Marcia Kambeba - foto: © Nícolas Noel
© Pesquisa, seleção, edição e organização: Elfi Kürten Fenske
Por gentileza citar conforme consta no final desse trabalho.
Por gentileza citar conforme consta no final desse trabalho.
"Nasci na Uka sagrada
Na mata por tempos vivi
Na terra dos povos indígenas
Sou Wayna, filha de Aracy"
- Márcia Kambeba, em "Ay kakyri
Tama". Pólen, 2018.
ESBOÇO BIOBIBLIOGRÁFICO DE MÁRCIA WAYNA KAMBEBA
Márcia Wayna Kambeba é indígena, do povo Omágua/Kambeba no Alto Solimões (AM). Nasceu na aldeia Belém do Solimões, do povo Tikuna. Mora hoje em Belém (PA) e é mestra em Geografia pela Universidade Federal do Amazonas. Atualmente, está cursando doutorado em Linguística na UFPA. Escritora, poeta, compositora, fotógrafa e ativista.
Em sua luta na literatura e na música, aborda, sobretudo, a identidade dos povos indígenas, territorialidade e a questão da mulher nas aldeias. Em 2013, lançou o seu primeiro livro "Ay Kakyri Tama", que reúne textos poéticos e fotografias da vivência do seu povo dentro das cidades.
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OBRA DE MÁRCIA WAYNA KAMBEBA
Poesia e crônicas
:: Ay kakyri Tama - Eu moro na cidade. Márcia Wayna Kambeba. [apresentação Benedito Maciel]. Manaus: Grafisa Gráfica e Editora, 2013; Editora Pólen, 2ª ed., 2018.
:: Kumiça Jenó: Narrativas Poéticas dos Seres da Floresta. Márcia Wayna Kambeba. Flórida: Underline Publishing LLC, 2021.
Educação - ensaio e poesia
:: Saberes da floresta. Márcia Wayna Kambeba. [prefácio Julie Dorrico]. Coleção Insurgências. São Paulo: Editora Jandaíra, 2020.
:: O lugar do saber ancestral. Márcia Wayna Kambeba. [prefácio Aloir Pacini]. Série Saberes Tradicionais, v. 1; São Leopoldo: Casa Leiria, 2020; São Paulo: Uk'a Editorial, 2021. Disponível no link. (acessado 1.12.2021).
Dissertação e ensaios
:: Reterritorialização e identidade do povo Omágua- Kambeba na aldeia Tururucari- Uka. Márcia Vieira da Silva/Márcia Wayna Kambeba. (Dissertação Mestrado em Geografia). Universidade Federal do Amazonas, UFAM, Manaus, 2012. Disponível no link. (acessado em 2.12.2021).
:: As culturas dos povos indígenas, política e religião. Márcia Wayna Kambeba. In: RIBEIRO, Cláudio de Oliveira; TOSTES, Angelica (Org.). Religiões e Intervenção Política: múltiplos olhares. São Paulo: Editora Recriar, 2020.
:: Literatura indígena: da oralidade à memória escrita. Márcia Wayna Kambeba. In: DORRICO, Julie; DANNER, Leno Francisco; CORREIA, Heloisa Helena; DANNER, Fernando (Org.). Literatura indígena brasileira contemporânea: criação, crítica e recepção. Porto Alegre, RS: Editora Fi, 2018. Disponível no link. (acessado em 2.12.2021).
Depoimento
:: Márcia Kambeba – culturas indígenas. In: Itaú Cultural, 22.9.2017. Disponível no link. (acessado em 1.12.2021).
:: Memória da mãe terra. (organização Maria Pankararu, Fernanda Martins, Joana Brandão Tavares, Gabriela Saraiva de Mello, Potyra Tê Tupinambá e Sebastián Gerlic). São Paulo: Thydwá, 2014. {autores presentes: Arian Pataxó, Naine Terena, Manoel Moura Tukano, Yracerê Xucuru-Kariri, Nazaré Pankararu, Joarez Karapotó, Atiã Pankararu, Edson Kayapó, Ararawã Baenã Hãhãhãe, Maya Pataxó Hãhãhãe, Ítala Xokó, Elyzama Xokó, Franklin Xokó, Yatan Xokó, Karine Xokó, Reginaldo Kanindé, Nhenety Kariri-Xocó, Alexsandro Potiguara, Maike Witxô Fulni-ô, Joel Braz Pataxó, Bu’ú Tukano, Nynhã Gwarini Tupinambá, Jamopoty Tupinambá, Katu Tupinambá, Casé Angatu, Veronica Manaura, Márcia Wayna Kambeba}.
