno Mar dos Insensatos!
- Marcos Avelino Martins, em "Até a última gota de sangue". 8ª vol. da série 'Olympus'. E-book. Goiânia: edição do autor, maio/2016.

§

ERAS
Eras perfeita, mesmo através das eras, 
Ah, quão amável e linda tu eras, 
Emprestando teu frescor às gentis primaveras, 
Alimentando as minhas doces quimeras, 
Amansando com tua alegria todas as feras, 
Mantendo ao teu redor as amizades austeras, 
Acalentando os sonhos de quem um dia quiseras, 
Eternizando frases que nem mesmo disseras! 
E eu, aguardando por beijos que jamais me trouxeras, 
Querendo ganhar abraços que nunca liberas, 
Cultuando os mesmos santos que tu veneras, 
Deixando de cantar as músicas que não toleras, 
Esperando que um dia dissesses que me amas deveras, 
E descobrindo por fim que jamais me esperas, 
E nunca farei parte de tuas paixões mais sinceras, 
E que de meu insensato amor nem mesmo souberas, 
Pois amizade era a única coisa que um dia me deras…
- Marcos Avelino Martins, em "Até a última gota de sangue". 8ª vol. da série 'Olympus'. E-book. Goiânia: edição do autor, maio/2016.

§

ORA, DIREIS!
Ora, direis: “Fazer poesia, 
Por certo, ficaste maluco, 
Foste a um Baile da Fantasia, 
Ou então já estás caduco…

De que te serve escrever versos, 
Se não te enchem a barriga? 
Não serão uns poemas controversos 
Que pagarão a casa que te abriga!

Acorda, homem, apeia de teus sonhos, 
Arranja um meio de ganhar dinheiro, 
Que não fazer poemas medonhos! 
Larga dessa alucinação o dia inteiro,

Não sei mais o que fazer contigo, 
Depois que foste viver no Mundo da Lua, 
Acho que vou ter que te botar de castigo, 
Ou então te mandar para o meio da rua!”
- Marcos Avelino Martins, em "Até a última gota de sangue". 8ª vol. da série 'Olympus'. E-book. Goiânia: edição do autor, maio/2016.

§

DUALIDADE
Seres humanos são duais 
Compartilham trevas e luz 
Ódio e amor 
Maldição e cruz 
Bênçãos e terror 
Tristeza e alegria 
Vingança e perdão 
Concretismo e fantasia 
Pena e condenação 
Desespero e felicidade 
Liberdade e prisão 
Degradação e divindade 
Justiça e injustiça 
Lealdade e traição 
Hiperatividade e preguiça 
Desprezo e paixão 
Guerra e paz 
Esperança e desilusão 
Deus e Satanás 
Como poderia dar certo?
- Marcos Avelino Martins, em "Até a última gota de sangue". 8ª vol. da série 'Olympus'. E-book. Goiânia: edição do autor, maio/2016.

§

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____
Página atualizada em 1.8.2016.


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Hélio Oiticica e a ditadura militar no Brasil

