COMPARTILHE NAS SUAS REDES

Hermann Hesse - escritor e pintor alemão

 
  •  Hermann Hesse - foto © Martin Hesse Erben

"Você já sabe onde se oculta esse outro mundo, já sabe que esse outro mundo que busca é a sua própria alma. Só em seu próprio interior vive aquela outra realidade por que anseia. Nada lhe posso dar que já não exista em você mesmo, não posso abrir-lhe outro mundo de imagens além daquele que há em sua própria alma. Nada lhe posso dar, a não ser a oportunidade, o impulso, a chave. Eu o ajudarei a tornar visível seu próprio mundo, e isso é tudo."
- Hermann Hesse, no livro "O Lobo da Estepe". [tradução Ivo Barroso]. Record, 1955.


Hermann Hesse - nasceu alemão, na cidade de Calw (região de Karlsruhe, Estado de Baden-Württemberg), a 2 de julho de 1877, mas iria naturalizar-se suíço em 1923. Futuro escritor de sucesso, Hermann Hesse contrariou a tendência excessivamente religiosa da família e optou por dedicar-se à escrita, não se limitando à poesia e escolhendo também os caminhos do ensaio, do conto e do romance. "Cantos Românticos" é de 1898, seguindo-se "Uma Hora Depois da Meia-Noite" (1900), "Textos e Poemas Póstumos de Hermann Lauscher" (1901), "Francisco de Assis", "Bocaccio" e "Peter Camenzind" (todos de 1904). A partir deste último, Hesse concentrou atenções dos leitores e o sucesso passou a ser marca habitual nas suas publicações. Entretanto, o casamento com Maria Bernoulli levou-o a mudar-se para junto do lago Constança, perto da fronteira da Alemanha com Áustria e Suíça. 

Nem a mudança, nem o facto de ser pai (Bruno nasce em 1905) o inibem, contudo, de escrever e publicar: "Sob a Roda" (1906), "Do Lado de Cá" (1907), "Vizinhos" (1908) ou "Gertrud" (1910), todos exemplos do seu trabalho literário. Pelo meio, em 1909, nasce Heiner, o segundo filho. Uma viagem à Índia, em 1911, ano do nascimento de Martin, terceiro e último filho, irá influenciá-lo de forma vincada, deixando-o impressionado com o universo espiritual daquele país. Apresenta "Por Estrada" (1911), "Vias Tortuosas" (1912) e "Viagem à Índia" (1913), este um sinal bem evidente das marcas deixadas pela referida deslocação. Seguem-se "Rosshalda" (1914), mas a I Guerra Mundial causa estragos no seu estado psicológico e será um seguidor do famoso Carl Jung a ocupar-se dos seus problemas. 

"Na Estrada" e "Três Histórias da Vida de Knulp" (ambos de 1915) surgem antes de "Demian", "Fábulas" e "O Regresso de Zaratustra", todos de 1919. Outra mudança regista-se em 1920 quando o casal e os filhos passam a viver em território suíço - esse é também o ano em que escreve "Siddartha", livro de que aqui se lê um excerto. Entretanto, a pintura também integra o seu quotidiano e, nesse ano de mudança, publica "Olhar sobre o Caos", "Poemas do Pintor", "O Último Verão de Klingsor" e "Klein e Wagner". Nunca deixa de escrever, embora o casamento entre em crise e, em 1923, Hesse se afaste da mulher - mas não fica só durante muito tempo, pois no ano seguinte casa-se com Ruth Wenger (acabarão por separar-se em 1927). Continua a escrever e a publicar: "A Cura" (1925), "Livro de Imagens" (1926), "O Lobo da Estepe" e "Viagem a Nuremberga" (os dois de 1927), "Considerações" e "Crises" (ambos de 1928), "Uma Biblioteca da Literatura Universal" e "Consolação da Noite" (os dois de 1929), "Narziss und Goldenmund" (1930). Em 1931 casa-se com aquela que será a sua mulher até ao final da vida: Ninon. Viviam juntos desde 1927.

Aproximam-se de novo os anos sombrios do horror de um conflito mundial e Hesse prossegue na escrita como se fosse infatigável: "Peregrinação ao Oriente" (1932), "A Árvore da Vida" (1934), "Livro de Fábulas" (1935), "Horas no Jardim" (1936), "Novos Poemas" e "Folhas de Memórias" (ambos de 1937). Com a eclosão da II Guerra Mundial a 1 de setembro de 1939, a escrita de Hermann Hesse também estagna. Profundamente desiludido com o comportamento dos alemães, o escritor defende sempre os judeus e contesta os nazis e estes vão banindo as suas obras do acesso ao público. Só regressa com "O Jogo das Contas de Vidro", em 1943, antes de "Pistas Oníricas" e "O Ramo Florido" (os dois de 1945, ano do fim da guerra). 

O ano de 1946 não é apenas o da publicação de "Guerra e Paz. Considerações Sobre a Guerra e a Política a Partir de 1914", mas sobretudo aquele em que junta ao Prémio Goethe o Nobel da Literatura. Nem a consagração o trava, embora o ritmo passe a ser diferente e aumentem os intervalos entre novas publicações: "Prosa Tardia" é de 1951, "Encantamentos" surge em 1955, "Gradini. Poemas Velhos e Novos" publica-se em 1961.  

Na parte final da sua vida está mais atento à pintura e à correspondência abundante que lhe chega por causa da fama resultante do Nobel. Aos 85 anos, a 9 de agosto de 1962, Hermann Hesse morre na localidade de Montagnola. A terceira mulher, Nino Hesse, sobrevive-lhe apenas durante quatro anos, falecendo a 22 de setembro de 1966.
:: Biografia (Coleção Público/Tradução de Pedro Miguel Dias)

"Continuei meu caminho a meditar. Sim, eu podia arranjar-me mesmo sem música de câmara e sem amigo, e era ridículo consumir-me no impotente desejo de calor humano. Solidão é independência, com ela eu sempre sonhara e a obtivera afinal após tantos anos."
- Hermann Hesse, no livro "O Lobo da Estepe". [tradução Ivo Barroso]. Record, 1955.


OBRA DE HERMANN HESSE PUBLICADA NO BRASIL


ROMANCES

PETER CAMENZIND: ROMAN (1904) 
:: Peter CamenzindHermann Hesse. tradução Myriam Moraes Spiritus. Brasiliense, 1972.
:: Peter Camenzind. Hermann Hesse. [tradução Claudia Abeling; capa Luciana Facchini e Juan Narowé]. Todavia Livros, 2022.
UNTERM RAD: ROMAN (Berlin: Fischer, 1906)
:: Debaixo das Rodas / Unterm Rad. Hermann Hesse. [tradução Álvaro Cabral]. Coleção Biblioteca do leitor moderno, 135. Civilização Brasileira, 1971.
:: Menino prodígio (Debaixo das rodas) / Unterm Rad. Hermann Hesse. [tradução de Álvaro]. Rio de Janeiro: 1983
GERTRUD: ROMAN (München: Langen, 1910)
:: GertrudHermann Hesse. [tradução Mário da Silva]. Coleção Biblioteca do Leitor Moderno. Civilização Brasileira, 1971.
ROßHALDE: ROMAN (Berlin: Fischer, 1914)
:: Rosshalde. Hermann Hesse. [tradução Álvaro Cabral; orelha do livro Mário da Silva Brito]. Coleção Biblioteca do Leitor Moderno, 137. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1971.
:: Rosshalde. Hermann Hesse[tradução Julia Bussius; capa Luciana Facchini e Juan Narowé]. São Paulo: Todavia Livros, 2023.
DEMIAN / DEMIAN (escrito em 1917 / 1ª edição, publicado  - Berlin: Fischer, 1919)
:: Demian: história da juventude de Emil Sinclair / Demian: Die Geschichte von Emil Sinclairs Jugend "suhrkamp taschenbuch" Hermann Hesse [tradução e posfácio Ivo Barroso; Orelha do livro Otto Maria Carpeaux]. 1ª ed., Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1965. {Observação: a primeira edição de Demian, de Hermann Hesse no Brasil, traduzido por Ivo Barroso, foi feita a partir da tradução espanhola de Luís López Ballesteros y Torres (1930). Somente anos mais tarde, Ivo Barroso faz uma revisão da tradução de 'Demian' a partir da edição original em língua alemã, versão hoje no mercado editorial}.
:: Demian: história da juventude de Emil SinclairHermann Hesse. [tradução e posfácio Ivo Barroso]. 1ª ed., Rio de Janeiro: Editora Record, 1979; 49ª ed., 2017.
:: Demian: história da juventude de Emil SinclairHermann Hesse. [tradução e nota do tradutor Ivo Barroso].  Edição comemorativa dos 50 anos de lançamento da obra no Brasil. Editora Record, 2015. 
SIDDHARTHA: EINE INDISCHE DICHTUNG (Berlin: Fischer Verlag, 1922)
:: Sidarta / Siddhartha. Hermann Hesse. [tradução de Herbert Caro]. 1ª ed., Rio de Janeiro: Record, 1950; 71ª ed., 2021.
:: Sidarta / Siddhartha. Hermann Hesse. [tradução de Herbert Caro; prefácio Luiz Carlos Maciel]. 1ª ed., Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1965. 
:: Sidarta: Um poema indiano / Siddhartha. Hermann Hesse. [tradução de Herbert Caro; estudo introdutório de Georg Thürer; ilustrações de Hans Hernie]. Coleção 'Dos Prêmios Nobel de Literatura/ XVI'. Rio de Janeiro: Opera Mundi, 1970.
:: Sidarta / Siddhartha. Hermann Hesse. [tradução de Herbert Caro]. Coleção Biblioteca Folha 16. São Paulo: Folha de S. Paulo, 2003.
:: Sidarta / Siddhartha. Hermann Hesse. [tradução de Herbert Caro]1ª ed.,  Rio de Janeiro: Bestbolso, 2012.
DER STEPPENWOLF: ROMAN (Berlin: Fischer, 1927)
:: O Lobo da estepe / Der Steppenwolf. Hermann Hesse. [tradução Augusto de Souza]. Coleção Literatura Moderna. 1ª ed., São Paulo: Cultura Brasileira, 1935.
:: O Lobo da estepe (Só para loucos) / Der Steppenwolf. Hermann Hesse. [tradução Augusto de Sousa; capa E. Bianco]. 2ª ed., Rio de Janeiro: O Cruzeiro, 1943.
:: O lobo da estepe / Der Steppenwolf. Hermann Hesse. [tradução e prefácio Ivo Barroso; orelha do livro Franklin de Oliveira]. 1ª ed., Rio de Janeiro: Record, 1955; 53ª ed., 2020.
:: O lobo da estepe / Der Steppenwolf. Hermann Hesse. [tradução e prefácio Ivo Barroso; orelha do livro Franklin de Oliveira]. Coleção Biblioteca do Leitor Moderno, 95. 1ª ed., Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1968.
:: O lobo da estepe / Der Steppenwolf. Hermann Hesse. [tradução e prefácio Ivo Barroso]. 1ª ed., Rio de Janeiro: BestBolso, 2009.
DAS GLASPERLENSPIEL (Zürich: Fretz & Wasmuth, 1943
:: O jogo das contas de vidro: ensaio de biografia do Magister Ludi José Servo / Das glasperlenspiel. Hermann Hesse. [tradução Lavinia Abranches Viotti e Flavio Vieira de Souza; prefácio Nogueira Moutinho]. 1ª ed., São Paulo: Editora Brasiliense, 1969. {Brasiliense edita a obra até 1973)
:: O jogo das contas de vidro / Das glasperlenspiel. Hermann Hesse. [tradução Lavinia Abranches Viotti e Flavio Vieira de Souza; prefácio Nogueira Moutinho]. Rio de Janeiro: Record, 1971?.
:: O jogo das contas de vidro / Das glasperlenspiel. Hermann Hesse. [tradução Lavinia Abranches Viotti e Flavio Vieira de Souza; prefácio da edição brasileira Waldemar Falcão]. 1ª ed., Rio de Janeiro:  Best Bolso, 2007.
=======
:: Box Hermann Hesse. Demian - O lobo da estepe - Sidarta (traduções de Ivo Barroso e Herbert Caro) / inclui 'livreto' do escritor e tradutor Marcelo Backes. Edição de luxo. Rio de Janeiro: Record, 2021.

NARRATIVAS | HISTÓRIAS | NOVELAS | CONTOS

:: O último verão de Klingsor / Klingsors letzter Sommer. Klein und Wagner. Kinderseele. Hermann Hesse. [tradução Pinheiro de Lemos]. Rio de Janeiro: Record, 1952.
:: Este lado da vida / Diesseits. erzählugen (1907*) . Hermann Hesse. [tradução Álvaro Cabral]. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1954. {* edição revisada e ampliada 1930, verificar qual foi escolhida para tradução}. 8 contos.
:: O Livro das Fábulas / Fabulierbuch. Hermann Hesse. [tradução Álvaro Cabral; orelha do livro Mario da Silva Brito]. Rio de Janeiro:  Record, 1954
:: Narciso e Goldmund / Narziß und Goldmund (1930). Hermann Hesse. [tradução Myriam Moraes Spiritus]. Rio de Janeiro: Record, 1957.
:: Narciso e Goldmund / Narziß und Goldmund (1930). Hermann Hesse. [tradução Myriam Moraes Spiritus; capa Carmela Gross]. São Paulo: Editora Brasiliense, 1969.
:: Viagem ao Oriente / Die Morgenlandfahrt. Erzählung (1932). Hermann Hesse. [tradução Leda Maria Goncalves Maia]. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1958.
:: O Livro das Fábulas / Fabulierbuch. Hermann Hesse. [tradução Álvaro Cabral; orelha do livro Mario da Silva Brito]. Rio de Janeiro:  Civilização Brasileira, 1970. 
:: Knulp: Três episódios de sua vida / Knulp. Drei geschichten aus dem leben knulps. Erzählung - erzählungen (1915)Hermann Hesse. [tradução Eglê Malheiros ]. Coleção Biblioteca do Leitor Moderno 129. Civilização Brasileira, 1970.
:: Knulp: três histórias da vida de um andarilho / Knulp. Drei geschichten aus dem leben knulps. Erzählung - erzählungen (1915). Hermann Hesse. [tradução Julia Bussius; capa Luciana Facchini e Juan Narowé]. São Paulo: Todavia Livros, 2020.
:: Sonho de uma Flauta e Outros Contos /Märchen (1919)Hermann Hesse. [tradução Angelina Peralva]. Rio de Janeiro: Record, 1955 (1ª edição).
:: Contos / Märchen. Hermann Hesse. [tradução Angelina Peralva]. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1969 (2ª edição)
:: Sonho de uma Flauta e Outros Contos / Märchen (1919). Hermann Hesse. [tradução Angelina Peralva]. Rio de Janeiro: Record, 1983.
:: Pequeno mundo / Kleine Welt (1933). [tradução Álvaro Cabral; orelha do livro Mariano Torres]. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1971. (contos) 
:: Minha fé / Mein Glaube. Hermann Hesse. [tradução Luiza L. Leite Ribeiro]. Rio de Janeiro: Record, 1971.
:: Obstinação: escritos autobiográficos / Eigensinn (1919). Hermann Hesse. [tradução Bélchior Cornelio da Silva]. Rio de Janeiro:  Record, 1971. 
:: Para ler a pensar - Pensamentos extraídos de seus livros e cartas / Lektüre für Minuten. Hermann Hesse. [tradução Bélchior Cornelio da Silva]. Rio de Janeiro: Record, 1971. (aforismos e pensamentos)
:: Minha vida / Autobiographical writings. Hermann Hesse. [introdução Theodore Ziolkowski; tradução Affonso Blacheyre]. Artenova, 1972.
:: A arte dos ociosos / Die Kunst des Müßiggangs. Hermann Hesse. [tradução Paul Schenetzer e Mathilde Latja]. Rio de Janeiro: Record, 1973. (Crônicas e ensaios) 
:: Sobre a guerra e a paz / Krieg und FriedenHermann Hesse. [tradução Lya Luft]. Editora Record, 1974. 
:: Hermann Lauscher. Hermann Hesse. [tradução Eloísa Breda Ferreira]. São Paulo: Brasiliense, 1974.
:: Para ler e guardar / Lektüre für minuten. Hermann Hesse. [tradução Bélchior Cornélio da Silva].
Rio de Janeiro: Record, 1975.
:: Pequenas alegrias / Kleine Freuden. Hermann Hesse. [tradução Lya Luft]. Rio de Janeiro: Record, 1977. {Inclui posfácio traduzido de Volker Michels da edição alemã / cronologia e orelha de Lya Luft}. (Prosa e verso)
:: Vivências - trechos escolhidos / Erzählungen. Hermann Hesse. [tradução Lya Luft]. Rio de Janeiro: Record, 1977. 
:: Caminhada / Wandering - notes and sketches ou Wanderung (1920). Hermann Hesse. [tradução Ildikó Maria Jávor]. Rio de Janeiro: Record, 1977
:: Narrativas: textos escolhidos / Erzählungen. Hermann Hesse. [tradução e prefácio Lya Luft]. Rio de Janeiro: Record, 1981.
:: O Caderno de Sinclair / Sinclairs Notizbuch (1923). Hermann Hesse. [tradução Marija Cesar Mendes Bezerra; aquarelas do autor]. Rio de Janeiro: Record, 1984.
:: O Lobo e Outros contos. Hermann Hesse. [seleção e posfácio Volker Michels; tradução Sonali Bertuol; capa Luciana Facchini e Fabio Zimbres]. Todavia Livros, 2021. (Contos)
:: Felicidade. Hermann Hesse. [tradução Lya Luft; prefácio Marco Lucchesi]. Rio de Janeiro: Record, 1999 (reflexões)
:: A magia de cada começo / Jedem anfang wohnt ein zauber inne. Hermann Hesse. [tradução Lya Luft]. Rio de Janeiro: Record, 2022. (reunião de textos autobiográficos)
:: Quem pode amar é feliz / Wer lieben kann, ist glucklich. Hermann Hesse. [tradução Luis Montez]. Rio de Janeiro: Record, 2008. (pequenos contos e aforismos)
:: A infância do mago / Kindheit des zauberers. Hermann Hesse. [apresentação e tradução Samuel Titan Jr.]. Coleção Sabor Literário. Rio de Janeiro: José Olympio, 2010 (escritos autobiográficos)
:: Com a maturidade fica-se mais jovem / Mit Der Reife Wird Man Immer Junger. Hermann Hesse. [tradução Roberto Rodrigues; epílogo Volker Michels]. Rio de Janeiro: Record, 2018. (ensaios)  
:: Francisco de Assis / Franz von Assisi (1904). Hermann Hesse. [tradução Kristina Michahelles]. Rio de Janeiro: Record, 2019. (biografia / ensaio)
=======
:: Correspondência entre amigos - Hermann Hesse e Thomas Mann / Hermann Hesse - Thomas Mann: Briefwechsel. [organização Anni Carlsson e Volker Michels; tradução Lya Luft]. Rio de Janeiro: Record, 1975.
:: Histórias medievais / Geschichten aus dem mittelalter. [compilação Hermann Hesse; traduzidas do latim por J.G.Th. Graesse e Hermann Hesse; com narrativas de Leo Greiner; posfácio de Fritz Wagner; tradução do alemão por Lya Luft]. Rio de Janeiro: Record, 1976.  
=======
:: O Circulo Hermético - C. G. Jung and Hermann Hesse / El Círculo Hermético de Hesse a Jung. Miguel Serrano. [tradução Marcelo Corção]. São Paulo: Brasiliense, 1970. (memórias - relato dos encontros do autor com Hesse e Jung)

POESIA

:: Andares - Antologia poética / Stufen - Ausgewählte Gedichte. Hermann Hesse [tradução e prólogo Geir Campos]. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1976.
:: Transformações / Piktors Verwandlungen. Ausgewählte Gedichte (1922). Hermann Hesse. [posfácio Volker Michels; ilustrações do autor; tradução Lya Luft]. Rio de Janeiro: Record, 1984. (poesia?)

EM ANTOLOGIAS 
:: Poesia da Alemanha - Antologia de poetas da língua alemã[seleção, prólogo e tradução Geir Campos]. Coleção Coroa de Ouro, n. 1321. Rio de Janeiro: Edições de Ouro, 1961. {poetas presentes: Hans Sachs. Martin Opitz. Friedrich Gottlieb Klopstock. Gotthold Ephraim Lessing. Matthias Claudius. Johann Gottfried Herder. Gottfried August Bürger. Johann Wolfgang Von Goethe. Friedrich Von Schiller. Friedrich Hölderlin. Friedrich Von Hardenberg. Clemens Brentano. Adelbert Von Chamisso. Justinus Kerner. Ludwig Uhland. Friedrich Rückert. Joseph Von Eichendorf. Teodor Körner. August Von Platen. Heinrich Heine. Annette Von Droste-Hülshoff. Johann Nepomuck Vogl. Nikolaus Lenau. Eduard Mörike. Friedrich Hebbel. Emanuel Geibel. Theodor Storm. Theodor Fontane. Detlev Von Liliencron. Friedrich Nietzsche. Richard Dehmel. Otto Erich Hartleben. Ricarda Huch. Stepan George. Christian Morgenstern. Hugo Von Hofmannsthal. Rainer Maria Rilke. Georg Trakl. Hermann Hesse. Hans Carossa. Georg Heym. Franz Werfel. Josef Weinheber. Werner Bergengruen. Bertold Brecht. Friedrich Georg Jünger. Werner Hundertmark. Gertrud Von Le-Fort. Stephan Hermlin // Edição bilíngue alemão/português}.
:: O livro de ouro da poesia alemã: antologias de poetas da língua alemã. [seleção, prólogo e tradução Geir Campos]. Coleção Universidade. Rio de Janeiro: Tecnoprint, 1966 {Edição bilíngue alemão/português} / reedição.
:: O livro de ouro da poesia alemã. [seleção, prólogo e tradução Geir Campos]. Coleção Clássicos de Bolso. Rio de Janeiro: Ediouro, 1989 {Edição bilíngue alemão/português} / reedição.

  •  Hermann Hesse - foto © Martin Hesse Erben

PRÓLOGO 

DA POESIA E DA TRADUÇÃO

HÁ QUEM ANUNCIE e garanta que "poesia não se traduz": um anúncio e uma garantia que condenariam liminarmente inúmeros amantes da poesia à impossibilidade de tomarem conhecimento das obras que poetas de renome universal deixaram ou estão deixando escritas em idiomas que lhes são estrangeiros.

Evitando o debate sobre a justeza de tal condenação, preferimos tentar uma abordagem algo técnica da tradução, que é uma técnica com alguma arte, e da própria poesia, que é uma arte com alguma técnica.
A começar pela busca de uma conceituação do que possa ou deva ser a poesia, alinharemos três pronunciamentos, bastante difundidos, de três autores sincrônica e diacronicamente respeitáveis – em vários lugares, através de edições que sobrepassaram muitas fronteiras, e em várias épocas, através de reedições que venceram muitos anos: o melhor teste para a respeitabilidade de qualquer autor.

Para o alemão Novalis (Friedrich von Hardenberg, 1772-1801), talvez o mais sublime representante do romantismo germânico, "poesia é a arte de excitar a alma". Para o norte-americano Thomas Stearns Eliot (nascido em 1888 e naturalizado cidadão britânico, Prêmio Nobel em 1948), "toda verdadeira poesia é uma visão de mundo". Para o inglês Samuel Taylor Coleridge (1772-1834), um dos precursores do romantismo na literatura do seu país, "poesia são as melhores palavras em sua melhor ordem".

Fundindo esses três conceitos magistrais, obtém-se uma espécie de liga conceitual de elevado teor filosófico-literário, com um enfoque individual, um enfoque social e um enfoque estético da arte poética: "poesia é a arte de excitar a alma com uma visão de mundo através das melhores palavras em sua melhor ordem".

Vejamos agora, desses três elementos da obra poética, quais os que se podem traduzir, isto é, transplanta de um idioma para outro.

O de mais fácil transplante há de ser o mais denotativo dos três: a "visão de mundo", com seus significados perfeitamente acessíveis por meio de significantes adequados em qualquer idioma. A "visão de mundo", portanto, é traduzível, ainda que seja parte da poesia.

E uma visão de mundo é capaz de, por si só, "excitar a alma" de quem a lê bem-posta em palavras de qualquer idioma assim como, em qualquer idioma, a informação puramente jornalística (audiovisual, pelo cinema ou pela televisão; ou apenas áudio, pelo rádio; ou apenas visual, em foto ou em texto, pelo jornal impresso) de um oficial executando em praça pública um prisioneiro de guerra no Vietnã, por exemplo, há de "excitar a alma" de qualquer telespectador ou ouvinte ou leitor, em qualquer parte da "aldeia global" infeliz em que as telecomunicações vêm transformando o nosso planeta. Também este elemento, portanto, é traduzível, ainda que integrado numa obra poética.

Fica assim a questão restante a girar sobre o terceiro elemento: "as melhores palavras em sua melhor ordem" – pois de fato, no poema bem realizado, em que a forma e o conteúdo se completam e se equilibram como os prótons e os eléctrons que gravitam no microcosmo de um átomo, parecendo depender cada um de cada outro, qualquer palavra mal mexida é capaz de acarretar o desmoronamento de todo o edifício verbal.

Nesta parte, "as melhores palavras em sua melhor ordem", no bom poema original, não admitem uma pura e simples substituição pelos seus equivalentes léxicos na "língua-meta" (denominação que os teóricos da tradução costumam dar ao idioma para o qual algum outro texto é transplantado). O bom tradutor tem o dever, se não o direito, de buscar, se não o de rebuscar, palavras que reproduzam na tradução não só a logopéia (efeitos de significância), como também a fanopéia (efeitos de imagem) e a melopéia (efeitos de musicalidade) do original, transplantando assim, de um idioma para o outro, o máximo possível de elementos psicológicos ("excitação da alma"), históricos ("visão de mundo") e lingüísticos ("as melhores palavras em sua melhor ordem"). Por isso mesmo ainda se permitem ao tradutor de poesia, sem abusos, algumas das chamadas "licenças poéticas", as bastantes para que ele possa levar a bom termo o seu trabalho sem "trair", como temem alguns, o pensamento e o sentimento do autor na obra traduzida. Tomadas assim algumas precauções, chegamos à conclusão de que também "as melhores palavras em sua melhor ordem", que constituem o terceiro elemento da poesia, são passíveis de transplante de um idioma para outro, tudo dependendo da habilidade ou habilitação do tradutor como a de um Onestaldo de Pennafort traduzindo Shakespeare e Verlaine, ou a de um Guilherme de Almeida traduzindo Baudelaire e Geraldy, por exemplos.

Posta em pratos limpos a viabilidade da tradução de poesia, vejamos a possível aplicação de cada um desses itens na poesia de Hermann Hesse – um poeta confessadamente lírico, introspectivo, evasivo e amargo quase sempre, de cuja obra poética este volume é uma razoável amostragem.

A poesia de Hermann Hesse, principalmente em suas primeiras páginas, é metrificada e rimada com rigor, um rigor que se foi amaciando com o avanço do poeta pelos descaminhos da vida e da literatura. É uma poesia intimista, de homem afeito à solidão e à natureza, ainda mais à solidão em meio à natureza. Começou a poetar muito cedo, e já aos doze anos de idade confidenciava à sua irmã Adele, num bilhete datado de 4 de dezembro de 1889:

"Faz já algum tempo que me levanto pontualmente às seis da manhã, e nas primeiras horas matinais, das seis às sete diariamente, acabei de escrever duas poesias, Der fremde Jäger e Der Schwanenritter..."
Já aos dezoito anos, em carta de maio de 1895 a seu professor Ernst Kapff, declara-se um lírico, sem vocação para a dramaturgia (chegou a escrever em 1919 uma peça em um ato, Die Heimkehr) mas com a esperança de vir a ser um prosador razoável, confessando ter já em esboço o plano de um romance.
Na poesia, como na prosa, Hermann Hesse, suíço (1877-1962) de língua alemã (Prêmio Nobel em 1946), mostrou-se permanentemente preocupado com a busca de um sentido para a vida, levando-o essa busca a preferir a solidão, longe das aglomerações urbanas que lhe eram penosas de suportar. Poesia e prosa parecem ter andado sempre de mãos dadas, em toda a existência de Hermann Hesse – que se dizia, ele mesmo, um poeta das nuvens, sem raízes e sem pátria-lar: a ausência da pátria-lar (Heimat) é uma constante na obra desse autocondenado ao degredo perpétuo no mundo dos homens. Parece tê-lo marcado muito uma viagem à Índia, em 1913, e a mística do Oriente aparece ou transparece em várias das suas páginas em verso e prosa. Em 1918, Hermann Hesse publicou um ensaio, Uber Gedichte, dando a entender que não existem poesias boas ou más, porém autênticas ou falsas (um juízo intempestivamente romântico). Seu primeiro volume de poesias foi publicado, por sua conta, em 1899, com o título de Romantische Lieder (Canções românticas) e influências de Novalis, Heine e Eichendorf. Em 1902 saiu do prelo o seu segundo livro de versos, intitulado simplesmente Gedichte (Poesias), já comparando as mutações da natureza com as do ser humano. Seu terceiro livro de poesias, Interwegs (A caminho), circulou em 1911. Em 1913 publicou um volume de poemas de sua viagem pela Índia, Aus Indien. Já com menos rigores formais, com menos apego ao metro e à rima, sai em 1915, em verso e prosa, Musik der Einsamen (Música do solitário). Em 1920, Hermann Hesse, que dois anos antes começara a pintar aquarelas, como um derivativo talvez, ilustra cada um dos dez poemas do seu novo livro Gedichte des Malers (Poemas do pintor), grande sucesso de venda: daí por diante, não faltaram admiradores que lhe encomendassem poemas manuscritos e ilustrados, naturalmente muito bem remunerados. Em 1942 publica-se em Zurique um volume com Die Gedichte (Os poemas) de Hermann Hesse, com mais de seiscentos títulos, incluindo reflexos da guerra e da esperança de paz: o pacifismo de Hesse reponta em várias páginas da presente antologia*. Em 1963, no ano seguinte ao da morte do poeta, a Editora lnsel publica um volume póstumo com Die spaten Gedichte (Os derradeiros poemas) de Hermann Hesse, dos quais o último realmente escrito, com data de 8 de agosto de 1962, véspera do passamento do poeta, foi Knarren eines geknickten Astes, incluído no presente volume* sob o título Ranger de galho rachado.

Na tradução de textos versificados de um idioma conciso e preciso, como o alemão, para um idioma neolatino qualquer, uma das licenças permitidas sine qua non ao tradutor, para um trabalho justalinear, há de ser a de alongar, em alguns casos, as medidas dos versos, para não lhes aumentar o número, de modo a caberem nas linhas traduzidas as denotações e conotações das linhas originais. Também precisou ser contornado o problema da rima, presente na maioria dos poemas de Hermann Hesse: a rima, “ce bijou d’un sou, qui sonne creux et faux sous la lime“, como diria Verlaine, outro grande rimador, e que deveria ser, como queria Du Bellay, “reçue, non appeIée“. Toda vez que a rima teria de ser “convocada”, tivemos o cuidado de abrir mão dela, aproveitando apenas as que em boa hora se faziam dadivosas, como sói acontecer em pleno jogo de palavra-puxa-palavra ou idéia-puxa-idéia.


SELETA DE POEMAS DE HERMANN HESSE


A UM AMIGO 
COM O LIVRO DE POESIAS
O que me empolgou sempre e me alegrou
desde os lendários dias de rapaz,
toda essa distraída e multifária 
dispersão entre inspiração e sonho,
entre orações, clamores e lamentos
– nestas páginas voltas a encontrar.
Se elas são oportunas ou inúteis,
não vamos muito a sério perguntar:
aceita como amigo os velhos cantos!
Para nós, já maduros, a demora
no passado é lícita e confortante:
por trás desses mil linhas desabrocha
uma vida, algum dia deliciosa.
Ao nos pedirem contas por nos termos
ocupado com tais futilidades,
suportaremos um fardo mais leve
que os aviadores atroando as noites,
e as tropas, e os rebanhos dessangrados,
e os senhores da terra e os potentados.

*

EINEM FREUNDE 
MIT DEM GEDICHTBUCH
Was mich je bewegte und erfreute
Seit den sagenhaften Jugendtagen,
All dies Flüchtige und bunt Zerstreute
An Besinnungen und Träumereien,
An Gebeten, Werbungen und Klagen
Findest du auf diesen Seiten wieder.
Ob erwünscht sie oder unnütz seien,
Wollen wir nicht allzu ernstlich fragen –
Nimm sie freundlich auf, die alten Lieder!
Uns, den Altgewordnen, ist das Weilen
Im Vergangenen erlaubt und tröstlich,
Hinter diesen vielen tausent Zeilen
Blüht ein leben, und es war einst köstlich.
Werden wir zur Rechenschaft gezogen,
Daß wir uns mit solchem Tand befaßten,
Tragen wir wohl leichter unsre Lasten
Als die Flieger, die heut nacht geflogen,
Als der Heere arme, blutige Herde,
Als die Herren und Großen dieser Erde.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976.

§§

ANOITECER NA ALDEIA
Com as ovelhas passa o pastor
pelas ruelas tranqüilas:
as casas querem dormir,
anoitece e elas cochilam.

Entre estes muros sou eu
o único estranho do dia:
com pena bebe meu coração,
até o fundo, o cálice da nostalgia.

Aonde quer que me leve algum  caminho,
por toda parte há uma lareira a arder:
terra-natal ou pátria, apenas eu
jamais pude conhecer.

*

DORFABEND
Der Schäfer mit den Schafen
Zieht durch die stillen Gassen ein,
Die Häuser wollen schlafen
Und dämmern schon und nicken ein.

Ich bin in diesen Mauern
Der einzige fremde Mann zur Stund,
Es trinkt mein Herz mit Trauern
Den Kelch der Sehnsucht bis zum Grund.

Wohin der Weg mich führet,
Hat überall ein Herd gebrannt;
Nur ich hab nie gespüret,
Was Heimat ist und Vaterland.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976.               

§§

FUGA DA JUVENTUDE
Fatigado o verão dobra a cabeça
e olha no lago a sua imagem descorada.
Fatigado e coberto de poeira
vou pelas alamedas sombreadas.

Entre os olmos perpassa um vento tímido.
Atrás de mim tenho o vermelho céu
e à minha frente receios da noite
e crepúsculo e morte.

Vou fatigado e coberto de pó:
atrás de mim, hesitante, de pé,
a juventude abana a linda cabeça
e prosseguir comigo não mais quer.

*

JUGENDFLUCHT
Der müde Sommer senkt das Haupt
Und schaut sein falbes Bild im See.
Ich wandle müde und bestaubt
Im Schatten der Allee.

Durch Pappeln geht ein zager Wind,
Der Himmel hinter mir ist rot,
Und vor mir Abendängste sind
– Und Dämmerung – und Tod. 

Ich wandle müde und bestaubt,
Und hinter mir bleibt zögernd stehn
Die Jugend, neigt das schöne Haupt
Und will nicht fürder mit mir gehn.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976.               

§§

NOITE DE VERÃO PRECOCE
Céu de trovão;
lá no jardim
treme uma tília.
A tarde chega ao fim.

Claro relâmpago
deixa-se ver
com grandes olhos
no tanque úmidos.

Nas hastes frágeis
as flores ouvem
aproximar-se
o anjo da foice.

Céu de trovão,
ar abafado:
– “Fala, não sentes também?”
A rapariga estremece a meu lado.

*

FRÜHSOMMERNACHT
Der Himmel gewittert,
Im Garten steht
Eine Linde und zittert.
Es ist schon spät.

Ein Wetterleuchten
Beschaut sich bleich
Mit großen, feuchten
Augen im Teich.

Auf schwanken Stengeln
Die Blumen stehn,
Hören Sensendengeln
Herüberwehn.