:: Nós da poesia: vozes da rua. [organização Brenda Marques Pena]. São Paulo: All Print Editora, 2014.
:: Cult Antologia Poética: Poemas para ler antes das notícias. [curadoria Alberto Pucheu; projeto gráfico Fernando Saraiva]. Ebook. Editora Bregantini, 2019. {participam os poetas: André Luiz Pinto, Tatiana Pequeno, Danielle Magalhães, Bruna Mitrano, Luiz Guilherme Barbosa, Heitor Ferraz, Diego Vinhas, Tarso de Melo, Antônio Moura, Piero Eyben, Jarid Arraes, Heleine Fernandes, Paulo Ferraz, Carlos de Assumpção, Cuti, Lubi Prates, Conceição Evaristo, Nina Rizzi, Eliane Potiguari, Marcia Wayna Kambeba, Josoaldo Lima Rêgo, Reuben, Horácio Costa, Cláudio Oliveira, Natasha Felix, Helena Zelic, Tertuliana Lustosa, Catia Cernov, Bruno Domingues Machado, Pieta Poeta, Letícia Brito, Marcelo Diniz | artistas: PV Dias, Pedro Lemos, Marcelo D'Salete, Marilia Marz, Thiago TeGui, Bea Corradi, Guilhermina Augusti}.:: Sensibilidade. 11ª Antologia da Academia Formiguense de Letras. [organização Paulo José de Oliveira]. Rio de Janeiro: Letras e Versos, 2019.
:: Elas e as letras: diversidade e resistência. [organização Aldirene Máximo e Jullie Veiga; prefácio Alexandra Patrocínio; apresentação Rita Queiroz; homenagem Eliane Potiguara]. Versejar Edições Literárias, 2019. {autoras/ meu lugar de fala: Catita, Lana Nóbrega, Márcia Wayna Kambeba | escritoras convidadas: Catita, Diedra Roiz, Lana Nóbrega, Luiza Lemos, Márcia Wayna Kambeba, Neide Almeida| elas e as letras: Adriana Santiago, Alexandra Jacob, Alexia Tunkis, Aline Venâncio, Ana Raquel Fernandes, Ana Sabina, Beatrice Medrado, Carol Gaertner, Claudirene Favarin, Cleonice Alves Lopes-Flóis, Clevane de Araújo Lopes, Coral Michelin, Cristina Serrano, Daniela Tertuliano, Edvânia Rodrigues, Edy Justino, Elza Helena, Fabiane Rodrigues da Silva, Glauce Cristine Cacau, Iara Gregnani, Iriane da Costa, Itaciana Kaline, Jeovânia P., Jô Viana, Juliana dos Santos, Juliana Graminho, Julie Lua, Laryssa Frezze e Silva, Letícia Gerola, Liliana Ripardo, Lu Dallabrida, Luiza Rodrigues, Maria Teresa Moreira, Marjorie Carvalho, Mila Lopes, Nina Balbi, Palmira Heine, Priscilla Hingred, Reginalva Alves, Rute Beserra, Sandra Modesto, Sandra Sampaio, Sigridi Borges, Silvinha Rabone, Sophia Vargas, Teresinha Nascimento, Vanessa Maia, Yasmim Honorato Izidoro | participações especiais: Alexandra Patrocínio, Angelita Alves, Josielma Ramos, Lindevania Martins, Mohine Yamir, Rita Queiroz, Tânia Diniz}.