Hélio Oiticica no seu estúdio com Bólides e Parangolés, Rio de Janeiro, 1965

Hélio Oiticica e a ditadura militar no Brasil*  
por Michael Asbury


Que Hélio Oiticica conclamou ativamente um boicote dos artistas à Bienal de São Paulo de 1969 em oposição à censura e à repressão instauradas pelo regime militar no Brasil é um fato histórico inegável.1 No entanto, sua visão política vai muito além  da mera oposição à ditadura.
Ao chegarmos aos 50 anos (2014) do golpe de Estado no Brasil, testemunhamos uma série de incidentes que nos convidam a pensar na relação de Oiticica tanto com aquele momento histórico quanto com os debates da atualidade. Nesse sentido, seu famoso lema “Seja marginal, seja herói” ainda possui muito de sua força original se pensarmos nas recentes apologias à violência dos autodenominados justiceiros, como o slogan “Adote um bandido”, que foi ampla e vergonhosamente difundido pela grande imprensa brasileira.
Oiticica sem dúvida jogava com a ambivalência da palavra “marginal”: um termo que define tanto o indivíduo fora da lei, os setores excluídos da sociedade e, pode-se presumir, a consciência de si mesmo como artista latino-americano. Em outras palavras, o artista propunha um espaço de relação, um fato que a dicotomia proposta pelo slogan recente, que sugere que você ou toma partido do linchamento ou adota um infrator, procura ativamente negar. Essa retórica expressa uma separação irrevogável e, ao fazê-lo, relembra preocupantemente o infame refrão dos militares: “Brasil: ame-o ou deixe-o”.
Muito do que foi publicado sobre Oiticica fora (e às vezes dentro) do Brasil nos últimos anos faz questão de reforçar o fato de que a Tropicália, o “movimento”, apropriou-se do nome da instalação homônima do artista, que ocorreu às vésperas do endurecimento do regime militar, marcado pela decretação do AI-5, em dezembro de 1968. A perseguição a Caetano Veloso e Gilberto Gil pelo regime também está relacionada às práticas de Oiticica, uma vez que a prisão e o posterior exílio dos dois, segundo o próprio Caetano, foram consequência da exibição da bandeira “Seja marginal, seja herói” durante uma apresentação deles.2
Hélio Oiticica - Seja marginal, seja herói
Contrariamente a essas aproximações, contudo, eu afirmo que ver Oiticica apenas como um artista que desafiou o regime militar não revela o verdadeiro significado da conjunção da sua ética política e estética. Evidentemente, Oiticica denunciava o regime – como poderia ser diferente? –, mas colocá-lo no simples antagonismo entre “a favor ou contra” obscurece o fato de que ele estava engajado em transformar o modo como entendemos arte, ao trazer à luz problemas que afetam a sociedade brasileira até hoje. Se esses problemas continuam ou foram exacerbados a partir dos anos 1960, apesar do fim da ditadura nos anos 1980 e os subsequentes governos “democráticos” de distintas afiliações no espectro político, a recepção de seu trabalho como artista, na minha opinião, ainda não é considerada satisfatória.
O fato de que a Tropicália pode ser razoavelmente descrita como um “movimento” da música popular brasileira não significa necessariamente que, no campo da arte, houvesse uma coerência equivalente de propósitos, sem falar de estética. O ensaio de Oiticica, “Esquema geral da nova objetividade”, publicado em 1967, no catálogo da exposição Nova objetividade brasileira, onde sua instalação Tropicália foi apresentada pela primeira vez, no Museu de Arte Moderna do Rio, é um testemunho de sua posição favorável tanto a uma prática artística de natureza mais pluralista quanto à política de resistência. Sua insistência numa posição ética que surgisse dessa prática mais pluralista ligada à resistência, em oposição a uma proposta panfletária direta e declarada, sem falar na resistência armada, revela muito da diversidade de práticas e da práxis política adotada pelos artistas naquele momento. Oiticica estava, no fundo, tentando encontrar coerência em um momento de desarranjos e divergências políticas e estéticas.
Hélio Oiticica - Instalação 'Tropicália', 1967
De fato, há muito a ser aprendido sobre sua posição nesses tempos de divisões segundo quadros ideológicos ortodoxos, onde se espera uma tomada de posição sem reflexão ou, como é cada vez mais frequente, ao se clicar em um botão, sobre situações de conflito e protesto, seja no Brasil, na Venezuela, nos EUA ou no leste europeu. Tropicália, nesse sentido, produtivamente, estrategicamente e, sobretudo, intelectualmente, articulava uma posição entre facções aparentemente irreconciliáveis. Era, em outras palavras, não uma posição de síntese, como muitas vezes se diz, no sentido das fontes estéticas, mas no nível político, muito pelo contrário, de contínua reflexão sobre possíveis relações no interior das possibilidades de resistência. Essa posição, no caso de Oiticica, surge a partir de um processo pessoal de articulação com o abismo sociorracial brasileiro, que revelou as contradições intrínsecas das próprias reivindicações de identidade nacional feitas pelos extremos políticos, que, no limite, viriam a ser antagonistas do “movimento” com o qual a instalação Tropicália se tornou associada.