Der Himmel gewittert,
Schwül geht ein Hauch.
Mein Mädel zittert –
“Sag, spürst du's auch?”
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976.               

§§

PRIMAVERA
Em crepusculares criptas
eu longamente sonhei
com teus ares azuis e árvores,
com teus perfumes e cantos de pássaros.

Agora toda te abres
em glorioso resplendor, assim
inundada de luz
como um prodígio diante de mim.

De novo me reconheces e com ternura me tentas:
vibra ao longo de todos os meus membros
tua alegre presença.

*

FRÜHLING
In dämmrigen Grüften
Träumte ich lang
Von dein Bäumen und blauen Lüften, 
Von deinem Duft und Vogelsang.

Nun liegst du erschlossen
In Gleiss und Zier
Von Licht übergossen
Wie ein Wunder vor mir.

Du kennst mich wieder, 
Du lockest mich zart, 
Es zittert durch all meine Glieder
Deine selige Gegenwart.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976.               

§§

SOBRE HIRSAU
Fazendo alto em baixo dos abetos,
sinto saudade dos tempos passados
quando, com minha primeira paixão,
me vinha este mesmo cheiro de mato.

Neste lugar, no musgo, eu me deitava 
ardente e tímido a sonhar com ela:
era uma rapariga esbelta e loura,
primeira rosa da minha coroa. 

Passou-se o tempo, o sonho se cansou
e foi-se embora. Um outro apareceu:
há quanto tempo já me deu adeus!

De qual delas eu gostei mais? – Agora
pensou nisto: de qual? Apenas sei 
que ela era esbelta, loura, e encantadora.

*

ÜBER HIRSAU
Rast haltend unter Edeltannen
Besinn ich mich der alten Zeit,
Da in mein erstes Knabenleid
Dieselben Waldesdüfte rannen.

An diesem Ort – – ich lag im Moose
Und träumte scheu und knabenwild
Ein blondes, schlankes Mädchenbild,
In meinem Kranz die erste Rose.

Die Zeit ging hin; der Traum ward alt
Und wich von mir.  Ein andrer kam. –
Wie lang, daß der auch Abschied nahm!

Mich quält, wem jener erste galt.
Ja wem? Ich weiß nur noch: sie war
Holdselig, schlank und blond von Haar.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976.               

§§

AZUL-TARDE
Ó pura, maravilhosa visão 
– quando entre púrpura e ouro,
grave e propício, vais baixando em paz,
resplandecente azul do céu da tarde!

Lembras um mar azul onde a fortuna
com a âncora se encerra
num bendito repouso. Cai do remo
a última gota de mágoa da terra.

*

SPÄTBLAU
O reine, wundervolle Schau,
Wenn du aus Purpurrot und Gold
Dich ebnest friedvoll, ernst und hold,
Du leuchtendes Späthimmelblau!

Du mahnst an eine blaue See,
Darauf das Glück vor Anker hält
Zu seliger Rast. Vom Ruder fällt
Der letzte Tropfen Erdenweh.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976.               

§§


NUVEM MANSA
Minúscula, branca,
leve, sem rumor,
boia no azul uma nuvem:
volve teus olhos e sente
como em seu alvo frescor te conduz
feliz por entre sonhos azuis.

*

DIE LEISE WOLKE
Eine schmale, weiße
Eine sanfte, leise
Wolke weht im Blauen hin.
Senke deinen Blick und fühle
Selig sie mit weißer Kühle
Dir durch blaue Träume ziehn.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976.               

§§

PELOS CAMPOS
Pelos céus passam as nuvens,
sobre os campos sopra o vento,
pelos campos erra o filho
perdido de minha mãe.

Pelas ruas rolam folhas,
sobre as árvores há pássaros.
Sobre as montanhas, em algum lugar
minha pátria há de estar.

*

ÜBER DIE FELDER...
Über den Himmel Wolken ziehn
Über die Felder geht der Wind,
Über die Felder wandert
Meiner Mutter verlorenes Kind.

Über die Straße Blätter wehn,
Über den Bäumen Vögel schrein —
Irgendwo über den Bergen
Muß meine ferne Heimat sein.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976.               

§§

BÉTULA
As gavinhas do sonho de um poeta
não são mais finas ao ramificar-se,
nem se inclinam com mais leveza ao vento,
nem são mais nobres no galgar o azul.

Terna e tenra, e superentrelaçada,
deixas que pendam quase em desalento
tuas ramagens claras e alongadas
a cada sopro ocasional do vento.

Assim pendente, flexível e mansa,
com os teus delicados arrepios,
és para mim o amor da juventude
terno e puro – em feliz alegoria.

*

DIE BIRKE
Eines Dichters Traumgerank
Mag sich feiner nicht verzweigen,
Leichter nicht dem Winde neigen,
Edler nicht ins Blaue steigen.

Zärtlich, jung und überschlank
Lässest du die lichten, langen
Zweige mit verhaltnem Bangen
Jedem Hauche regbar hangen.

Also wiegend leis und schwank
Willst du mir mit deinen feinen
Schauern einer zärtlich reinen
Jugendliebe Gleichnis scheinen.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976.               

§§

RELÂMPAGOS
Relâmpagos em febre ao longe.
Pálida e tímida estrela
de estranho clarão cintila
o jasmim do teu cabelo.

Ao teu mágico poder
difícil e inconstelado,
trazemos beijos e rosas 
– ó noite densa e abafada!

Beijos sem sorte e sem fogo
dos quais mal nos lamentamos;
rosas que em lúgubre dança
murchas pétalas derramam.

Noite sem pingo de orvalho!
Amor sem glória e sem pranto!
Sobre nós paira um mau tempo
que tememos e anelamos.

*

WETTERLEUCHTEN
Wetterleuchten fiebert fern,
Der Jasmin mit sonderbaren
Lichtern wie ein scheuer Stern
Schimmert bleich in deinen Haaren.

Deiner wundersamen Macht,
Deiner schweren, sternelosen,
Opfern Küsse wir und Rosen,
Atemlose, schwüle Nacht.

Küsse ohne Glück und Glanz,
Die wir kaum geküßt bereuen -
Rosen, die in trübem Tanz
Überreife Blätter streuen.

Nacht, die ohne Tau vergeht!
Liebe ohne Glück noch Tränen!
Über uns ein Wetter steht,
Das wir fürchten und ersehnen.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

VALSA BRILHANTE
Na sala, música de Chopin:
selvagem música arrebatada.
Brancas de tempo, as janelas brilham;
orna o piano murcha  grinalda.

Tu ao piano, ao violino eu,
sem parar vamos tocando, enquanto
ansiamos por ver qual de nós dois
será o primeiro a quebrar o encanto.

Qual de nós dois a meio compasso
detém-se e as luzes de si desvia:
qual dos dois faz primeiro a pergunta
que em resposta se apagaria.

*

VALSE BRILLANTE
Ein Tanz von Chopin lärmt im Saal,
Ein wilder, zügelloser Tanz.
Die Fenster leuchten wetterfahl,
Den Flügel ziert ein welker Kranz.

Den Flügel du, die Geige ich,
So spielen wir und enden nicht
Und warten angstvoll, du und ich,
Wer wohl zuerst den Zauber bricht.

Wer wohl zuerst einhält im Takt
Und von sich weg die Lichter schiebt,
Und wer zuerst die Frage sagt,
Auf die es keine Antwort gibt.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

ELISABETH
Pousa-te sobre a fronte, boca e mão,
a fina e doce e clara primavera:
o doce encantamento que eu achei
em antigas pinturas de Florença.

Já viveste por certo em outros tempos,
esbelta e mágica forma de maio:
Botticelli pintou-te como Flora
com seu vestido em flores todo aberto.

És aquela também que ao jovem Dante
cativou com graça de um sorriso:
teu pé já conheceu, sem se dar conta,
o caminho que cruza o Paraíso.

Igual a branca nuvem
no páramo celeste,
branca e bela e distante
és tu, Elisabeth.

A nuvem passa e some,
mal te apercebes dela;
mas no teu sonho, em noite
escura, lá está ela!

E reluz tão argêntea
que, desde então, te invade
daquela branca nuvem
a mais terna saudade.

*

ELISABETH
Dir liegt auf Stirne, Mund und Hand
Der feine, zärtlich helle Lenz,
Der holde Zauber, den ich fand
Auf alten Bildern zu Florenz.

Du lebtest schon einmal vorzeit,
Du wunderschöne Maigestalt,
Als Flora im beblümten Kleid
Hat Botticelli dich gemalt.

Auch bist du jene, deren Gruß
Den jungen Dante übermannt,
Und unbewußt ist deinem Fuß
Der Weg durchs Paradies bekannt.

Wie eine weiße Wolke
Am hohen Himmel steht,
So weiß und schön und ferne
Bist du, Elisabeth.

Die Wolke geht und wandert,
Kaum hast du ihrer acht,
Und doch durch deine Träume
Geht sie in dunkler Nacht.

Geht und erglänzt so silbern,
Daß fortan ohne Rast
Du nach der weißen Wolke
Ein süßes Heimweh hast.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

DENTRO DA NOITE
Muitas vezes desperto com a ideia
de que um navio singra a noite fria,
ganha os mares e ruma a litorais
dos quais me sinto arder de nostalgia.

De que em lugares que marujo algum
conhece, brilha uma aurora boreal
nunca vista. De que em meu travesseiro
há um braço de mulher, belo e sensual.

De que alguém, feito para amigo meu,
longe no mar chega a um obscuro fim.
De que minha mãe, que não me conhece
mais, em sonho talvez chame por mim.

*

IN DER NACHT
An dem Gedanken bin ich oft erwacht
Daß jetzt ein Schiff geht durch die kühle Nacht
Und Meere sucht und nach Gestaden fährt,
Nach denen heiße Sehnsucht mich verzehrt.

Daß jetzt an Orten, die kein Seemann kennt,
Ein rotes Nordlicht ungesehen brennt.
Daß jetzt ein schöner fremder Frauenarm
Sich liebesuchend preßt in Kissen weiß und warm.

Daß einer, der zum Freund mir war bestimmt,
Jetzt fern im Meer ein dunkles Ende nimmt.
Daß meine Mutter, die mich nimmer kennt,
Vielleicht im Schlaf jetzt meinen Namen nennt.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§


NOITE 
Com crepúsculo e com piar de melros,
dos vales avultando a noite vem.
Descansam as andorinhas; o dia
longo deixou-as cansadas  também.

Pela janela, com velado som,
meu doce violino faz-se ouvir.
Entendes, linda noite, o meu cantar,
minha velha canção, meu canto a ti?

Fresco sussurro chega da floresta,
fazendo rir meu coração tristonho.
De manso, com amistoso poder,
vão-me envolvendo a noite, o sono, o sonho.

*

NACHT
Mit Dämmerung und Amselschlag
Kommt aus den Tälern her die Nacht.
Die Schwalben ruhn, der lange Tag
Hat auch die Schwalben müd gemacht.

Durchs Fenster mit verhaltenem Klang
Geht meiner Geige milder Strich.
Verstehst du, schöne Nacht, den Sang –
Mein altes Lied, mein Lied an dich?

Ein kühles Rauschen kommt vom Wald,
Daß mir das Herz erschauernd lacht,
Und leis mit freundlicher Gewalt
Besiegt mich Schlummer, Traum und Nacht.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§


NO NORTE
Devo dizer com que sonho?
Com esplêndidos solstícios, 
morros, bosques, negras árvores,
louras pedras, mansões alvas.

Uma cidade no vale,
branca de igrejas de mármore 
a reluzir para mim 
– e que se chama Florença.

E num vetusto jardim,
de estreitas ruas cercado,
a sorte a esperar por mim
que ali a deixei de lado.

*

IM NORDEN
Soll ich sagen, was ich träume
An beglänzten, sonnenstillen
Hügeln Haine dunkler Bäume,
Gelbe Felsen, weiße Villen.

Eine Stadt im Tal gelegen,
Eine Stadt mit marmorweißen
Kirchen leuchtet mir entgegen,
Und sie ist Florenz geheißen.

Und in einem alten Garten,
Eingehegt von schmalen Gassen,
Muß das Glück noch auf mich warten,
Das ich dort zurückgelassen.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

FLORESTA NEGRA
Estranha e linda linha de colinas,
escuros montes, luminosos prados,
rubros rochedos, pardas ribanceiras
onde se enfloram sombras de pinheiros.

Se neste instante o piedoso som 
de um campanário vem-se misturar 
aos sussurros dos pinheirais, eu posso
ficar horas e horas a escutar.

Empolga-me, tanto quanto uma lenda
lida de noite ao clarão da lareira,
a memória dos dias pressentidos
como se aqui passara a vida inteira.

Como se a fidalguia destes longes,
destes montes cheios de pinheirais,
mais ricos já tivessem fulgurado
aos meus olhos felizes de rapaz.

*

SCHWARZWALD
Seltsam schöne Hügelfluchten,
dunkle Berge, helle Matten,
rote Felsen, braune Schluchten,
überflort von Tannenschatten!

Wenn darüber eines Turmes
frommes Läuten mit dem Rauschen
sich vermischt des Tannensturmes,
kann ich lange Stunden lauschen.

Dann ergreift wie eine Sage,
nächtlich am Kamin gelesen,
das Gedächtnis mich der Tage,
da ich hier zu Hause gewesen,

da die Fernen edler, weicher,
da die tannenforstbekränzten
Berge seliger und reicher
mir im Knabenauge glänzten.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

O CLAUSTRO DE SANTO ESTÊVÃO
(Veneza)
.
Retângulo de parede, pálido, velho e encardido,
pintado outrora pela mão de Pordenone.

Tempo comeu as imagens: enxergam-se agora apenas
aqui e ali uns vestígios quase apagados, 

de afrescos que a água lava ainda: um pé, um braço 
– fantasmas de beleza gasta que ainda acena.

E há uma criança, também, com olhos que alegres riem
e estranhamente a quem os vê enchem de pena.

*

IM KREUZGANG VON SANTO STEFANO
(Venedig)
.
Ein Wändeviereck, blaß, vergilbt und alt, 
ehmals von Pordenones Hand bemalt. 

Die Bilder fraß die Zeit. Du siehest nur 
mit schwachem Umriss hier und dort die Spur 

verwaschener Fresken noch: ein Arm, ein Fuß –  
vergangener Schönheit geisterhafter Gruß. 

Ein Kind mit Augen auf, die lustig lachen 
und den Beschauer seltsam traurig machen.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

RAVENA
Também já estive em Ravena:
pequena cidade morta,
de igrejas e ruínas muitas,
como nos livros se lê.

Correndo, verás em torno
ruas tristes e apertadas
mudas há milênios, musgo
e capim por toda parte.

É como as velhas canções:
a gente ouve sem achar
graça – a ouvir e pensar nelas
até a noite baixar.

*

RAVENNA
Ich bin auch in Ravenna gewesen,
Ist eine kleine, tote Stadt,
Die Kirchen und viel Ruinen hat,
Man kann davon in den Büchern lesen.

Du gehst hindurch und schaust dich um,
Die Straßen sind so trüb und naß
Und sind so tausendjährig stumm,
Und überall wächst Moos und Gras!

Das ist wie alte Lieder sind,
Man hört sie an und keiner lacht
Ein jeder lauscht und jeder sinnt
Hernach daran bis in die Nacht.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

POUSADA DE ANDARILHOS
Como é maravilhoso e singular
que toda noite, ininterruptamente,
refrescada à sobra das aceráceas,
continue a jorrar a mansa fonte!

E toda vez, com um perfume ainda,
sobre as fachadas cai a luz da Lua;
e, o ar escuro e frio atravessando,
revoam nuvens em ligeiro bando.

Tudo isso aconteceu, provadamente:
ali nós descansamos uma noite,
prosseguindo viagem pelo campo
sem ninguém que ficasse nos lembrando.

Depois, talvez passados muitos anos,
em sonho nos ressurge aquela fonte, 
e os portões e as fachadas – como então 
eram e pelo tempo ainda serão.

Em nós refulge, como uma saudade 
– e ali só descansamos uma noite –
o estranho teto de estranho hospedeiro
que não chega a ter nome nem cidade. 

Como é maravilhoso e singular
que toda noite, ininterruptamente,
refrescada à sobra das aceráceas,
continue a jorrar a mansa fonte!

*

LANDSTREICHERHERBERGE
Wie fremd und wunderlich das ist,
Daß immervort in jeder Nacht
Der leise Brunnen weiterfließt,
Vom Ahornschatten kühl bewacht.

Und immer wieder wie ein Duft
Der Mondschein auf den Giebeln liegt
Und durch die kühle, dunkle Luft
Die leichte Schar der Wolken fliegt!

Das alles steht und hat Bestand,
Wir aber ruhen eine Nacht
Und gehen weiter über Land,
Wird uns von niemand nachgedacht.

Und dann, vielleicht nach manchem Jahr,
Fällt uns im Traum der Brunnen ein
Und Tor und Giebel, wie es war
Und jetzt noch und noch lang wird sein.

Wie Heimatahnung glänzt es her
Und war doch nur zu kurzer Rast
Ein fremdes Dach dem fremden Gast,
Er weiß nicht Stadt, nicht Namen mehr.

Wie fremd und wunderlich das ist,
Daß immerfort in jeder Nacht
Der leise Brunnen weiterfließt,
Vom Ahorhschatten kühl bewacht!
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

TEMPLO
Onde entre sombras jaz o deus caído
no capim alto à beira do caminho,
e onde o mato balança as copas negras
em luto pelo templo demolido 
– deixa eu também ali, pausa divina,
ao canto fresco dos velhos ciprestes,
esquecer meu vagar de dor e pó,
 e descansar o peso do meu fardo!

Já não sabes quem sou: durante anos
longe do teu silêncio, em outras terras
segui deuses que amei e reneguei,
entoando-lhes cânticos profanos...
Na volta de tão proscritas jornadas,
deixa minha cabeça atormentada
pousar em paz no retiro dos deuses
em quem um dia eu cri e a quem traí.

*

TEMPEL
Wo der gestürzte Gott, von Schatten überschauert,
Im hohen Gras am Rand des Weges liegt,
Und wo der Hain die schwarzen Wipfel wiegt
Und über dem gebrochenen Tempel trauert,
Dort laß auch mich, geweihte Götterrast,
Im kühlen Lied der alternden Zypressen
Des heißen Wegs durch Staub und Qual vergessen
Und niederlegen meiner Bürden Last!

Du kennst mich nimmer, der ich jahrelang
Fern deiner Stille durch die Länder suchte
Nach Göttern, die ich liebte und verfluchte
Und denen ich unheilige Lieder sang.
Rückkehrend von verbot'nen fremden Wegen
Laß mich das schwere und verstürmte Haupt
Im Hain des Gottes, den ich einst geglaubt
Und den ich dann verriet, zur Ruhe legen.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

FINALE
Nuvens que passam e vento inclemente
me resfriam, a mim que estive enfermo:
a sonhar, qual sossegada criança,
fico em repouso e me restabeleço.

No mais profundo do meu peito, um som
de minha amada é tudo quanto resta
com seu luto e sua melancolia
a amortecer qualquer rumor de festa.

Esse som, que não chega a ter um nome,
horas e dias eu posso ficar 
– enquanto o vento e os abetos ciciam – 
entregue todo e em silêncio a escutar. 

*

AUSKLANG
Wolkenflug und herber Wind 
Kühlt mich, der ich krank gewesen. 
Träumend wie ein stilles Kind 
Ruh ich aus und bin genesen.

Nur ein Klang in tiefer Brust 
Ist von meinem armen Lieben, 
Dämpfend alle laute Lust, 
Leis und trauernd überblieben.

Diesen namenlosen Klang, 
Während Wind und Tannen rauschen, 
Kann ich Stunden, Tage lang 
Schweigend hingegeben lauschen.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

CIPRESTES DE SAN CLEMENTE
Rodeamos o cume flamante e esguio ao vento,
olhamos ao jardins repletos de mulheres
e folguedos e risos. Olhamos os jardins,
onde gentes nasceram e foram enterradas.

Vemos templos que foram durante muitos anos
apinhados de deuses e seus adoradores:
os deuses estão mortos e desertos  os templos,
pedaços de colunas se estendem no capim.

Vemos vales e vemos argênteos descampados
onde gentes se alegram, se cansam e entristecem;
onde ginetes montam e sacerdotes rezam,
onde irmãos e parentes uns aos outros enterram.

Mas à noite, ao chegarem as grandes tempestades,
curvamo-nos tristonhos e quietos esperamos
fincamos as raízes e quietos esperamos
que a morte nos alcance ou que passe adiante.

*

DIE ZYPRESSEN VON SAN CLEMENTE
Wie biegen flammend schlanke Wipfel im Wind, 
Wir schauen Gärten, welche voll Frauen sind
Und voll Spiel und Gelächter. Wir schauen Gärten, 
Wo Menschen geboren und wieder begraben werden. 

Wir sehen Tempel, welche vor vielen Jahren 
Voll von Göttern und voll von Betenden waren. 
Aber die Götter sind tot und die Tempel sind leer 
Und im Grase liegen gebrochene Säulen umher. 

Wir sehen Täler und sehen silberne Weiten, 
Wo Menschen sich freuen, müde werden und leiden, 
Wo Reiter reiten und Priester Gebete sagen, 
Wo Geschlechter und Brüder einander zu Grabe tragen. 

Aber des Nachts, wenn die großen Stürme kommen, 
Werden wir traurig und bücken uns todbeklommen, 
Stemmen die Würzeln angstvoll und warten leise, 
Ob der Tod uns erreiche, oder vorüberreise.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§


ESTA É A MINHA MÁGOA
Esta é a minha mágoa: com tão numerosas
máscaras ter representado tanto,
a mim e aos outros igualmente bem
ter sabido enganar. Em mim não há
qualquer gesto ou qualquer menção de canto
sem algum truque ou segunda intenção.

Devo dizer que é esta a minha desgraça:
conhecer o meu íntimo tão bem,
ante-sabendo cada batida do pulso,
que não há símbolo inconsciente de sonho,
nem perspectiva de alegria ou de tristeza,
capaz de alvoroçar-me ainda o coração.

*

DAS IST MEIN LEID
Das ist mein Leid, daß ich in allzuvielen
Bemalten Masken allzugut zu spielen
Und mich und andre allzugut
Zu täuschen lernte. Keine leise Regung
Zuckt in mir auf und keines Lieds Bewegung,
In der nicht Spiel und Absicht ruht.

Das muss ich meinen Jammer nennen:
Mich selber so ins Innerste zu kennen,
vorwissend jedes Pulses Schlag,
dass keines Traumes unbewusste Mahnung
und keiner Lust und Leides Ahnung
mir mehr die Seele rühren mag.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

SONHO
O sonho é sempre igual:
um castanheiro com flores vermelhas,
um estuante jardim estival,
e mais a solitária casa velha.

Lá, onde o calmo jardim se estende,
minha mãe me ninava;
talvez – já tanto tempo faz – 
casa, árvore, jardim nem hajas mais.

Agora talvez haja uma picada
por onde relha e arado passem:
de pátria, jardim, casa, castanheiro,
nada haveria além do sonho que ficasse.

*

TRAUM
Es ist immer derselbe Traum:
Ein rotblühender Kastanienbaum,
Ein Garten, voll von Sommerflor,
Einsam ein altes Haus davor.

Dort, wo der stille Garten liegt,
Hat meine Mutter mich gewiegt;
Vielleicht - es ist so lange her - 
Steht Garten, Haus und Baum nicht mehr.

Vielleicht geht jetzt ein Wiesenweg
Und Pflug und Egge drüber weg,
Von Heimat, Garten Haus und Baum
Ist nichts geblieben als mein Traum.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

NOITE DE SOLIDÃO 
Vós, que sois meus irmãos, pobres 
de perto e de longe, vós
que entre as estrelas sonhais consolar vossa aflição
sob a noite constelada
pondo as mansas frias mãos,
vós que sofreis e velais,
triste e errante multidão,
barcos sem norte e sem sorte,
estranhos e em comunhão 
– devolvei-me a saudação!

*

EINSAME NACHT
Die ihr meine Brüder seid,
Arme Menschen nah und ferne,
Die ihr im Bezirk der Sterne
Tröstung träumet eurem Leid,
Die ihr wortelos gefaltet
In die blaß gestirnte Nacht
Schmale Dulderhände haltet,
Die ihr leidet, die ihr wacht,
Arme, irrende Gemeinde,
Schiffer ohne Stern und Glück –
Fremde, dennoch mir Vereinte,
Gebt mir meinen Gruß zurück.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

APRENDIZES 
Findo o dinheiro, vazia a garrafa,
um após outro, deitam-se 
no chão, fatigadíssimos
de tanto perambular.

Em sonho, um vê o polícia
de quem a custo escapou;
o outro vê-se deitado
num campo morno ao sol.

A luz apaga-se e tudo repousa,
só as vidraças continuam a brilhar:
ele apanha em silêncio o chapéu e o bordão 
e sai no escuro a perambular.

*

HANDWERKSBURSCHENPENNE
Das Geld ist aus, die Flasche leer,
Und einer nach dem andern
Legt sich zu Boden müde sehr
Und ruht vom langen Wandern.

Der eine träumt noch vom Gendarm,
Dem er mit Not entronnen,
Dem andern ist, er liege warm
Im Felde an der Sonnen.

Das Licht verlischt und alles ruht,
Nur noch die Scheiben funkeln,
Da nimmt er leise Stock und Hut
Und wandert fort im Dunkeln.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

CHIOGGIA
Fachadas encardidas e apertadas, imagens 
da Virgem em absconsos nichos, espelhos de água,
e de permeio gôndolas indolentes e largas 
barcaças cheias de pescadores tisnados.
Por toda parte, em cada muro desmoronado,
nos becos todos e canais e escadarias,
adormenta-se um luto desesperançado
a querer contar coisas de tempos passados.
Caminho devagar e com intimo susto
sobre as lajes – pensando a medo em acordá-las:
se as acordasse, eu não escaparia mais!
Passo depressa adiante e vou buscando o cais,
vou procurando o mar e um barco de partida.
Tristes, com sono, os becos titubeiam atrás.

*

CHIOGGIA
Wetterbraune, dichtgedrängte Fassaden,
Marienbilder in verborgenen Nischen,
Wasserspiegel und träge Gondeln dazwischen
Und breite Barken mit braunen Fischern beladen.
Überall aber, auf jeder bröckelnden Mauer,
In allen Gassen, auf Treppen und in Kanälen
Liegt eingeschlummert eine verzweifelte Trauer
Und will von vergangenen Zeiten erzählen.
Leise geh ich und mit verborgenem Schrecken
Über die Fliesen - ängstlich, ich möchte sie wecken.
Wenn sie erwachte! Ich könnte nimmer entrinnen!
Eilend schreit' ich vorbei und suche den Hafen,
Suche das Meer und ein reisendes Schiff zu gewinnen.
Hinter mir zögern traurig die Gassen und schlafen.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

PASSEIO NOTURNO
Já a noite cai, descansa a rua.
Em sonolenta pulsação
o rio vai, com suas águas indolentes,
rumo à calada escuridão.

Resmunga ele, no seu leito fundo,
tão contrafeito, pesado e rouco,
como se só quisesse repousar;
igual a ele, fatigado eu vou.

Atravessar a noite e terra estranha
é um penoso arrastar-se de um e outro:
silente e imóvel peregrinação
a dois, sem que nenhum saiba para onde.

*

NACHTGANG 
Es nachtet schon, die Straße ruht,
Seitab treibt mit verschlafenen Schlägen
Der Strom mit seiner trägen Flut
Der stummen Finsternis entgegen.

Er rauscht in seinem tiefen Bett
So wegverdrossen, rauh und schwer,
Als ob er Lust zu ruhen hätt,
Und ich bin wohl so müd wie er.

Das ist durch Nacht und fremdes Land
Ein traurig Miteinanderziehn,
Ein Wandern stumm und unverwandt
Zu zwein, und keiner weiß wohin.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

A CARTA 
Sopra do oeste um vento,
as tílias choram mais;
entre os ramos, a lua
vem espiar meu quarto.

Eu tinha, à amada minha
que me deixara já,
escrito uma longa carta:
na folha reluz o luar.

Ao seu tranqüilo clarão
que nas pautas vai pisando
esquece meu coração
lua e prece, choro e sono.

*

DER BRIEF
Es geht ein Wind von Westen,
Die Linden stöhnen sehr,
Der Mond lugt aus den Ästen
In meine Stube her.

Ich habe meiner Lieben,
Die mich verlassen hat, 
Einen langen Brief geschrieben,
Der Mond scheint auf das Blatt.

Bei seinem stillen Scheinen,
Das über die Zeilen geht,
Vergisst mein Herz vor Weinen
Schlaf, Mond und Nachtgebet.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

DE UM PASSEIO NOTURNO
O vaguear pela montanha em meio à noite,
por entre o pálido debrum da pradaria 
e moles sombras de arvoredos  invisíveis,
levou-me ao aberto portão da urbe antiga.

Cumprida rua vagarento percorri,
mas em nenhuma das vidraças apagadas
vi uma vela reluzindo a instar comigo
para ficar: tudo dormia, e era só noite.

Eis que, afastando-me de novo pelo prado,
voltando os olhos sobre os escuros frontões
tontos de sono, em alinhada construção,
vi um clarão suspenso lá no alto da torre.

Então havia, na cornija, alguém desperto
que balançava uma lanterna por um fio
e para a frente se inclinava e olhava ao longe
na direção de onde meus passos mal se ouviam.

*

AUF EINER NACHTWANDERUNG
Herwandernd aus den Bergen durch die Nacht
Hat mich der Weg durch fahle Wiesensäume
Und weiche Schatten unsichtbarer Bäume
Ans offene Tor der alten Stadt gebracht.

Durch eine lange Straße schritt ich sacht,
Und nirgends schien aus all den schwarzen Scheiben
Ein einzig Kerzenlicht und lud zum Bleiben,
Und alles schlief, und überall war Nacht.

Erst, da ich wieder weit im Felde ging
Und rückwärts auf die wunderlich gebaute,
Schlafwirre Flucht der dunkeln Giebel schaute,
Sah ich ein Licht, das hoch im Turme hing.

Und oben am Gesims war Einer wach;
Der trug am Strick die schaukelnde Laterne
Und bog sich vor und schaute in die Ferne
Und meinen kaum gehörten Schritten nach.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

GÔNDOLA
No alto, o azul e o fogacho do sol;
em baixo, o rio eternamente calmo;
sobre a quilha ligeira e graciosa,
coisas de amor e instrumentos de cordas.

Recatados e escuros são teus bordos,
mas com doçura o momento se curte;
estranho e doce é o sonho da morte,
do fim do amor e da juventude.

Rumo a desconhecidos objetivos
meus jovens anos deslizando vão 
– como tu, leve e graciosa gôndola,
por luminosa e amável amplidão.

*

GONDEL
Bläue über dir und Sonnenglut,
Unter dir die ewig stille Flut,
Auf dem schlanken, leichtbewegten Kiel
Trägst du Saitenklang und Liebesspiel.

Schwarz und ernst sind deine leichten Wände.
Süß, solang das frohe Heute loht,
Süß und seltsam ist der Traum vom Tod,
Von der Jugend und der Liebe Ende.

Meine jungen Jahre gleiten
Unbekannten Zielen zu
Durch beglänzte schöne Weiten,
Schlanke Gondel, rasch und leicht wie du.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

NOITE
Úmidas nuvens mornas vão passando;
ouvem-se nos juncais aves noturnas
pesadas asas ruflando
e lá na aldeia uma canção de pescadores.

De tempos jamais havidos
sombrias sagas se entoam
e queixas de longevos sofrimentos:
ai daquele que as ouve em meio à noite!

Basta, criança, de murmúrios e lamentos!
De dor, o mundo em redor está cheio.
Vamos ouvir o gorjeio das aves
e essa canção que nos chega da aldeia!

*

ZUNACHTEN
Laufeuchte Winde schweifen,
Nachtvögel hört man überm Ried
Mit schweren Flügeln streifen
Und fern im Dorf ein Fischerlied.

Aus niegewesenen Zeiten
Sind trübe Sagen angestimmt
Und Klagen um ewige Leiden;
Weh dem, der sie bei Nacht vernimmt!

Laß klagen, Kind, laß rauschen!
Rings ist die Welt vom Leide schwer.
Wir wollen den Vögeln lauschen
Und auch dem Lied vom Dorfe her.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

ÀS VEZES
Às vezes, quando um pássaro chama
ou entre os ramos algum vento sopra
ou nalgum pátio longe ladra um cão,
por longo tempo eu escuto e me calo.

Minha alma voa para o passado,
para onde, há mil esquecidos anos,
o pássaro e o vento que soprava
mais pareciam meus irmãos e eu.

Minha alma faz-se uma árvore,
um animal, um tecido de nuvens…
Transfigurada e estranha, volta a mim
e me interroga. Que resposta lhe darei?

*

MANCHMAL
Manchmal, wenn ein Vogel ruft
oder ein Wind geht in den Zweigen
oder ein Hund bellt im fernsten Gehöft,
dann muß ich lange lauschen und schweigen.

Meine Seele flieht zurück,
bis wo vor tausend vergessenen Jahren
der Vogel und der wehende Wind
mir ähnlich und meine Brüder waren.

Meine Seele wird Baum
und ein Tier und ein Wolkenweben.
Verwandelt und fremd kehrt sie zurück
und fragt mich. Wie soll ich Antwort geben?
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

NA BRUMA
Estranho, andar pela bruma:
isolado está cada arbusto ou pedra,
árvore alguma vê outra,
cada qual está só.

Cheio de amigos era para mim o mundo,
quando tinha ainda clara a minha vida:
agora, que a bruma cai,
não se vê nenhum mais.

Em verdade, sábio não é ninguém
que não saiba do escuro
inevitável e silencioso
a isolá-lo de tudo.

Estranho, andar pela bruma.
Viver é ser sozinho.
Ninguém conhece ninguém:
cada qual está só.

*

IM NEBEL
Seltsam, im Nebel zu wandern!
Einsam ist jeder Busch und Stein,
Kein Baum sieht den andern,
Jeder ist allein.

Voll von Freunden war mir die Welt,
Als noch mein Leben licht war;
Nun, da der Nebel fällt,
Ist keiner mehr sichtbar.

Wahrlich, keiner ist weise,
Der nicht das Dunkel kennt,
Das unentrinnbar und leise
Von allen ihn trennt.

Seltsam, Im Nebel zu wandern!
Leben ist Einsamsein.
Kein Mensch kennt den andern,
Jeder ist allein.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

NUVENS DO ENTARDECER
O que um poeta imagina e burila,
e anota num livrinho, em verso e rima,
a alguns pode sem nexo parecer;
mas Deus entende e acata com prazer.

Também ele, que cuida do universo,
de vez em vez é poeta também:
quando repicam os sinos da tarde,
como em sonho, toma nas mãos o ar
e, para a festa do final do dia,
faz lindas nuvens de ouro  tênues, muitas,
a debruar o perfil das montanhas 
– espuma carmesim na pompa do crepúsculo.
Uma e outra, que lhe saem melhores,
por algum tempo ele conduz e guarda,
a fim de que, feitas de quase nada,
pairem no céu em contente sorrir.
A que parece um vão jogo de rima
logo tem algo de magia e imã
a atrair a alma humana
em nostalgia e oração a Deus.
Então a rir o Criador desperta
do breve sonho, a brincadeira esfria,
e da fresca distância desabrocha
plena de paz a noite.
Assim é que da pura mão de Deus,
mesmo de brincadeira, toda imagem
brota perfeita, formosa e feliz
como poeta  algum imaginou jamais.

Possa o teu canto terrenal valer
como um acorde musical de sinos,
e que das mãos de Deus, cheias de luz,
brotem nuvens lá em cima.