:: Poesia indígena hoje: resiliência. [organização Beatriz Azevedo e Julie Dorrico]. Dossiês 1. Revista p-o-e-s-i-a, n. 1 . 2020. {“Cardumes poéticos” - conta com participação de: Ailton Krenak, Aline Pachamama (puri), Auritha Tabajara, Ãtekáy (pataxó), Eliane Potiguara, Edson Krenak, Graça Graúna (potiguara/RN), Gustavo Caboco (wapichana), Ian Wapichana, Itayná Ranny Tuxá, Jamile Nunes (parintintim), Juliana Kerexu (guarani), Julie Dorrico (makuxi), Marcia Mura, Marcia Kambeba, Olivio Jecupé (guarani), Renata Machado (Tupinambá), Tiago Hakiy (mawé), Yaguaré Yamã (sateré-mawé) e Zélia Balbina (puri) | ensaios “Sementes” - conta com participação de: Daniel Munduruku, Fernanda Vieira (xocó/SE), Geni Ñunez (guarani), Jaider Esbell (makuxi), Kaka Werá (Tapuia) e Maria Elis Nunc-Nfôonro (xokleng)}. Disponível no link. (acessado em 2.12.2021).
:: Geração 2010 – O sertão é o mundo. [organização Fred Di Giacomo; orelhas do livro Marçal Aquino; editor Marcelo Nocelli]. São Paulo: Editora Reformatório, 2020. {autores presentes: Ailton Krenak, Bruno Ribeiro, Débora Ferraz, Franklin Carvalho, Fred Di Giacomo, Gilvan Eleutério, Isabor Quintiere, Itamar Vieira Junior, Jarid Arraes, Julie Dorrico, Krishna Monteiro, Mailson Furtado, Marcelo Maluf, Marcia Kambeba, Maria Fernanda Elias Maglio, Maria Valéria Rezende, Mariana Basilio, Maya Falks, Micheliny Verunschk, Monique Malcher, Nara Vidal, Natalia Borges Polesso, Raimundo Neto, Santana Filho e Victor Guilherme Feitosa}.
:: Ato poético: Poemas pela democracia. São Paulo: Oficina Raquel, 2020. {autores presentes: Marcia Tiburi, Luis Maffei, MC Carol, Rita Isadora Pessoa, Clarissa Macedo, Horácio Costa, Patrícia Porto, Manoel Ricardo de Lima, Tarso de Melo, Dora Dacosta, Carla Andrade, Zé Luiz Rinaldi, Rodrigo Garcia Lopes, Wanda Monteiro, Elves França, Haroldo Ceravolo Sereza, Carlos Orfeu, Dani Balbi, Alice Ruiz, Thiago Rodrigues, Wilson Alves-Bezerra, Adriane Garcia, Bruna Kalil Othero, Evando Nascimento, Luciany Aparecida, Ismar Tirelli Neto, Leonardo Gandolfi, Paula Glenadel, Natasha Felix, Guilherme Gontijo Flores, Bruna Mitrano, Armando Freitas Filho, Ricardo Vieira Lima, Ana Chiara, Adalberto Müller, Camila Assad, Flavia Rocha, Marcelo Reis de Melo, Priscilla Campos, Márcia Wayna Kambeba, Renato Rezende, Talles Azigon, Tatiana Pequeno, Júlio Machado, Mariano Marovatto, Nina Rizzi, Rafael Zacca, Masé Lemos, .rômulo-silva, Annita Costa Malufe, Hélio de Assis, Maiara Gouveia, Claudio Daniel, Jussara Salazar, Leonardo Tonus, Paulo Franchetti, Ana Kiffer, Sérgio Nazar David, Paloma Franca Amorim, Eliza Araújo, Marcos Siscar, Heleine Fernandes, Roberta Ferraz, Janice Caiafa, Ana Cristina Joaquim, Ronaldo Cagiano, Danielle Magalhães, Rafaela Figueiredo, Leila Danziger, Éle Semog, Beatriz Azevedo, Marcelo Sandmann}.