É difícil, em se tratando de Oiticica, fazer afirmações definitivas. Em vez disso, é necessário falar de processos e desenvolvimentos, de releituras e revisitações. Esse foi, aliás, o método adotado no artigo que escrevi em 2006, intitulado “O Hélio não tinha ginga”, que, até onde sei, é sempre citado por outros autores como uma crítica à habilidade de Hélio como dançarino. Minha crítica, se é que havia alguma, era bastante simples, poderia ser resumida como um alerta contra o perigo de se considerar Hélio, o artista branco de classe média, como uma espécie de Tarzan que se sentia mais em casa na favela do que os próprios moradores do morro.3
O enfoque em sua habilidade de dançarino enfraquece, portanto, o ponto crucial sobre a relevância daquela experiência para sua prática artística, seu processo intelectual ou mesmo (no contexto deste ensaio) sua posição política diante do regime militar.
Miro da Mangueira com Parangolé
Por trás desse simples alerta, há um aspecto mais complexo relativo à história da arte, que nos diz, no caso de Oiticica, que é problemático discutir uma única obra ou série sem considerar a natureza reavaliadora inerente de sua prática criativa como um todo. Boa parte do artigo, portanto, retoma o advento do Parangolé, a série de obras mais associada ao carnaval, ao samba e, por extensão, à própria Mangueira.
O artigo propunha um estudo historiográfico dos escritos de Oiticica no intuito de desfazer a percepção de que sua obra era puramente produto do encontro do artista com a cultura popular. Uma compreensão assim limitadora sugere implicitamente que ela representaria uma ruptura com sua prática anterior. Em vez disso, defendo que seu envolvimento com a cultura popular brasileira era como um desenvolvimento de sua trajetória criativa e intelectual totalmente coerente com sua experiência dentro das vanguardas neoconstrutivistas brasileiras do final dos anos 1950: justamente porque essas experiências seriam continuamente retomadas pelo artista ao longo de toda sua vida.
O artigo questionava uma abordagem metodológica defendida pela crítica pós-colonial simplista, dominante entre as narrativas da dita arte “periférica”. Segundo essa abordagem, a ênfase na relação de Oiticica com a cultura popular brasileira me parecia consolidar o próprio discurso que ele proclamava querer derrubar. Em vez de avaliar a obra como arte, esses discursos tendem a alienar o artista numa genealogia “paralela” da história da arte, um modernismo tropical alternativo, que pode, por sua vez, ser (como de fato foi) inserido nas grandes antologias da arte do século XX sem maiores descontinuidades dentro da narrativa canônica euro-americana. Esses discursos, em última análise, mesmo implicitamente, sugerem uma posição na história da arte de separação ao invés de relação. Propor uma relação com o cânone já é criar uma ruptura dentro dele, e era justamente isso que eu tentava fazer.
No esquema com o qual tentei romper, o Parangolé é compreendido de forma reducionista como uma proposta afinada com o discurso da ampliação do campo da cultura erudita, que se afasta da percepção da autonomia da arte, um fato enfatizado pelo sempre relembrado evento da inauguração dos Parangolés, em 1965, quando Oiticica e amigos da favela, vestidos com parangolés e dançando samba, foram expulsos do Museu de Arte Moderna do Rio. Se Oiticica realçava o apartheidsociorracial inerente que existe no Brasil, a inauguração do Parangolé poderia ser considerada uma forma de protorrolezinho – a recente onda entre jovens das favelas e periferias que organizam flash mobs em shopping centers e locais frequentados pela classe média, de onde são expulsos à força, revelando, portanto, a violência implícita das estruturas sociais dominantes. O Parangolé, e essa era minha principal tese naquele artigo, não se restringe apenas ao escopo sociorracial. Ele age dentro do quadro das questões fundamentais sobre como a arte é compreendida. É, portanto, uma contribuição para esse campo, que deveria ser discutida não apenas dentro das especificidades do contexto social e político regional, mas nos termos das práticas radicais desenvolvidas contemporaneamente na Europa, nos EUA, no Japão, entre outros países. Como a própria retórica pós-colonial, ao celebrar acriticamente a relação que o Parangolé estabelece com a cultura popular brasileira, essas abordagens tanto enquadram quanto restringem seu significado dentro do contexto regional. Por um lado, elas transformam essas práticas em entidades inofensivas que jamais romperão as premissas legitimadoras das genealogias pós-greenberguianas, mas, por outro, implícita ou convenientemente disfarçam o fato de que os problemas sociais e étnicos que a obra destacava ainda persistem hoje em dia. Se voltarmos aos escritos de Oiticica durante os anos 1960, encontraremos tanto uma crítica das desigualdades vigentes na sociedade brasileira como também uma contínua relação que o artista estabelece entre artistas no Brasil e em outros países. Essas duas linhas do pensamento de Oiticica não podem ser consideradas investigações separadas.
Hélio Oiticica - Parangolé