*

ABENDWOLKEN
Was so ein Dichter sinnt und treibt,
Sich Reim und Vers ins Büchlein schreibt,
Manch einem scheint es ohne Kern,
Doch Gott versteht's und duldet's gern.

Er selber, der die Welt ermißt,
Zuzeiten auch ein Dichter ist,
Und wenn das Abendläuten ruft,
Greift er wie träumend in die Luft,
Baut sich zum Feierabendspiel
Zartgoldene Wölklein schön und viel,
Läßt sie an Bergesrändern säumen
Und rot im Abendglanz erschäumen.
Und manche, die ihm wohl gelang,
Die leitet er und hütet lang,
Daß sie, die fast aus nichts gemacht,
Am Himmel ruht und selig lacht.
Und die nur Tand und Reimwerk schien,
Wird nun ein Zauber und Magnet
Und zieht der Menschen Seelen hin
Zu Gott in Sehnsucht und Gebet.
Der Schöpfer lächelt und erwacht
Vom kurzen Traum, das Spiel verglüht,
Und aus der kühlen Ferne blüht
Herauf die friedevolle Nacht.
Nur daß aus Gottes reiner Hand,
Sei's auch im Spiel, jedwedes Bild
Vollkommen, schön und selig quillt,
Wie es kein Dichter je erfand.

Mag denn dein irdisch Lied bedeuten
Ein schnell vertönend Abendläuten,
Darüber hin, im Licht entbrannt,
Die Wolken wehen aus Gottes Hand.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

ENTRADA DE PRIMAVERA
O vento quente zune toda a noite,
pesadamente rufla a sua asa molhada.
Aves pernaltas titubeiam no ar.
Nada mais dorme:
toda a terra está acordada,
a primavera chama.

Fica quieto, coração, fica quieto!
Mesmo que densa e íntima no sangue
agite-se a paixão
e caminhos antigos te seduzam:
de volta à juventude
teus caminhos jamais te levarão.

*

VORFRÜHLING
Der Föhn schreit jede Nacht,
Sein feuchter Flügel flattert schwer.
Brachvögel taumeln durch die Luft.
Nun schläft nichts mehr,
Nun ist das ganze Land erwacht,
Der Frühling ruft.

Bleib still, bleib still, mein Herz!
Ob auch im Blute eng und schwer
Die Leidenschaft sich rührt
Und dich die alten Wege führt –
Nicht jugendwärts 
Gehn deine Wege mehr.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

TARDE DE FEVEREIRO
Azul a tarde cai da colina para o lago;
mole em degelo a neve rebrilha fracamente;
como sonhos sem cor e sem forma, na neblina
flutuam enfadonhas coroas de extintas árvores.

Mas na aldeia, por todos os sonolentos becos,
vaga sereno e tíbio o vento incerto da noite:
pousa na sebe, e deixa que nos jardins escuros
e nos sonhos dos jovens faça-se primavera.

*

FEBRUARABEND 
Bläulich dämmert am Hügel hinab zum See
Matten Schimmers im Schmelzen der weiche Schnee,
In den Nebeln gestaltlos wie bleiche Träume
Schwimmen vielästige Kronen erstorbener Bäume.

Aber durchs Dorf, durch alle schlummernden Gassen
Wandelt der Nachtwind, schlendert lau und gelassen,
Rastet am Zaun und läßt den dunklen Gärten
Und in den Träumen der Jugend Frühling werden.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

PRIMAVERA
Mais uma vez percorre a parda senda
dos montes limpos pelos temporais:
aonde a beleza chega, brotam flores
e cantos de pássaro, uma vez mais.

Uma vez mais bafeja-me os sentidos
para, em tão puro e terno florescer,
doce pátria e propriedade minha
a terra – que me hospeda – parecer.

*

FRÜHLING
Wieder schreitet er den braunen Pfad
Von den stürmeklaren Berge nieder,
Wieder quellen, wo der Schöne naht,
Liebe Blumen auf und Vogellieder.

Wieder auch verführt er meinen Sinn,
Daß in dieser zart erblühten Reine
Mir die Erde, deren Gast ich bin,
Eigentum und holde Heimat scheine.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

NOITE
Acabo de apagar a minha vela:
pela janela aberta a noite vem,
me abraça com doçura, e me permite
ser amigo e irmão dela.

Sofremos ambos da mesma saudade:
cheio de augúrios nosso sonho vai,
e cochichamos sobre velhos tempos
em casa de nosso pai.

*

NACHT
Ich habe meine Kerze ausgelöscht;
Zum offenen Fenster strömt die Nacht herein,
Umarmt mich sanft und läßt mich ihren Freund
Und ihren Bruder sein.

Wir beide sind am selben Heimweh krank;
Wir senden ahnungsvolle Träume aus
Und reden flüsternd von der alten Zeit
In unsres Vaters Haus.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

JUNHO EM DIA VENTO 
O lago está parado feito vidro.
Na alcantilada encosta da colina
ondula em prateado a relva fina.

Lastimosa e com seu temor da morte,
grita no ar uma ave de arribação
cambaleando em curvas indecisas.

Voando para cá, vem do outro lado
um som de foice e um forte olor do prado.

*

WINDIGER TAG IM JUNI
Der See starrt wie Glas,
Um steilen Hügelhang
Weht silbern das dünne Gras. 

Jammernd und todesbang
Schreit ein Kiebitz in der Luft, 
Taummelt in zuckenden Bogen. 

Vom anderen Ufer herübergeflogen 
Kommt Sensengeläut und sehnlicher Wiesendurft.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

ADÁGIO 
Irmão e irmã de todas as coisas
tu deves ser,
de modo que te pervaguem todo
e não distingas o teu do meu.

Não caia estrela, nem folha alguma
sem que te sintas também morrer:
assim também, com cada uma delas
a todo instante hás de reviver.

*

SO MUSST DU ALLEN DINGEN
So mußt Du allen Dingen
Bruder und Schwester sein,
Daß sie dich ganz durchdringen,
Daß du nicht scheidest Mein und Dein.

Kein Stern, kein Laub soll fallen –
Du mußt mit ihm vergehn!
So wirst du auch mit allen
Allstündlich auferstehn.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

SENTIMENTO DA NOITE
Com o fundo poder azul da noite,
que me clareia o coração,
por uma súbita nesga entre as nuvens
reluz o mundo das estrelas e da lua.

Em seu jazigo, lampeja minha alma
com o redivivo ardor;
ao pálido perfume das esferas,
a noite dedilha a harpa.

A essa convocação, míngua a penúria
e a preocupação foge.
Mesmo que eu amanhã já não esteja
aqui – aqui estou hoje!

*

NACHTGEFÜHL
Tief mit blauer Nachtgewalt
Die mein Herz erhellt,
Bricht aus jähem Wolkenspalt
Mond und Sternenwelt.

Seele flammt aus ihrer Gruft
Lodernd aufgeschürt,
Da im bleichen Sternenduft
Nacht die Harfe rührt.

Sorge flieht und Not wird klein,
Seit der Ruf geschah.
Mag ich morgen nimmer sein,
Heute bin ich da!
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

O POETA
Somente para mim, o solitário,
murmura a fonte de pedra sua canção de magia;
só para mim, só para o solitário,
errantes nuvens passam arrastando
sombras de cores como sonhos sobre o campo.
Nem ofício me é dado,
nem casa, nem lavoura, nem pomar:
é meu somente o que a ninguém pertence
– é meu o arroio que coleia atrás do véu da mata,
meu é o fecundo mar,
meu é o trinado de pássaros das crianças que brincam,
a tristeza e o pranto do apaixonado a sós no entardecer,
Meus são também os templos dos deuses, meu é
o venerável horto do passado.
Minha pátria é não menos
a abóbada celeste com a luz do amanhã;
muitas vezes nas asas da saudade arroja-se minha alma para o alto,
a olhar o glorioso porvir da humanidade,
o amor acima da lei, o amor de povo a povo.
Volto a encontrá-los todos nobremente mudados:
o camponês, o rei, o comerciante, a ativa marujada,
o jardineiro e o pastor, todos
agradecidos celebrando a festa mundial do porvir.
Falta apenas o poeta
– ele, o contemplativo marginal,
a imagem pálida e o portador do anseio da humanidade,
a quem o futuro, a plenitude do mundo,
já não faz falta: murcham
numerosas coroas em seu túmulo,
mas a memória dele está apagada.

*

DER DICHTER
Nur mit dem Einsamen
Scheinen des Nachts die unendlichen Sterne,
Rauscht der steinerne Brunnen sein Zauberlied,
Mir allein, mir dem Einsamen
Ziehen die farbigen Schatten
Wandernder Wolken Träumen gleich übers Gefild.
Nicht Haus noch Acker ist,
Nicht Wald noch Jagd noch Gewerb mir gegeben,
Mein ist nur, was keinem gehört,
Mein ist sitürzender Bach hinterm Waldesschleier,
Mein das fruchtbare Meer,
Mein der spielenden Kinder Vogelgeschwirre,
Träne und Lied einsam Verliebter am Abend.
Mein auch sind die Tempel der Götter, mein ist
Der Vergangenheit ehrwürdiger Hain.
Und nicht minder der Zukunft
Lichtes Himmelsgewölbe ist meine Heimat:
Oft in Flügen der Sehnsucht stürmt die Seele empor,
Seliger Menschheit Zukunft zu schauen,
Liebe, Gesetz besiegend, Liebe von Volk zu Volk.
Alle find ich sie wieder, edel verwandelt:
Landmann, König, Händler, emsiges Schiffervolk,
Hirt und Gärtner, sie alle
Feiern dankbar der Zukunft Weltfest.
Einzig der Dichter fehlt,
Er, der vereinsamt Schauende,
Er, der Menschensehnsucht Träger und bleiches Bild,
Dessen die Zukunft, dessen die Wetlerfüllung
Nicht mehr bedarf. Es welken
Viele Kränze an seinem Grabe,
Aber verschollen ist sein Gedächtnis.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

NOITE DE VERÃO
Pingos caem, o ar está inquieto.
Não sopra nenhum vento.
Na rua um ébrio canta longamente:
é um canto incerto e frágil como uma criança.

Cala-se agora:
o céu se dilacera,
e no intenso azul claro do relâmpago
fulgura a rua.

Como um trotar de cavalos brancos
vem o barulho da chuva.
Apagadas as luzes, dissolvidas as formas,
águas se precipitam e me rendem cativo.

*

SOMMERNACHT
Tropfen sinken, die Luft ist bang.
Noch geht kein Wind.
Ein Trunkener singt die Straße entlang.
Sein Lied ist irr und schwach wie ein Kind.

Nun schweigt er ganz:
Der Himmel zerreißt
Und grell im blauweißen Glanz
Der Blitze die Straße gleißt.

Wie Getrabe von weißen Rossen
Rauscht Regen heran.
Alles Licht erlosch, alle Form zerrann,
Stürzende Wogen halten mich eingeschlossen.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

FIM DE VERÃO
De mansinho, monótona e queixosa,
no morno entardecer a chuva corre
chorando como cansada criança
ao encontro da meia-noite próxima.

Farto de suas festas, o verão
toma a própria coroa nas mãos murchas,
atira-a longe – flores não tem mais –
e curva-se com medo e quer morrer.

Nosso amor também foi coroa a arder
em aquecidas festas estivais;
pouco a pouco se esvai a última dança,
os convidados vão-se, a chuva cai.

Antes que do esplendor arrefecido
tenhamos pejo, e do extinto fervor,
aproveitemos esta noite grave
para dizer adeus ao nosso amor.

*

SOMMERS ENDE
Gleichtönig, leis und klagend rinnt
Den lauen Abend lang der Regen,
Hinweinend wie ein müdes Kind
Der nahen Mitternacht entgegen.

Der Sommer, seiner Feste müd,
Hält seinen Kranz in welken Händen
Und wirft ihn weg – er ist verblüht –
Und neigt sich bang und will verenden.

Auch unsre Liebe war ein Kranz
Auflodernd heißer Sommerfeste,
Nun löst sich sacht der letzte Tanz,
Der Regen stürzt, es fliehn die Gäste.

Und eh wir der verwelkten Pracht
Und der erloschenen Glut uns schämen,
Laß uns in dieser ernsten Nacht
Von unsrer Liebe Abschied nehmen.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

MEIO-DIA EM SETEMBRO
O dia azul se detém
por uma hora em sua alta pousada.
Em sua luz todas as coisas se contêm. 
Como num sonho, a gente pode ver
desensombrado o mundo 
– em outro azul ninado –
pender em fundo alento e sazonada paz.

– Se neste quadro caísse uma sombra!

Nem bem isto pensaste
e já a hora dourada
desperta do seu levíssimo sonho
e empalidece, enquanto ri mais sossegada,
e em sua ronda o sol esfria mais.

*

MITTAG IM SEPTEMBER
Es hält der blaue Tag
Für eine Stunde auf der Höhe Rast.
Sein Licht hält jedes Ding umfaßt,
Wie man's in Träumen sehen mag:
Daß schattenlos die Welt,
In Blau und Gold gewiegt,
In lauter Duft und reifem Frieden liegt.

- Wenn auf dies Bild ein Schatten fällt! -

Kaum hast du es gedacht,
So ist die goldene Stunde
Aus ihrem leichten Traum erwacht,
Und bleicher wird, indes sie stiller lacht,
Und kühler wird die Sonne in der Runde.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

SORTE
Enquanto vives perseguindo a sorte,
não estás pronto para ser feliz,
ainda que seja teu o que mais queres.

Enquanto te lamentas do perdido,
e tens metas e não te dás descanso,
não podes saber o valor da paz.

Só quando a todo anelo renuncias,
sem objetivos nem desejos mais,
e já não dás à sorte qualquer nome,

já a maré dos eventos não te atinge
o coração, e se acalma tua alma.

*

GLÜCK
Solang du nach dem Glücke jagst,
Bist du nicht reif zum glücklich sein
Und währe alles Liebste dein.

Solange du nach Verlorenem klagst
Und Ziele hast und rastlos bist,
Weißt du noch nicht, was Friede ist.

Erst wenn du jedem Wunsch entsagst,
Nicht Ziele mehr, noch Begehren kennst,
Das Glück nicht mehr mit Namen nennst,

Dann reicht dir des Geschehens Flut
Nicht mehr ans Herz – und deine Seele ruht.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

A CAMINHO
E quando sobre nuvens no alto da montanha
eu pisava a ascender em ares mais sutis,
abriu-se para mim o domínio  dos mortos: 
uma nuvem de mil ancestrais,
cintilante clarão de espíritos sem número.
E me empolgou então a espantosa noção  
de que eu não sou sozinho, estrangeiro não sou,
de que a alma que eu tenho e o olhar dos meus olhos,
minha boca e ouvidos, e o ritmo dos meus passos,
não são novos nem são meus exclusivamente,
nem a vontade, tida como dona de mim.
Sou um raio de luz, uma folha da árvore
de gerações sem conta, cujos primeiros povos
viviam nas florestas e em hordas erradias,
outros de guerra em guerra a tomar-se de fúria, 
e outros mais cujas casas de madeira de lei
e ouro e pedras preciosas elevaram-se esplêndidas  
em cidades formosas de muitas maravilhas.
A partir de tudo isso, inclusive o silente
olhar de minha mãe, que órfão me deixou,
tudo é um caminho só, seguro e inevitável,
para o meu existir – esse mesmo caminho
que se estende ante mim rumo a tempos sem margens,
para homens de quem eu sou o ancestral distante
e em cujas vidas há de estar contida a minha.
E quando sobre nuvens no alto da montanha
em ares mais sutis ia eu pisando, a vida
minha, meus olhos vendo, meu coração batendo,
eram um rico feudo que eu grato conduzia,
cuja glória e valor, porém, não me pertencem,
por isso não se acabam.
E eis que de mim adeja
o ar fresco das alturas me rodeando a fronte.

*

UNTERWEGS
Und da ich über Wolken hoch am Berg
In leichten Lüften schritt und stieg,
Tat sich das Reich der Toten vor mir auf:
Von tausend fernen Ahnen ein Gewölk,
Ein Flimmerblitz unzähliger Geister.
Und wunderlich ergriff mich die Erkenntnis,
Daß ich kein Einzelner, kein Fremder bin,
Daß meine Seele, meiner Augen Blick,
Mein Mund und Ohr und meiner Schritte Takt
Nicht neu und nicht mein Eigen sind,
Auch nicht mein Wille, der mir Herr erschien.
Ein Strahl bin ich des Lichts, ein Blatt am Baum
Unzähliger Geschlechter, deren frühe Völker
In Wäldern lebten und auf Wanderung,
Und andrer, die von Krieg zu Krieg getobt,
Und wieder andrer, deren Wohnungen
Von Edelholz und Gold und Schmuck gebaut
In schönen Städten wundersam erglänzten.
Von ihnen her bis auf den stillen Blick,
Den meine Mutter hatte, die mir starb,
Ist alles nur ein unentrinnbar sichrer Weg
Zu mir gewesen, und derselbe Weg
Führt von mir weg in uferlose Zeiten
Zu Menschen, deren ferner Ahn ich bin
Und deren Leben meines in sich schließt.
Und da ich über Wolken hoch am Berg
In leichten Lüften schritt, ward mir mein Leben,
Mein schauend Auge und mein schlagend Herz
Ein köstlich Lehen, das ich dankbar trug,
Doch dessen Wert und Schönheit mir nicht eignet
Und darum nicht vergeht.
Und leise flog
Die kühle Höhenluft mir um die Stirn.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

MONTANHAS DENTRO DA NOITE
O lago está apagado,
escuro dorme o canavial
a resmungar em sonho.
Espalham-se terríveis sobre a terra
as longas ameaças das montanhas:
elas não tem descanso,
respiram fundo e ficam
umas de encontro às outras apertadas,
num surdo respirar,
carregadas de forças abafadas
sem remissão numa paixão insaciada

*

BERGE IN DER NACHT
Der See ist erloschen,
Schwarz schläft das Ried,
Im Traume flüsternd.
Ungeheuer ins Land gedehnt
Drohen die hingestreckten Berge.
Sie ruhen nicht.
Sie atmen tief, und sie halten
Einer den andern an sich gedrückt.
Tief atmend,
Mit dumpfen Kräften beladen,
Unerlöst in verzehrender Leidenschaft.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

SOZINHO
Por sabre a terra se estendem
ruas e caminhos mil,
mas levam todos
aos mesmo fim.

De dois em dois, três em três,
indo a pé ou a cavalo,
o último passo – sozinho
há de dá-lo.

Não há, portanto, saber
nem poder algum melhor
do que o difícil a gente
fazer só.

*

ALLEIN
Es führen über die Erde
Strassen und Wege viel, 
Aber alle haben 
Dasselbe Ziel.

Du kannst reiten und fahren
Zu zwein und zu drein,
Den letzten Schritt 
Mußt du gehen allein.

Drum ist kein Wissen
Noch Können so gut,
Als daß man alles Schwere
Alleine tut.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

DE UM ANDAR NOTURNO
Tempestade, chuva oblíqua,
negreja a pradaria,
solenes sombras de nuvens
fazem-nos companhia.

De um vão entre escuras nuvens
súbito a se iluminar
a noite esgueira-se e espia
plena de luar.

Límpidas ilhas do céu,
estrelas sóbrias saúdam;
ao luar, fímbria de nuvens
em rios de prata ondula.

Alma, prepara-te, alma!
Das trevas do tempo,
irmãos de longe te acenam
com pisos de ouro.

Alma, responde ao sinal:
banha-te no espaço!
Deus guiará para a luz
teus obscuros passos.

*

AUF EINEM NÄCHTLICHEN MARSCH
Sturm und schräger Regenstrich,
Schwarze Felderweite,
Wolkenschatten feierlich
Geben uns Geleite.

Plötzlich aus erhelltem Schacht
Dunkler Wolkenhänge
Blickt die monderfüllte Nacht
Still in das Gedränge.

Himmelsinseln blauen rein,
Strenge Sterne grüßen,
Wolkenrand im Mondesschein
Wallt in Silberflüssen.

Seele, Seele, sei bereit!
Ferne Brüder rufen
Aus der Finsternis der Zeit
Dich zu goldnen Stufen.

Seele, nimm das Zeichen an,
Bade dich im Weiten!
Gott wird deine dunkle Bahn
Noch zum Lichte leiten.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

FESTA NOTURNA 
          DOS CHINESES EM SINGAPURA
Ao vaivém das lanternas 
em cima, na varanda engrinaldada,
tranqüilos acocoram-se na noite tranqüila,
dizem versos de bardos mortos há muito tempo,
contentes ouvem as vibrantes notas do alaúde
que faz ainda maiores mais belos os olhos das raparigas.

Na noite sem estrelas a música retine
nos copos, como um toque de asas de grandes libélulas;
olhos castanhos riem-se em quieta ventura.
Ninguém há que não tenha um sorriso nos olhos.
Em baixo, aguarda insone, com mil claros
olhos de luz, à beira-mar, a esplêndida cidade.

*

NACHTFEST 
          DER CHINESEN IN SINGAPUR
Bei den wehenden Lichtern
Oben auf dem bekränzten Balkon
Kauern sie ruhevoll in der festlichen Nacht,
Singen Lieder von lang verstorbenen Dichtern,
Horchen beglückt auf der Laute schwirrenden Ton,
Der die Augen der Mädchen größer und schöner macht.

Durch die sternlose Nacht klirrt die Musik
Gläsern wie Flügelschlag großer Libellen,
Braune Augen lachen in lautlosem Glück –
Keiner, der nicht ein Lächeln im Auge hat!
Drunten wartet schlaflos mit tausend hellen
Lichteraugen am Meere die glänzende Stadt.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

RIO NA MATA
Flui há milênios através da mata
vendo as choupanas dos morenos homens nus,
de madeira e de palha, a alterar-se e a sumir.
Em contínua torrente a sua água marrom
enrola folhas e galhos e barro do mato virgem,
e ferramenta ao calor do sol a pino.
De noite vem o tigre ou vem o elefante
e ávido banha suas poderosas forças
e ruge em surda volúpia varrendo a mata.
Na lama turva e nos capins da mata ronca
o crocodilo, pesado como há milhares
e centenas de milhares anos; esquivo e esguio
irrompe entre os caniços o terrível jaguar.

Aqui na mata eu vivo dias de repouso
em choupanas de palha e em ligeiras canoas,
e é raro ouvir-se um eco do mundo dos homens
a despertar adormecidas lembranças.
No fim da tarde, quando a noite vem
hostil e rápida, eu fico à beira do rio,
pondo-me à escuta, e aqui e ali, próximo e longe, eu ouço
perdidos sons – canto de vozes humanas na noite.
É o pescador ou o caçador que a noite apanha de surpresa 
nos seus pequenos botes
e a quem um medo pueril afrouxa o coração:
medo das forças  e do crocodilo
e das almas dos mortos
que se mexem de noite sobre as águas escuras.

É um canto estranho e sem palavra que eu entenda,
e ainda assim, quando eu estou em casa
ou no Reno ou no Neckar, não soa de outro modo 
á noitinha a canção
que um pescador ou uma rapariga entoa:
respiro medo e respiro saudade 
e o mato bravo e o rio escuro são para mim pátria 
– pois aqui, como em toda parte onde há seres humanos
as almas correm aflitas para perto de seus deuses,
os pavores da noite conjurando com alguma canção.

De regresso ao precário abrigo da choupana
deito-me, tendo em volta a noite e a mata
e o vítreo e estridente zunir da cigarra,
até o sono vir raptar-me e vir a Lua
com sua fria claridade consolar o mundo amedrontado.

*

FLUSS IM URWALD
Seit tausend Jahren fließt er durch den Wald
Und sieht der nackten braunen menschen Hütten
Aus Holz und Rohrgeflecht erstehen und vergehn.
Sein braunes Wasser wälzt im steten Schwall 
Laub und Geäst und dunklen Urwaldschlamm 
Und gärt in brennend steilem Sonnenbrand. 
Nachts kommt der Tiger und Elefant
Und badet gierig seine schwülen Kräfte
Und brüllt in dumpfer Wollust durch den Wald.
Am Ufer rauscht im trüben Schlamm und Rohr
Das schwere Krokodil, heut wie vor tausend
Und hunderttausend Jahren; scheu und schlank
Bricht durch den Schilf der wilde Jaguar.

Hier leb ich stille Tag hin im Wald 
In röhrener Hütte und im leichten Einbaum 
Und selten rührt ein Klang der ...
Und selten rührt ein Klang der Menschenwelt 
Verschlafene Erinnerungen wach.
Am Abend aber, wenn die rasche Nacht 
Sich feindlich naht, steh ich am Strom und lausche 
Und höre da und dort und nah und fern 
Verirrten Laut,
Gesang von Menschenstimmen in der Nacht.
Das sind die Fischer und die Jäger, die
im leichten Boot der Abend überrascht
Und denen kindlich tiefe Furcht das Herz erschlafft,
Furcht vor der Macht und vor dem Krokodil
Und vor den Geistern der Verstorbenen,
Die nachts sich regen überm schwarzen Strom.

Fremd ist das Lied und mir kein Wort vertraut, 
Und klingt mir doch nicht anders als daheim 
Am Rhein und Neckar mir ein Abendlied 
Der Fischer oder Mägde klingt: ich atme Furcht 
Und atme Sehnsucht, und der wilde Wald 
Und fremde dunkle Strom ist mir wie Heimat, 
Weil hier wie überall, wo Menschen sind, 
Sich zage Seelen ihren Göttern nähern, 
Den Schreck der Nacht beschwörend durch ein Lied. 

Heimkehrend in der Hütte kargen Schutz 
Leg ich mich nieder, ringsum Wald und Nacht 
Und gläsern schrillender Zikadensang, 
Bis mich der Schlaf entführt und bis der Mond 
Die bange Welt mit kühlem Schimmer tröstet.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

A UMA CANTORA CHINESA 
Íamos pelo rio sossegado na tarde,
em cor de rosa o pé de acácias reluzia,
em cor de rosa as nuvens – mas eu não via:
só via a flor de cerejeira em teu cabelo.

Ias sorrindo à minha frente no bote enfeitado,
tendo nas mãos habilidosas o alaúde:
entoavas o canto da pátria sagrada,
enquanto nos teus olhos flamejava a juventude.

Junto ao mastro em silêncio eu só pensava em ser
escravo para sempre desses olhos ardentes 
– eternamente a ouvir-te, em misto de enleve e dor,
o teu cantar e o toque das tuas mãos em flor.

*

AN EINE CHINESISCHE SÄNGERIN
Auf dem stillen Flusse sind wir am Abend gefahren,
Rosig stand und beglänzt der Akazienbaum,
Rosig strahlten die Wolken. Ich aber sah sie kaum,
Sah nur die Pflaumenblüte in deinen Haaren.

Lächelnd saßest du vorn im geschmückten Boote,
Hieltest die Laute in der geübten Hand,
Sangest das Lied vom heiligen Vaterland,
Während in deinen Augen die Jugend lohte.

Schweigend stand ich am Mast und wünschte mir, ohne Ende
Dieser glühenden Augen Sklave zu sein,
Ewig dem Liede zu lauschen in seliger Pein
Und dem beglückenden Spiel deiner blumenhaft zarten Hände.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

DE PASSAGEM
À memória de Knulp
.
Não fiques triste: já vem vindo a noite
quando veremos sobre a terra esbranquiçada
a Lua fria, como que a rir-se por dentro,
e então descansaremos de mãos dadas.

Não fiques triste: já vem vindo o tempo
quando teremos sossego. Nossas cruzinhas estão
erguidas juntas na margem clara da vida,
chove e neva,
e os ventos vêm e vão.

*

AUF WANDERUNG
(Dem Andenken Knulps)
.
Sei nicht traurig, bald ist es Nacht,
Da sehn wir über dem bleichen Land
Den kühlen Mond, wie er heimlich lacht
Und ruhen Hand in Hand.
 
Sei nicht traurig, bald kommt die Zeit,
Da haben wir Ruh. Unsre Kreuzlein stehen
Am hellen Straßenrande zu zweit,
Und es regnet und schneit,
Und die Winde kommen und gehen.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

SINA
Em fúria e incompreensão,
como crianças,
nos separamos e nos evitamos,
barrados por estúpida vergonha.

Os anos foram passando por cima,
com remorso e esperança.
Já os jardins da nossa mocidade
rua nenhuma alcança.

*

SCHICKSAL
Wir sind in Zorn und Unverstand
Wie Kinder tun, geschieden
Und haben uns gemieden,
Von blöder Scham gebannt.

Die Jahre gingen drüber her
Mit Reuen und mit Warten.
In unsern Jugendgarten
Führt keine Straße mehr.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

RAMO EM FLOR
Para cá e para lá
sempre se inclina ao vento o ramo em flor,
para cima e para baixo
sempre meu coração vai feito uma criança
entre claros e nebulosos dias,
entre ambições e renúncias.
Até que as flores se espalham
e o ramo se enche de frutos,
até que o coração farto de infância
alcança a paz
e confessa: de muito agrado e não perdida
foi a inquieta jogada da vida.

*

IMMER HIN UND WIDER
Immer hin und wider
Strebt der Blütenzweig im Winde,
Immer auf und nieder
Strebt mein Herz gleich einem Kinde
Zwischen hellen und dunklen Tagen,
Zwischen Wollen und Entsagen.

Bis die Blüten sind verweht
Und der Zweig in Früchten steht,
Bis das Herz, der Kindheit satt,
Seine Ruhe hat
Und bekennt: voll Lust und nicht vergebens
War das unruhvolle Spiel des Lebens.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

PAUSA DE ESQUI
No tope da ladeira, prestes à descida,
firmo-me no bastão para um breve descanso
e fico deslumbrado a ver por toda parte
o mundo em seu revérbero de azul e branco.
Para cima, em silêncio, crista sobre crista,
os solitários montes gelados avisto;
para baixo, a perder-se em meio a tanto brilho,
de vale em vale arroja-se a sinuosa trilha.
Eu me demoro ainda um instante, perplexo,
tocado pela calma e pela solidão,
e desço deslizando pela encosta íngreme,
rumo ao vale, com pressa e sem respiração.

*

SKI-RAST
Am hohen Hang zur Fahrt bereit,
Halt ich am Stab für Augenblicke Rast
Und seh geblendet weit und breit
Die Welt in blau und weißem Glast,
Seh oben schweigend Grat an Grat
Die Berge einsam und erfroren;
Hinabwärts ganz in Glanz verloren
Durch Tal um Tal stürzt der geahnte Pfad.
Betroffen halt ich eine Weile,
Von Einsamkeit und Stille übermannt,
Und gleite abwärts an der schrägen Wand
Den Tälern zu in atemloser Eile. 
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

ODE A HÖLDERLIN
Companheiro da minha juventude: cheio de gratidão retorno a ti,
em certas tardes, quando 
no sabugal do bosque adormecido
ouve-se só a fonte murmurante.

Ninguém sabe de ti, amigo: a nova era 
anda muito distante da tranqüila fascinação da Grécia.
Órfã de deuses e sem coração
erra no pó a insipida multidão.

Mas para o grupo secreto dos que meditam mais fundo,
a quem o Deus tocou com nostalgia a alma,
fazem-se ouvir para esses até hoje
os acordes da tua harpa divina.

Fatigados do dia, com fervor nos voltamos
para a noite ambrosíaca do teu cantar,
cuja asa desdobrada
vem num sonho dourado nos agasalhar.

Ah, e crepita mais forte, quando nos vem o encanto do teu canto,
com mais paixão flameja, rumo à  saudosa terra do passado,
rumo aos templos dos gregos,
a nossa imorredoura saudade de uma pátria.

*

ODE AN HÖLDERLIN
Freund meiner Jugend, zu dir kehr' ich voll Dankbarkeit
Manchen Abend zurùck, wenn im Fliedergebüsch
Des entschlummerten Gartens
Nur der rauschende Brunnen noch tönt.

Keiner kennt dich, o Freund; weit hat die neuere Zeit
Sich von Griechenlands stillen Zaubern entfernt,
Ohne Gebet und entgöttert
Wandelt nüchtern das Volk im Staub.

Aber der heimlichen Schar innig Versunkener,
Denen der Gott die Seele mit Sehnsucht schlug,
Ihr erklingen die Lieder
Deiner göttlichen Harfe noch heut.

Sehnlich wenden wir uns, vom Tag Ermüdete,
Der ambrosischen Nacht deiner Gesänge zu,
Deren wehender Fittich
Uns beschattet mit goldenem Traum.

Ach, und glühender brennt, wenn dein Lied uns entzückt,
Schmerzlicher brennt nach der Vorzeit seligem Land,
Nach den Tempeln der Griechen
Unser ewiges Heimweh auf.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

NA RELVA DEITADO
Então tudo isto é mágica de flores,
é campina estival com seu frouxel de cores,
ampla ternura azul de céu, zumbir de abelhas?
Tudo isto é sonho de algum suspiroso deus?
Forças de instinto a clamar pela redenção?
E na distância a linha da montanha
temerária e formosa a alterar-se no azul,
também é espasmo só?
É só selvagem tensão da natureza em fermento?
É só dor, só tormento, mera agitação
num tatear sem fim, sem sentido e sem glória?
Ah, não! Longe de mim, sonho ruim
das aflições do mundo!
A luz da tarde picam-te nuvens de mosquitos,
atordoam-te aves agourentas,
sopra de ti um vento
que com adulação me esfria o rosto.
Longe de mim, velhíssima dor do homem! 
Pode ser tudo tormento,
pode ser tudo sombra e aflição 
– mas esta hora doce de sol, não,
nem este aroma de trevo encarnado,
nem este intenso e terno bem que estou sentindo
no coração!

*

IM GRASE LIEGEND
Ist dies nun alles, Blumengaukelspiel
Und Farbenflaum der lichten Sommerwiese,
Zartblau gespannter Himmel, Bienensang,
Ist dies nun alles eines Gottes
Stöhnender Traum,
Schrei unbewusster Kräfte nach Erlösung?
Des Berges ferne Linie,
Die schön und kühn im Blauen ruht,
Ist denn auch sie nur Krampf,
Nur wilde Spannung gärender Natur
Nur Weh, nur Qual, nur sinnlos tastende,
Nie rastende, nie selige Bewegung?
Ach nein! Verlass mich du, unholder Traum
Vom Leid der Welt!
Dich wiegt ein Mückentanz im Abendglast,
Dich wiegt ein Vogelruf,
Ein Windhauch auf, der mir die Stirn
Mit Schmeicheln kühlt.
Verlass mich du, uraltes Menschenweh!
Mag alles Qual,
Mag alles Leid und Schatten sein -
Doch diese eine süße Sonnenstunde nicht,
Und nicht der Duft vom roten Klee,
Und nicht das tiefe, zarte Wohlgefühl
In meiner Seele.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

CEMITÉRIO RÚSTICO
Trepadeiras galgando as cruzes inclinadas,
sol manso, doce aroma e zumbido de abelhas.

Felizes de vós, que jazeis em segurança
aconchegados ao bom coração da terra!

Felizes de vós, que tranqüilos e sem nome
descansais retornados ao seio materno!

Mas escutai: no vôo de abelhas e nas flores
pulsa uma ânsia de vida e um prazer de existir,

do fundo sono das raízes vem à tona
o anelo da substância há longo tempo morta,

há destroços de vida enterrados no escuro
a se transfigurar e a clamar por presença,

e regiamente vai a mãe-terra cedendo
em meio à urgência de tão vários nascimentos.

Não: no fundo da cova o tesouro da paz
não pesa mais que um sonho no fundo da noite.

Turva fumaça apenas é a ilusão da morte,
e por trás dela a vida é que é o fogo forte.

*

LÄNDLICHER FRIEDHOF
Über schiefen Kreuzen Efeuhang,
Sanfte Sonne, Duft und Bienensang

Selig Ihr, die ihr geborgen liegt,
An der guten Erde Herz geschmiegt

Selig, die ihr sanft und namenlos
Heimgekehrte, ruht im Mutterschoß!