:: Cartas para o Bem Viver. [organização Suzane Lima Costa e Rafael Xucuru-Kariri]. Salvador: Boto-Cor-de-Rosa Livros, Arte e Café, 2020. {autores presentes: Ailton Krenak, Sônia Guajajara, Gersem Baniwa, Juvenal Payayá, Graça Graúna, Marcia Kambeba, Denilson Baniwa, Rafael Xucuru-Kariri, Jerry Matalwê, José Carlos Tupinambá, Taquari Pataxó, Eloá Kastelie, Rosenilda Luciano, Angela Mendes, Rubelise da Cunha, Cristina Araripe Fernandes, John Antón Sánchez, Aparecida Vilaça, Fábio Merladet, Ricardo Piera Chacón, Milena Britto, Rosinês Duarte, Maria Vanessa, Deise Queiroz, Thaiane Pinheiro, Tim Ingold, Bernd Reiter, Stéphane Pujol, Paloma Vidal, Arami Marschner, Joseley Francisco de Souza, Antônio Marcos Pereira, Alexandre San Goes, Joseane Maytê Sousa, Suzane Lima Costa, Irene Maria, Joseli dos Reis Querino, Lucien Azevedo, Fernanda Mota Pereira, Roberto Sobral, Maria Rosário de Carvalho, Nego Bispo, Diosmar Filho, Kandya Obezo Casseres, Beth Rangel, Alvanita Almeida Santos, Ramon Fontes, Felipe Milanez, Amanda Marina Batista, Leandro Durazzo}. Disponível no link. (acessado em 2.12.2021).
:: Letras: poemas que encantam o povo paulivense. Antologia Poética. [organização Lizandro Barbosa]. Quirinópolis: Editora IGM, 2020.
:: (Entre Parentes): Narrativas Indígenas Ilustradas [curadoria Daniel Munduruku e Mauricio Negro]. Sesc Osasco/Sesc SP, 2022. {autores - textos: Rosi Waikhon, Kamuu Dan Wapichana, Kanátyo Pataxoop, Auritha Tabajara, Ariabo Kezo, Márcia Wayna Kambeba, Lucia Morais Tucuju, Jaime Diakara Dessana, Juvenal Payayá, Eliane Potiguara, Vãngri Kaingáng, Darlene Yaminalo Taukane // autores - ilustrações: Alexandra Tupi Krenak, Gustavo Caboco, Dona Liça Pataxoop, Carmézia Emiliano, Cleomar Myahu Tan Huare, Ibã Huni Kuin, Uziel Guaynê, Jonas Estevam Malakuiawá, Bu´u Kennedy, Denilson Baniwa, Moara Tupinambá, Arissana Pataxó, Naine Terena}. Disponível no link. (acessado em 28.1.2023).
:: Apytama: floresta de histórias. [organização Kaka Wera; ilustações Digo Cardoso]. Coleção Veredas. Editora Moderna, 2023. {autores presentes: Daniel Munduruku, Kaká Werá, Cristino Wapichana, Ademario Ribeiro Payayá, Tiago Hakiy, Edson Kaiapó, Auritha Tabajara, Trudruá Dorrico e Márcia Kambeba}.
Outras participações
:: Calendário Vozes Antirracistas 2023. [organização Camila Oliveira, Carolline Sotero, Graziele Vidal; revisão Aline Lobo]. Edição: @awaeducadoras {autores presentes: Alaíde Costa - Aza Njeri - Waldete Tristão - Celia Xakriabá - Taís Espírito Santo - Denilson Baniwa - Carol Adesewa - Yaguarê Yamã - Lucas Veiga - Adriana Corrêa - Kiusam de Oliveira - Marcia Kambeba}. Disponível no link. (acessado em 1.3.2023) || *Conheça o projeto "Àwa - Educação antirracista". aqui!
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Marcia Kambeba - foto: © Arquivo pessoal
UMA SELETA DE POEMAS DA POETA MÁRCIA WAYNA KAMBEBA
ÁRVORE DA VIDA
Sany uny yuçuca tana may-sangara Kambeba!
Tradução:
Vem água, banha nossa alma Kambeba!
No despertar da aurora,
No mito de criação,
Na gota que traz a vida,
De um povo, de uma nação.
Batendo na samaumeira
Caindo feito algodão,
Pro colo do grande rio
Que num sopro de criação,
Dá vida ao “índio” guerreiro,
E a mulher, sua paixão.
Assim para o povo Omágua
A samaumeira tem a função,
De mãe das grandes árvores,
De cura e proteção,
E pelo indígena é cultuada,
Essa gigante, mãe amada,
Na dança nativa, dos povos irmãos.