Oiticica estava claramente diferenciando o Parangolé dos artefatos da cultura popular precisamente por isso. Para ele, aquilo não representava a cultura popular, e sim criava um espaço de relação com ela, como de fato criou com outras práticas experimentais de outros contextos. Dizer que Hélio não sabia dançar era, portanto, um modo provocativo de afirmar que ele não representava o samba. Felizmente, o samba é perfeitamente capaz de se representar a si mesmo. A relação entre oParangolé e o samba, talvez seja o caso de dizer, é também fundamentalmente distinta do atual emprego do termo relacional, que tende a considerar a arte sob tal denominação predominantemente como uma forma de representação da alteridade, um modo de trazê-la para o museu, a bienal ou a galeria.
A questão da representação é significativa, portanto, porque ainda há uma necessidade desesperada dos setores marginalizados da sociedade de terem o direito e o espaço para a autorrepresentação. Em outras palavras, enquanto ainda for necessário um artista para tornar visíveis os desejos desses setores, o problema persistirá. O Parangolé não foi, nesse sentido, um precursor do rolezinho. Como Oiticica declarou no catálogo da exposição Information, no MoMA, em 1970: “Não estou aqui para representar o Brasil”. Essa declaração é geralmente entendida como uma recusa a qualquer associação com o regime militar no Brasil na época. Claro que isso também é verdade, mas a frase é mais profunda do que apenas isso. Ela sugere que Oiticica não queria representar, ponto. Seu projeto – os Ninhos (expostos na ocasião) e, por extensão, a proposta político-estética do Barracão, da qual os Ninhosderivavam – era estabelecer condições do ser, não importando o lugar, seja social ou geográfico. O Barracão é a afirmação política mais profunda de Oiticica, sua resposta às ideologias de todo espectro. Era um espaço de relação, de comunicação não hierárquica que se valia de sua experiência comunitária na favela, em outras palavras, de sua própria vivência. O Barracão é, portanto, uma abstração par excellence, não um modelo arquitetônico, uma representação de um espaço típico da favela, mas propõe uma práxis política, conferindo poder aos participantes pelo estabelecimento de comunidades e processos de relação. É uma reavaliação autoconsciente da síntese imagética proposta em Tropicália.
Lembramos aqui de uma anedota que Hélio costumava contar sobre seu avô. Quando chamado para ser jurado em um processo criminal, José Oiticica disse logo de início que não julgaria o acusado, fossem quais fossem as evidências. Para Hélio, essa parecia ser uma posição problemática, que ele admitia ter tido grande impacto em sua visão de mundo. Se um advogado representa um cliente ou o Estado, não existe nenhuma posição disponível para a articulação de qualquer relação. Pede-se que o júri tome partido de um ou de outro lado. Podemos assim entender a frase do avô de Hélio como uma recusa a revelar posições, uma vez que adotar uma posição é estagnar, é defender um juízo definitivo. Como seu avô, Hélio se tornou um revolucionário, tanto na sua posição como ser sociopolítico quanto como artista. Seu Bólide Homenagem a cara de cavalo é um bom exemplo de como essas duas posições se fundem pela distinção entre representação e relação. A imagem fotográfica, multiplicada dentro da caixa, não é uma representação do bandido assassinado, mas uma apropriação, trata-se de um ready-made. Em outras palavras, é uma imagem tirada de seu contexto original, em si mesma uma representação. Oiticica está efetivamente transformando as possibilidades de relação que a imagem midiática do jornal foi capaz de fornecer. Está tornando abstrata a estrutura em que a imagem estava representada para oferecer uma nova forma de relação entre o observador e a imagem. Essa estratégia de questionamento da própria estrutura pela qual a imagem é apresentada remonta ao neoconcretismo, por exemplo. O mesmo poderia ser dito a respeito do Parangolé.
Hélio Oiticica com Bólide 'Homenagem
 a Cara de Cavalo'
Em 1964, quando ocorrem duas catástrofes na vida do artista, o golpe militar e a morte do pai, Oiticica experimentou possivelmente o ano mais libertador de sua vida. Sua imersão na cultura da Mangueira, que também aconteceu naquele ano, foi um momento catártico para ele, política, sexual e artisticamente. Ver isso como contraditório é deixar de entender o impulso dialógico de sua ética e de sua estética.
Anarquista, nietzschiano, chame como quiser, a relação de Oiticica com a ditadura militar no Brasil, como sua própria arte, foi de contínua e produtiva reavaliação. Entender obras – a homenagem a Cara de Cavalo e os Parangolés – e ideias – oBarracão – como formas de representação seria colocar sua obra como expressão da repressão e da vitimização. Nada poderia estar mais longe da verdade.
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1 Os arquivos de Guy Brett sobre o artista no período londrino e posteriores à exposição na Whitechapel Gallery, em 1969, contêm diversos materiais relacionados a isso.
2 Caetano faz essa afirmação em seu livro autobiográfico Verdade tropical, além de mencioná-la em seu depoimento para o catálogo Oiticica in London, organizado por Guy Brett e Luciano Figueiredo, publicado pela Tate, em 2007.
3 BRAGA, P. (org.) Fios soltos do experimental: a arte de Hélio Oiticica. São Paulo: Perspectiva, 2008, pp. 27-65.
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. Tradução de Alexandre Barbosa de Souza.