Aber horch: aus Bienenflug und Blust
Atmet Lebensgier und Daseinslust

Aus der Tiefe Wurzelträumen bricht
Längst erloschener Wesen Drang ans Licht,

Lebenstrümmer dunkel eingescharrt
Wandeln sich und heischen Gegenwart

Und die Erdenmutter königlich
Rührt in drängenden Geburten sich

Nein, der Friedenshort im Grabesschacht
Wiegt nicht schwerer als ein Traum der Nacht;

Trüber Rauch nur ist der Traum vom Tod
Unter dem des Lebens Feuer loht
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

ANTE UMA COLEÇÃO 
DE ESCULTURAS EGÍPCIAS
De trás das gemas dos olhos
silenciosos e eternos olhais
para nós: retardatários irmãos.
Parece que nem ânsia nem amor
conhecem vossas brilhantes feições polidas.
Soberanos e aos astros irmanados,
um dia incompreendidos,
entre templos vagastes.
Como um distante olor divino, a santidade
em vossos rostos ainda hoje sopra,
a dignidade rodeia-vos os joelhos.
Vossa beleza respira serena:
na eternidade tendes vossa pátria.

Mas nós, irmãos mais novos,
sem deuses tropeçando numa vida enganosa,
vemos abrir-se avidamente às nossas almas
todos os torvelinhos da paixão,
cada saudade em brasa.
Nossa meta é a morte,
nosso credo a inconstância;
não há lapso de tempo que se contraponha
à nossa efígie súplice.
E contudo trazemos nós também
o estigma de um secreto vínculo espiritual 
em fogo na alma:
nós pressentimos deuses e sentimos
perante vós, silenciosas imagens da antiguidade,
amor sem medo. Nos vedes 
sem ódio a nenhum ente, nem à morte:
o sofrer e o morrer
não nos abalam a alma,
pois aprendemos a amar mais profundamente.

É do pássaro o nosso coração,
e do mar e do bosque; aos miseráveis
e aos escravos tratamos como irmãos,
e à pedra e ao animal também chamamos com amorosos nomes.
Sendo assim as imagens 
do nosso efêmero ser
não nos hão de sobreviver em dura pedra:
sorridentes se desvanecerão
e em transitória poeira de sol
novos encantos e tormentos, a cada momento,
impacientes e perpétuas ressuscitarão.

*

IN EINER SAMMLUNG 
ÄGYPTISCHER BILDWERKE
Aus den Edelsteinaugen
Blicket ihr still und ewig
Über uns späte Brüder hinweg.
Nicht Liebe scheint noch Verlangen
Euren schimmernd glatten Zügen bekannt.
Königlich und den Gestirnen verschwistert
Seid ihr Unbegreiflichen einst
Zwischen Tempeln geschritten,
Heiligkeit weht wie ein ferner Götterduft
Heut noch um eure Stirnen,
Würde um eure Knie;
Eure Schönheit atmet gelassen,
Ihre Heimat ist Ewigkeit.

Aber wir, eure jüngeren Brüder,
Taumeln gottlos ein irres Leben entlang,
Allen Qualen der Leidenschaft,
Jeder brennenden Sehnsucht
Steht unsre zitternde Seele gierig geöffnet.
Unser Ziel ist der Tod,
Unser Glaube Vergänglichkeit,
Keiner Zeitenferne
Trotzt unser flehendes Bildnis.
Dennoch tragen auch wir
Heimlicher Seelenverwandtschaft Merkmal
In die Seele gebrannt,  Ahnen Götter und fühlen vor euch,
Schweigende Bilder der Vorzeit,
Furchtlose Liebe. Denn sehet,
Uns ist kein Wesen verhasst, auch der Tod nicht,
Leiden und Sterben
Schreckt unsre Seele nicht,
Weil wir tiefer zu lieben gelernt!

Unser Herz ist des Vogels,
Ist des Meeres und Walds, und wir nennen
Sklaven und Elende Brüder,
Nennen mit Liebesnamen noch Tier und Stein.
So auch werden die Bildnisse
Unsres vegänglichen Seins
Nicht im harten Steine uns überdauern;
Lächelnd werden sie schwinden
Und im flüchtigen Sonnenstaub
Jeder Stunde zu neuen Freuden und Qualen
Ungeduldig und ewig auferstehn.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

À MELANCOLIA
No vinho ou entre amigos, de ti eu fugia,
pois do teu olho escuro eu sentia pavor:
ingrato filho teu, assim eu te esquecia
ao toque do alaúde e nos braços do amor.

Com toda a discrição, no entanto, me seguias:
sempre estavas no vinho que eu tonto bebia
e no mormaço das minhas noites de amor
e no desdém com que eu a ti me referia.

Agora me refrescas os membros cansados
e tens minha cabeça em teu colo macio,
para o regresso das minhas longas viagens
— pois a ti me traziam todos os meus desvios.

*

AN DIE MELANCHOLIE
Zum Wein, zu Freunden bin ich dir entflohn,
da mir vor deinem dunklen Auge graute, 
in Liebesarmen und beim Klang der Laute
vergaß ich dich, dein ungetreuer Sohn.

Du aber gingst mir verschwiegen nach
Und warst im Wein, den ich verzweifelt zechte,
warst in der Schwüle meiner Liebesnächte
Und warest noch im Hohn, den ich dir sprach.

Nun kühlst du die erschöpften Glieder mir
Und hast mein Haupt in deinen Schoß genommen,
da ich von meinen Fahrten heimgekommen:
denn all mein Irren war ein Weg zu dir.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

ROSA BRANCA AO CREPÚSCULO
Inclinas triste o rosto
nas folhas, para a morte,
respiras luz fantástica
e emites sonhos pálidos.

Íntima como um canto,
à última luz flutua
no quarto, a tarde toda,
a doce fragrância tua.

No inefável se engaja
tua alma temerosa,
e vai rindo e morrendo
em meu peito, irmã rosa.

*

WEISSE ROSE IN DER DÄMMERUNG
Traurig lehnst du dein Gesicht
Übers Laub, dem Tod ergeben,
Atmest geisterhaftes Licht,
Lässest bleiche Träume schweben.

Aber innig wie Gesang
Weht im letzten leisen Schimmer
Noch den ganzen Abend lang
Dein geliebter Duft durchs Zimmer

Deine kleine Seele wirb
Ängstlich um das Namenlose,
Und sie lächelt, und sie stirbt
Mir am Herzen, Schwester Rose.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

A MEU IRMÃO
Quando revemos nossa casa, agora,
andamos encantados pelos cômodos,
ficamos longo tempo no jardim
onde – meninos levados – brincávamos.

E de todos os outros esplendores
que pelo mundo afora conquistamos,
nenhum mais nos alegra nem agrada
quando o sino da igreja faz-se ouvir.

Calados repisamos velhas trilhas
cruzando o verde terreno da infância:
e elas no coração tornam-se vivas,
grandes e estranhas, como um belo conto.

Mas tudo o que estaria à nossa espera
já não há de ter mais o puro brilho
de outrora – quando, ainda rapazolas
no jardim caçávamos borboletas.

*

MEINEM BRUDER
Wenn wir jetzt die Heimat wieder sehen,
Gehen wir bezaubert durch die Stuben,
Bleiben lang im alten Garten stehen,
Wo wir einst gespielt als wilde Buben.

Und von jenen Herrlichkeiten allen,
Die wir draußen in der Welt erbeutet,
Will uns keine freun mehr und gefallen,
Wenn daheim die Kirchenglocke läutet.

Stille gehen wir die alten Wege
Durch das grüne Land der Kindertage,
Und sie werden uns im Herzen rege,
Fremd und groß wie eine schöne Sage.

Ach, und alles, was auf uns mag warten,
Wird den einen Glanz doch nicht mehr haben
Wie vor Zeiten, da wir noch als Knaben
Falter fingen, jeder Tag im Garten.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

CHEGADA A CREMONA
Canta a chuva, a planície está cheia de noite,
vem das árvores altas um som fresco e úmido;
ternos toques de sino pingam do cruzeiro
e, embalados de manso pela chuva, dormem.

Ao clarão de lanternas, por alegres ruas
vou tranqüilo a vagar pela cidade estranha:
escurecem telhados, janelas se embaçam,
calmos burgueses sentam-se à roda do vinho.

Escancara-se um átrio defronte aos meus passos
e vagarosamente uma escada me leva
a um alpendre, em colunas, pelas lajes úmidas 
a minha fraca sombra parece escorrer.

Eis que do átrio vejo então abrir-se o poço:
detenho-me assustado – prédio atrás de prédio,
erguem-se a catedral, a torre, o palacete,
e lá no alto choca a noite fabulosa.

Apenas entrevista, tudo é familiar
e soa bem perante o assombrado olhar,
com a harmonia e com a pureza da música
límpida como uma canção do Paraíso.

Sonhados por criaturas de um tempo diverso,
erguem-se a catedral e a torre e o palacete
com majestade, e falam-me, e a Eternidade
entre as colunas sopra e das arcadas ri.

*

ANKUNT IN CREMONA
Der Regen singt, die Ebene liegt voll Nacht,
In hohen Bäumen ist rauscht naß und kühl,
Zart tropfen Glockentöne vom Gestühl
Und schlafen ein, vom Regen verlacht Gesetze.

Durch die Gassen bei Laternenschein
Zieh ich gelassen in die fremde Stadt,
Gewölbe dunkeln, Fenster schimmern matt,
Friedvolle Bürger sitzen noch beim Wein.

Ein Bogengang Hallt auf von Meinem Tritt,
Und eine Treppe leitet mich gemach
Im Gewölb, in Saulen hin und schwach
Läuft überm feuchten Stein mein Schatten mit.

Weit öffnet nun die Halle ihren Schacht,
Erschrocken halt ich: riesig Bau an Bau
Ragt Dom, Turm und Palast, darüber blau
Und schweigsam brütet ungeheure Nacht.

Und kaum erschaut, das ist alles wie bekannt
Und klingt beseligt dem erstaunten Blick
Wohllaut und rein entgegen wie Musik,
Hölle wiein Lied aus Paradiesesland.

Erträumt von Menschen einer andern Zeit
Steht Dom, Turm und Palast voll Majestät
Nein spricht zu mir, nein aus den Saulen weht.
Unden den Bogen Lächelt Ewigkeit. 
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

NA HORA DE DORMIR
Depois que o dia exausto me deixou,
amavelmente a noite constelada
há de acolher meu ardente desejo
como a uma criança fatigada.

Mãos, esquecei todos os afazeres!
Rosto, deixa o pensar ao abandono!
Agora todos os sentidos meus
querem afundar no sono.

A alma, sem ter quem tome conta dela,
em vôos libérrimos quer flutuar
e no círculo mágico da noite
a vida de mil formas esgotar.

*

BEIM SCHLAFENGEHEN
Nun der Tag mich müd' gemacht,
soll mein sehnliches Verlangen
freundlich die gestirnte Nacht
wie ein müdes Kind empfangen.

Hände, lasst von allem Tun,
Stirn, vergiss du alles Denken, 
alle meine Sinne nun
wollen sich in Schlummer senken.

Und die Seele unbewacht
will in freien Flügen schweben,
um im Zauberkreis der Nacht
tief and tausendfach zu leben.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

DIA DE PRIMAVERA
Vento na mata e piar de pássaros;
lá, no mais alto e mais doce azul,
soberbo e leve barco de nuvens...
Eu sonho com certa mulher loura
e nos meus tempos de jovem penso:
o céu altíssimo azul e extenso,
abre-se em meu berço de saudade
onde, a cismar aquietado
em tépida bem-aventurança,
a ressonar de leve me embalo
como nos braços da mãe
uma criança

*

FRÜHLINGSTAG
Wind im Gesträuch und Vogelpfiff
Und hoch im höchsten süßen Blau
Ein stilles, stolzes Wolkenschiff. . .
Ich träume von einer blonden Frau,
Ich träume von meiner Jugendzeit,
Der hohe Himmel blau und weit
Ist meiner Sehnsucht Wiege,
Darin ich stillgesinnt
Und selig warm
Mit leisem Summen liege,
So wie in seiner Mutter Arm
Ein Kind.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

NENHUM SOSSEGO
Alma, pássaro assustado,
tu sempre perguntarás:
quando, após tantos maus dias,
vem a calma, vem a paz?

Mas sei: tão logo tenhamos
calmos dias sob a terra,
com saudade hás de fazer
de cada dia uma praga.

E, apenas salva, estarás
cansando-te em outras penas:
e impaciente arderás como
a mais jovem das estrelas.

*

KEINE RAST
Seele, banger Vogel du, 
Immer wieder mußt du fragen:
Wann nach so viel wilden Tagen 
Kommt der Friede, kommt die Ruh? 

O ich weiß: kaum haben wir 
Unterm Boden stille Tage, 
Wird vor neuer Sehnsucht dir
Jeder liebe Tag zur Plage. 

Und du wirst, geborgen kaum,
Dich um neue Leiden mühen
Und voll Ungeduld den Raum 
Als der jüngste Stern durchglühen.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

SOLENE MÚSICA DO ENTARDECER
ALLEGRO
Nuvens esgarçam-se; do céu em brasa
errante luz bruxuleia sobre vales ofuscados.
Pando com o vento quente da procela
fujo a passo incansável
atravessando uma vida nublada.
Ah, se por um instante
ao menos, entre mim e a luz eterna
uma propícia borrasca soprasse o cinzento nevoeiro!
Estrangeira é a terra que me cerca:
leva-me longe, arrancado da pátria,
de um lado para outro o poderoso vagalhão do destino.
Vamos, vento: corre com essas nuvens,
rasga esses véus
para que a luz me possa cair sobre os incertos atalhos!

ANDANTE
Consolador ainda
e sempre novo em resplendor de eterna criação
o mundo a meus olhos ri,
vive e cresce em mil formas respirantes,
adeja a borboleta ao vento e ao sol,
a andorinha veleja em glorioso azul,
estua o mar no litoral rochoso.
Ainda e sempre árvores e estrelas,
nuvens e pássaros são meus parentes próximos,
o rochedo me faz sinais de irmão,
amigável me chama o infinito mar.
Insensato me leva meu caminho
a uma perdida lonjura azul:
em parte alguma um sentido, nenhures meta segura.
Cada regato na mata, contudo,
cada mosca a zumbir, vem me falar de uma profunda lei,
uma sagrada ordem,
pela qual sobre mim também se estende a abóboda celeste,
pela qual sons secretos
como ao passar dos astros
no pulsar do meu coração também retinem.

ADÁGIO
Repõe o sonho o que o dia consome;
à noite, quando a vontade sucumbe,
afloram forças libertas
acompanhando divinos pressentimentos.
Murmuram bosque e rio, e através da alma esperta
um relâmpago cruza o céu de azul de noite.
Dentro e fora de mim
é o mesmo: somos um, o mundo e eu.
A nuvem flutua em meu coração,
sonha meu sonho o bosque,
contam-me a casa e a pereira
as esquecidas sagas de uma infância comum.
Em mim ressoam rios e ensombram-se barrancos,
são companheiras íntimas a lua e as estrelas pálidas.
E a benfeitora noite
que sobre mim se inclina com nuvens macias
tem o semblante de minha mãe,
e sorrindo me beija com amor inexaurível,
sonhadora balança como nos velhos tempos
a adorável cabeça, e seus cabelos
pelo mundo flutuam, e estremecem
em palidez inquieta os milhares de estrelas.

*

FEIERLICHE ABENDMUSIK
ALLEGRO
Gewölk zerreisst, vom glühenden Himmel her
Irrt taumelndes Licht ueber geblendete Täler.
Mitgeweht vom föhnigen Sturm
Flieh ich mit unermüdetem Schritt
Durch ein bewölktes Leben.
Oh, dass nur immer für Augenblicke
Zwischen mir und dem ewigen Licht
Gütig ein Sturm die grauen Nebel verweht!
Fremdes Land umgibt mich,
Losgerissen treibt von der Heimat fern
Mich des Schicksals mächtige Woge umher.
Jage die Wolken, Föhn,
Reisse die Schleier hinweg,
Dass mir Licht auf die zweifelnden Pfade falle.

ANDANTE
Immer wieder tröstlich
Und immer wieder neu in ewiger Schöpfung Glanz
Lacht mir die Welt ins Auge,
Lebt und regt sich in tausend atmenden Formen,
Flattert Falter im sonnigen Wind,
Segelt Schwalbe in seliger Bläue,
Strömt Meerflut am felsigen Strand.
Immer wieder ist Stern und Baum,
Ist mir Wolke und Vogel nahe verwandt,
Grüsst mich als Bruder der Fels,
Ruft mir freundschaftlich das unendliche Meer.
Unverstanden führt mich mein Weg
Einer blau verlorenen Ferne zu,
Nirgends ist Sinn, nirgends ein sicheres Ziel -
Dennoch redet mir jeder Waldbach,
Jede summende Fliege von tiefem Gesetz,
Heiliger Ordnung,
Deren Himmelsgewölb auch mich überspannt,
Deren heimliches Tönen
Wie im Gang der Gestirne
So auch in meines Herzens Taktschlag klingt. 

ADAGIO
Traum gibt, was Tag verschloss;
Nachts, wenn der Wille erliegt,
Streben befreite Kräfte empor,
Göttlicher Ahnung folgend.
Wald rauscht und Strom, und durch den regen
Nachtblauen Himmel Wetterleuchten weht.
In mir und ausser mir
Ist ungeschieden, Welt und ich ist eins.
Wolke weht durch mein Herz,
Wald träumt meinen Traum,
Haus und Birnbaum erzählen mir 
Die vergessene Sage gemeinsamer Kindheit.
Ströme wallen und Schluchten schatten in mir,
Mond ist und bleicher Stern mein vertrauter Gespiele.
Aber die milde Nacht,
Die sich über mich mit sanftem Gewölke neigt,
Hat meiner Mutter Gesicht,
Küsst mich lächelnd in unerschöpflicher Liebe,
Schüttelt träumerisch wie in alter Zeit
Ihr geliebtes Haupt, und ihr Haar
Wallt durch die Welt, und es zittern
Blass aufzuckend darin die tausend Sterne. 
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

BHAGAVAD GITA
Mais uma vez deitado e insone, horas e horas,
a alma ferida e cheia de incrível tristeza.

Incêndio e morte eu via na terra a arder,
mil inocentes a sofrer, morrer, apodrecer.

E no meu coração eu reneguei a guerra,
cega deusa de males e aflições sem sentido.

E eis que me assoma a ressoar, então,
a relembrança da sombria solidão,

e a palavra de paz me vem trazer
de um velho livro sagrado da índia:

“Guerra ou paz, uma ou outra tanto faz,
pois morte alguma afeta o reino do espírito.

Abra-se ou feche-se o pano da paz,
não diminui a penúria do mundo.

Portanto, luta e não fiques inerte:
é desígnio de Deus que cries forças.

Mas, ainda que te leve a luta a mil triunfos,
há de continuar batendo intacto o coração do mundo.”

*

BHAGAVAD GITA
Wieder lag ich schlaflos Stund um Stund,
Unbegriffenen Leids die Seele voll und wund.

Brand und Tod sah ich auf Erden lodern,
Tausende unschuldig leiden, sterben, modern.

Und ich schwor dem Kriege ab im Herzen
Als dem blinden Gott sinnloser Schmerzen.

Und es sprach zu mir den Friedensspruch
Ein uraltes indisches Götterbuch:

“Krieg und Friede, beide gelten gleich,
dein Tod berührt des Geistes Reich.

Darum kämpfe du und lieg nicht stille;
Dass du Kräfte regst, ist Gottes Wille!

Doch ob dein Kampf zu tausend Siegen führt,
Das Herz der Welt schlägt weiter unberührt.”
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

PAZ
Todos a tinham,
valor ninguém lhe dava:
esbanjavam-se todos em sua doce fonte...
Ah, como soa agora esta palavra – Paz!

Deixa-se ouvir à distância e a medo,
deixa-se ouvir encharcada de lágrimas;
ninguém sabe nem advinha o dia,
nele pensando todos cheios de ansiedade.

Em tua direção
vão toda noite os olhos do meu sonho
e impacientes palpam uma viva esperança,
já pressentindo o fruto louro da árvore.

Bem-vinda seja, um dia,
como acima do sangue e da miséria
no céu da terra brilhavas 
– arrebol de um futuro muito outro!

*

FRIEDE
Jeder hat's gehabt,
Keiner hat's geschätzt,
Jeden hat der süsse Quell gelabt,
O wie klingt der Name Friede jetzt!

Klingt so fern und zag,
Klingt so tränenschwer,
Keiner weiß und kennt den Tag,
Jeder sehnt ihn voll Verlangen her.

Dir entgegen blickt
Jede Nacht mein Traum,
Ungeduldig rege Hoffnung pflückt
Ahnend schon die goldne Frucht vom Baum.

Sei willkommen einst,
Wenn aus Blut und Not
Du am Erdenhimmel uns erscheinst,
Einer andern Zukunft Morgenrot!
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

VIVÊNCIA NOVA
Mais uma vez eu vejo véus caírem,
e o mais familiar torna-se estranho:
novos espaços siderais acenam,
a alma salta freada pelo sonho.

Em retirados círculos de novo
ao meu redor vai-se ordenando o mundo,
e eu vejo em mim um sábio envaidecido
igual a uma criança dentro dele.

Mas já de anteriores nascimentos
vago pressentimento me palpita:
astros caíram e nasceram astros,
porém vazio nunca esteve o espaço.

A alma curva-se humilde e se levanta,
respira no infinito,
e de esgarçados fios se entretecem
novas e belas as vestes de Deus.

*

NEUES ERLEBEN
Wieder seh ich Schleier sinken,
Und Vertrautestes wird fremd,
Neue Sternenräume winken,
Seele schreitet traumgehemmt.

Abermals in neuen Kreisen
Ordnet sich um mich die Welt,
Und ich seh mich eiteln Weisen,
Als ein Kind hineingestellt.

Doch aus früheren Geburten
Zuckt entfernte Ahnung her:
Sterne sanken, Sterne wurden,
Und der Raum war niemals leer.

Seele beugt sich und erhebt sich,
Atmet in Unendlichkeit,
Aus zerrißenen Fäden webt sich
Neu und schöner Gottes Kleid.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

SUL
Exíguos becos, frescos abismos de sombra,
cristal de mar, ar de serena claridade,
argênteas árvores em austeros jardins,
gente criança a fazer coisas e negócios,
livre e sem pejo a pobreza apanhando sol 
junto aos muros com os dourados camaleões.

Tudo quanto  por longas luas cor de cinza 
eu me pintava em ansiedade e sonho e canto,
abre-se imperturbavelmente à boa sorte;
curvam-se em fila as arcadas acolhedoras,
um odor acre têm no sul a fruta e o vinho
tinto vertido fartamente com jactância.

Acolá, sobre a fímbria clara da montanha,
meu coração rebusca a pátria sempre longe 
– o império límpido das nuvens e do vento:
nunca mais há de pertencer-me o doce sul,
nunca mais há de dar-me entrada o Paraíso,
nunca mais há de ser criança o homem adulto.

*

SÜDEN 
Kühler Gassen enge Schattenkluft, 
Meerkristall und heiter-helle Luft, 
Silberbäume wehn in strengen Gärten. 
Kindermenschen treiben Markt und Kram,
Armut sonnt sich frei und ohne Scham 
An den Mauern bei den Goldlazerten. 

Alles wie ich's graue Monde lang. 
Mir gemalt in Sehnsucht, Traum, Gesang, 
Alles heiter und dem Glück erschlossen: 
Gastlich wölben Bogen sich in Reihn, 
Südfrucht duftet herb und roter Wein, 
Prahlerisch im Überfluß vergossen.

Drüben überm weißen Bergesrand 
Sucht mein Herz das ferne Vaterland, 
Kühles Reich der Wolken und der Winde. 
Nimmer wird der süße Süden mein, 
Nimmer läßt das Paradies mich ein, 
Nimmer wird der Mann zum Kinde.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

DIA NA SERRA
Canta, coração meu: é hoje o teu momento!
Amanhã estás morto:
estrelas brilham e tu não vês,
pássaros cantam e tu não ouves.
Canta, coração meu, que é teu este momento:
o teu fugaz momento!

Sobre a neve irisada e resplendente sorri o sol,
nuvens ao longo pairam coroando a várzea,
tudo é novo, tudo é calor e brilho,
não há sombra que pese nem aflição que doa.
Respirar é tão bom: respirar é um dom,
é prece e cântico.
Alma, respira: abre-te bem ao sol,
enquanto dura o teu fugaz momento!

É doce a vida, a dor é doce, e o enlevo:
feliz de cada floco em pó ao vento,
feliz de mim – cerne de Criação,
dileto filho da Terra e do Sol,
por um momento,
por um risonho momento,
até que o floco se dissipe ao vento!

Canta coração meu: é hoje o teu momento!
Amanhã estás morto:
estrelas brilham e tu não vês,
pássaros cantam e tu não ouves.
Canta, coração meu, que é teu este momento:
o teu fugaz momento!

*

TAG IM GEBIRG
Singe, mein Herz, heut ist deine Stunde!
Morgen, da liegst du tot:
Sternen scheinen, du siehst sie nicht,
Vögel singen,du hörst sie nicht –
Singe, mein Herz, so lang deine Stunde loht,
Deine Flüchtige Stunde!

Sonne lacht überm sternig flimmernden Schnee,
Wolken ruhen fern überm Tale im Kranz,
Alles ist neu, alles ist Glut und Glanz,
Kein Schatten drückt, keine Sorge tut weh,
Atmen tut wohl, Atmen ist Seligkeit,
Ist Gebet und Gesang,
Atme, Seele, öffne der Sonne dich weit
Deine flüchtige Stunde lang!

Süß ist Leben, süß ist Wonne und Schmerz, 
Selig jede verstäubende Flocke im Wind,
Selig bin ich, ich bin der Schöpfung Herz, 
Bin der Erde und Sonne geliebtes Kind 
Eine Stunde lang, 
Eine lachende Stunde lang, 
Bis die Flocke verstiebt im Wind.

Singe, mein Herz, heut ist deine Stunde!
Morgen, da liegst du tot:
Sternen scheinen, du siehst sie nicht,
Vögel singen,du hörst sie nicht –
Singe, mein Herz, so lang deine Stunde loht,
Deine Flüchtige Stunde!
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

DIAS DO DESTINO
Quando são de espantar os dias turvos
e o mundo hostil e frio se apresenta,
amedronta-se a confiança tua
a depender de ti completamente.

Mas fechado em ti mesmo, desterrado
do país da relembrada alegria,
vais entrevendo paraísos novos
em que a crença tua se repatria.

Já reconheces como afim de ti
o que antes parecia adverso e estranho,
e passas a chamar com novo nome
o destino que tu vais aceitando.

O que fora ameaça de esmagar-te,
mostra-se afável, a respirar luz:
é qual um mensageiro, qual um guia
que bem alto mais alto te conduz.

*

SCHICKSALSTAGE
Wenn die trüben Tage grauen,
Kalt und feindlich blickt die Welt,
Findet scheu sich dein Vertrauen
Ganz auf dich allein gestellt.

Aber in dich selbst verwiesen
Aus der alten Freuden Land,
siehst du neuen Paradiesen
Deinen Glauben zugewandt.

Als dein Eigenstes erkennst du,
Was dir fremd und feind erschien,
Und mit neuen Namen nennst du
Dein Geschick und nimmst es hin.

Was dich zu erdrücken drohte,
Zeigt sich freundlich, atmet Geist,
Ist ein Führer, ist ein Bote,
Der dich hoch und höher weist.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

RELENDO MALER NOLTEN
Humilde bato uma vez mais ao teu portão
e vou entrando pelo jardim muito amado:
a predileta flor da minha juventude
aspiro então com sentido mais apurado.

Da minha idade juvenil me vem o aroma
das longas horas em que eu enlevado lia;
jamais, porém, como nesta hora de tristeza,
senti o profundo valor de tanta poesia.

De frias grutas vêm cantar-me ao coração
uma paixão dulcíssima e flores se abrindo:
vai-se tornando sagrado o que antes doía,
e, ao sinal da poesia, aprendo a dor sorrindo.

*

BEIM WIEDERLESEN DES MALER NOLTEN
Bescheiden klopf ich wieder an dein Tor
Und tret in den geliebten Garten ein,
Da atm ich meiner Jugend Lieblingsflor
Aufs neue mit geschärften Sinnen ein.

Herüber duftet aus der Jugendzeit
Begeisterung entrückter Lesestunden,
Doch hab ich nie so tief wie jetzt im Leid
Geliebter Dichtung innigen Wert empfunden.

Aus kühlen Grotten ruft mir Blütenglut
Und süße Leidenschaft ihr Lied ins Herz,
Und heilig wird, was sonst so wehe tut;
Die Dichtung winkt, und lächeln lernt der Schmerz.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

FLOR, ÁRVORE, PÁSSARO
Estás só, no vazio:
ardes só, coração.
Saúda-te, do abismo,
negra flor de aflição.

Alteia bem seu caule
a árvore da tristeza:
entre seus ramos canta
o pássaro do eterno.

A dor da flor é muda:
não encontra palavras.
A árvore chega às nuvens
e canta sempre o pássaro.

*

BLUME, BAUM, VOGEL
Bist allein im Leeren,
Glühst einsam, Herz,
Grüßt dich am Abgrund
Dunkle Blume Schmerz.

Reckt seine Äste
Der hohe Baum Leid,
Singt in den Zweigen
Vogel Ewigkeit.

Blume Schmerz ist schweigsam,
Findet kein Wort,
Der Baum wächst bis in die Wolken,
Und der Vogel singt immerfort. 
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

PRIMAVERA EM LOCARNO
Frondes agitam-se em trevoso fogo.
No confiante anil
tudo se mostra mais novo ao olhar,
mais infantil.

Degraus velhos, bastante transitados,
afagam a montanha
com prudência; de requeimados muros
me chamam ternas flores prematuras.

No agrião verde um regato coleia,
pinga a pedra e o sol lambe:
eis-me pronto a esquecer o gosto amargo
que tem a terra alheia.

*

FRÜHLING IN LOCARNO
Wipfel wehn in dunklem Feuer,
Im vertrauensvollen Blau
Zeigt sich kindlicher und neuer
Alles aufgetan zur Schau.

Alte oftbegangne Stufen
Schmeicheln klug den Berg hinan,
Von verbrannter Mauer rufen
Frühste Blumen zart mich an.

Bergbach wühlt in grünen Kressen,
Felsen tropft und Sonne leckt,
Sieht mich willig zu vergessen,
Daß die Fremde bitter schmeckt.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

CHUVA
Morna chuva de verão
chia no mato, na árvore:
ó, que bênção, outra vez
sonhar até me fartar!

Demorei tanto no claro,
que estranho a onda de agora:
ter casa na própria alma,
infenso a apelos de fora.

Nada almejo, nada peço:
nanas de criança canto
e vou retornando ao lar
de morno sonhado encanto.

Coração, como és sofrido!
Que bom às cegas saltar
só sentindo, só sentindo
sem saber e sem pensar!

*

REGEN
Lauer Regen, Sommerregen
Rauscht von Büschen, rauscht von Bäumen.
O wie gut und voller Segen,
Einmal wieder satt zu träumen!

War so lang im Hellen draussen,
Ungewohnt ist mir dies Wogen:
In der eignen Seele hausen,
Nirgends fremdwärts hingezogen.

Nichts begehr ich, nichts verlang ich,
Summe leise Kindertöne,
Und verwundert heim gelang ich
In der Träume warme Schöne.

Herz, wie bist du wund gerissen
Und wie selig, blind zu wühlen,
Nichts zu denken, nichts zu wissen,
Nur zu atmen und zu fühlen!
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

COMOÇÃO
Turvou-se de repente o vinho no meu copo,
fatigado sentei-me e pus-me a olhar o chão:
Senti branco o cabelo e vago o coração.
Riam alto os amigos, bêbados, no salão.

Veio à janela a amiga de minha juventude:
a Lua, a dilatar o saguão com seu brilho,
reluzindo em meu copo e nas lágrimas minhas.
Cantavam e berravam, bêbados, meus amigos.

Hora após hora eu ando agora, e em minhas faces
em fogo sinto os ventos de um distante verão;
vocalizo canções de quando era rapaz,
penso na pátria – e sei que não a encontro mais.

*

ERSCHÜTTERUNG
Trübe ward mir plötzlich der Wein im Becher,
Müde saß ich und mußte zu Boden schauen,
Fühlte mein Herz stillstehn und mein Haar ergrauen.
Lärmend lachten im Saal meine Freunde, die Zecher.

Da im Fenster erschien meiner Jugend Vertrauter,
Glänzender Mond, und schien die Halle zu dehnen,
Blitzte im Kelch und in meinen ausbrechenden Tränen.
Meine Freunde, die Zecher, sangen und jubelten lauter.

Stund um Stunde nun wandre ich und fühle die Winde
Ferner Sommer auf meinen brennenden Wangen,
Summe Lieder, die einst wir als Knaben sangen,
Denke der Heimat und weiß, daß ich nie mehr sie finde.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

SOLITÁRIO ANOITECER
Na vazia garrafa e no copo
bruxuleia a luz da vela.
Dentro do quarto faz frio.
Lá fora a chuva cai mole na relva.
Mais uma vez te recostas para um pequeno descanso,
curtindo o frio e a desolação.
Manhã e tarde passam e voltam,
sempre passam e voltam,
mas tu não.

*

EINSAMER ABEND
In der leeren Flasche und im Glas
Wankt der Kerze Schimmer;
Es ist kalt im Zimmer.
Draußen fällt der Regen weich ins Gras.
Wieder legst du nun zu kurzer Ruh
Frierend dich und traurig nieder.
Morgen kommt und Abend wieder,
Kommen immer wieder,
Aber niemals du.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

A NOITE
Rescende a flor na várzea,
longínqua flor da infância
que só de raro em raro ao sonhador
abre o velado cálice
e deixa ver – cópia do sol – seu interior.
Por cima das cordilheiras azuis
cega a noite vagueia
puxando sobre o seio a veste escura:
sorrindo esparze a esmo
sua dádiva – o sonho.
Curtidos pelo dia, em baixo dormem
os homens: têm os olhos
cheios de sonhos,
alguns viram o rosto suspirando
para as flores da infância
cujo aroma os atrai de leve na penumbra,
e ao severo chamado paternal do dia
confortados se alheiam.
Para o exausto, é um alívio
refugiar-se nos braços da mãe
que os cabelos do sonhador alisa
com mãos despreocupadas.
Somos crianças, logo nos fatiga o sol 
– ainda que seja para nós destino e futuro sagrado –
e tombamos a cada anoitecer
pequeninos de novo no regaço da mãe,
balbuciamos palavras da infância,
palpamos o caminho do regresso às origens.
Também o pesquisador solitário
que para o vôo ao sol se propusera
vacila, também ele, à meia-noite
voltado para o ponto de partida longe.
E o que dorme, quando um pesadelo o desperta,
confusa a alma, pressente no escuro
a hesitante verdade:
toda corrida, para o sol ou para a noite,
conduz à morte, leva a novo nascimento,
dores que a alma receia.
Mas seguem todos o mesmo caminho:
todos morrem e tornam a nascer,
porque a eterna mãe
devolve-os eternamente ao dia.