- Márcia Kambeba, no livro "Ay kakyri Tama - Eu moro na cidade". Grafisa Gráfica e Editora, 2013.
§§
AY KAKUYRI TAMA
(Eu Moro na Cidade)
Ay kakuyri tama.
Ynua tama verano y tana rytama.
Ruaia manuta tana cultura ymimiua,
Sany may-tini, iapã iapuraxi tanu ritual.
Tradução:
Eu moro na cidade
Esta cidade também é nossa aldeia,
Não apagamos nossa cultura ancestral,
Vem homem branco, vamos dançar nosso ritual.
Nasci na Uka sagrada,
Na mata por tempos vivi,
Na terra dos povos indígenas,
Sou Wayna, filha da mãe Aracy.
Minha casa era feita de palha,
Simples, na aldeia cresci
Na lembrança que trago agora,
De um lugar que eu nunca esqueci.
Meu canto era bem diferente,
Cantava na língua Tupi,
Hoje, meu canto guerreiro,
Se une aos Kambeba, aos Tembé, aos Guarani.
Hoje, no mundo em que vivo,
Minha selva, em pedra se tornou,
Não tenho a calma de outrora,
Minha rotina também já mudou.
Em convívio com a sociedade,
Minha cara de “índia” não se transformou,
Posso ser quem tu és,
Sem perder a essência que sou,
Mantenho meu ser indígena,
Na minha Identidade,
Falando da importância do meu povo,
Mesmo vivendo na cidade.
- Márcia Kambeba, no livro "Ay kakyri Tama - Eu moro na cidade". Grafisa Gráfica e Editora, 2013.
§§
CABOCLO RIBEIRINHO
Ao som do banzeiro do rio
As canoas vem, as canoas vão.
É o caboclo ribeirinho,
Que luta pelo seu sustento, pelo seu pão
Ele rema, joga a sua malhadeira
Esperando pegar um bom pirarucu
Ou um grande pirabutão.
Ao som da melodia dos pássaros,
Que voam em sua direção,
Ele segue o seu caminho,
Observando o horizonte,
que está além do alcance de sua mão.
Ao som do banzeiro do rio
As canoas vem, as canoas vão.
É o caboclo ribeirinho,
Que vive a vida com emoção,
Em meio ao verde e à margem do rio,
Cultiva a vida, sem muita preocupação.
Seu convívio em meio a natureza,
Fez dele um grande conhecedor,
Sabe os segredos da fauna e da flora,
Dom de Deus, o nosso criador,
Que se revela no entardecer da aurora.
Ao som do banzeiro do rio
As canoas vem, as canoas vão!
- Márcia Kambeba, no livro "Ay kakyri Tama - Eu moro na cidade". Grafisa Gráfica e Editora, 2013.
§§
NATUREZA EM CHAMA
Na terra sagrada
Que TUPÃ criou,
Do seio materno
Se ouve o clamor,
Da mãe natureza
Sofrendo de dor.
O fogo ardente,
Ao longe se vê,
Queimando a mata
Sem Q, nem porquê,
As folhas se torcem
Querendo viver.
No solo desnudo,
Os restos mortais,
Do verde da vida
E dos animais,
Queimados, sofridos
Em cinzas reais.
Dos gritos agudos
Se ouve o clamor,
Do fruto ardendo
Na chama, no calor,
Ceifado, perdido,
O fogo o calou.
Dos olhos tristes,
Uma lágrima cai,
O lamento de dor
Com o vento se vai,
Varrendo o chão,
Varrendo o chão!
- Márcia Kambeba, no livro "Ay kakyri Tama - Eu moro na cidade". Grafisa Gráfica e Editora, 2013.
§§
OS FILHOS DAS ÁGUAS DO SOLIMÕES
A água é a mãe que sustenta,
A vida que nasce como flor
Alimenta a planta e o ser vivente,
É estrada por onde anda o pescador.
Na enchente, vem veloz e furiosa,
Derrubando ribanceiras, destruindo a plantação,
Afeta a vida do indígena e ribeirinho,
é um ciclo, que se renova a cada estação.
Na vazante o rio quase some.