Sobre o autor:
Michael Asbury é integrante do Centro de Pesquisa Transnational Art identity and Nation da University of the Arts London e referência, como teórico e curador, em arte brasileira moderna e contemporânea.

* Originalmente publicado no site do Instituto Moreira Sales - IMS, em 23.4.2014. 
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Saiba mais sobre Hélio Oiticica

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** Página atualizada em 28.7.2016.


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Carta de George Orwell explica 1984



1984 é um dos romances mais influentes do século XX. Lançada poucos meses antes da morte de George Orwell, é uma obra magistral que ainda se impõe como uma poderosa reflexão ficcional sobre a essência nefasta de qualquer forma de poder totalitário. Em 1944, três anos antes de escrever 1984 e cinco antes de sua publicação, George Orwell encaminhou a Noel Willmett uma carta em que detalhava a tese de seu grande romance. A seguir, leia a carta e conheça mais sobre o que pensava o autor de um dos clássicos modernos mais importantes da literatura mundial.

Tradução de Carlos Alberto Bárbaro


Para Noel Willmett
18 de maio de 1944
10a Mortimer Crescent NW 6

 
Caro Sr. Willmett,

Muito obrigado pela sua carta. O senhor pergunta se o totalitarismo, culto ao caudilho etc. estão em ascensão de fato, ressaltando que essas coisas, aparentemente, não registram crescimento aqui na Inglaterra e nos Estados Unidos.