*

DIE NACHT
Blume duftet im Tal,
Ferne Blume der Kindheit,
Die nur selten dem Träumer
Ihre verborgenen Kelche öffnet
Und das Innre, Abbild der Sonne, zeigt.
Auf den blauen Gebirgen
Wandelt die blinde Nacht,
Überm Schoß das dunkle Gewand gerafft,
Streut sie ziellos und lächelnd
Ihre Gaben, die Träume, aus.
Unten lagern, vom Tag verbrannt,
Schlafende Menschen;
Ihre Augen sind voller Traum,
Seufzend wenden viele das Antlitz
Hin nach der Blume der Kindheit,
Deren Duft sie zärtlich ins Dunkel lockt
Und dem väterlich strengen
Ruf des Tages tröstlich entfremdet.
Rast des Ermüdeten ist’s,
In der Mutter Umarmung zurückzufliehn,
Die mit lässigen Händen
Über das Haar dem Träumenden streicht.
Kinder sind wir, rasch macht die Sonne uns müd,
Die uns doch Ziel und heilige Zukunft ist,
Und aufs neue an jedem Abend
Fallen wir klein in der Mutter Schoß,
Lallen Namen der Kindheit,
Tasten den Weg zu den Quellen zurück.
Auch der einsame Sucher,
Der den Flug zur Sonne sich vorgesetzt,
Taumelt, auch er, um die Mitternacht
Rückwärts seiner fernen Herkunft entgegen.
Und der Schläfer, wenn ihn ein Angsttraum weckt,
Ahnt im Dunkeln mit irrer Seele
Zögernde Wahrheit:
Jeder Lauf, ob zur Sonne oder zur Nacht,
Führt zum Tode, führt zu neuer Geburt,
Deren Schmerzen die Seele scheut.
Aber alle gehen den Weg,
Alle sterben, alle werden geboren,
Denn die ewige Mutter
Gibt sie ewig dem Tag zurück.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

NO QUARTO ANO DE GUERRA
Embora a tarde fria e triste esteja,
e a chuva rumoreje,
sem saber quem me escuta, o meu cantar
em tempo entôo ainda.

Embora o mundo se asfixie em guerra e medo,
nalgum lugar,
em segredo, sem que ninguém o veja,
o amor flameja ainda.

*

IM VIERTEN KRIEGSJAHR
Wenn auch der Abend kalt und traurig ist 
Und Regen rauscht, 
Ich singe doch mein Lied in dieser Frist,
Weiß nicht, wer lauscht.

Wenn auch die Welt in Krieg und Angst erstickt, 
An manchem Ort 
Brennt heimlich doch, ob niemand sie erblickt, 
Die Liebe fort
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

PERDIMENTO
Sonâmbulo tateio entre bosque e barranco,
há um halo de magia aceso ao meu redor:
sem reparar se sou bem aceito ou maldito,
sigo à risca o meu próprio mandato interior.

Quantas vezes veio chamar-me a realidade
em que vós existis, para me comandar!
Dentro dela eu ficava assustado e sem forças,
e logo descobria um jeito de escapar.

Ao meu país ardente, do qual me privais,
ao meu sonho de amor, do qual me sacudis,
como as águas retornam sempre para o mar
também meu ser retorna usando mil ardis.

Amigas fontes guiam-me com seu cantar,
aves de sonho as plumas de luz a ruflar:
de novo faz-se ouvir o som da minha infância 
– em áurea rede, ao doce zumbir das abelhas,
junto de minha mãe volto enfim a me achar.

*

VERLORENHEIT
Nachtwandler, tast' ich mich durch Wald and Schlucht,
Phantastisch um mich glüht ein Zauberkreis, 
Unachtend ob umworben ob verflucht, 
Folg' ich getreu dem inneren Geheiß. 

Wie oft hat mich die Wirklichkeit geweckt, 
In der Ihr lebt, und mich zu sich befohlen! 
Ich stand in ihr ernüchtert and erschreckt 
Und habe bald mich wieder fortgestohlen. 

O warme Heimat, der ihr mich entzieht, 
O Liebestraum, aus dem ihr mich gestört, 
Zu dir zurück auf tausend Schlichen flieht 
Mein Wesen, wie zum Meer das Wasser kehrt.

Mich leiten heimlich Quellen mit Gesang, 
Traumvögel rühren glänzendes Gefieder; 
Aufklingt aufs neue meiner Kindheit Klang,
Im Goldgeflecht, im süßen Bienensang
Find' ich mich schluchzend bei der Mutter wieder.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

CONFISSÃO
Aos jogos teus, propícia aparição,
vês que me entrego voluntariamente:
outros terão propósitos e fins,
já para mim viver é suficiente.

Tudo que a meus sentidos comovia
antes, agora quer me parecer
mero reflexo do infinito e ano
que tão vívido sempre eu pude ver.

Decifrar todos esses ideogramas
compensará meu viver até o fim 
– pois o eterno, imutável, essencial
eu sei que trago a cada instante em mim.

*

HOLDER SCHEIN, AN DEINE SPIELE
Holder Schein, an deine Spiele
Sieh mich willig hingegeben;
Andre haben Zwecke, Ziele,
Mir genügt es schon, zu leben.

Gleichnis will mir alles scheinen,
Was mir je die Sinne rührte,
Des Unendlichen und Einen,
Das ich stets lebendig spürte.

Solche Bilderschrift zu lesen,
Wird mir stets das Leben lohnen,
Denn das Ewige, das Wesen,
Weiß ich in mir selber wohnen.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

CAMINHO INTERIOR
Quem descobre o caminho interior,
quem na mais fervorosa introspecção
vislumbra o cerne da sabedoria,
passa a sentir Deus e o mundo
à sua imagem e semelhança:
para ele, cada ação ou pensamento
será um diálogo com a própria alma,
que a Deus e ao mundo em si mesma contém.

*

WEG NACH INNEN
Wer den Weg nach innen fand,
Wer in glühndem Sichversenken
Je der Weisheit Kern geahnt,
Daß sein Sinn sich Gott und Welt
Nur als Bild und Gleichnis wähle:
Ihm wird jedes Tun und Denken
Zwiegespräch mit seiner eignen Seele,
Welche Welt und Gott enthält.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

LIVROS 
Todos os livros do mundo 
felicidade alguma hão de trazer-te, 
pois te remetem misteriosamente 
em retorno a ti mesmo. 

Aqui tens tudo de que necessitas: 
sol, estrelas e lua 
– pois a luz que querias 
em ti mesmo reside. 

Sabedoria, que tanto buscavas 
em bibliotecas, 
em cada uma destas folhas brilha agora: 
e é tua, toda. 

*

BÜCHER
Alle Bücher dieser Welt
Bringen dir kein Glück,
Doch sie weisen dich geheim
In dich selbst zurück.

Dort ist alles, was du brauchst,
Sonne, Stern und Mond,
Denn das Licht, danach du frugst,
In dir selber wohnt.

Weisheit, die du lang gesucht
In den Bücherein,
Leuchtet jetzt aus jedem Blatt –
Denn nun ist sie dein.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

TEMPO DE CHUVA
Há longo tempo ouço cantar a chuva,
por muitos dias e por muitas noites:
qual se pairasse a murmurar sonhando
envolta em som eternamente igual.

Igual me soava outrora em longes terras
dos chinos a música deslizante:
como um cantar de grilo, intenso e fino,
mas tão prenhe de encanto a cada instante.

Murmúrio de chuva, cantar de chinos,
som de cascata, marulho de mar 
– que força é esta com que me atrai sempre
vossa magia pelo mundo afora?

Tendes por alma o som imperecível
que não conhece tempo nem mudança,
cuja pátria evadimos no passado
e o coração nos queima na lembrança.

*

REGENZEIT
Lange hab ich nun dem Regenlied gelauscht,
Tagelang und viele Nächte lang,
Wie es schwebend hängt und träumend rauscht,
Eingehüllt in ewig gleichen Klang.

Ähnlich klang mir einst im fernsten Reich
Der Chinesen gleitende Musik,
Heimchendünn und hoch und ewig gleich,
Doch voll Reiz in jedem Augenblick.

Regenrauschen und Chinesenlied,
Wasserfallmusik und Meeresklang,
Welche Macht ist's, die mich wieder zieht
Euren Zaubern nach die Welt entlang?

Eure Seele ist der ewige Ton,
Der nicht Zeit und der nicht Wechsel kennt,
Dessen Heimat wir vorzeit entflohn,
Dessen Nachklang uns im Herzen brennt.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

À NOITE
À noite casais passeiam 
vagarosos pelo campo,
mulheres soltam cabelos,
vendeiros contam dinheiro,
cidadãos a medo lêem
novas do jornal da tarde,
bebês cerram as mãozinhas 
dormindo em profunda paz.
Cada qual faz o que é certo,
por sublime orientação:
e eu, não?

Também meus atos noturnos,
dos quais um escravo sou,
entram na voga do mundo:
também eles têm sentido.
Para cima e para baixo
vou eu, dançando por dentro,
murmuro canções de rua,
louvo a Deus e louvo a mim,
bebo vinho e me alucino
como se fosse um paxá,
sinto cansaço nos rins, 
dou risada, bebo mais,
digo sim ao coração
(amanhã pode ser não),
fio passadas tristezas
e vou tecendo um poema;
vejo em roda lua e estrelas,
perscruto lhes o destino
e vou seguindo com elas
para onde nem imagino.

*

ABENDS
Abends gehn die Liebespaare
Langsam durch das Feld,
Frauen lösen ihre Haare,
Händler zählen Geld,
Bürger lesen bang das Neuste
In dem Abendblatt,
Kinder ballen kleine Fäuste,
Schlafen tief und satt.
Jeder tut das einzig Wahre,
Folgt erhabner Pflicht,
Säugling, Bürger, Liebespaare --
Und ich selber nicht?
 
Doch! Auch meiner Abendtaten,
Deren Sklav' ich bin,
Kann der Weltgeist nicht entraten,
Sie auch haben Sinn.
Und so geh ich auf und nieder,
Tanze innerlich,
Summe dumme Gassenlieder,
Lobe Gott und mich,
Trinke Wein und phantasiere,
Daß ich Pascha wär,
Fühle Sorgen an der Niere,
Lächle, trinke mehr,
Sage ja zu meinem Herzen
(Morgens geht es nicht),
Spinne aus vergangenen Schmerzen
Spielend ein Gedicht,
Sehe Mond und Sterne kreisen,
Ahne ihren Sinn,
Fühle mich mit ihnen reisen
Einerlei wohin.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

DESPERTAR NO MEIO DA NOITE
Pela janela, me desperta a lua:
grossos de sono forcejam meus olhos
e no magnífico palor pressinto
a precipitação de novos sonhos.                   

Cá e lá um clarão e uma brancura,
e por trás da azulada escuridão
longos trilhos de vidros espelhados,
velas bentas e caudas de Satã.

De claro e escuro o espírito do sonho
vai silentes palácios construindo,
cepo e machado, noiva de grinalda,
festejos, bebedeiras, bailarinas.

Então destaca-se encantada a alma
sobre um mundo real que apodreceu
e vira-se feliz para o outro lado
a deslizar num império que é seu.

*

ERWACHEN IN DER NACHT
Mond vom Fenster weckte mich,
Schlafbeschwerte Augen ringen,
In der Blässe feierlich
Ahn ich neue Träume schwingen....

Da und dort ein Hell und Weiß,
Hinter allem blaue Schwärzen,
Glasig spiegelndes geleiß,
Teufelsschwanz und fromme Kerzen.

Aus dem Hell und Dunkel baut
Traumgeist schweigende Paläste,
Block und Beil, bekränzte braut,
Tänzerinnen, Räusche, Feste.

Und die Seele reißt entzückt
An den morschen Wirklichkeiten,
Um hinüber neu beglückt
In ihr eignes Reich zu gleiten.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

NOITE DE VERÃO
As árvores gotejam do aguaceiro.
Na relva molhada reluz o frio
luar. No vale, o invisível rio
reboa escuro com inquieta voz.

No casario ladram cães. Ó noite 
de verão e de estrelas mal veladas:
como seduz, vossa pálida estrada,
meu coração ébrio de espaço e viagem!

*

SOMMERNACHT
Die Bäume tropfen vom Gewitterguß,
Im nassen Laub glänzt Mondlicht kühlvertraut,
Vom Tal herauf der unsichtbare Fluß
Tönt dunkel her mit ruhelosem Laut.

Jetzt im Gehöfte schlagen Hunde an –
O Sommernacht und halbverhangene Sterne,
Wie reißt es mir auf eurer bleichen Bahn
Das Herz hinaus in Reiserausch und Ferne!
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

IRMÃ MORTE
Também a mim tu hás de vir um dia:
não te esqueces de mim,
e os grilhões rompem-se
e o martírio chega ao fim.

Distante e estranha te mostras ainda,
irmã Morte querida,
qual fria estrela
sobre a minha pobre vida.

Porém um dia mais perto hás de vir
e toda em chamas: 
– Vem, Amada, aqui estou eu!
Leve-me, que sou teu!

*

BRUDER TOD
Auch zu mir kommst du einmal,
Du vergißt mich nicht,
Und zu Ende ist die Qual,
Und die Kette bricht.

Noch erscheinst du fremd und fern,
Lieber Bruder Tod,
Stehest als ein kühler Stern
Über meiner Not.

Aber einmal wirst du nah
Und voll Flammen sein -
Komm, Geliebter, ich bin da,
Nimm mich, ich bin dein.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

MUNDO SONHO NOSSO
Em sonho, à noite, cidades
e gentes, castelos no ar,
monstros – tudo, bem o sabes,
do escuro da alma a brotar,
tudo é imagem e obra tua,
és tu próprio, em teu sonhar.

Vai à cidade, de dia,
olha as ruas, rostos, nuvens,
e hás de ver maravilhado
que é tudo teu: és o autor!
Tudo que ante os teus sentidos
avulta e vive cem vezes
é bem teu, fundo em ti cala,
sonho que tua alma embala.

Andando sempre em ti mesmo,
ora a estreitar-te, ora a abrir-te,
és o que fala e o que escuta,
o que cria e  o que destrói.
Velha e esquecida magia
sagradas miragens fia,
e o mundo com seu portento
vive pelo teu alento.

*

DIE WELT UNSER TRAUM
Nachts im Traum die Städt’ und Leute,
Ungeheuer, Luftgebäude,
Alle, weißt du, alle steigen
Aus der Seele dunklem Raum,
Sind dein Bild und Werk, dein eigen,
Sind dein Traum.

Geh am Tag durch Stadt und Gassen,
Schau in Wolken, in Gesichter,
Und du wirst verwundert fassen:
Sie sind dein, du bist ihr Dichter!
Alles, was vor deinen Sinnen
Hundertfältig lebt und gaukelt,
Ist ja dein, ist in dir innen,
Traum, den deine Seele schaukelt.

Durch dich selber ewig schreitend,
Bald beschränkend dich, bald weitend,
Bist du Redender und Hörer,
Bist du Schöpfer und Zerstörer.
Zauberkräfte, längst vergeßne,
Spinnen heiligen Betrug,
Und die Welt, die unermeßne,
Lebt von deinem Atemzug.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

Ó MUNDO ARDENTE
Velho ou moço, isto eu sempre senti: uma montanha 
na noite, uma mulher calada na varanda,
branca rua ao clarão da lua, num embalo
que do corpo o saudoso coração me arranca.

Ardente mundo, branca mulher na varanda,
cão no vale a ladrar, trem no longe a rodar:
como mentíeis, como me tínheis enganado,
conquanto ainda sejais minha ilusão mais doce!

Muitas vezes tentei a horrível realidade
onde professor, lei, câmbio e moda vigoram;
mas frustrado e liberto escapei sempre só
para onde o sonho e a adorável loucura brotam.

Vento de noite em árvore, negra cigana,
mundo de anelos vãos e fragrância de poeta,
esplêndido mundo a cuja mercê me encontro 
– eis que tua voz me chama e eu tremo ao teu relâmpago!

*

HERRLICHE WELT
Immer und immer fühl ich’s, ob alt oder jung:
Ein Gebirg in der Nacht, am Balkon ein schweigendes Weib,
Eine weiße Straße im Mondschein mit sanftem Schwung,
Das reißt mir vor Sehnsucht das bange Herz aus dem Leib.

O brennende Welt, o weißes Weib am Balkon,
Bellender Hund im Tal, fernrollende Eisenbahn,
O wie loget ihr, o wie bitter betrogt ihr mich schon -
Dennoch seid ihr noch immer mein süßester Traum und Wahn!

Oft versucht ich den Weg in die schreckliche “Wirklichkeit”,
Wo Professor, Gesetz, Mode und Geldkurs gilt,
Aber einsam entfloh ich immer, enttäuscht und befreit,
Dort hinüber, wo Traum und liebliche Narrheit quillt.

Schwüler Nachtwind im Baum, schwarze Zigeunerin,
Welt voll törichter Sehnsucht und Dichterduft,
Herrliche Welt, der ich ewig verfallen bin,
Wo dein Wetterleuchten mir zuckt, wo deine Stimme mir ruft.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

DESDE A INFÂNCIA
Desde a infância
me sopra uma voz que um dia
me prometera a bem-aventurança:
sem ela, a vida bem mais difícil seria.
Calada a sua magia,
fico sem luz,
vejo em redor a angústia e a escuridão;
mas volto a ouvir, em meio ao sofrimento
que fiz por merecer,
a doce voz da bem-aventurança
que mágoa ou culpa alguma estragaria.
Voz adorada,
luz da casa minha,
não tornes a apagar-te ,
não cerres mais teus olhos azuis 
– pois o mundo depressa perderia
toda a sua aparência de carinho,
estrelas grandes e pequenas tombariam,
e eu estaria sozinho.

*

AUS DER KINDHEIT HER
Aus der Kindheit her
Weht ein Klang mir nach,
Der mir einst die Seligkeit versprach-
Ohne ihn wär Leben viel zu schwer.
Tönt sein Zauber nicht,
Steh ich ohne Licht
Sehe Angst und Dunkel rings umher.
Aber immer wieder durch das Leid,
Das ich mir erwarb,
Klingt der süße Ton voll Seligkeit,
Den kein Weh und keine Schuld verdarb.
Liebe Stimme du,
Licht in meinem Haus,
Lösche niemals wieder aus,
Tu die blauen Augen niemals zu!
Sonst verliert die Welt
Allen holden Schein,
Stern um Sternlein fällt,
Und ich steh allein.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

NOITE DE ANGÚSTIA
A medo fala o relógio com a teia de aranha na parede,
com força o vento bate na porta da loja,
queimadas até em baixo e escorridas de cera
então minhas bruxuleantes velas,
vinho algum mais no copo,
em todos os cantos sombras
a estender para mim os dedos longos.
Como nos tempos da infância,
respiro a custo e entrecerro meus olhos,
o medo prende-me agachado na cadeira;
mas já não vem mãe nenhuma,
nenhuma criada ralhona e boa,
quebrar gostosamente o encantamento e iluminar-me com novo conforto. 
Demoro-me agachado em meio às trevas,
escuto o vento nas telhas e junto aos muros a morte
a fiar com enregelados dedos,
sob o tapete ouço o ranger da areia:
quisera vê-la e pegá-la, arregalo  os olhos,
meu olhar cai no vazio e à distância
escuto o lento assobio dos seus lábios zombeteiros.
Vou tateando em direção à cama: dormir, que bom, dormir! 
Mas o sono se fez um pássaro assustado,
difícil de pegar e de reter, tão fácil de esmagar,
e se afasta a piar, com amarga ironia,
ruflando as asas para o vento o carregar.

*

ANGST IN DER NACHT
Die Uhr spricht ängstlich mit dem Spinnweb an der Wand,
Am Laden reißt der Wind,
Meine flackernden Kerzen sind
Ganz vertropft und heruntergebrannt,
Kein Wein im Glase mehr,
Schatten in allen Ecken,
Deren lange Finger sich nach mir strecken.
Wie in der Kinderzeit
Schließ ich die Augen und atme schwer,
Angst hält mich kauernd im Stuhl gefangen.
Aber keine Mutter kommt mehr,
Keine gute, scheltende Magd mehr gegangen,
Die mich am Arm nimmt und mir die schreckliche Welt
Freundlich entzaubert und neu mit Trost erhellt.
Lange bleib ich im Finstern kauern,
Höre den Wind im Dach und den knisternden Tod in den Mauern,
Höre Sand hinter Tapeten rinnen,
Höre den Tod mit frierenden Fingern spinnen,
Reiße die Augen auf, will ihn sehen und greifen,
Sehe ins Leere und höre ihn fern
Aus den spöttischen Lippen leise pfeifen,
Taste zum Bett -- schliefe, schliefe so gern!
Aber Schlaf ist ein scheuer Vogel geworden,
Schwer zu fangen, zu halten, doch leicht zu morden;
Pfeifend fährt er, die Stimme voll bittrem Hohn,
Sausenden Fluges im zerrenden Winde davon.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

FUGACIDADE
Cai-me folha após folha
da árvore da vida.
Ó mundo múltiplo e vertiginoso,
como sacias,
como sacias e cansas, 
como embriagas!
O que hoje é brasa ainda, 
amanhã será cinza.    
Já vem ranger o vento    
sobre meu pardo túmulo.
Sobre o meninozinho
curva-se a mãe:
quero rever-lhe os olhos,
seu olhar é a estrela que me guia; 
tudo mais pode ir-se e dissipar-se, 
tudo morre e faz bem tudo em morrer.
Apenas permanece a eterna mãe
da qual somos oriundos:
seu dedo escreve a brincar 
o nosso nome na fugacidade do ar.

*

VERGÄNGLICHKEIT 
Vom Baum des Lebens fällt
Mir Blatt um Blatt,
O taumelbunte Welt,
Wie machst du satt,
Wie machst du satt und müd,
Wie machst du trunken!
Was heut noch glüht,
Ist bald versunken.
Bald klirrt der Wind
Über mein braunes Grab,
Über das kleine Kind
Beugt sich die Mutter herab.
Ihre Augen will ich wiedersehn,
Ihr Blick ist mein Stern,
Alles andre mag gehn und verwehn,
Alles stirbt, alles stirbt gern.
Nur die ewige Mutter bleibt,
Von der wir kamen,
Ihr spielender Finger schreibt
In die flüchtige Luft unsre Namen.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

OUTONO
Pássaros, que nos ramos
entoais vosso canto
pelo crestado bosque:
pássaros, aviai-vos!

Já vem o vento que sopra,
já vem a morte que ceifa,
já vem o cinério fantasma que gargalha
a enregelar-nos  o coração 
– e o jardim perde toda a sua pompa,
e a vida perde todo o seu fulgor.

Amados pássaros entre as folhagens,
irmãozinhos queridos,
permiti que cantemos e nos alegremos:
nós já vamos ser pó!

*

HERBST
Ihr Vögel im Gesträuch,
Wie flattert euer Gesang
Den bräunenden Wald entlang –
Ihr Vögel, sputet euch!

Bald kommt der Wind, der weht,
Bald kommt der Tod, der mäht,
Bald kommt das graue Gespenst und lacht, 
Daß uns das Herz erfriert 
Und der Garten all seine Pracht 
Und das Leben all seinen Glanz verliert.

Liebe Vögel im Laub,
Liebe Brüderlein,
Lasset uns singen und fröhlich sein,
Bald sind wir Staub.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

PASSEIO NO FIM DO OUTONO
Chuva de outono esgravatou o bosque cinza,
ao vento da manhã o vale tem arrepios de frio,
caem do castanheiro os duros frutos
e racham-se e gargalham úmidos e pardos.

O outono tem esgravatado minha vida,
o vento puxa as folhas em frangalhos,
sacode galho por galho: onde está o fruto?

Dei flor de amor, o fruto foi de dor.
Dei flor de fé, o fruto foi de ódio.
O vento me repuxa os galhos secos:
rio-me dele e ainda resisto aos temporais.

Para mim, o que é fruto? O que é meta? – Eu dei flor,
e minha meta era florir. Agora eu murcho,
e minha meta é murchar: nada mais.
Escassas metas se propõe o coração...

Deus vive em mim, Deus morre em mim, Deus pena
no peito meu: para mim, é meta bastante.
Caminho e descaminho, flor ou fruto,
é tudo a mesma coisa: palavra apenas.

Ao vento da manhã o vale tem arrepios de frio,
caem do castanheiro os duros frutos
a rir em alto e bom som. E eu, com eles, me rio.


*

GANG IM SPÄTHERBST
Herbstregen hat im grauen Wald gewühlt,
im Morgenwind aufschauert kalt das Tal,
hart fallen Früchte vom Kastanienbaum
und bersten auf und lachen feucht und braun.

In meinem Leben hat der Herbst gewühlt,
zerfetzte Blätter zerrt der Wind davon
und rüttelt Ast um Ast -- wo ist die Frucht?

Ich blühte Liebe, und die Frucht war Leid.
Ich blühte Glaube, und die Frucht war Hass.
An meinen dürren Ästen reißt der Wind,
ich lach ihn aus, noch halt ich Stürmen stand.

Was ist mir Frucht? Was ist mir Ziel! --
Ich blühte, und blühen war mein Ziel.
Nun welke ich, und Welken ist mein Ziel, nicht andres,
kurz sind die Ziele, die das Herz sich steckt.

Gott lebt in mir, Gott stirbt in mir,
Gott leidet in meiner Brust, das ist mir Ziel genug.
Weg oder Irrweg, Blüte oder Frucht,
ist alles eins, sind alles Namen nur.

Im Morgenwind aufschauert kalt das Tal,
hart fallen Früchte vom Kastanienbaum
und lachen hart und hell. Ich lache mit.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§


TODAS AS MORTES
Já morri todas as mortes,
todas as mortes quero tornar a morrer:
morrer morte de madeira na árvore,
morrer morte de pedra na montanha,
morte de terra no chão,
morte de folha na relva a crepitar no verão,
e a pobre morte de sangue no ser humano.

Flor quero ser quando nascer de novo,
árvore e relva quando de novo nascer,
peixe e gamo, pássaro e borboleta,
e dessas formas todas
o anelo irá conduzindo meus passos
para as dores mais altas 
– as dores do ser humano.

Ó arco tenso a vibrar,
quando o punho do furioso anelo
os dois pólos da vida
tenta envergar até que os dois se toquem!
Mais uma vez e muitas vezes mais,
da morte ao nascimento, me perseguirás
na dolorosa via da materialização 
– maravilhosa via da materialização.

*

ALLE TODE
Alle Tode bin ich schon gestorben,
Alle Tode will ich wieder sterben,
Sterben den hölzernen Tod im Baum,
Sterben den steineren Tod im Berg,
Irdenen Tod im Sand,
Blätternen Tod im knisternden Sommergras
Und den armen, blutigen Menschentod.

Blume will ich wieder geboren werden,
Baum und Gras will ich wieder geboren werden,
Fisch und Hirsch, Vogel und Schmetterling.
Und aus jeder Gestalt
Wird mich Sehnsucht reißen die Stufen
Zu den letzten Leiden,
Zu den Leiden des Menschen hinan.

O zitternd gespannter Bogen,
Wenn der Sehnsucht rasende Faust
Beide Pole des Lebens
Zueinander zu biegen verlangt!
Oft noch und oftmals wieder
Wirst du mich jagen von Tod zu Geburt
Der Gestaltungen schmerzvolle Bahn,
Der Gestaltungen herrliche Bahn.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

MÁGOAS
De dor se torce no fogão a acha de lenha acesa:
trêmula escrita a fogo risca-lhe a pele de cinza.
Fora troveja a noite e cai úmida a sofrer como
bicho acuado a clamar por misericórdia e morte.

Fico de cócoras, no meio, à luz que bruxuleia:
para minha alma, insuportável parece o destino.
Meu coração tem calafrio sobre calafrio:
sinal da mágoa com que a mim mesmo torturo e queimo.

Como essa lenha em brasa, como a noite lancinada,
o coração se entrega aflito ao inimigo em fúria 
– à mágoa em que rendidos e inermes nos abrasamos,
que ao fogo e à lenha, à trovoada e ao bicho nos irmana.

*

SCHMERZEN
Im Kamin krümmt sich in Schmerzen das brennende Scheit,
Glutschrift läuft schaudernd ihm über die aschige Haut.
Draußen die Nacht stürmt feucht und leidet so laut,
Wie ein Tier in Qualen nach Tod und Erbarmen schreit.

Ich inmitten kaure im flackernden Licht am Kamin,
Unerträglich scheint mein Geschick der zitternden Seele,
Über mein Herz läuft Schauer um Schauer hin,
Feuer des Leids, in dem ich brennend mich quäle.

Wie das flammende Scheit und wie die klagende Nacht
Gibt das Herz sich aufzuckend dem grimmigen Feinde hin,
Jenem Leide, in dem wir ergeben und machtlos glühn,
Das uns Flamme und Scheit, Sturm und Tierschrei zu Brüdern macht.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

CAMINHO À NOITE
Pé ante pé na escuridão vou pondo:
imensa e mansa me rodeia a noite.
Junto ao úmido muro vou molhando,
no musgo aljofarado mão e rosto.

Em sombra contra os ares e as estrelas
o pé de acácia embala-se;
no longe reluzem luzes
e o perto eu mal consigo perceber.

Com seu mágico fio, o amor faz vir 
até meu coração toda a distância:
as Plêiades e a Estrela-Polar chamam
ao céu os seus irmãos.

Ao mundo todo eu me sinto ligado,
a toda forma de vida eu me abro:
de novo achei a estrada
que me integra no plano do universo.

*

NÄCHTLICHER WEG
Schuh um Schuh im Finstern setz ich, 
Nacht umgibt mich sanft und groß, 
An betauter Mauer netz ich 
Hand und Stirn im feuchten Moos.

Dunkel gegen Luft und Sterne 
Wiegt sich der Akazienbaum, 
Lichter blitzen in der Ferne, 
Doch die Nähe ahn ich kaum.

Liebe zieht am Zauberfaden 
Alle Ferne mir ans Herz, 
Pol-Stern rufen und Plejaden
Ihren Bruder himmelwärts.

Aller Welt bin ich verbunden, 
Allem Leben aufgetan, 
Habe neu die Bahn gefunden, 
Die mich hält im Weltenplan.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

CANÇÃO DE AMOR 
Tu és a corça e eu o cervo,
pássaro tu e eu árvore,
o sol tu e eu a neve,
tu és o dia e eu o sonho.

De minha boca adormecida à noite
um pássaro de ouro voa a ti:
tem a voz clara, multicolores asas,
e vai cantar-te a canção do amor 
– e vai cantar-te a canção de mim.

*

LIEBESLIED
Ich bin der Hirsch und du das Reh, 
Der Vogel du und ich der Baum, 
Die Sonne du und ich der Schnee, 
Du bist der Tag und ich der Traum.

Nachts aus meinem schlafenden Mund 
Fliegt ein Goldvogel zu dir, 
Hell ist seine Stimme, sein Flügel bunt, 
Der singt dir das Lied voll der Liebe, 
Der singt dir das Lied von mir.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

REGRESSO
De regresso de uma viagem longa,
acho em meu quarto a correspondência a esperar-me:
sento-me, abro aflito os envelopes,
e o meu alento embaça o recinto gelado.

Ah, gente estranha, que vagueia e que procura
como eu: que me escreveis em tantas cartas?
Se não restassem noite e enigma por trás de tudo,
como seria a vida desolada e horrível!

Vossas cartas empilho na escura lareira:
para o que indagam todas, não tenho resposta...
Aquecei-vos comigo, com as chamas que elevam-se animadas!
Alegrai-vos comigo, com o dia que vem com o amanhã!

Hostil e frio é o mundo murado à nossa volta:
só o nosso coração parece aberto ao sol e às coisas boas.
Ah, como treme em nosso peito a assustada centelha
que ainda assim sozinha sobrevive aos espectros do mundo!

*

HEIMKEHR
Von langer Reise zurückgekommen 
In kalter Stube finde ich wartende Post, 
Setze mich, öffne die Briefe beklommen, 
Schnaube Qualm in den dumpfen Frost.

Ach, was schreibt ihr mir alle die Briefe,
Fremde Menschen, Pilger und Sucher wie ich?! 
–Wenn hinter allem nicht Nacht und Geheimnis schliefe,
Wie wäre das Leben öde und schauerlich!

Eure Briefe schicht ich im schwarzen Kamin zusammen,
Weiß keine Antwort auf das, was ihr alle fragt – 
Wärmt euch mit mir an den grell aufzuckenden Flammen,
Freut euch mit mir, daß morgen ein Tag uns tagt!

Kalt ist die Welt und feindlich um uns gemauert,
Unser Herz allein ist Sonne und fähig der Lust – 
O wie zittert der bange Funke in unsrer Brust,
Der doch allein die Gespenster der Welt überdauert!
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

O DOENTE
Que nem vento, passou a minha vida.
Aqui me deito acordado e sozinho.
Pela janela o crescente da lua,
a espiar o que faço.
Deitado e frio faz tempo que estou.
Sinto no quarto a morte.
– Como bates com medo, coração!
Pegando fogo ainda?
Começo a cantar baixinho,
a cantar mansamente a lua e o vento,
o gamo e o cisne,
Maria e seu filho:
vêm-me à cabeça todas as canções
que podem ser cantadas,
entram nelas a lua e as estrelas, 
bosque e gazela estão dentro de mim.
As mágoas e alegrias todas correm-me
detrás dos olhos fechados
sem poder distinguir-se uma das outras:
todos são doces, todos são ardentes.
Onde estou, eu  não sei:
vêm mulheres de lábios pálidos e vermelhos,
bruxuleiam de amor como assustadas velas,
chama-se Morte uma delas.
Ah, como o seu olhar fervente de paixão me suga o coração!
Deuses abrem os seus olhos antigos,
e cerram velados céus 
– céus para rir e céus para chorar –
rodam seus astros num correr mais apressado,
deixam que brilhem todas as luas e sóis.
Mais manso e baixo torna-se o meu canto;
o sono chega do centro do céu
beirando o  mundo dos deuses,
a andar por ruas de estrelas:
seu andar é como pisar em neve.,,
Que tenho ainda a pedir?
Tudo quanto eu amava, já se foi:
nada mais dói.

*

DER KRANKE
Wie Wind ist mein Leben verweht,
Ich liege allein und wache,
Im Fenster das Mondhorn steht,
Sieht zu, was ich mache.
Ich liege und friere lang,
Fühle den Tod im Zimmer --
Herz, wie schlägst du so bang,
Brennst du noch immer?
Leise fang ich zu singen an,
Singe leise von Mond und Wind,
Von Hirsch und Schwan,
Von Maria und ihrem Kind,
Alle Lieder fallen mir ein,
Die man singen kann,
Stern und Mond kommt herein,
Wald und Reh ist bei mir innen.
Alle Schmerzen und Freuden rinnen
Hinter meinen geschlossenen Augen hin,
Sind nicht auseinanderzukennen,
Alle sind süß, alle brennen,
Ich weiß nicht, wo ich bin,
Frauen kommen mit Lippen bleich und rot,
Flackern vor Liebe wie bange Kerzen,
Eine von ihnen heißt Tod,
O wie saugt ihr glühender Blick mir am Herzen!
Götter tun ihre alten Augen auf,
Schließen ihre verborgenen Himmel auf,
Himmel zum Lachen und zum Weinen,
Drehen ihre Sterne im schnellsten Lauf,
Lassen alle Monde und Sonnen scheinen.
Leiser wird und verstummt mein Gesang,
Schlaf kommt aus Himmels Mitten
Die Welt der Götter entlang
Auf Sternenstraßen geschritten.
Sein Schritt ist wie auf Schnee . . .
Um was soll ich ihn bitten . . . ?
Fort ist alles, was ich gelitten,
Nichts tut mehr weh.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

FIM DE INVERNO
Na verde encosta coberta de asas
já repica um azul de violetas.
Somente ao longo da floresta escura
demora a neve em línguas dentilhadas,
mas gota a gota vai-se desfazendo
atraída pela sede da terra.
No pálido céu alto pastam alvos
rebanhos de nuvens. Um pintassilgo 
em amoroso canto se desfaz: 
– Homens, amai-vos e cantai em paz!