A praia começa a surgir,
A água, agora bem calminha,
Não tem forças para a roça destruir.
Nas margens de um rio em formação,
Vive um povo que a água fez nascer,
Em um parto de dor e emoção,
A VÁRZEA, o Kambeba escolheu pra viver.
Mas em um contato fatal,
Com um povo mais socializado,
Fez dos herdeiros das águas,
Um povo desaldeado,
Tomando seu solo sagrado,
Sem dor, piedade ou compaixão,
Os Kambeba foram escravizados,
Apresentados a “civilização”.
Exploraram a sua força,
Forjando uma falsa proteção.
- Márcia Kambeba, no livro "Ay kakyri Tama - Eu moro na cidade". Grafisa Gráfica e Editora, 2013.
§§
SER INDÍGENA – SER OMÁGUA
Sou filha da selva, minha fala é Tupi.
Trago em meu peito,
as dores e as alegrias do povo Kambeba
e na alma, a força de reafirmar a
nossa identidade
que há tempo fico esquecida,
diluída na história
Mas hoje, revivo e resgato a chama
ancestral de nossa memória.
Sou Kambeba e existo sim:
No toque de todos os tambores,
na força de todos os arcos,
no sangue derramado que ainda colore
essa terra que é nossa.
Nossa dança guerreira tem começo,
mas não tem fim!
Foi a partir de uma gota d’água
que o sopro da vida
gerou o povo Omágua.
E na dança dos tempos
pajés e curacas
mantêm a palavra
dos espíritos da mata,
refúgio e morada
do povo cabeça-chata.
Que o nosso canto ecoe pelos ares
como um grito de clamor a Tupã,
em ritos sagrados,
em templos erguidos,
em todas as manhãs!
- Márcia Kambeba, no livro "Ay kakyri Tama - Eu moro na cidade". Grafisa Gráfica e Editora, 2013.
§§
SILÊNCIO GUERREIRO
No território indígena,
O silêncio é sabedoria milenar,
Aprendemos com os mais velhos
A ouvir, mais que falar.
No silêncio da minha flecha,
Resisti, não fui vencido,
Fiz do silêncio a minha arma
Pra lutar contra o inimigo.
Silenciar é preciso,
Para ouvir com o coração,
A voz da natureza,
O choro do nosso chão,
O canto da mãe d’água
Que na dança com o vento,
Pede que a respeite,
Pois é fonte de sustento.
É preciso silenciar,
Para pensar na solução,
De frear o homem branco,
Defendendo nosso lar,
Fonte de vida e beleza,
Para nós, para a nação!
- Márcia Kambeba, no livro "Ay kakyri Tama - Eu moro na cidade". Grafisa Gráfica e Editora, 2013.
§§
TANA KANATA AYETU
(Nossa Luz Radiante)
Tuyuca com sua magia,
Um canto se faz ecoar,
Com a orquestra dos passarinhos
A música paira no ar,
Mas, é preciso sensibilidade,
Para a melodia escutar.
Nas escala musical
O roxinol vem nos mostrar,
Sua voz graciosa,
Que unida ao sabiá,
Formam uma dupla harmoniosa,
E com suavidade, nossa vida vem alegrar.
E diante de tanta beleza,
Deste solo verde e marrom,
Convivem os povos indígenas
Dividindo os bens em comum,
E com a força da natureza,
Deus mostra sua realeza,
Na presença de Tana Kanata Ayetu.
- Márcia Kambeba, no livro "Ay kakyri Tama - Eu moro na cidade". Grafisa Gráfica e Editora, 2013.
§§
TERRTÓRIO ANCESTRAL
Maá munhã ira apigá upé rikué
Waá perewa, waá yuká
Waá munhã maá putari.
Tradução:
O que fazer com o homem na vida,
Que fere, que mata,
Que faz o que quer.
Do encontro entre o “índio” e o “branco”,
Uma coisa não se pode esquecer,
Das lutas e grandes batalhas,
Para terra o direito defender.
A arma de fogo superou minha flecha,
Minha nudez se tornou escandalização,
Minha língua foi mantida no anonimato,
Mudaram minha vida, destruíram o meu chão.
Antes todos viviam unidos,
Hoje, se vive separado.