Insisto que acredito, ou temo, que quando se observa o mundo em sua totalidade, essas coisas estão aumentando. Claro, não restam dúvidas de que Hitler em breve será passado, mas somente às custas do fortalecimento de (a) Stálin, (b) dos milionários anglo-americanos e (c) de todo tipo de fuhrerzinho à la de Gaulle. Para onde quer que se olhe, todos os movimentos nacionalistas, mesmo os que surgiram como forma de resistência ao domínio alemão, parecem assumir formas não-democráticas, organizando-se em torno a algum tipo de fuhrer sobre-humano (Hitler, Stálin, Salazar, Franco, Gandhi, De Valera e vários outros modelos) e adotando a teoria dos fins que justificam os meios. Por toda parte, o mundo parece convergir para economias centralizadas, que podem até “funcionar” no sentido econômico do termo, mas que não são democraticamente organizadas, possuindo o pendor a estabelecer um sistema de castas. Acrescente-se a isto o horror do nacionalismo exacerbado e uma tendência à descrença na existência das verdades objetivas, já que todos os fatos têm que se adequar às palavras e profecias de algum fuhrer infalível. Na verdade, em certo sentido, a história já deixou de existir, não havendo mais uma história contemporânea que possa ser universalmente aceita, e as ciências exatas também estarão ameaçadas tão logo não se precise mais do exército para manter a ordem. Hitler pode dizer que os judeus começaram a guerra, e se ele sobreviver, isso passará a ser a história oficial. Mas ele não pode dizer que dois mais dois são cinco, porque para os objetivos, digamos, da balística é preciso que essa soma continue sendo quatro. Mas se o tipo de mundo que eu temo vier a se tornar realidade, um mundo de dois ou três grandes super Estados incapazes de conquistar um ao outro, dois mais dois será cinco se o fuhrer assim o desejar. E é para aí, até onde posso enxergar, que estamos nos movendo de fato, embora, claro, esse processo seja reversível.

No que respeita à comparativa imunidade da Inglaterra e dos Estados Unidos, digam o que disserem os pacifistas etc., ainda não trilhamos o caminho do totalitarismo, o que é um bom sinal. Eu acredito profundamente, o que expliquei em O leão e o unicórnio, no povo inglês e em sua capacidade de centralizar sua economia sem destruir a liberdade no processo. Mas é preciso recordar que a Inglaterra e os Estados Unidos não foram de fato postos à prova, nenhum deles sofreu uma derrota ou perda severa, e que há alguns maus sintomas que podem desequilibrar os bons. Comecemos com a falta de preocupação generalizada com a decadência da democracia. O senhor se dá conta, por exemplo, que na Inglaterra de hoje, ninguém com menos de 26 anos vota e que, pelo que se pode constatar, a grande maioria dos que estão nessa faixa etária não dá a mínima para isso? Acrescente-se que os intelectuais são mais propensos a soluções totalitárias que o vulgo. Os intelectuais ingleses, é verdade, se opuseram majoritariamente a Hitler, mas somente às expensas de aceitar Stálin. A maioria deles está perfeitamente pronta para os procedimentos ditatoriais — polícia secreta, falsificação sistemática da história etc. –, desde que a percepção deles indique que isso esteja “do nosso” lado. Na verdade, a afirmação de que não temos um movimento fascista na Inglaterra significa mais que os jovens, no momento, buscam seu fuhrer em outro lugar. Não é possível assegurar que isso não vá mudar, nem que a gente comum não vá daqui a dez anos pensar como os intelectuais ingleses pensam agora. Eu espero que não, eu chego a acreditar que não vão, mas se for assim, não será sem conflito. Simplesmente afirmar que tudo vai bem, sem identificar alguns sintomas sinistros, apenas ajuda a fazer do totalitarismo uma possibilidade mais próxima.

O senhor também me pergunta se, uma vez que julgo que o mundo está rumando em direção ao fascismo, por que então apoio a guerra. Trata-se de uma escolha entre dois males — creio que toda guerra o é. Eu conheço o imperialismo britânico o suficiente para não o apreciar, mas eu o apoiaria contra os imperialismos nazista e japonês, como o mal menor. Do mesmo modo, eu apoiaria a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas contra a Alemanha, por julgar que a URSS não pode, a um só tempo, fugir do seu passado e manter o suficiente dos ideais originais da Revolução Russa, o que faz dela um fenômeno mais esperançoso que o da Alemanha Nazista. Eu acredito, e é isso o que penso desde que a guerra eclodiu, por volta de 1936, que nossa causa é a melhor, mas que temos que continuar a fazer com que ela evolua, e isso implica um constante exercício crítico.