*

MÄRZ
An dem grün beflognen Hang
Ist schon Veilchenblau erklungen,
Nur den schwarzen Wald entlang
Liegt noch Schnee in zackigen Zungen.
Tropfen aber schmilzt um Tropfen hin,
Aufgesogen von der durstigen Erde,
Und am blassen Himmel oben ziehn
Lämmerwolken in beglänzter Herde.
Finkenruf verliebt schmilzt im Gesträuch:
Menschen, singt auch ihr und liebet euch!
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

DOENÇA
Bem-vinda, noite! Bem-vinda, estrela!
Estou com sede de sono, acordado não posso mais ficar,
pensar não posso mais, não mais chorar e rir:
eu gostaria apenas de dormir,
dormir cem anos, mil anos,
com as estrelas por cima de mim...
Minha mãe sabe quão fatigado eu estou:
curva-se a rir, cheia de estrelas nos cabelos.

Não deixes, mãe, que torne a amanhecer!
Não deixes que o dia me desponte jamais:
tão má e hostil é a sua claridade branca,
nem sei dizer!
Tão longas ruas quentes tenho andado,
meu coração está todo queimado.
Abre-te, noite, para mim, no país da Morte!
Outra vontade não tenho,
nem posso dar mais um passo.
Mãe Morte, dá-me tua mão:
dos olhos teus, deixa eu me ver na amplidão!

*

KRANKHEIT
Willkommen Nacht! Willkommen Stern!
Mich dürstet nach Schlaf, ich kann nimmer wachen,
Ich kann nimmer denken, nimmer weinen und lachen,
Nur schlafen möcht ich gern,
Schlafen hundert, tausend Jahr,
Und über mir gehen die Sterne hin;
Meine Mutter weiss, wie ich müde bin,
Beugt sich lächelnd herab, hat Sterne im Haar.

Mutter, lass nimmer tagen,
Lass keinen Tag mehr zu mir herein!
So böse, so feind ist sein weisser Schein,
Ich kann es nicht sagen.
So viel lange heisse Strassen bin ich gegangen,
Mein Herz ist ganz verbrannt -
Öffne mir, Nacht, führ mich in Todes Land,
Ich habe kein andres Verlangen,
Ich kann keinen Schritt mehr gehen,
Mutter Tod, gib mir die Hand,
Lass mich in deine unendlichen Augen sehen!
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

MEDIA IN VITA
Um dia, coração, descansarás:
um dia morrerás a derradeira morte,
e te encaminharás para o silêncio
daquele sono profundo e sem sonhos.
Muitas vezes ele te faz sinais da escuridão de ouro,
muitas vezes presentes que ele vem 
– porto ao longe, quando tua canoa
corcoveia no mar de procela em procela.
Porém o sangue ainda
te embala sobre as ondas escarlates entre o agir e o sonhar.
Ardes ainda, coração, com ímpetos de vida e flama;
nas grimpas da árvore da vida,
serpente e fruto engambelam-te ainda com suave insistência
o desejo e o apetite, a culpa e o prazer;
nas sete cordas do arco-íris do teu peito
um canto de cem vozes faz-se ouvir;
tenta-te o jogo do amor
na selva do prazer, para o espasmo do gozo,
a te fazer embriagado hóspede ou animal ou deus,
excitado ou já frouxo, a vacilar sem meta;
atrai-te a arte, silenciosa feiticeira,
ao seu círculo de venturosa magia
– pinta um véu colorido sobre a morte e a desgraça,
faz da dor um prazer, do caos faz harmonia,
induz o espírito a subir mais alto
para o jogo diante das estrelas,
coloca-te no fulcro do universo
e rege ao teu redor o Todo em coro;
mostra as pegadas do percurso ansioso,
faz de ti o ponto final da Natureza,
abre escuros portões à tua frente,
deixa ver deuses, mostra o espírito e o instinto,
dá a entender que dela se desdobra o mundo dos sentidos,
e como o infinito se refaz em formas sempre novas,
e faz o mundo espumar, para o jogo
mais uma vez amares 
– pois és aquele que sonha com ela e com o Todo.
Também depois dos sombrios percursos
onde o sangue e o instinto fazem coisas horríveis,
daí se abre a trilha
em que floresce do medo o êxtase, do amor o assassinato,
fermenta o crime, esbraseia a insânia,
sem que uma pedra marque a divisão entre o sonho e a ação.
Qualquer desses inúmeros caminhos tu podes escolher,
podes entrar em todos esses jogos,
e ao seguir cada um deles hás de ver
abrir-se um outro ainda mais sedutor...
Que bons, os bens e o dinheiro!
Que bom, desdenhar o dinheiro e os bens!
Que beleza, em renúncia desviar os olhos deste mundo!
Que beleza, anelar com todo o ardor os encantos do mundo!
Elevar-se até Deus, voltar ao animal,
e ver por toda parte palpitando uma gloria fugaz:
ir aqui, ir ali, ser homem, bicho, planta...
Infinito é o sonho multifário do mundo,
incontáveis as portas que se abrem:
de cada uma se escuta o coro da vida, 
chama de cada uma, de cada uma acena 
uma efêmera glória, um doce aroma esquivo.
Põe em prática a virtude e a renúncia, quando tiveres medo!
Sobe à torre mais alta, arroja-te de lá!
Fica sabendo, porém: és hospede, em toda parte,
e apenas hospede – do ar, da dor, do próprio túmulo,
que, antes mesmo de teres descansado,
já te cospe de novo para o eterno fluxo dos nascimentos.

Dos mil caminhos, entretanto, existe um,
difícil de encontrar, fácil de imaginar,
que como um passo mede a volta ao mundo,
que não se perde jamais, que alcança a última meta.
Nesse caminho te florescerá o conhecimento 
do teu ego interior, que morte alguma destrói,
e que só a ti pertence,
infenso no mundo que se consome em palavras.
Foi de extravio a tua longa peregrinação,
extravio no cerco do equívoco sem nome,
enquanto perto de ti sempre esteve o verdadeiro caminho.
Como pudeste andar por tanto tempo às cegas?
Como te pôde acontecer esse feitiço 
de nunca terem visto esse caminho os olhos teus?
Agora acaba-se o poder desse feitiço:
tu despertaste,
agora escutas o coro das vozes
no vale dos sentidos e dos erros,
e te voltas de fora calmamente 
para dentro, para o teu próprio ser.
Terás descanso agora,
morrerás afinal a morte última
de retorno ao silêncio
para o profundo sono sem sonhos.

*

MEDIA IN VITA
Einmal, Herz, wirst du ruhn, 
Einmal den letzten Tod gestorben sein,
Zur Stille gehst du ein,
Den traumlos tiefen Schlaf zu tun.
Oft winkt er dir aus goldnem Dunkel her,
Oft sehnst du ihn heran,
Den fernen Hafen, weinn dein Kahn
Von Sturm zu Sturm gehtzt treibt auf dem Meer.
Noch aber wiegt dein Blut
Auf roter Welle dich durch Tat und Traum.
Noch brennst du, Herz, in Lebensdrang und Glut.
Hoch aus dem Weltenbaum
Lockt Frucht und Schlange dich mit süßem Zwang
Zu Winsch und Hunger, Schuld und Lust,
Spielt hundertstimmiger Gesang
Sein holdes Regenbogenspiel durch deine Brust.
Dich ladet Liebesspiel,
Urwald der Lust, zum Krampf der Wonne ein,
Erregt, erschlafft, hinzuckend ohne Ziel.
Dich ziegt die Kunst, die stille Zauberin,
In ihren Kreis mit seliger Magie,
Malt Farbenschleier über Tod und Jammer hin,
Macht Qual zu Lust, Chaos zu Harmonie.
Geist lockt zu höchstem Spiel empor,
Den Sternen gegenüber stellt
Er dich, macht dich zum Mittelpunkt der Welt
Und ordnet rund um dich das All im Chor.
Vom Tier und Urschlamm bis zu dir herauf
Weist er der Herkunft ahnenreiche Spur,
Macht dich zum Ziel und Endpunkt der Natur,
Dann tut er dunkle Toere auf,
Er deutet Götter, deutet Geist und Trieb,
Zeigt, wie aus ihm sich Sinnenwelt entfaltet, 
Wie das unendliche sich immer neu gestaltet,
Und macht die Welt, die er zu Spiel zerschäumt,
Dir erst von neuem lieb,
Da du es bist, der sie und Gott und All erträumt.
Auch nach den düstern Gängen hin,
Wo Blut un Trieb das Schaurige vollziehn,
Auch dahin offen steht der Pfad,
Wo Rausch aus Angst, wo Mord aus Liebe blüht,
Verbrechen dampft und Wahnsinn glüht,
Kein Grenzstein scheidet zwischen Traum und Tat.
All diese vielen Wege magst du gehn,
Alll diese Spiele magst du spielen noch,
Und jedem folgt, so wirst du sehn,
Ein neuer Weg, verführerischer noch.
Wie hübsch ist Gut und Geld!
Wie hübsch ist: Gut und Geld verachten!
Wie schön: entsagend wegsehn von der Welt!
Wie schön: nach ihren Reizen brünstig trachten!
Zum Gott hinauf, zum Tier zurück,
Und überall zuckt flüchtig auf ein Glück.
Geh hier, geh dort, sei Mensch, sei Tier, sei Baum!
Unendlich ist der Welt vielfarbiger Traum,
Unendlich steht dir offen Tor um Tor,
Aus jedem braust des Lebens voller Chor,
Aus jedem lockt, aus jedem ruft
Ein flüchtig Glück, ein flüchtig holder Duft.
Entsagung, Tugend übe, wenn dich Angst erfaßt!
Steig auf den höchsten Turm, wirf dich herab!
Doch wisse: überall bist du nur Gast,
Gast bei der Luft, beim Leid, Gast auch im Grab – 
Es speit dich neu, noch eh du ausgeruht,
Hinaus in der Geburten ewige Flut.

Doch von den tausend Wegen einer ist,
Zu finden schwer, zu ahnen leicht,
Der aller Welten Kreis mit einem Schritt ermißt,
Der nicht mehr täuscht, der letztes Ziel erreicht.
Erkenntnis blüht auf diesem Pfade dir:
Dein innerstes Ich, das nie ein Tod zerstört,
Gehört nur dir,
Gehört der Welt nicht, die auf Namen hört.
Irrweg war deine lange Pilgerschaft,
Irrweg in namenlosen Irrtums haft,
Und immer war der Wunderpfad dir nah,
Wie konntest du so lang verblendet gehn,
Wie konnte solcher Zauber dir geschehn,
Daß diesen Pfad dein Auge niemals sah?!
Nun endet Zaubers Macht,
Du bist erwacht,
Hörst fern die Chöre brausen
Im Tal des Irrens und der Sinnen,
Und ruhig wendest du vom Außen
Dich weg und zu dir selbst, nach innen.
Dann wirst du ruhn,
Wirst letzten Tod gestorben sein,
Zur Stille gehst du ein,
Den traumlos tiefen Schlaf zu tun.. 
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

SONHANDO CONTIGO
Às vezes quando me deito
e meus olhos se fecham,
com a chuva batendo na cornija
os seus dedos molhados,
tu vens a mim,
esguia corça hesitante,
dos territórios do sonho.
Então andamos ou nadamos ou voamos
por entre bosques, rios, bandos de animais,
estrelas e nuvens com tintas de arco-íris:
tu e eu, a caminho da terra de origem,
rodeados de mil formas e imagens do mundo,
ora na neve, ora ao fogo do sol,
ora afastados, ora muito juntos
e de mãos dadas.

Pela manhã o sono se dissipa,
afunda dentro de mim,
está em mim e já não é mais meu:
começo o dia calado, descontente e irritadiço,
porém algures continuamos a andar,
tu e eu, rodeados de coleções de imagens,
a interrogar-nos entre os encantos da vida
que nos embroma sem saber mentir.

*

TRAUM VON DIR 
Oft wenn ich zu Bett geh
Und die Augen fallen mir zu
Mit nassem Finger klopft am Sims der Regen,   
Da kommst mir du,
Schlankes zögerndes Reh, 
Aus Traumländern still entgegen.  
Wir gehen, oder schwimmen, oder schweben 
Durch Wald, Ströme, plauderndes Tiergevölk, 
Durch Sterne und regenbogenfarbenes Gewölk,
Ich und du, unterwegs nach dem Heimatland, 
Von tausend Gestalten und Bildern der Welt umgeben, 
Bald im Schnee, bald in Sonnenflammen,
Bald getrennt, bald nah zusammen 
Und Hand in Hand

Am Morgen ist der Traum entflossen, 
Tief sank er in mich hinein, 
Ist in mir und doch nicht mein, 
Schweigend beginn ich den Tag, unfroh und verdrossen,  
Aber irgendwo gehn wir auch dann, 
Ich und du, von Bilderspielen umgeben, 
Fragend durch ein verzaubertes Leben, 
Das uns täuschen und doch nicht betrügen kann.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

O AMANTE
Agora está teu amigo na calma noite acordado,
ainda morno de ti, ainda envolto em teu aroma,
em teu olhar e em teu cabelo e no teu beijo – ó meia-noite,
ó Lua e estrela e ar de névoa azulada!
De ti, amada, eleva-se o meu sonho
alto como do mar o monte e o precipício,
salpicado em ressaca e esvaído na espuma,
e é sol, bicho, raiz,
só por estar junto a ti.
Saturno e Lua gravitam longe, e eu não vejo:
só vejo a pálida flor do teu rosto,
e em silêncio me rio e embriagado choro,
nem alegria nem tristeza existe mais,
só tu, só tu e eu, imersos
no imenso Todo, no profundo mar,
e dentro nos perdemos,
e aí morremos e aí renascemos.

*

DER LIEBENDE
Nun liegt dein Freund wach in der milden Nacht,
Noch warm von dir, noch voll von deinem Duft,
Von deinem Blick und Haar und Kuß – o Mitternacht,
O Mond und Stern und blaue Nebelluft!
In dich, Geliebte, steigt mein Traum
Tief wie in Meer, Gebirg und Kluft hinein,
Verspritzt in Brandung und verweht zu Schaum,
Ist Sonne, Wurzel, Tier,
Nur um bei dir,
Um nah bei dir zu sein.
Saturn kreist fern und Mond, ich seh sie nicht,
Seh nur in Blumenblässe dein Gesicht,
Und lache still und weine trunken,
Nicht Glück, nicht Leid ist mehr,
Nur du, nur ich und du, versunken
Ins tiefe All, ins tiefe Meer,
Darein sind wir verloren,
Drin sterben wir und werden neugeboren.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

EM ALGUM LUGAR
No deserto da vida eu erro e ardo
a gemer sob o peso do meu fardo,
mas em algum lugar quase esquecidos
sei de frescos jardins em sombra e em flor.

Em algum lugar, nos confins do sonho,
sei que um abrigo vela
onde a alma volta a ter pátria
e estão à espera o sono, a noite e as estrelas.

*

IRGENDWO
Durch des Lebens Wüste irr ich glühend
Und erstöhne unter meiner Last,
Aber irgendwo, vergessen fast,
Weiß ich schattige Gärten kühl und blühend.

Aber irgendwo in Traumesferne
Weiß ich warten eine Ruhestatt,
Wo die Seele wieder Heimat hat,
Weiß ich Schlummer warten, Nacht und Sterne.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

O PEREGRINO
Estive sempre em viagem,
peregrino sempre.
Pouco tratei de mim:
sorte e azar vão e vêm.

Desconhecidos o sentido e o objetivo
do meu peregrinar,
das mil vezes que caí
tornei a me levantar.

Ah, havia a estrela do amor,
de que eu andava atrás:
lá nas alturas posta,
santa e longe demais.

Antes de conhecer o objetivo,
andei à toa:
tive sublimes prazeres
e alguma coisa boa.

Agora, que mal entrevi a estrela,
é tão tarde, afinal:
ela se escondeu, já,
desaba o aguaceiro matinal.

Despede-se o variegado mundo
a que eu tão bem queria: 
mesmo tendo perdido o objetivo,
a viagem valeu pela ousadia.

*

DER PILGER
Immer war ich auf der Fahrt,
Immer Pilgersmann,
Wenig hab ich mir bewahrt,
Glück und Weh zerrann.
 
Unbekannt war Sinn und Ziel
Meiner Wanderschaft,
Tausend Male, daß ich fiel,
Neu mich aufgerafft!
 
Ach, es war der Liebe Stern,
Den ich suchen ging,
Der so heilig und so fern
In den Höhen hing.
 
Eh das Ziel mir war bewußt,
Wanderte ich leicht,
Habe manche Höhenlust,
Manches Glück erreicht.
 
Nun ich kaum den Stern erkannt,
Ist es schon zu spät,
Hat er schon sich abgewandt,
Morgenschauer weht.
 
Abschied nimmt die bunte Welt,
Die so lieb mir ward.
Hab ich auch das Ziel verfehlt,
Kühn war doch die Fahrt.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

O POETA
À noite, eu muitas vezes não consigo dormir:
a vida dói.
Fico então a brincar com as palavras,
com as boas e as más,
com as gordas e as magras,
e vou nadando pelo espelho do mar delas.
Longínquas ilhas surgem com azuis palmeiras,
da praia sopra um vento perfumado,
na praia um menino cata conchinhas de várias cores,
banha-se em verde cristal uma mulher cor de neve.
Como no mar arrepiam-se as cores,
em minha alma flutuam sonhos-versos:
gotejam de prazer, enrijecem de luto,
bailam, correm, dispersam-se perdidos,
enrolam-se em palavras conformados com essa vestimenta,
interminavelmente vão trocando de som, forma e semblante,
parecem antiquíssimos e contudo cheios de inconsistência,
A maioria das pessoas não entende:
dão por loucura os sonhos e me dão por perdido
– e assim me veem mercadores, jornalistas, professores.
Crianças e mulheres muitas, de outro lado,
sabem de tudo e me amam como eu a elas,
pois também elas estão vendo o caos dos aspectos do mundo
e a elas também a deusa emprestou seu véu.

*

DER DICHTER
Nachts kann ich oft nicht schlafen,
Das Leben tut weh,
Da spiel ich dichtend mit den Worten,
Den schlimmen und den braven,
Den fetten und den verdorrten,
Schwimme hinaus in ihre still spiegelnde See.
Ferne Inseln mit Palmen erheben sich blau,
Am Strande weht duftender Wind,
Am Strande spielt mit farbigen Muscheln ein Kind,
Badet im grünen Kristall eine schneeweiße Frau.
Wie übers Meer die wehenden Farbenschauer
Über meine Seele die Versträume wehn,
Triefen von Wollust, starren in Todestrauer,
Tanzen, rennen, bleiben verloren stehen,
Kleiden sich in der Worte viel zu bescheidenes Kleid,
Wechseln unendlich Klang, Gestalt und Gesicht,
Scheinen uralt und sind doch so voll Vergänglichkeit.
Die meisten verstehen das nicht,
Halten die Träume für Wahnsinn und mich für verloren,
Sehn mich an, Kaufleute, Redakteure und Professoren -
Andre aber, Kinder und manche Frauen,
Wissen alles und lieben mich wie ich sie,
Weil auch sie das Chaos der Bilderwelt schauen,
Weil auch ihnen die Göttin den Schleier lieh.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

LOBO DA ESTEPE
Lobo da estepe, vou eu trotando, trotando.
O mundo cobre-se todo de neve.
De uma bétula, sai voando um corvo;
mas em nenhum lugar se vê uma lebre,
não se vê uma gazela.
Com as gazelas sou tão delicado,
ah, se uma aparecesse!
Tomá-la-ia nas garras, nos dentes:
não há coisa mais linda.
Aos mansos, mostro o meu bom coração:
em seus tenros pernis enterraria suavemente os dentes,
e o sangue claro eu iria sorvendo até mais não poder,
para ficar depois a noite inteira uivando em solidão.
Uma lebre já me contentaria:
mornas carnes de gosto doce à noite.
— Mas será que de mim se esconde tudo
que torna a vida um pouco mais bonita?
Em minha cauda o pelo já branqueia
e eu já não tenho a vista tão certeira;
faz anos que morreu-me a companheira.
Agora vou eu trotando e sonhando com gazelas,
vou eu trotando e sonhando com lebres,
ouvindo o vento a zunir na noite de inverno;
engulo neve, a ver se a goela me acalma,
e vou seguindo com o diabo na alma.

*

STEPPENWOLF
Ich Steppenwolf trabe und trabe, 
Die Welt liegt voll Schnee, 
Vom Birkenbaum flügelt der Rabe, 
Aber nirgends ein Hase, nirgends ein Reh! 
In die Rehe bin ich so verliebt, 
Wenn ich doch eins fände! 
Ich nähm's in die Zähne, in die Hände, 
Das ist das Schönste, was es gibt. 
Ich wäre der Holden so von Herzen gut, 
Fräße mich tief in ihre zärtlichen Keulen, 
Tränke mich satt an ihrem hellroten Blut, 
Um nachher die ganze Nacht einsam zu heulen. 
Sogar mit einem Hasen war ich zufrieden, 
Süß schmeckt sein warmes Fleisch in der Nacht - 
Ach, ist denn alles von mir geschieden, 
Was das Leben ein bißchen fröhlicher macht? 
An meinem Schwanz ist das Haar schon grau, 
Auch kann ich nicht mehr ganz deutlich sehen, 
Schon vor Jahren starb meine liebe Frau. 
Und nun trab ich und träume von Rehen, 
Trabe und träume von Hasen, 
Höre den Wind in der Winternacht blasen, 
Tränke mit Schnee meine brennende Kehle,
Trage dem Teufel zu meine arme Seele.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

OS IMORTAIS
Agora e sempre dos fundos vales da terra
sobe até nós a fumegante compulsão da vida:
necessidade selvática, alucinante transporte,
embriaguez sanguinária de mil nações de carrascos,
longos espasmos de gozo, intermináveis desejos,
mãos de assassinos, mãos de agiotas, mãos de beatos,
magote humano fustigado de prazer e medo,
que cheira a podre e abafado, brutal e quente,
transpira beatitude e rudes cios,
a um tempo se devora e se vomita,
choca guerras e artes refinadas,
adorna de ilusões o abrasado bordel,
e se enrola e consome e fornica em picantes
passatempos de feira em seu mundo infantil,
a erguer-se renovado ao passar cada onda,
como antes dela vir se decompunha em esterco.

Nós, ao contrário, já nos encontramos
no gelo do éter constelado por dentro,
dia e hora não contam para nós,
nem homens nem mulheres, jovens nem velhos, somos.
Vossos pecados e vossos temores,
vossos crimes e lascivos deleites,
são para nós uma cena como a dos astros nas órbitas,
e para nós o mais longo dos dias é qualquer um.
Silentes balançamos a cabeça ante a palpitação de vossas vidas,
silentes contemplamos as estrelas que em si mesmas gravitam,
respirarmos o inverno do universo,
já afeiçoados ao dragão celeste.
Frio e imutável é o nosso eterno existir,
frio e alumiado de astros é o eterno riso nosso.

*

DIE UNSTERBLICHEN
Immer wieder aus der Erde Tälern
Dampft zu uns empor des Lebens Drang,
Wilde Not, berauschter Überschwang,
Blutiger Rauch von tausend Henkersmählern
Krampf der Lust, Begierde ohne Ende,
Mörderhände, Wuchererähäande, Beterhände,
Angst- und lustgepeitschterMenschenschwarm
Dunstet schwül und faulig, roh und warm,
Atmet Seligkeit und wilde Brünste,
Frißt sich selbst und speit sich wieder aus,
Brütet Kriege aus und holde Künste,
Schmückt mit Wahn das brennende Freudenhaus,
Schlingt und zehrt und hurt sich durch die grellen
Jahrmarktsfreuden ihrer Kinderwelt,
Hebt für jeden neu sich aus den Wellen,
Wie sie jedem einst zu Kot zerfällt.

Wir dagegen haben uns gefunden,
In des Äthers sterndurchglänztem Eis,
Kennen keine Tage, keine Stunden,
Sind nicht Mann noch Weib, nicht jung noch Greis.
Eure Sünden sind eure Ängste,
Euer Mord und eure geilen Wonnen
Schauspiel uns gleichwie die kreisenden Sonnen,
Jeder einzige Tag ist uns der längste.
Still zu eurem zuckenden Leben nickend,
Still in die sich drehenden Sterne blickend
Atmen wir des Weltraums Winter ein,
Sind befreundet mit dem Himmelsdrachen,
Kühl und wandellos ist unser ewiges Sein,
Kühl und sternhell unser ewiges Lachen.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

AO POETA INDIANO BHARTRIHARI
Igual a ti, ancestre e irmão, também vou eu
entre o espírito e o instinto, em zigue-zague:
hoje sábio, doido amanhã, hoje de todo
entregue a Deus, amanhã ao ardor da carne.
Com ambos os açoites vou me flagelando
em sangue os costados: volúpia e penitência 
– monge ou estróina, pensador ou bestial.
A culpa do existir em mim pede perdão.
Hei de pagar pecados em ambos caminhos,
em ambos fogos ardendo me aniquilar.

Os que me veneravam ontem como santo,
hoje em mim vêem um perdido libertino;
os que comigo chafurdavam na sarjeta
ontem, hoje me vêem jejuar e orar;
e todos cospem de lado e fogem de mim 
– o amante falso, sem decoro e dignidade.
Em minha coroa de espinhos eu também
trago, entre as rosas rubras, a flor do desdém.

Hipócrita palmilho um mundo de aparências,
malquisto por vós e por mim, para as crianças
um monstro – e sei que qualquer ação, vossa ou minha,
perante Deus pesa menos que o pó ao vento.
E sei mais: nesta senda inglória de pecado
me sopra o bafo de Deus e eu devo agüentá-lo,
devo abusar – cada vez mais culpado, no êxtase
do prazer ou na proscrição dos meus malfeitos.

Qual o sentido desta agitação, não sei:
com as imundas e perversas mãos esfrego
o pó e o sangue do meu rosto – e bem ou mal
este caminho hei de levar até o final.

*

AN DEN INDISCHEN DICHTER BHARTRIHARI
Wie du, Vorfahr und Bruder, geh auch ich
Im Zickzack zwischen Trieb und Geist durchs Leben,
Heut Weiser, morgen Narr, heut inniglich
Dem Gotte, morgen heiß dem Fleisch ergeben.
Mit beiden Büßergeißeln schlag ich mir
Die Lenden blutig: Wollust und Kasteiung;
Bald Mönch, bald Wüstling, Denker bald, bald Tier;
Des Daseins Schuld in mir schreit nach Verzeihung.
Auf beiden Wegen muß ich Sünde richten,
In beiden Feuern brennend mich vernichten.

Die gestern mich als Heiligen verehrt,
Sehn heute in den Wüstling mich verkehrt,
Die gestern mit mir in den Gossen lagen,
Sehn heut mich fasten und Gebete sagen,
Und alle speien aus und fliehen mich,
Den treulos Liebenden, den Würdelosen;
Auch der Verachtung Blume flechte ich
In meines Dornenkranzes blutige Rosen.

Scheinheilig wandl' ich durch die Welt des Scheins,
Mir selbst wie euch verhaßt, ein Greuel jedem Kinde,
Und weiß doch: alles Tun, eures wie meins,
Wiegt weniger vor Gott als Staub im Winde.
Und weiß: auf diesen ruhmlos sündigen Pfad
Weht Gottes Atem mich, ich muß es dulden,
Muß weiter treiben, tiefer mich verschulden
Im Rausch der Lust, im Bann der bösen Tat.

Was dieses Treibens Sinn sei, weiß ich nicht.
Mit den befleckten, lasterhaften Händen
Wisch ich mir Staub und Blut vom Angesicht
Und weiß nur: diesen Weg muß ich vollenden.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

ENSINAMENTO 
Mais ou menos embuste, meu querido rapaz,
há sempre nas palavras de todas as criaturas:
definitivamente damos conosco em fraldas 
e logos nos achamos dentro da sepultura.

Jazendo então ao lado de nossos ancestrais,
enfim sábios e plenos de fria lucidez
vamos com brancos ossos repicando a verdade, 
e uns mentem só pensando em viver mais uma vez.

*

BELEHRUNG
Mehr oder Weniger, mein lieber Knabe,
sind schließlich alle Menschenworte Schwindel,
verhältnismäßig sind wir in der Windel
am ehrlichsten, und später dann im Grabe.

Dann legen wir uns zu den Vätern nieder,
sind endlich weise und voll kühler Klarheit,
mit blanken Knochen klappern wir die Wahrheit,
und mancher lög und lebte lieber wieder.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

A MORTE A PESCAR DE ANZOL
Senta-se a Morte e vai pescando-nos da vida
com sua linha torpe, invisível e fina.
Não há truque ou esforço que nos valha mais:
ela tem paciência e uma isca que fascina.

Quem cai no seu anzol, pode cavar na areia
ou no lodo, ou tentar qualquer manha mesquinha:
senta-se a Morte nele, e não mais lá na beira.
Está perdido, mesmo que arrebente a linha.

Pode, numa escapada, no fundo revolto
longo tempo esconder-se ainda com medo dela:
para finar-se, está completamente solto.
Nada tem gosto mais: o anzol pegou na goela.

*

DER TOD ALS ANGLER
Es sitzt der Tod und angelt uns mit schnöder,
Unsichtbar dünner Leine aus dem Leben.
Uns hilft kein Klugsein und kein Mühegeben;
Er hat Geduld, und magisch lockt sein Köder.

Wen seine Angel packt, der mag sich bohren 
In Sand und Schlamm und alle Listen üben, 
Der Tod sitzt in ihm, nicht am Ufer drüben!
Selbst wenn die Leine reißt, ist er verloren. 

Er mag, entronnen, im durchwühlten Grunde 
Noch lange Zeit erschrocken sich verkriechen, 
Wohl ist er frei, doch nur um hinzusiechen.
Die Lust ist hin. Die Angel sitzt im Schlunde.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

GOTA
Nos dias em que os dedos não posso dobrar
passam-me as horas todas escrevendo versos;
e se acaso algum verso bom eu chego a achar,
pouco me importa a dor, a gota, o universo.

Em outros dias é impraticável a escrita
e eu fico a ouvir a que do fundo dos meus ossos
avulta sobre mim, serpenteando sempre 
– a morte, sim, a quem também chamamos gota.

Não gosto dela: nós estamos sempre em luta.
Mas eu sei, muitas vezes, que não é por mal
que se cansa comigo: visa à redenção!
E avanço com vontade mais um estirão.

No dia em que nos virmos unidos e em paz,
de gota nem de morte eu a chamarei mais:
hei de vê-la então como eterna mãe, seu grito
como sinal de amor, e eu como filho aflito.

*

GICHT
An Tagen, wo ich meine Finger biegen kann,
Vergehn mit Verseschreiben mir die Stunden,
Und wenn ich einen guten Vers gefunden,
Geht mich die Welt, die Gicht, der Schmerz nichts an.

An andern Tagen geht das Schreiben nicht.
Dann lausch ich dem, der tief in meinen Knochen
Sich dehnt und immer weiter kommt gekrochen,
Es ist der Tod, doch nennen wir ihn Gicht.

Ich lieb ihn nicht, oft liegen wir im Streit.
Doch weiß ich manchmal, daß er nicht im Bösen
Sich um mich müht. Sein Amt ist das Erlösen,
Und willig folg ich eine Strecke weit.

Wenn wir einst ganz versöhnt und einig sind,
Dann werd ich ihn nicht Gicht, nicht Tod mehr nennen.
Als ewige Mutter werd ich ihn erkennen,
Als Liebe seinen Ruf, und mich als Kind.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

A MORTE A PESCAR DE ANZOL
Senta-se a Morte e vai pescando-nos da vida
com sua linha torpe, invisível e fina.
Não há truque ou esforço que nos valha mais:
ela tem paciência e uma isca que fascina.

Quem cai no seu anzol, pode cavar na areia
ou no lodo, ou tentar qualquer manha mesquinha:
senta-se a Morte nele, e não mais lá na beira.
Está perdido, mesmo que arrebente a linha.

Pode, numa escapada, no fundo revolto
longo tempo esconder-se ainda com medo dela:
para finar-se, está completamente solto.
Nada tem gosto mais: o anzol pegou na goela.

*

DER TOD ALS ANGLER
Es sitzt der Tod und angelt uns mit schnöder,
Unsichtbar dünner Leine aus dem Leben.
Uns hilft kein Klugsein und kein Mühegeben;
Er hat Geduld, und magisch lockt sein Köder.

Wen seine Angel packt, der mag sich bohren 
In Sand und Schlamm und alle Listen üben, 
Der Tod sitzt in ihm, nicht am Ufer drüben!
Selbst wenn die Leine reißt, ist er verloren. 

Er mag, entronnen, im durchwühlten Grunde 
Noch lange Zeit erschrocken sich verkriechen, 
Wohl ist er frei, doch nur um hinzusiechen.
Die Lust ist hin. Die Angel sitzt im Schlunde.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

GOTA
Nos dias em que os dedos não posso dobrar
passam-me as horas todas escrevendo versos;
e se acaso algum verso bom eu chego a achar,
pouco me importa a dor, a gota, o universo.

Em outros dias é impraticável a escrita
e eu fico a ouvir a que do fundo dos meus ossos
avulta sobre mim, serpenteando sempre 
– a morte, sim, a quem também chamamos gota.

Não gosto dela: nós estamos sempre em luta.
Mas eu sei, muitas vezes, que não é por mal
que se cansa comigo: visa à redenção!
E avanço com vontade mais um estirão.

No dia em que nos virmos unidos e em paz,
de gota nem de morte eu a chamarei mais:
hei de vê-la então como eterna mãe, seu grito
como sinal de amor, e eu como filho aflito.

*

GICHT
An Tagen, wo ich meine Finger biegen kann,
Vergehn mit Verseschreiben mir die Stunden,
Und wenn ich einen guten Vers gefunden,
Geht mich die Welt, die Gicht, der Schmerz nichts an.

An andern Tagen geht das Schreiben nicht.
Dann lausch ich dem, der tief in meinen Knochen
Sich dehnt und immer weiter kommt gekrochen,
Es ist der Tod, doch nennen wir ihn Gicht.

Ich lieb ihn nicht, oft liegen wir im Streit.
Doch weiß ich manchmal, daß er nicht im Bösen
Sich um mich müht. Sein Amt ist das Erlösen,
Und willig folg ich eine Strecke weit.

Wenn wir einst ganz versöhnt und einig sind,
Dann werd ich ihn nicht Gicht, nicht Tod mehr nennen.
Als ewige Mutter werd ich ihn erkennen,
Als Liebe seinen Ruf, und mich als Kind.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

LANTERNAS EM NOITE DE VERÃO
Quentes na fresca sombra do jardim
bóiam fileiras de lanternas coloridas:
no tumulto das folhas, irradiam
um clarão terno e recheado de mistério.

Sorri uma em cor clara de limão,
riem-se gordas as brancas e as encarnadas;
uma azul dá a impressão de residir
com algo de espírito e lua entre as ramadas.

De repente uma delas pega fogo,
tem um assomo trêmulo e se extingue logo...
Juntas e mudas ficam tremendo as irmãs,
sorrindo à espera da morte chegar:
a purpurina, a ouro-de-vinho, a azul-luar.

*

LAMPIONS IN DER SOMMERNACHT
Warm in dunkler Gartenkühle
Schweben bunte Ampelreihn,
Senden aus dem Laubgewühle
Zart geheimnisvollen Schein.

Eine lächelt hell zitronen,
Rot und weiße lachen feist,
Eine blaue scheint zu wohnen
Im Geäst wie Mond und Geist.

Eine plötzlich steht in Flammen,
Zuckt empor, ist rasch verloht...
Schwestern schauern still zusammen,
Lächeln, warten auf den Tod:
Mondblau, Weingelb, Sammetrot.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

OUTONO PRECOCE
Odor picante já de folhas murchas,
trigais a abrir-se  vagos e sem vista:
sabe-se que das tempestades próximas
uma desnucará nosso exausto verão.

As vagens da giesta rangem. De repente 
avultam ante nós o distante e o lendário:
o que hoje imaginamos ter na mão
perde-se, e cada flor, misteriosamente.