Antes se fazia o Ajuri,
Hoje, é cada um para o seu lado.
Antes a terra era nossa casa,
Hoje, se vive oprimido.
Antes era só chegar e morar,
Hoje, nosso território está dividido.
Antes para celebrar uma graça,
Fazia um grande ritual.
Hoje, expulso da minha aldeia,
Não consigo entender tanto mal.
Como estratégia de sobrevivência,
Em silêncio decidimos ficar.
Hoje nos vem a força,
De nosso direito reclamar.
Assegurando aos tanu tyura,
A herança do conhecimento milenar
Mesmo vivendo na cidade,
Nos unimos por um único ideal,
Na busca pelo direito,
De ter o nosso território ancestral.
O que fazer com homem na vida
Que fere, que mata,
Que faz o que quer.
- Márcia Kambeba, no livro "Ay kakyri Tama - Eu moro na cidade". Grafisa Gráfica e Editora, 2013.
§§
UNIÃO DOS POVOS
Nós, povos indígenas,
Habitantes do solo sagrado,
Mesmo sem nossa aldeia,
Somos herdeiros de um passado.
Buscamos manter a cultura,
Vivendo com dignidade,
Exigimos nosso respeito,
Mesmo vivendo na cidade.
Somos parte de uma história,
Temos uma missão a cumprir,
De garantir aos tanu muariry,
Sua memória, seu porvir.
Vivendo na rytama do branco,
Minha uka se modificou,
Mas, a nossa luta pelo respeito,
Essa ainda não terminou.
Pela defesa do que é nosso,
Todos os povos devem se unir,
Relembrando a bravura,
Dos Kambeba, dos Macuxi,
Dos Tembé e dos Kocama,
Dos valentes Tupi Guarani
Assim, os povos da Amazônia,
Em uma grande celebração,
Dançam o orgulho de serem,
Representantes de uma nação,
Com seu canto vem dizer:
Formamos uma aldeia de irmãos.
- Márcia Kambeba, no livro "Ay kakyri Tama - Eu moro na cidade". Grafisa Gráfica e Editora, 2013
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Marcia Kambeba - foto: ©José Carlos
FORTUNA CRÍTICA DE MÁRCIA WAYNA KAMBEBA
ALENCAR, Ivanor. A história da poeta indígena Márcia Wayna Kambeba. In: Blog Faro Fino, 24.6.2015. Disponível no link. (acessado em 2.12.2021).
BENGOZI, Bruna. 5 poemas de Márcia Wayna Kambeba. In: Livro e Café, 15.7.2020. Disponível no link. (acessado em 1.12.2021).
BONIN, Iara Tatiana; KAMBEBA, Raimundo Cruz da Silva (org). Aua Kambeba - A palavra da Aldeia Nossa Senhora. Brasília: CIMI; Unicef, 1999. Disponível no link. (acessado em 2.12.2021).
CHAVES, Kena Azevedo. Mulheres indígenas demarcam as eleições: Entrevista com Márcia Kambeba. In: PerCursos, Florianópolis, v. 22, n. 48, p. 383 - 398, 2021. Disponível no link. (acessado em 1.12.2021).
CORRÊA, Adriana de Oliveira Alves. Márcia Wayna Kambeba: um mergulho entre as margens do rio. In: Muitas Vozes, Ponta Grossa, v. 8. n. 2, p. 289-311, março, 2019. Disponível no link. (acessado em 2.12.2021).
COSTA, Heliene Rosa da.. Poéticas de Cristiane Sobral e Márcia Kambeba: a vivência do sagrado como resistência. In: Igarapé - Revista de Estudos de Literatura, Cultura e Alteridade, v. 14, p. 139-160, 2021.
COSTA, Jacqueline. Márcia Wayna Kambeba, geógrafa: "Abre-se um novo papel para a mulher indígena". In: O Globo, 10.7.2017. Disponível no link. (acessado em 1.12.2021).
COSTA, Vicente. Literatura Indígena: (Re)existência!. In: Sesc Rio, 19.4.2021. Disponível no link. (acessado em 1.12.2021).