Sinceramente, seu,

Geo. Orwell


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To Noel Willmett
18 May 1944
10a Mortimer Crescent NW 6

Dear Mr Willmett,

Many thanks for your letter. You ask whether totalitarianism, leader-worship etc. are really on the up-grade and instance the fact that they are not apparently growing in this country and the USA.

I must say I believe, or fear, that taking the world as a whole these things are on the increase. Hitler, no doubt, will soon disappear, but only at the expense of strengthening (a) Stalin, (b) the Anglo-American millionaires and (c) all sorts of petty fuhrers° of the type of de Gaulle. All the national movements everywhere, even those that originate in resistance to German domination, seem to take non-democratic forms, to group themselves round some superhuman fuhrer (Hitler, Stalin, Salazar, Franco, Gandhi, De Valera are all varying examples) and to adopt the theory that the end justifies the means. Everywhere the world movement seems to be in the direction of centralised economies which can be made to ‘work’ in an economic sense but which are not democratically organised and which tend to establish a caste system. With this go the horrors of emotional nationalism and a tendency to disbelieve in the existence of objective truth because all the facts have to fit in with the words and prophecies of some infallible fuhrer. Already history has in a sense ceased to exist, ie. there is no such thing as a history of our own times which could be universally accepted, and the exact sciences are endangered as soon as military necessity ceases to keep people up to the mark. Hitler can say that the Jews started the war, and if he survives that will become official history. He can’t say that two and two are five, because for the purposes of, say, ballistics they have to make four. But if the sort of world that I am afraid of arrives, a world of two or three great superstates which are unable to conquer one another, two and two could become five if the fuhrer wished it.1 That, so far as I can see, is the direction in which we are actually moving, though, of course, the process is reversible.

As to the comparative immunity of Britain and the USA. Whatever the pacifists etc. may say, we have not gone totalitarian yet and this is a very hopeful symptom. I believe very deeply, as I explained in my book The Lion and the Unicorn, in the English people and in their capacity to centralise their economy without destroying freedom in doing so. But one must remember that Britain and the USA haven’t been really tried, they haven’t known defeat or severe suffering, and there are some bad symptoms to balance the good ones. To begin with there is the general indifference to the decay of democracy. Do you realise, for instance, that no one in England under 26 now has a vote and that so far as one can see the great mass of people of that age don’t give a damn for this? Secondly there is the fact that the intellectuals are more totalitarian in outlook than the common people. On the whole the English intelligentsia have opposed Hitler, but only at the price of accepting Stalin. Most of them are perfectly ready for dictatorial methods, secret police, systematic falsification of history2 etc. so long as they feel that it is on ‘our’ side. Indeed the statement that we haven’t a Fascist movement in England largely means that the young, at this moment, look for their fuhrer elsewhere. One can’t be sure that that won’t change, nor can one be sure that the common people won’t think ten years hence as the intellectuals do now. I hope 3 they won’t, I even trust they won’t, but if so it will be at the cost of a struggle. If one simply proclaims that all is for the best and doesn’t point to the sinister symptoms, one is merely helping to bring totalitarianism nearer.

You also ask, if I think the world tendency is towards Fascism, why do I support the war. It is a choice of evils—I fancy nearly every war is that. I know enough of British imperialism not to like it, but I would support it against Nazism or Japanese imperialism, as the lesser evil. Similarly I would support the USSR against Germany because I think the USSR cannot altogether escape its past and retains enough of the original ideas of the Revolution to make it a more hopeful phenomenon than Nazi Germany. I think, and have thought ever since the war began, in 1936 or thereabouts, that our cause is the better, but we have to keep on making it the better, which involves constant criticism.

Yours sincerely,

Geo. Orwell


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Página atualizada em 27.7.2016.



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