Na alma assustada cresce um tímido desejo:
de não prender-se à  vida  em demasia,
de aceitar como as árvores o emurchecer,
de não deixar que ao seu outono faltem cores e alegria.

*

VERFRÜHTER HERBST
Schon riecht es scharf nach angewelkten Blättern,
Kornfelder stehen leer und ohne Blick;
Wir wissen: eines von den nächsten Wettern
Bricht unserm müden Sommer das Genick.

Die Ginsterschoten knistern. Plötzlich wird
Uns all das fern und sagenhaft erscheinen,
Was heut wir in der Hand zu halten meinen,
Und jede Blume wunderbar verirrt.

Bang wächst ein Wunsch in der erschreckten Seele:
Daß sie nicht allzu sehr am Dasein klebe,
Daß sie das Welken wie ein Baum erlebe,
Daß Fest und Farbe ihrem Herbst nicht fehle.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

ENTARDECER DE VERÃO 
      NUMA CABANA SILVESTRE EM TICINO
Brinca ainda nos troncos dos plátanos a luz.
Por entre as altas frondes arqueadas filtra-se ainda o azul
a espelhar-se no vinho. Uma mulher
invisível no bosque fala com crianças.
De uma aldeia na várzea sobe a música
domingueira e suada a ressoar;
Lá fora, aos raios oblíquos do sol,
fumega ainda o mundo do verão aquecido e pesado.

Aqui porém respiram folhas de mato e pedras,
conventual inocência perpassa e a tarde cai em festa,
o bocado de pão e o vinho fresco
provendo com suave poder de sonho mágico.
Rescende picante e forte a filifolha do caminho,
já entre as madeiras a ratazana desperta,
o primeiro morcego persegue a sua presa
pelos varais de entrelaçados galhos.
E som por som, então, e luz por luz,
o dia morre – e das árvores brota
pesada e grossa, cheirando a resina e mel, 
a noite que maternalmente nos aquieta.

Vão se esfumando com o dia os nomes
com que pomos em ordem nosso mundo:
plátano, ácer, freixo, penedia, casa 
– fundem-se numa coisa só, e a policrônica
variedade retorna ao seio da mãe,
entregue toda ao surdo prazer da infância.
Cheiram a medo o fungo e a hortaliça, uma coruja pia,
o trançado das folhagens das árvores oscila vagarento.

Que cheiro bom tem mesmo assim a efemeridade!
Como o espírito anela pelo sangue, e o dia pela noite!

*

SOMMERABEND
        VOR EINEM TESSINER WALDKELLER
An den Platanenstämmen spielt noch Licht.
Durchs hohe Astgewölbe blickt noch Blau
Und spiegelt sich im Wein. Im Walde spricht
Mit Kindern eine unsichtbare Frau.
Aus einem Dorf im Tale lärmt Musik
Sonntäglich her und klingt nach Schweiß;
Dort draußen unterm schrägen Sonnenblick
Dampft sommerliche Welt noch schwer und heiß.

Hier aber atmet Waldlaub und Gestein,
Weht Unschuld klösterlich und Feierabend,
Den Bissen Brot, die kühle Schale Wein
Mit holder Zaubertraumkraft fromm begabend.
Farnkraut am Wege duftet scharf und strenge,
Schon wird im Holz der Siebenschläfer wach,
Die erste Fledermaus jagt durchs Gestänge
Gekreuzter Äste ihrem Raube nach.
Und nun stirbt Laut um Laut und Licht um Licht
Der Tag dahin, und aus den Bäumen quillt,
Wie Harz und Honig duftend, schwer und dicht
Herab die Nacht, die mütterlich uns stillt.

Es löschen mit dem Tag die Namen aus,
Mit denen wir geordnet unsere Welt:
Platane, Ahorn, Esche, Felsen, Haus
Schmelzen in Eines, hingegeben fällt
Die bunte Vielfalt an der Mutter Brust
Zurück und in der Kindheit dumpfe Lust.
Kraut duftet bang und Pilz, ein Waldkauz schreit,
Das Laubgewirr der Bäume taumelt sacht...

Wie selig duftet doch Vergänglichkeit!
Wie sehnt sich Geist nach Blut, und Tag nach Nacht!
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

REMINISCÊNCIA 
        DO VERÃO DE KLINGSOR
Dez anos já passados desde um verão em Klingor 
quando, junto com ele, varando a noite quente,
entre vinho e mulheres perdidas eu  florescia 
e entoava as canções dos boêmios do lugar.

Como as noites de agora me parecem insípidas,
como vão por aí apagados os meus dias!
Mesmo que uma palavra mágica devolvesse
a embriaguez de outrora – eu não quereria mais.

Não fazer mais girar para trás a roda  célere!
Dizer um sim tranqüilo  à morte mansa no sangue!
Não ter mais pretensão de alcançar o inconcebível:
é esta agora minha lei, o bem de minha alma.

Outra glória, outro encanto, depois daquele tempo
me tocou muitas vezes: ser apenas um espelho
no qual por horas pousam, como no Reno a lua,
imagens das estrelas, dos anjos e de Deus!

*

GEDENKEN 
  AN DEN SOMMER KLINGSORS
Zehn Jahre schon, seit Klingors Sommer glühte 
Und ich mit ihm die warmen Nächte lang 
Bei Wein und Frauen so verloren blühte 
Und seine trunknen Klingsor-Lieder sang!        
                                                
Wie anders schau´n und nüchtern jetzt die Nächte,  
Wie so viel stiller geht mein Tag einher! 
Wenn auch ein Zauberwort mir wiederbrächte  
Den Rausch von einst – ich wollte ihn nicht mehr.      
                        
Das eilige Rad nicht mehr zurückzurollen, 
Still zu bejah‘n den leisen Tod im Blut, 
Nicht mehr das Unausdenkliche zu wollen,  
Ist meine Weisheit jetzt, mein Seelengut.  
                                                        
Ein andres Glück, ein neuer Zauber faßten 
Seither mich manchmal: nichts als Spiegel sein,   
Darin für Stunden, so wie Mond im Rhein, 
Der Sterne, Götter, Engel Bilder rasten.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

O POETA E SEU TEMPO
Fiel a imagens eternas, firme na contemplação,
tu estás pronto para o ato e para o sacrifício;
falta-te ainda, no entanto, um tempo desassombrado
de ofício e púlpito, confiança e autoridade.

Há de bastar-te, num posto perdido,
ante o deboche do mundo, compenetrado da fama que tens,
renunciando ao brilho e aos prazeres do mundo,
guardar aqueles tesouros que não azinhavram nunca.

Não te faz mal a zombaria das feiras,
enquanto ouves a voz sagrada, ao menos:
se ela entre incertezas cala, te sentes um renegado
do próprio coração – feito um bobo na terra.

Pois é melhor, por uma realização futura,
servir sofrendo, ser sacrificado,
do que ter grandeza e reino pela traição
ao sentido do teu sofrer – tua missão.

*

DER DICHTER UND SEINE ZEIT
Den ewigen Bildern treu, standhaft im Schauen
Stehst du zu Tat und Opferdienst bereit.
Doch fehlt in einer ehrfurchtlosen Zeit
Dir Amt und Kanzel, Würde und Vertrauen.

Dir muß genügen, auf verlorenem Posten,
Der Welt zum Spott, nur deines Rufs bewußt,
Auf Glanz verzichtend und auf Tageslust,
Zu hüten jene Schätze, die nicht rosten.

Der Spott der Märkte mag dich kaum gefährden,
Solang dir nur die heilige Stimme tönt;
Wenn sie in Zweifeln stirbt, stehst du verhöhnt
Vom eigenen Herzen als ein Narr auf Erden.

Doch ist es besser, künftiger Vollendung
Leidvoll zu dienen, Opfer ohne Tat,
Als groß und König werden durch Verrat
Am Sinne deines Leids: an deiner Sendung.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

CANTO DA MORTE DE ABEL
Morto jaz na relva Abel:
fugiu seu irmão Caim.
Um pássaro aproxima-se, mergulha o bico
no sangue, leva um susto e sai voando.

Foge o pássaro pelo mundo inteiro,
molhado o vôo, estridulante a voz,
carpindo o seu lamento interminável:
sobre o formoso Abel e a dor da sua morte,
sobre o feio Caim e seu mortal pecado,
sobre seus próprios dias juvenis.
Logo lhe atira Caim ao coração sua flecha:
e logo há de levar disputa e guerra e morte
a todas as cabanas e cidades,
fará inimigos para assassiná-los,
a eles e a si mesmo em desespero odiando,
a eles e a si mesmo por todos os becos
caçando torturado até à próxima Noite Universal,
até de si por fim vomitar-se Caim.

Foge o pássaro: do seu bico ensangüentado
um lamento de morte faz-se ouvir cobrindo o mundo inteiro.
Caim o escuta, o morto Abel o escuta,
mil o escutam sob o toldo celeste,
dez mil e mais não o escutam, porém,
sobre a morte de Abel não querem saber nada,
nada sobre Caim e o peso em seu coração,
nada do sangue a jorrar de tantas feridas,
nada da guerra que estava aí ainda ontem
e da qual sabem agora lendo romances.
Para esses todos, alegres e satisfeitos,
fortes e brutos,
Caim e Abel, tristeza e morte, não existem:
louvam a guerra como um tempo formidável.

E quando passa voando o pássaro lamentoso
dizem que é agourento e pessimista,
sentem-se fortes e invictos,
e apedrejam o pássaro
até fazê-lo calar e sumir,
ou tocam música para não mais o ouvirem
porque a voz triste dele os incomoda.

O pássaro com suas pequeninas
gotas de sangue no bico, voa de um a outro lugar
e o seu pranto por Abel não para de ressoar.

*

DAS LIED VON ABELS TOD
Tot in den Gräsern liegt Abel,
Bruder Kain ist entflohn.
Ein Vogel kommt, taucht den Schnabel
Ins Blut, schrickt auf. fliegt davon.

Der Vogel flieht durch die ganze Welt,
Sein Flug ist scheu, seine Stimme gellt,
Er klagt unendliche Klage:
Um den schönen Abel und seinen Todesschmerz,
Um den finsteren Kain imd seine Seelennot,
Um seine eigenen jungen Tage.
Bald schiesst ihm Kain seinen Pfeil ins Herz,
Bald wird er Streit und Krieg und Tod
In alle Hütten und Städte tragen,
Wird sich Feinde schaffen und sie erschlagen,
Wird sie und sich selber verzweifelt hassen,
Wird sie und sich selber in allen Gassen
Verfolgen und quälen bis zur nächsten Welten-Nacht,
Bis Kain endlich sich selber umgebracht.

Der Vogel flieht, aus seinem blutigen Schnabel
Schreit Todesklage über die ganze Welt.
Es hört ihn Kain, es hört ihn der tote Abel,
Es hören ihn Tausend unterm Himmelszelt.
Zehntausend aber und mehr, die hören ihn nicht,
Sie wollen nichts wissen von Abels Tod,
Nichts von Kain und seiner Herzensnot,
Nichts vom Blut, das aus so vielen Wunden bricht,
Nichts vom Krieg, der noch gestern gewesen
Und von dem sie jetzt in Romanen lesen.
Für sie alle, die Satten und Frohen,
Die Starken und die Rohen
Gibt es nicht Kain noch Abel, nicht Tod noch Leid,
Und den Krieg preisen sie als grosse Zeit.

Und wenn der klagende Vogel vorüberfliegt,
Dann nennen sie ihn Schwarzseher und Pessimist,
Fühlen sich stark und unbesiegt
Und werfen nach dem Vogel mit Steinen.
Bis er verstiunmt und verschwunden ist.
Oder machen Musik, dass mein ihn nicht mehr hört.
Weil seine traurige Stimme sie stört.

Der Vogel mit seinem kleinen
Blutstropfen am Schnabel fliegt von Ort zu Ort,
Seine Klage um Abel tönt fort und fort.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

BORBOLETA AZUL
Pequenina borboleta
azul no vento esvoaça:
um tremor de madrepérola
flameja, reluz e passa.
Num átimo, num piscar
de olhos, eu vi assim
flamejante e reluzente
a sorte passar por mim.

*

BLAUER SCHMETTERLING
Flügelt ein kleiner blauer
Falter vom Wind geweht,
Ein perlmutterner Schauer,
Glitzert, flimmert, vergeht.
So mit Augenblicksblinken,
So im Vorüberwehn
Sah ich das Glück mir winken,
Glitzern, flimmern, vergehn.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

SETEMBRO
Entristece o jardim.
Fria nas flores a chuva cai.
O verão se arrepia
em silêncio diante do seu fim.

Pétala a pétala goteja em ouro
do alto pé de acácia.
O verão ri abatido e perplexo
no sonho do jardim em agonia.

A prolongar-se ainda junto às rosas,
ele espera, de pé, pelo repouso,
e os grandes olhos fatigados vai
entrecerrando aos poucos.

*

SEPTEMBER
Der Garten trauert, 
kühl sinkt in die Blumen der Regen. 
Der Sommer schauert
still seinem Ende entgegen.

Golden tropft Blatt um Blatt
nieder vom hohen Akazienbaum. 
Sommer lächelt erstaunt und matt
in den sterbenden Gartentraum.

Lange noch bei den Rosen
bleibt er stehn, sehnt sich nach Ruh, 
langsam tut er
die müdgeword'nen Augen zu.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

LINGUAGEM
O sol nos fala com luz; com cor
e com perfume nos fala a flor;
com nuvens, chuva e neve nos fala
o ar. Há no sacrário do mundo
um incontido afã de romper
com a mudez das coisas e expor
em gesto e som, em palavra e cor,
todo o mistério que envolve o ser.
A clara fonte das artes flui
para a palavra, a revelação;
para o mental flui o mundo, e aclara 
em lábio humano um saber eterno.
Pela linguagem a vida anseia:
em verbo, cifra, cor, linha som,
conjura-se a nossa aspiração
e um alto trono aos sentidos ergue.
Como na flor o vermelho e o azul,
na palavra do poeta volta-se
para dentro a obra de criação,
sempre a iniciar-se e e acabar jamais.
Onde palavra e som se combinam,
e soa o canto, a arte se revela,
e cada cântico e cada livro,
cada imagem, é uma descoberta 
– uma milésima tentativa
de cumprimento da vida uma.
A penetrar nessa vida una
vos chama a música, a poesia:
para entender a criação vária,
já e bastante um olhar no espelho.
O que confuso antes parecia,
é claro e simples na poesia:
a nuvem chove, a flor ri, o mudo 
fala – o mundo faz sentido em tudo.

*

SPRACHE
Die Sonne spricht zu uns mit Licht,
Mit Duft und Farbe spricht die Blume,
Mit Wolken, Schnee und Regen spricht
Die Luft. Es lebt im Heiligtume
Der Welt ein unstillbarer Drang,
Der Dinge Stummheit zu durchbrechen,
In Wort, Gebärde, Farbe, Klang
Des Seins Geheimnis auszusprechen.
Hier strömt der Künste lichter Quell,
Es ringt nach Wort, nach Offenbarung,
Nach Geist die Welt und kündet hell
Aus Menschenlippen ewige Erfahrung.
Nach Sprache sehnt sich alles Leben,
In Wort und Zahl, in Farbe, Linie, Ton
Beschwört sich unser dumpfes Streben
Und baut des Sinnes immer höhern Thron.
In einer Blume Rot und Blau,
In eines Dichters Worte wendet
Nach innen sich der Schöpfung Bau,
Der stets beginnt und niemals endet.
Und wo sich Wort und Ton gesellt,
Wo Lied erklingt, Kunst sich entfaltet,
Wird jedesmal der Sinn der Welt,
Des ganzen Daseins neu gestaltet,
Und jedes Lied und jedes Buch
Und jedes Bild ist ein Enthüllen,
Ein neuer, tausendster Versuch,
Des Lebens Einheit zu erfüllen.
In diese Einheit einzugehn
Lockt euch die Dichtung, die Musik,
Der Schöpfung Vielfalt zu verstehn
Genügt ein einziger Spiegelblick.
Was uns Verworrenes begegnet,
Wird klar und einfach im Gedicht:
Die Blume lacht, die Wolke regnet,
Die Welt hat Sinn, das Stumme spricht.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

PARA NINON
Por ficares junto a mim
quando escura é minha vida
e fora os astros têm pressa.
e tudo faz-se esplendor.

Por saberes ver um fulcro
nas engrenagens da vida 
– és como um anjo do bem
para mim, com teu amor.

Em minha treva adivinhas
a estrela tão escondida
e com teu amor me apontas
o cerne doce da vida.

*

FÜR NINON
Daß du bei mir magst weilen,
Wo doch mein Leben dunkel ist
Und draußen Sterne eilen
Und alles voll Gefunkel ist,

Daß du in dem Getriebe
Des Lebens eine Mitte weißt,
Macht dich und deine Liebe
Für mich zum guten Geist.

In meinem Dunkel ahnst du
Den so verborgnen Stern.
Mit deiner Liebe mahnst du
Mich an des Lebens süßen Kern.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

SEI DE ALGUMAS....
Em certas almas é tão arraigada a infância,
que elas não perdem nunca de todo a magia:
vivem numa cegueira povoada de sonho
e jamais falam a língua do dia-a-dia.

Ai delas, quando alguma desgraça as alcança,
a lhes abrir os olhos para a realidade!
Postas fora do sonho e da infantil confiança,
fitam a vida com horror e em desamparo.

Sei de algumas que a guerra veio despertar
quando estavam passando já da meia-noite: 
ficaram, desde aí, a ir e vir pela vida
como sonâmbulos trêmulos e assustados.

É qual se a espécie humana, em tais desesperados,
buscasse a própria terra encharcada de sangue
e a própria atrocidade e a própria alma perdida,
com temor e tremor de se tornar consciente.

*

ICH WEISS VON SOLCHEN
In manchen Seelen wohnt so tief die Kindheit,
dass sie den Zauber niemals ganz durchbrechen,
sie leben hin in traumgefüllter Blindheit
und lernen nie des Tages Sprache sprechen.

Weh ihnen, wenn ein Unheil sie erschreckt
und plötzlich hell zur Wirklichkeit erweckt!
Aus Traum gescheucht und kindlichem Vertrauen
starren sie hilflos in des Lebens Grauen.

Ich weiß von solchen, die der Krieg erst weckte,
da sie des Lebens Mitte überschritten,
und die seither am Leben wie erschreckte
Traumwandler zitternd und geängstigt litten.

Es scheint: in diesen Hoffnungslosen sucht
die Menschheit ihrer blutgetränkten Erden,
sucht ihrer Grausamkeit und Seelenflucht
erschauernd und beschämt bewusst zu werden.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

A NOTÍCIA 
    DA MORTE DE UM AMIGO
Murcha depressa o efêmero.
Dissipam-se depressa os anos gastos.
Olham zombando os astros que eternos parecem.

Dentro de nós, o espírito somente
pode assistir impassível ao jogo
sem zombaria ou dor:
“efêmero” e “eterno” para ele
querem dizer mais ou menos o mesmo.

O coração, porém,
luta e em amor se inflama,
e capitula, emurchecida flor,
ante o infinito chamado da morte,
ante o infinito chamado do amor.

*

BEI DER NACHRICHT 
           VOM TOD EINES FREUNDES
Schnell welkt das Vergängliche. 
Schnell stieben die verdorrten Jahre davon. 
Spöttisch blicken die scheinbar ewigen Sterne.

In uns innen der Geist allein 
Mag unbewegt schauen das Spiel, 
Ohne Spott, ohne Schmerz. 
Ihm sind »vergänglich« und »ewig« 
Gleich viel, gleich wenig... 

Aber das Herz 
Wehrt sich, glüht auf in Liebe, 
Und ergibt sich, welkende Blume,  
Dem unendlichen Todesruf, 
Dem unendlichen Liebesruf.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

SEXTA-FEIRA SANTA
Dia encoberto, neve ainda no bosque,
pia um melro no galho desfolhado;
paira a medo um sopro de primavera
inchado de prazer, de água encharcado.

Pequenino e silente em meio à relva
o tufo de açafrão ou de violetas
tem perfume e não sabe a que o empresta:
perfuma por igual a morte e a festa.

Lágrimas cegam os brotos nas árvores,
o céu pende pertíssimo e inquieto;
são Gólgotas e são Getsêmanis
todos os mortos, todos os jardins. 

*

KARFREITAG
Verhangener Tag, im Wald noch Schnee,
Im kahlen Holz die Amsel singt:
Des Frühlings Atem ängstlich schwingt,
Von Lust geschwellt, beschwert von Weh.

So schweigsam steht und klein im Gras
Das Krokusvolk, das Veilchennest,
Es duftet scheu und weiß nicht was,
Es duftet Tod und duftet Fest.

Baumknospen stehn von Tränen blind,
Der Himmel hängt so bang und nah,
Und alle Gärten, Hügel sind
Gethsemane und Golgatha.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

A CAMINHO DO ORIENTE
A esmo por este mundo, desgarrado das Cruzadas,
muito irmão há de vagar pelos áridos desertos
dos números e das horas, a inquietar-se afastado 
da alta meta pela qual combatera e padecera;
contudo, enquanto o chamusca a desértica solina,
tem sempre em vista as palmeiras da usa terra de sonho.

Dele assim perdido zombam sem piedade nenhuma
as crianças que se ajuntam nas urbes e nos mercados;
como a Menão, entretanto, a esse colosso em letargo
cada raio de arrebol faz novamente vibrar 
– e ele, Dom Quixote, ri para o castelo encantado
na distância e para as fadas que embelezam o lugar.

E sempre, por toda parte, entre os gracejos da plebe
e o sangue dos mártires, algum rapaz aparece:
ergue para Dom Quixote o maravilhado olhar,
prosterna-se, presta a Deus o sagrado juramento
e, rumo ao Santo Sepulcro, acompanha o peregrino.

*

DIE MORGENLANDFAHRT
Verloren in der Welt, vom Kreuzheer abgesprengt, 
Irrt mancher Bruder in der dürren Wüste 
Der Zeit und Zahl, geängstet, abgedrängt 
Vom hohen Ziel, um das er schritt und büßte: 
Doch ahnt er, während Wüstenbrand ihn sengt, 
Stets seines Traumlands holde Palmenküste. 

Ihn den Verirrten wird erbarmungslos 
Der Städt’ und Märkte Kindervolk verhöhnen, 
Doch Memnon gleich, dem scheintoten Koloß, 
Bringt jeder Strahl aus Morgen ihn zum Tönen. 
Er lächelt, Don Quichotte, dem Zauberschloß 
Der Ferne zu und seinen Feen, den schönen. 

Und immer wieder zwischen Pöbelspott 
Und Märtyrerblut hebt da und dort ein Knabe 
Den Blick bezaubert auf zu Don Quichotte, 
Beugt sich, legt das Gelübde ab vor Gott 
Und folgt dem Pilgerzug zum heiligen Grabe.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

A UM RETRATO DA MOCIDADE
De uma aurora lendária, o meu retrato
de moço me contempla e me pergunta:
se da luz que uma vez alvorecia
alguma coisa brilha ou arde ainda.

A esse que fui, agora em minha frente,
a caminhada trouxe mágoas muitas 
e noites e amaríssimas mudanças:
não gostaria de percorrê-la outra vez. 

Mas perfiz lealmente o meu caminho 
e dou valor ao que ele quer dizer:
houve muitos desvios, muitos erros,
mas não tenho de que me arrepender.

*

ZU JUGENDBILDNISSEN
So blickt aus sagenhafter Frühe
Mein Jugendbild mich an und fragt,
Ob von dem Licht, das einst getagt,
Noch etwas leuchte, etwas glühe.

Den damals ich vor mir gesehen,
Der Weg hat mir viel Pein und Nacht
Und bittre Wandlungen gebracht;
Ich möcht' ihn nicht noch einmal gehen.

Doch ging ich meinen Weg in Treuen
Und halte sein Gedächtnis wert.
Viel war verfehlt, viel war verkehrt,
Und doch kann ich ihn nicht bereuen.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

CASARIO AO ANOITECER 
À tardia e oblíqua luz de ouro
se inflama o grupo das casas caladas:
em cores ricas e intensas floresce
feito prece o final de outra jornada.

Uma se encosta aconchegada à outra,
irmanadas crescendo na lareira:
velhas e simples como uma cantiga
que nenhuma aprendeu e todas sabem.

Paredes, caiações, telhados tortos,
pobreza e orgulho, decadência e glória:
com doce e funda ternura irradiam,
devolvido, o calor daquele dia.

*

HÄUSER AM ABEND
Im späten schrägen Goldlicht steht
Das Volk der Häuser still durchglüht,
In kostbar tiefen Farben blüht
Sein Feierabend wie Gebet.

Eins lehnt dem andern innig an,
Verschwistert wachsen sie am Hang,
Einfach und alt wie ein Gesang,
Den keiner lernt und jeder kann.

Gemäuer, Tünche, Dächer schief,
Armut und Stolz, Verfall und Glück,
Sie strahlen zärtlich, sanft und tief
Dem Tage seine Glut zurück.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

CANÍCULA 
Nas giestas que cobrem a ladeira,
na pedra parda, no dourado pó,
nas folhas da amarela acacieira,
o verão desabafa o seu excesso
e se consome no seu próprio fogo.
Em vagens secas estalam grãos negros,
e à noite estão pesadas as estrelas
sazonadas demais no firmamento
que lateja feito um pulso com febre
a ferver de contidas tempestades.

Onde há pouco em alegres aguaceiros
molhada a vida corria brincando,
morro acima o verão vai ofegando
enfurecido. Ele não quer durar,
quer o êxtase e a glória do holocausto,
a Morte o chama: num cavalo esquálido
ele sai a galope e deixa a terra
para trás – murcha, queimada, esgotada.

Relva e folhagem a gemer se espicham
e rangem com crepitações de vidro.

*

HUNDSTAGE
Wie nun am dürren Ginsterhang,
Im braunen Stein, im goldnen Staub,
Im gilbenden Akazienlaub
Der Sommer seinen Überschwang
Austobt und in sich selbst verbrennt!
Aus dürrer Schote knistern schwarze Kerne,
Und abends hängen schwer die Sterne
Wie überreif am Firmament,
Das wie ein Puls im Fieber pocht
Und von verhaltnen Wettern kocht.

Wo eben noch in frohen Schauern
Das Leben feucht und spielend rann,
Keucht Sommer wütend hügelan
Der Höhe zu. Er will nicht dauern,
Er lechzt nach Rausch und Opferglück,
Ihn rief der Tod: auf hagrem Pferde
Jagt er voran und läßt die Erde
Erschöpft, verblüht, verbrannt zurück.
 
Und seufzend reckt sich Laub und Gras
Und raschelt hart und klirrt wie Glas.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

CHUVA NOTURNA
Mesmo no sono a adivinhei 
e com isso acordei:
escuto-a bem agora e sinto
o seu rumor a encher a noite
de mil vozes frescas e úmidas,
risos, murmúrios e queixumes.
E fico a ouvir enfeitiçado
as notas moles do seu dedilhado.

Após o seco e áspero som
de tantos dias de sol forte,
o manso lamento da chuva
inquieta um pouco mas é bom.

Do peito ufano irrompe então,
por frágil que pareça,
o gosto infantil do soluço,
a amada torrente de lágrimas
– e escorre e geme e lava o encanto,
a fim de que fale o que foi calado,
e ao gozo de nova paixão
abre caminho e o coração.

*

NÄCHTLICHER REGEN
Bis in den Schlaf vernahm ich ihn
Und bin daran erwacht,
Nun hör ich ihn und fühle ihn,
Sein Rauschen füllt die Nacht
Mit tausend Stimmen feucht und kühl,
Geflüster, Lachen, Stöhnen,
Bezaubert lausch ich dem Gewühl
Von fließend weichen Tönen.

Nach all dem harten, dürren Klang
Der strengen Sonnentage,
Wie innig ruft, wie selig bang
Des Regens sanfte Klage!

So bricht aus einer stolzen Brust,
Wie spröde sie sich stellte,
Einmal des Schluchzens kindliche Lust,
Der Tränen liebe Quelle,
Und strömt und klagt und löst den Bann,
Da das Verstummte reden kann,
Und öffnet neuem Glück und Leid
Den Weg und macht die Seele weit.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

PLENITUDE DE VERÃO
O azul dos longes vai-se clareando
espiritualizado e luminoso
com esse mágico e suave tom
que só setembro é capaz de compor.

Depois da noite o amadurecido
verão quer colorir-se para a festa:
eis que tudo sorri em plenitude
e como que anelando fenecer.

Alma, arranca-te deste tempo ao menos,
deixa de lado a tua aflição vã,
e demonstra que estás ansiosa e pronta
para o vôo na tão sonhada manhã!

*

HÖHE DES SOMMERS
Das Blau der Ferne klärt sich schon
Vergeistigt und gelichtet
Zu jenem süßen Zauberton,
Den nur September dichtet.

Der reife Sommer über Nacht
Will sich zum Feste färben,
Da alles in Vollendung lacht
Und willig ist zu sterben.

Entreiß dich, Seele nun der Zeit,
Entreiß dich deiner Sorgen
Und mache dich zum Flug bereit
In den ersehnten Morgen.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

RETROSPECTO
Na encosta vão desabrochando as urzes
e a giesta se eriça em tufos pardos:
quem é que lembra ainda o verdejante
frouxel do bosque em maio?

Quem lembra ainda como é que soavam
o pio do cuco e o canto do melro?
O que era som de tanto encantamento
está findo e esquecido.

A festa da tarde estival na mata
com lua-cheia em cima da montanha,
quem anotou? Quem fixou? Quem guardou?
Tudo está terminado.

Também de ti e de mim, daqui a pouco
ninguém há de lembrar-se nem falar:
outros virão morar aqui e ninguém
sentirá nossa falta.

Esperamos pela névoa da aurora
e pela estrela da tarde nos céus:
de bom grado florimos e murchamos
no amplo jardim de Deus.

*

RÜCKGEDENKEN
Am Hang die Heidekräuter blühn,
Der Ginster starrt in braunen Besen.
Wer weiß heut noch, wie flaumiggrün
Der Wald im Mai gewesen?

Wer weiß heut noch, wie Amselsang
Und Kuckucksruf einmal geklungen?
Schon ist, was so bezaubernd klang,
Vergessen und versungen.

Im Wald das Sommerabendfest,
Der Vollmond überm Berge droben,
Wer schrieb sie auf, wer hielt sie fest?
Ist alles schon zerstoben.

Und bald wird auch von dir und mir
Kein Mensch mehr wissen und erzählen,
Es wohnen andre Leute hier,
Wir werden keinem fehlen.

Wir wollen auf den Abendstern
Und auf die ersten Nebel warten.
Wir blühen und verblühen gern
In Gottes großem Garten.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

FOLHA MURCHA
Para o fruto tende a flor,
para a tarde o amanhecer:
nada é eterno na terra 
– salvo o mudar e o des-ser.

Mesmo o mais belo verão
há de em outono murchar:
tem paciência, folha, espera
vir o vento te buscar!

Faz teu papel sem teimar
suceda o que suceder,
deixa o vento te arrancar
e em tua casa te deixar.

*

WELKES BLATT
Jede Blüte will zur Frucht,
Jeder Morgen Abend werden, 
Ewiges ist nicht auf Erden 
Als der Wandel, als die Frucht.

Auch der schönste Sommer will
Einmal Herbst und Welke spüren. 
Halte, Blatt, geduldig will, 
Wenn der Wind dich will entführen.

Spiel dein Spiel und wehr dich nicht,
Laß es still geschehen.
Laß vom Winde, der dich bricht,
Dich nach Hause wehen.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

REFLEXÃO
Divino e eterno é o Espírito.
A ele, de que somos imagem e instrumento,
leva o Caminho: nosso mais profundo anelo
é tornarmo-nos ele, em sua luz brilharmos.
Porém, terrestres e mortais que somos,
sobre nós – as criaturas – inerte cai o peso.
Em verdade propícia e maternal a Natureza cálida
cuida de nós, aleita-nos a terra, prepara-nos o berço e a sepultura...

mas não nos apazígua 
– paternalmente vara-lhe o materno encanto
a imorredoura centelha do Espírito:
paternalmente faz do filho um homem,
apaga a inocência e nos acorda para a luta e a consciência.

Assim entre mãe e pai,
assim entre corpo e Espírito,
vacila o filho mais frágil da Criação 
– homem de alma tremente, afeito ao sofrimento
qual nenhum outro ser, e afeito ao mais sublime:
o mais crédulo e esperançoso amor.

Dureza é seu caminho, pecado e morte o seu alimento;
muitas vezes vagueia pela treva, muitas vezes seria para ele
melhor não ter sido criado nunca.
Mas eterno sobre ele fulgura o seu anelo,
seu propósito: a luz, o Espírito.
E sentimos que a ele, ao desgraçado,
ama o Eterno com especial amor.

Por isso, a nós, erradios irmãos,
cabe, talvez mesmo na desavença, o amor;
não julgamento e ódio,
mas paciente amor.
A aceitação amorosa nos leva
mais perto do sagrado objetivo.

*

BESINNUNG
Göttlich ist und ewig der Geist.
Ihm entgegen, dessen wir Bild und Werkzeug sind,
Führt unser Weg; unsre innerste Sehnsucht ist:
Werden wie er, leuchten in seinem Licht!
Aber irden und sterblich sind wir geschaffen,
Träge lastet auf uns Kreaturen die Schwere.
Hold zwar und mütterlich warm umhegt uns Natur,
Säugt uns Erde, bettet uns Wiege und Grab;

Doch befriedet Natur uns nicht,
Ihren Mutterzauber durchstößt
Des unsterblichen Geistes Funke
Väterlich, macht zum Manne das Kind.
Löscht die Unschuld und wendet uns zu Kampf und Gewissen.

So zwischen Mutter und Vater,
So zwischen Leib und Geist
Zögert der Schöpfung gebrechlichstes Kind.
Zitternde Seele Mensch, des Leidens fähig
Wie kein anderes Wesen, und fähig des Höchsten:
Gläubiger, hoffender Liebe.

Schwer ist sein Weg, Sünde und Tod seine Speise,
Oft verirrt er ins Finstre, oft wär ihm
Besser, niemals erschaffen zu sein.
Ewig aber strahlt über ihm seine Sehnsucht,
Seine Bestimmung: das Licht, der Geist.
Und wir fühlen: ihn, den Gefährdeten,
Liebt der Ewige mit besonderer Liebe.

Darum ist uns irrenden Brüdern
Liebe möglich noch in der Entzweiung,
Und nicht Richten und Haß,
Sondern geduldige Liebe,
Liebendes Dulden führt
Uns dem heiligen Ziele näher.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

SOFRIMENTO
O sofrimento é um mestre que nos vem
apequenar, fogo que nos abrasa
miudamente: isola-nos da vida,
empareda-nos e nos deixa sós.

Amesquinham-se amor e sapiência,
confiança e esperança se adelgaçam
e fogem; com paixão ciumenta e rude,
o sofrimento nos faz e desfaz.

O eu – forma terrena – se contorce
e se bate e resiste em meio às chamas,
depois todo se afunda e silencia;
e eis que também o mestre renuncia.

*

SCHMERZ
Schmerz ist ein Meister, der uns klein macht,
Ein Feuer, das uns ärmer brennt,
Das uns vom eigenen Leben trennt,
Das uns umlodert und allein macht.

Weisheit und Liebe werden klein,
Trost wird und Hoffnung dünn und flüchtig;
Schmerz liebt uns wild und eifersüchtig,
Wir schmelzen hin und werden Sein.

Es krümmt die irdne Form, das Ich,
Und weht und sträubt sich in den Flammen.
Dann sinkt sie still in Staub zusammen
Und überläßt dem Meister sich.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

DEDICATÓRIA 
PARA UM LIVRO DE POESIA
Do arvoredo sopram folhas,
da vida canções de sonho
vão tocando por aí.
Muitas perderam-se desde
quando primeiro as cantamos:
carinhosas melodias.