CUNHA, Lívia Verena Cunha do.. Literatura, Memória e Resistência: aproximações entre Conceição Evaristo e Márcia Kambeba. In: VASCONCELOS, Adaylson Wagner Sousa de (Org). Letras: representações, construções e textualidades. Atena Editora, 2021. Disponível no link. (acessado em 1.12.2021).
DANNER, Leno Francisco; DORRICO, Julie; CORREIA, Heloisa Helena Siqueira; DANNER, Fernando (Orgs.). Literatura indígena brasileira contemporânea: criação, crítica, recepção. [prefácio Ana Lúcia Liberato Tettamanzy]. 1ª ed., Porto Alegre: Editora Fi, 2018. Disponível no link. (acessado em 7.12.2021).
DANNER, Leno Francisco; DORRICO, Julie; DANNER, Fernando. Literatura indígena como descatequização da mente, crítica da cultura e reorientação do olhar: sobre a voz-práxis estético-política das minorias. In: Teatro: criação e construção de conhecimento, v. 5, n. 1, p. 9-33, 2017. Disponível no link. (acessado em 7.12.2021).
D' AMORIM JÚNIOR, Miguel Antonio. May Sangara Kumissa: o encanto e o encontro com uma voz da poesia indígena brasileira e os ecos íntimos do leitor em sala de aula. (Dissertação Mestrado em Letras). Universidade Federal de Pernambuco, UFPE, 2019. Disponível no link. (acessado em 2.12.2021).
DIÁLOGOS. O lugar que a gente ocupa / Márcia Wayna Kambeba. In: Fagtar - a força delas, n.1, v.1, abril 2020. Disponível no link. (acessado em 2.12.2021).
DORRICO, Julie. A literatura indígena contemporânea no Brasil: a autoria individual e a poética do eu-nós. (Tese Doutorado em Letras). Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, PUCRS, 2021.
DORRICO, Julie. 3 Poemas de Márcia Kambeba. In: Revista Acrobata, 23 de abril de 2020. Disponível no link. (acessado em 1.12.2021).
DORRICO, Julie; GALVÃO, Demetrios. A Literatura e o Ativismo Indígena – Entrevista com Márcia Kambeba. In: Revista Acrobata, 13 de abril de 2020. Disponível no link. (acessado em 2.12.2021).
DORRICO, Julie. A leitura da literatura indígena para uma cartografia contemporânea. In: Revista Igarapé, Porto Velho (RO), v.5, n.2, p. 107-137, 2018. Disponível no link. (acessado em 1.12.2021).
ENTREVISTA. Márcia Kambeba: A Natureza é um sujeito!. In: Psol, 20.4.2021. Disponível no link. (acessado em 1.12.2021).
FIRMINA, Guia Maria. Márcia Kambeba e a poesia de um corpo que resiste [entrevista]. In: Medium - Guia Maria Firmina, 5 de setembro de 2018. Disponível no link. (acessado em 1.12.2021).
GIACOMO, Fred Di. Neta de boto, Márcia Kambeba é a primeira indígena na prefeitura de Belém. In: Uol, 26.1.2021. Disponível no link. (acessado em 1.12.2021).
GRAÚNA, Graça. Contrapontos da literatura indígena contemporânea no Brasil. Belo Horizonte: Mazza Edições, 2013.
GRAÚNA, Graça. Literatura Indígena: desconstruindo estereótipos, repensando preconceitos. Recife - UPE, 2011.
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MÁRCIA WAYNA KAMBEBA NA REDE
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FENSKE, Elfi Kürten (pesquisa, seleção, edição e organização). Márcia Wayna Kambeba - ecos de ancestralidade. In: Templo Cultural Delfos, fevereiro/2024. Disponível no link. (acessado em .../.../...).
FENSKE, Elfi Kürten (pesquisa, seleção, edição e organização). Márcia Wayna Kambeba - ecos de ancestralidade. In: Templo Cultural Delfos, fevereiro/2024. Disponível no link. (acessado em .../.../...).
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* Página atualizada em 26.2.2024.
** Página original DEZEMBRO/2021.
Haevete. Sucesso sempre, compartilhei no blog.
ResponderExcluirQuero ver mais publicações, cliclei errado no ver menos!!!
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