Canções também são mortais:
nenhuma se escuta sempre,
a todas o vento apaga.
Flor e borboleta são
transitórias aparências
de algo que nunca se acaba.

*

WIDMUNGSVERSE 
ZU EINEM GEDICHTBUCH
Blätter wehen vom Baume,
Lieder vom Lebenstraume
Wehen spielend dahin;
Vieles ist untergegangen,
Seit wir zuerst sie sangen,
Zärtliche Melodien.

Sterblich sind auch die Lieder,
Keines tönt ewig wieder,
Alle verweht der Wind:
Blumen und Schmetterlinge,
Die unvergänglicher Dinge
Flüchtiges Gleichnis sind.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

VIDA DE FLOR,
De verde anel de folhas a apertar-se infantis,
olha em redor e mal se atreve a contemplar:
sente-se rodeada por ondas de luz,
acha o dia e o verão estranhamente azuis.

Fazem-lhe a corte o vento, a luz, a borboleta:
pela primeira vez sorri, seu coração
abre-se aflito à vida, e aprende a se entregar
à seqüência de sonhos da sua pouca idade.

Agora ri-se toda e fulguram-lhe as cores,
intumesce no cálice o dourado pólen,
prova o incêndio do meio-dia abafado,
e à tarde se reclina exausta na folhagem.

Seus bordos lembram lábios de mulher madura
em cujas linhas treme um pavor de velhice:
seu riso brota quente e já nele farejam
a saturação e o amargor do declínio.

Já se enrugam também, e se esgarçam e pendem
sobre o talo, cansadas, as pétalas miúdas.
As cores se desbotam, fantasmais: enorme
é o segredo que envolve o que na morte dorme.

*

LEBEN EINER BLUME
Aus grünem Blattkreis kinderhaft beklommen
blickt sie um sich und wagt es kaum zu schauen,
fühlt sich von Wogen Lichtes aufgenommen,
spürt Tag und Sommer unbegreiflich blauen.

Es wirbt um sie das Licht, der Wind, der Falter,
im ersten Lächeln öffnet sie dem Leben
ihr banges Herz und lernt, sich hinzugeben
der Träumefolge kurzer Lebensalter.

Jetzt lacht sie voll, und ihre Farben brennen,
an den Gefäßen schwillt der goldne Staub,
sie lernt den Brand des schwülen Mittags kennen
und neigt am Abend sich erschöpft ins Laub.

Es gleicht ihr Rand dem reifen Frauenmunde,
um dessen Linien Altersahnung zittert;
heiß blüht ihr Lachen auf, an dessen Grunde
schon Sättingung und bittre Neige wittert.

Nun schrumpfen auch, nun fasern sich und hangen
die Blättchen müde überm Samenschoße.
Die Farben bleichen geisterhaft: das große
Geheimnis hält die Sterbende umfangen.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

LAMENTO
Não nos é dado Ser. Águas de rio,
a toda forma dóceis nos prestamos:
dia ou noite, caverna ou catedral,
a tudo nos impele a ânsia de Ser.

Forma após forma enchemos sem descanso:
nenhuma nos faz falta nem é pátria
ou sorte. Hóspedes sempre, sempre em trânsito,
terra e arado e pão nunca nossos.

Um dia endurecer em pedra! Um dia
durar! – É disso que temos vontade,
mas o que fica sempre é um arrepio
de medo, sem pausa na caminhada.

*

KLAGE
Uns ist kein Sein vergönnt. Wir sind nur Strom,
Wir fließen willig allen Formen ein:
Dem Tag, der Nacht, der Höhle und dem Dom,
Wir gehn hindurch, uns treibt der Durst nach Sein.

So füllen Form um Form wir ohne Rast,
Und keine wird zur Heimat uns, zum Glück, zur Not,
Stets sind wir unterwegs, stets sind wir zu Gast,
Uns ruft nicht Feld noch Pflug, uns wächst kein Brot.

Wir wissen nicht, wie Gott es mit uns meint,
Er spielt mit uns, dem Ton in seiner Hand,
Der stumm und bildsam ist, nicht lacht noch weint,
Der wohl geknetet wir, doch nie gebrannt.

Einmal zu Stein erstarren! Einmal dauern!
Danach ist unsre Sehnsucht ewig rege,
Und bleibt doch ewig nur ein banges Schauen,
Und wird doch nie zur Rast auf unsrem Wege. 
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

MAS TEMOS UM SECRETO AFÃ...
Grácil, espiritual, delicado arabesco,
parece a nossa vida, assim como a das fadas,
girar em danças leves ao redor de um nada
ao qual oferendamos o presente e o ser.

Encanto de sonhar, graciosa brincadeira
tão bem soprada, tão puramente afinada:
por baixo de tua face calma arde profundo
anelo de noite e de sangue e de barbárie.

Sem pressão nem urgência, a nossa vida livre
gira no vácuo, sempre disposta a brincar 
– mas temos um secreto afã de realidade,
de cópula e de parto, sofrimento e morte.

*

DOCH HEIMLICH DÜRSTEN WIR...
Anmutig, geistig, arabeskenzart
Scheint unser Leben sich wie das von Feen
In sanften Tänzen um das Nichts zu drehen,
Dem wir geopfert Sein und Gegenwart.
 
Schönheit der Träume, holde Spielerei,
So hingehaucht, so reinlich abgestimmt,
Tief unter deiner heiteren Fläche glimmt
Sehnsucht nach Nacht, nach Blut, nach Barbarei.
 
Im Leeren dreht sich, ohne Zwang und Not,
Frei unser Leben, stets zum Spiel bereit,
Doch heimlich dürsten wir nach Wirklichkeit,
Nach Zeugung und Geburt, nach Leid und Tod.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

SERVIÇO
No começo os devotos príncipes mandavam
benzer a terra, o grão, o arado, e praticar
o rito das medidas e dos sacrifícios
da raça dos mortais – sequiosos que eram

de terem o governo justo do Invisível
que matém sempre sol e lua em equilíbrio
e cujas figuras de eterno resplendor
desconhecem o mundo da morte e da dor.

A sagrada linhagem dos filhos de deuses
há muito se extinguiu: os homens estão sós
na voragem de gozo e dor, longe do Ser,
num eterno devir sem bênção nem medida.

Entretanto a intuição da verdadeira vida
não morre, e é nosso ofício, em meio à decadência,
por meio de signos, de símbolos e canto,
promover a observância do santo respeito.

É possível que a treva algum dia termine,
é possível que o tempo um dia volte atrás
e que torne a reger-nos o Sol como um deus
a tornar-nos das mãos as nossas oferendas.

*

DIENST
Im Anfang herrschten jene frommen Fürsten,
Feld, Korn und Pflug zu weihen und das Recht
Der Opfer und der Maße im Geschlecht
Der Sterblichen zu üben, welche dürsten

Nach der Unsichtbaren gerechtem Walten,
Das Sonn und Mond im Gleichgewichte hält,
Und deren ewig strahlende Gestalten
Des Leids nicht kennen und des Todes Welt.

Längst ist der Göttersöhne heilige Reihe
Erloschen, und die Menschheit blieb allein,
In Lust und Leides Taumel, fern vom Sein,
Ein ewiges Werden ohne Maß und Weihe.

Doch niemals starb des wahren Lebens Ahnung,
Und unser ist das Amt, im Niedergang
Durch Zeichenspiel, durch Gleichnis und Gesang
Fortzubewahren heiliger Ehrfurcht Mahnung.

Vielleicht, daß einst das Dunkel sich verliert,
Vielleicht, daß einmal sich die Zeiten wenden,
Daß Sonne wieder uns als Gott regiert
Und Opfergaben nimmt von unsern Händen.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

BOLHAS DE SABÃO 
De muitos anos de estudo e meditação
destila um homem, já de idade, a sua obra
de madurez – em cujas torcidas gavinhas
ele ficou brincando um suave saber.

Cheio de ardor chega um solícito estudante
que em  bibliotecas e arquivos andou buscando
muito e que sente-se arder na ambição
de uma obra jovem de genial profundidade.

Um rapaz senta-se e sopra um canudo
enchendo coloridas bolhas de sabão,
e a cada qual ostenta e louva como um salmo,
e vai sua alma pondo inteira nesse sopro.

E assim os três – o velho, o estudante e o rapaz –
fazem, da espuma de ilusão do mundo,
mágicos sonhos, que nada valem por si,
nos quais porém sorrindo se reconhece
a luz eterna que mais alegre rebrilha.

*

SEIFENBLASEN
Es destilliert aus Studien und Gedanken
Vielvieler Jahre spät ein alter Mann
Sein Alterswerk, in dessen krause Ranken
Er spielend manche süße Weisheit spann.

Hinstürmt voll Glut ein eifriger Student,
Der sich in Büchereien und Archiven
Viel umgetan und den der Ehrgeiz brennt,
Ein Jugendwerk voll genialischer Tiefen.

Es sitzt und bläst ein Knabe in den Halm,
Er füllt mit Atem farbige Seifenblasen,
Und jede prunkt und lobpreist wie ein Psalm,
All seine Seele gibt er hin im Blasen.

Und alle drei, Greis, Knabe und Student
Erschaffen aus dem Maya-Schaum der Welten
Zaubrische Träume, die an sich nichts gelten,
In welchen aber lächelnd sich erkennt
Das ewige Licht, und freudiger entbrennt.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

O JOGO DAS MIÇANGAS 
Música das esferas e música dos mestres
estamos sempre prontos a ouvir com devoção,
a evocar para festas de pureza maior
os amados espíritos de eras mais afáveis.

Deixamo-nos levar mais alto pelo mistério
dessas fórmulas mágicas em cuja extensão
em límpidas parábolas veio a se moldar
o que tem de infinita e de impetuosa a vida.

Cristalinas retinem, como constelações:
em seu serviço ganha sentido a nossa vida,
e do círculo delas cair nenhuma pode
senão no rumo do ponto central sagrado.

*

DAS GLASPERLENSPIEL
Musik des Weltalls und Musik der Meister
Sind wir bereit in Ehrfurcht anzuhören,
Zu reiner Feier die verehrten Geister
Begnadeter Zeiten zu beschwören.

Wir lassen vom Geheimnis uns erheben
Der magischen Formelschrift, in deren Bann
Das Uferlose, Stürmende, das Leben
Zu klaren Gleichnissen gerann.

Sternbildern gleich ertönen sie kristallen,
In ihrem Dienst ward unserm Leben Sinn,
Und keiner kann aus ihren Kreisen fallen
Als nach der heiligen Mitte hin.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

CHINÊS
De uma opalina brecha entre nuvens, o luar
conta a custo as pontudas sombras dos bambus;
pinta o reflexo da ponte com a corcova de uma gato
redonda e límpida sobre as águas.

São imagens que ternamente amamos
sobre o fundo apagado do mundo e da noite,
com encanto a flutuar, por encanto traçadas
e já riscadas pela hora seguinte.

Sob a amoreira o poeta embriagado,
que maneja o pincel como segura o copo,
descreve a noite de lua que propícia o empolga,
suaves sombras e luzes que passam.

Os traços rápidos do seu pincel
desenham nuvens e a lua e todas as coisas
que em sua embriaguez seguem passando,
para poder cantá-las tão fugazes,
para animá-las com sua ternura,
para doar-lhes alma e permanência.

E elas passam a ser intransitórias.

*

CHINESISCH
Mondlicht aus opalener Wolkenlücke
Zählt die spitzen Bambusschatten peinlich,
Malt der hohen Katzenbuckelbrücke
Spiegelbild aufs Wasser rund und reinlich.

Bilder sind es, die wir zärtlich lieben,
Auf der Welt und Nacht lichtlosem Grunde
Zaubrisch schwimmend, zaubrisch hingeschrieben,
Ausgelöscht schon von der nächsten Stunde.

Unterm Maulbeerbaum der trunkene Dichter,
Der den Pinsel wie den Becher meistert,
Schreibt der Mondnacht, die ihn hold begeistert,
Wehende Schatten auf und sanfte Lichter.

Seine raschen Pinselzüge schreiben
Mond und Wolken hin und all die Dinge,
Die dem Trunkenen vorübertreiben,
Daß er sie, die flüchtigen, besinge,
Daß er sie, der Zärtliche, erlebe,
Daß er ihnen Geist und Dauer gebe.

Und sie werden unvergänglich bleiben.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

CARAMANCHÃO 
Aqui, no vermelho caramanchão,
abanavam-se as damas na festa do verão; 
aqui banqueteavam-se e bebiam,
cantarolando árias do Don Pasquale.
Aqui dançavam, déspotas benévolos, 
patrões da época de Bonaparte:
diziam coisas ternas às damas em flor,
e com o vinho gritavam-se obscenos desafios.
Os netos dessa gente, nós ainda conhecemos:
aos senhores, na aldeia tirava-se o chapéu.
Mas o fausto passara, derrocados os bens 
– terras, casa e jardins, levados à hasta pública.
Já os portões, que a inveja rondava, não se fecham:
caminhos de capim convidam qualquer um
a passear aqui, hóspede de uns momentos,
junto à finada pompa da aristocracia.
Parece haver goteiras nos telhados, infiltrações nos muros
onde verdeja sedutor o ornato de musgo e hera; 
desolação e ruína espreitam das janelas 
– dá pena, agora, o que foi tão soberbo um dia.
Esvoaçam morcegos varando os aposentos.
Derradeiro consolo, ainda mais altas que antes,
no parque destratado as nobres árvores
estendem sobre tanta decadência a sua compaixão.

*

GARTENSAAL 
Hier haben ihre Frauen sich gefächert 
Beim Sommerfest im roten Gartensaale, 
Hier haben sie getafelt und gebechert 
Und Arien gesummt aus Don Pasquale.
Hier tanzten sie, gutmütige Despoten, 
Bauherren zu den Zeiten Bonapartes,
Sagten den bunten Damen etwas Zartes 
Und brüllten unter sich bei Wein und Zoten.
Wir haben ihre Enkel noch gekannt, 
Man zog im Dorf den Hut vor den Signoren, 
Doch war der Glanz dahin, das Gut verloren, 
Haus, Land und Gärten stehen nun zur Gant.
Die Tore klaffen, die vom Neid umschlichenen. 
Vergraste Wege laden jeden ein, 
Hier zu lustwandeln und bei der verblichenen 
Patrizierpracht ein wenig Gast zu sein.
Es scheinen leck die Dächer, feucht die Mauern,
Ihr Schmuck von Moos und Efeu grünt verführend,
Spinnweb und Öde in den Fenstern Lauern,
Ich war nur herrisch schön war, scheint jetzt rührend,
Und Fledermäuse flattern durch die Räume,
Doch ragen tröstlich höher als vor Zeiten,
Im ungepflegten Park die edlen Bäume,
Ihr Mitleid über den Verfall zu breiten.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

OLHANDO O VALE LACUSTRE 
Entre cinzentos ramos de abetos eriçados,
entre vermelhas e ásperas hastes de pinheiros,
entre azulados cedros que solenes se inclinam,
entre caules de tílias com seus restos de folhas 
amareladas, por apertadas perspectivas,
vai o olhar afundando, a descer montanha a baixo,
até o vale lacustre amigavelmente longe.  
o vítreo lago no seu debrum de claridade,
as aldeias sorrindo com seus tetos ao sol,
os campos como faixas de matizes sonhados 
pela alma de um  pintor a espalhar-se repartidas.
Tem-se a impressão de um vale sem sombras e feliz,
bem arejado e firme qual límpido cristal,
com festivas aldeias e matas e relvados
a comporem, por gosto, uma rústica pintura:
como se aqui contasse a beleza unicamente
numa ciranda de luzes de diversos tons.
Lindo divertimento de um pintor ou poeta,
o mundo aqui se mostra feito de alguma luz
que a si mesma exercita e que a si mesma dá forma.
Encanta-nos o palco, tanto quanto o espetáculo,
e agora não queremos tomar conhecimento
da dor que também pesa sobre tão doce mundo.

*

DURCHBLICK INS SEETAL
Zwischen grau behaarten Fichtenzweigen,
Zwischen roten, rauhen Kiefernästen,
Blauen Zedern, die sich würdig neigen,
Zwischen Lindenstämmen mit den Resten
Gelben Laubes sinkt der Blick hinunter,
Berghinab durch klamme Perspektiven,
In des Seetals freundlich-ferne Tiefen.
Sanft scheint alles dort und dennoch bunter,
Glasig schwebt der See, der licht umsäumte, 
Dörfer lächeln hell mit sonnigen Dächern,
Felder wie von Malergeist geträumte
Farbenfolgen breiten sich in Fächern.
Selig scheint dies Tal und ohne Schatten, 
Fest zugleich und luftig gleich Kristallen, 
Festlich ordnen Dörfer, Haine, Matten 
Sich ins Bild, es scheint um Wohlgefallen, 
Scheint um Schönheit einzig hier zu gehen, 
Um den Reigen bunt getönter Lichter:
Spielzeug einem Maler oder Dichter,
Scheint die Welt aus Licht nur zu bestehen, 
Das sich selbst erlebt, sich selbst gestaltet.
Uns bezaubern Bühne und Kulissen, 
Und wir weigern uns vom Leid zu wissen, 
Das auch diese holde Welt durchwaltet.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

PAVILHÃO VERMELHO 
Vermelho pavilhão, escondido no parque
a se perder em meio ao matagal:
ah, que alegria davas ao lugar,
quando te rias em tua manhã ainda jovem!
Sobre a clareira te erguias ufano,
octogonal, ousado, gracioso e galante;
muitas festas em ti se prepararam,
com o vinho para a caça e o licor do banquete.
Foi o mato crescendo e aí te vês
apequenado, secreto e quase esquecido:
respiras um finado encanto de matizes
com a melancolia de uma rima antiga
que um dia fez-se ouvir insólita e vibrante,
e que dá pena agora com seu toque ancestral.
Enterrado em lembranças,
deixas que venha o fatigado sol da tarde
lamber os teus gradis,
a tua arcada em ponta, o teu telhado. 
Abandonado às tuas formas trabalhadas,
refletes sobre as festas acabadas...
É o que fazemos também nós ao respondermos
ao cumprimento de um amor da mocidade – agora de cabelos
embranquecidos, agora em suas feições 
encantadoras e calmas da rapariga que foi
trazendo inscritos os traços da morte –
e a quem nós, comovidos, retornamos a amar:
a ela e ao inefável que ela era uma vez.

*

ROTER PAVILLON
Roter Pavillon, im Park verborgen,
Wo er sich in wilden Wald verliert,
Als du noch in deinem jungen Morgen
Lachtest, wie hast du den Park geziert!
Hast auf der Terrasse dich gebrüstet,
Schlank, achtkantig, zierlich, kühn, kokett,
Feste wurden oft in dir gerüstet,
Jagdtrunk, Vogelessen und Bankett.
Jetzt im groß gewordenen Walde stehst du
Klein, verloren fast und sehr geheim.
Mit verblichenem Farbenzauber wehst du
Lächelnd Wehmut wie ein alter Reim,
Der einst jung und frech und wird geklungen,
Heut altväterisch tönt und Rührung weckt;
Eingesunken in Erinnerungen
Stehst du, und die Abendsonne leckt
Müd an deinen rostigen Gitterstäben,  
Deinen spitzen Bogen, deinem Dach;
Deinen schmucken Formen hingegeben,
Sinnst du den verklungenen Festen nach.
So wird uns zu Sinn beim Wiedergrüßen 
Einer Jugendliebe, deren Haar
Weiß geworden, deren einst so süßen
Mädchenzügen still und wunderbar
Sich die Todeslinien eingeschrieben,
Daß wir sie, bewegt, noch einmal lieben,
Sie und das Unsägliche, das einst war.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

AMANHECER DE DEZEMBRO 
Em fina gaze a chuva cai. No véu cinzento
entretecem-se flocos indolentes 
que nos galhos e fios se penduram,
dissolvem-se a boiar no frio úmido,
e dão ao cheiro da terra molhada
algo de tênue, vago e inconsciente,
enquanto as gotas escorrem com gestos
de hesitação e a luz do dia assume
uma doentia e enfastiada palidez.
Na fila de vidraças que a aurora cegou
desponta com rosada e morna claridade
uma janela acesa ainda em meio à noite.
Uma enfermeira surge, lava os olhos 
com neve, fica um momento parada,
olha em redor, e volta a entrar no quarto.
A vela apaga-se, e ainda mais cinzento
no dia desbotado o muro estende-se.

*

MORGENSTUNDE IM DEZEMBER
Regen schleiert dünn, und träge Flocken
Sind dem grauen Schleier eingewoben,
Hängen sich an Zweig und Drähte oben,
Bleiben unten an den Scheiben hocken,
Schwimmen schmelzend in der kühlen Nässe,
Geben dem Geruch der feuchten Erde
Etwas Dünnes, Nichtiges und Vages,
Und dem Tropfenrieseln die Gebärde
Eines Zögerns, und dem Licht des Tages
Eine kränkelnde, verdrossene Blässe.
In der morgenblinden Scheiben Zeile
Dämmert da mit rosig warmem Schimmer
Einsam noch ein Fenster nachtbeleuchtet.
Eine Krankenschwester kommt, sie feuchtet
Sich mit Schnee die Augen, eine Weile
Steht und starrt sie, kehrt zurück ins Zimmer.
Es erlischt der Kerzenschein, und grauer
Dehnt sich in den bleichen Tag die Mauer.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

AO VENTO MORNO DA NOITE
Ao amornado vento da montanha balança-se a figueira
de novo contorcendo como cobras os galhos conturbados;
sobre o escalvado cume da lua-cheia sobe para um festim
de solidão, a povoar de sombras o espaço; a luz da lua,
entre os barcos de nuvens que deslizam, distraída conversa
consigo mesma, enfeitiçando a noite sobre o vale do lago
e transformando-a em silente imagem da alma e da poesia
para no fundo do meu coração a música acordar.
Num incontido assomo de saudade minha alma então, eleva-se,
luta contra o destino, pressentindo que lhe falta uma coisa,
brinca com o sonho da felicidade, remoendo cantigas:
quisera começar tudo de novo, de novo o já longínquo 
ardor da juventude restaurar na frigidez do agora,
quisera andar à toa e cortejar inclusive uma estrela,
tenutizar o repique dos sinos de vagantes desejos...
Fecho a janela com hesitação e acendo o lampião,
vejo em branco na cama os travesseiros esperando por mim,
em branco a lua e o mundo e a flutuante poesia das nuvens,
ao amornado vento da montanha, sobre o jardim prateado:
sinto-me pouco a pouco reintegrado às coisas de costume
e, até pegar no sono, ouço a canção da minha juventude.

*

FÖHNIGE NACHT
Schaukelt im wehenden Föhnwind der Feigenbaum 
Wieder wie Schlangen wirr die gewundenen Äste, 
Steigt übers kahle Gebirg zu einsamen Feste 
Vollmond empor und beseelt mit Schatten den Raum, 
Spricht zwischen gleitenden Wolkenschiffen der Lichte 
Träumerisch mit sich selber und zaubert die Nacht 
Über dem Seetal still zum Seelenbild und Gedichte, 
Daß mir im Herzen zuinnerst Musik erwacht, 
Dann erhebt sich in drängender Sehnsucht die Seele, 
Fühlt sich jung und begehrt ins flutende Leben zurück, 
Kämpft mit dem Schicksal und ahnt, woran es ihr fehle, 
Summt sich Lieder und spielt mit dem Traume vom Glück, 
möchte noch einmal beginnen, noch einmal der fernen 
Jugend heiße Gewalten beschwören ins kühlere Heut, 
Möchte wandern und werben und bis zu den Sternen 
Dehnen der schweifenden Wünsche dunkles Geläut. 
Zögernd schließ ich das Fenster, entzünde das Licht, 
Seh die weißglänzenden Kissen des Bettes warten, 
Weiß den Mond um die Welt und das wehende Wolkengedicht 
Draußen lebendig im Föhn überm silbrigen Garten, 
Finde zurück mich langsam zu meinen gewohnten Dingen, 
Höre bis in den Schlaf das Lied meiner Jugend klingen.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

COMO UM CONVITE PARA 
    “A FLAUTA MAGICA”
Mais uma vez eu estarei a ouvi-te,
música muito amada – e entre as bênçãos
do templo aceso, entre os corais de padres
e as flautas, serei um dos convidados.

Tantas vezes em tantos anos já
essa obra me tocou profundamente,
e a cada vez repete-se o milagre
e em silêncio eu refaço o mesmo voto

que me faz elo da vossa corrente 
– romeiro do oriente em antiquíssimo
vinculo, apátrida  ao redor do mundo,
sempre a achar novos serviçais ocultos.

Esse reencontro deixa-me, Tamino, 
temeroso: meu fatigado ouvido
e o velho coração serão capazes
de compreender-vos como em outros tempos
– coro de padres, vozes de rapazes?
Estarei pronto para as vossas provas?

Viveis eterna juventude, espíritos
puros, infensos aos baques do mundo:
sêde irmãos nossos, e guias e mestres, 
até que o facho nos caia das mãos!

E ao soar a solene hora de serdes
eleitos, e ninguém mais vos lembrar,
novos sinais vos seguirão nos céus,
pois toda vida aspira a se expressar.

*

MIT DER EINTRITTSKARTE 
       ZUR ZAUBERFLÖTE
So werd ich dich noch einmal wiederhören,
Geliebteste Musik, und bei den Weih’n
Des lichten Tempels, bei den Priesterchören,
Beim holden Flötenlied zu Gaste sein.

So viele Male in so vielen Jahren
Hab ich auf dieses Spiel mich tief gefreut,
Und jedesmal das Wunder neu erfahren
Und das Gelübde still in mir erneut,

Das mich als Glied in eure Kette bindet,
Morgenlandfahrer im uralten Bund,
Der nirgends Heimat hat im Erdenrund,
Doch immer neu geheime Diener findet.

Diesmal, Tamino, macht das Wiedersehen
Mir heimlich bang. Wird das ermüdete Ohr,
Das alte Herz euch noch wie einst verstehen,
Ihr Knabenstimmen und du Priesterchor –
Werd ich vor eurer Prüfung noch bestehen?

In ewiger Jugend lebt ihr, selige Geister,
Und unberührt vom Beben unsrer Welt,
Bleibt Brüder uns, bleibt Führer uns und Meister,
Bis uns die Fackel aus den Händen fällt.

Und wenn einst eurer heitern Auserwählung
Die Stunde schlägt und niemand mehr euch kennt,
So folgen neue Zeichen euch am Firmament,
Denn alles Leben dürstet nach Beseelung.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

PENSAMENTOS VADIOS
Um dia tudo isto deixará de existir:
nada mais destas guerras burramente geniais,
destes gases diabólicos lançados sobre
o inimigo, destes ermos de concreto,
destas florestas farpadas de arame
em vez de espinhos, destes berços mortuários
onde aterrados jazem tantos milhares,
destas redes mortíferas tramadas
com tanto engenho e arte, em meio a tão covardes
gracejos, na terra, no mar, no ar.

Montanhas hão de elevar-se no azul;
constelações refulgirão na noite 
– Gêmeos, Cassiopéia, Ursa Maior –
eternas em sereno gravitar;
relvas e  folhas orvalhadas pela noite
voltarão a pintar de verde o dia;
e ao sopro eterno do vento as marés virão
bater nas pedras e nos pálidos barrancos.

Assim tem-se passado a história deste mundo:
com dilúvios de sangue, convulsão e mentira,
tem a arrogância de um montão de lixo,
de traços apagados, saciada
a sua desmedida gulodice 
– e o ser humano esquecido.

Esqueceram-se os jogos infantis
que com tanta doçura e encantamento
imaginávamos, curiosos e belos;
as poesias que estão concebíamos,
e todas as figuras da nossa ternura
gravadas no mundo em torno de nós;
nossos deuses, mistérios e santuários,
taboadas e alfabetos – não existem mais.
Nossas fugas de órgão, nosso afã de céu,
nossas igrejas de torres esguias
e altaneiras, nossos livros e pinturas,
linguagens, fábulas, sonhos e idéias,
apagaram-se. A terra está sem luz.

E o Criador, que ao acaso
de tudo quanto é mau e quanto é bom
silencioso assiste, longamente
se põe a observar a terra libertada:
alegremente ecoa à sua volta ao gravitar dos astros 
– escuro paira o pequenino globo,
entre tanto esplendor. Sempre pensando,
Ele toma nas mãos um punhado de barro
e se põe a amassá-lo: vai fazer
mais uma vez um homem – um minúsculo filho
que lhe faça orações, um minúsculo filho
em cujos risos e artes e inocências
Ele espera ainda ter algum prazer.
Alegram-se os Seus dedos, o barro modelando,
e Ele se compraz nisso, enfim: está criando!

*

MÜSSIGE GEDANKEN
Einmal wird dies alles nicht mehr sein,
Nicht mehr diese töricht genialen Kriege,
Diese teuflisch in den Feind gewehten
Oase, diese Beton-Wüstenein,
Diese Wälder, statt mit Dorn mit Drähten
Dicht bestachelt, diese Todeswiegen,
Drin so viele Tausend schaudernd liegen,
Die mit so viel Geist und Fleiss ersonnenen,
Die mit soviel feigem Witz gesponnenen
Todesnetze über Land, Luft, Meer.

Berge werden in die Bläue ragen,
Sterne werden durch die Nächte leuchten,
Zwillinge, Kassiopeia, Wagen,
Ewig in gelassener Wiederkehr.
Laub und Gras mit seinem morgenfeuchten
Silber wird dem Tag entgegen grünen,
Und im ewigen Wind wird Meerflut schlagen
An den Fels und an die bleichen Dünen.

Doch die Weltgeschichte ist vorüber;
Mit dem Schwall von Blut, von Krampf, von Lüge
1st die prahlerische als ein trüber
Kehrichtstrom zerronnen, ihre Züge
Sind erloschen, ihre unermessen
Schlingende Gier gestillt, der Mensch vergessen.

Mit vergessen sind die Kinderspiele,
Deren wir so holde und berückende,
Deren wir so unersättlich viele
Uns erdacht, so fremde und entzückende.
Die Gedichte, die wir uns ersonnen,
Die Gebilde all, die unser Lieben
Rings der willigen Erde eingeschrieben,
Unsre Götter, Heiligtümer, Weihen,
Alphabet und Einmaleins sind nicht mehr.
Unsrer Orgelfugen Himmelswonnen,
Unsre Dome mit den trotzig schlanken
Türmen, unsre Bücher, Malereien,
Sprachen, Märchen, Träume und Gedanken,
Sie sind ausgelöscht. Die Erde hat kein Licht mehr.

Und der Schöpfer, der dem Untergange
All des Scheusslichen und all des Schönen
Stille zugeschaut, betrachtet lange
Die befreite Erde. Heiter tönen
Um ihn der Gestirne Reigen. Dunkel
Schwebt die kleine Kugel im Gefunkel.
Sinnend greift er etwas Lehm und knetet.
Wieder wird er einen Menschen machen,
Einen kleinen Sohn, der zu ihm betet,
Einen kleinen Sohn, von dessen Lachen,
Dessen Kinderei'n und Siebensachen
Er sich Lust verspricht. Sein Finger waltet
Froh im Lehm. Er freut sich. Er gestaltet.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

MÚSICA DE FLAUTA 
Uma casa na noite: entre arbustos e árvores 
deixava-se entrever de leve uma janela
e em algum cômodo invisível por trás  dela
um flautista a tocar.

Era uma melodia tão velha e conhecida
a fluir tão gostosa em meio à noite
como se a pátria fossem todos os países
e palmilhados todos os caminhos.

Era o secreto sentido do mundo
a se manifestar em seu alento,
e se entregava de bom grado o coração
e os tempos todos conjugavam-se em presente.

*

FLÖTENSPIEL
Ein Haus bei Nacht durch Strauch und Baum
Ein Fenster leise schimmern liess,
Und dort im unsichtbaren Raum
Ein Flötenspieler stand und blies.

Es war ein Lied so altbekannt,
Es floss so gütig in die Nacht,
Als wäre Heimat jedes Land,
Als wäre jeder Weg vollbracht.

Es war der Welt geheimer Sinn
In seinem Atem offenbart,
Und willig gab das Herz sich hin
Und alle Zeit ward Gegenwart. 
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

FINAL DE VERÃO
Dia a dia o verão no fim ainda oferece
o seu doce calor. Sobre umbelas de flores
adeja aqui e ali cansada borboleta 
repampeando as asas de veludo e ouro.

As tardes e manhãs respiram a umidade
de uma neblina tênue, ainda um tanto morna.
Com súbito clarão solta-se da amoreira
uma folha amarela a tremular no azul.

Dorme um lagarto sobre a pedra ensolarada.
Entre as sombras das folhas escondem-se as uvas.
Em sono e sonho o mundo da a impressão de estar 
encantado, a pedir que o esperem despertar.

A música se embala em múltiplos compassos,
cristalizando-se em dourada eternidade 
– até que, despertando, o mundo quebra o encanto
e volta a se animar de vida e atualidade.

Nós, idosos, colhemos da parreira os frutos
e aguentamos ao sol as nossas mãos tisnadas.
O dia ri-se ainda, ainda não foi embora:
nos prende e lisonjeia ainda, aqui e agora.

*

SPÄTSOMMER
Noch schenkt der späte Sommer
Tag um Tag voll süßer Wärme.
Über Blumendolden schwebt da und dort
mit müdem Flügelschlag ein Schmetterling
und funkelt sammetgolden.

Die Abende und Morgen atmen feucht
von dünnen Nebeln, deren Naß noch lau.
Vom Maulbeerbaum mit plötzlichem Geleucht
weht gelb und groß ein Blatt ins sanfte Blau.

Eidechse rastet auf besonntem Stein,
Blätterschatten Trauben sich verstecken.
Bezaubert scheint die Welt, gebannt zu sein,
in Schlaf, in Traum, und warnt dich, sie zu wecken.

So wiegt sich manchmal viele Takte lang
Musik, zu goldener Ewigkeit erstarrt.
Bis sie erwachend sich dem Bann entrang
zurück zu Werdemut und Gegenwart.

Wir Alten stehen erntend am Spalier
und wärmen uns die sommerbraunen Hände.
Noch lacht der Tag, noch ist er nicht zu Ende.
Noch hält und schmeichelt uns das heut und Hier.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

O REDENTOR
Sempre e sempre retorna feito homem,
fala a devotos e a surdos ouvidos,
chega-se a nós e já de novo some.

Sempre e sempre sozinho Ele conduz
as misérias e anelos dos irmãos,
e sempre acaba pregado na cruz.

Sempre e sempre se faz proclamar Deus:
quer que o espirito domine a carne
e que à terra venha o reino dos céus.

Sempre e sempre, nestes dias ainda,
de passagem, o Salvador redime
nossas angustias, queixas e perguntas

– com seu olhar de bem aventurança
que  nem  ousamos nos retribuir,
pois só o encaram olhos de criança.

*

DER HEILAND
Immer wieder wird er Mensch geboren
Spricht zu frommen, spricht zu tauben Ohren,
Kommt uns nah und geht uns neu verloren.

Immer wieder muß er einsam ragen,
aller Brüder Not und Sehnsucht tragen,
Immer wird er neu ans Kreuz geschlagen.

Immer wieder will sich Gott verkünden,
Will das Himmlische ins Tal der Sünden,
Will ins Fleisch der Geist, der ewige, münden.

Immer wieder, auch in diesen Tagen,
Ist der Heiland unterwegs, zu segnen,
Unsern Ängsten, Tränen, Fragen, Klagen

Mit den stillen Blicke zu begegnen,
Den wir doch nicht zu erwidern wagen,
Weil nur Kinderaugen ihn ertragen.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

ANDARES
Como emurchece toda flor, e toda idade
juvenil cede à senil – cada andar da vida
floresce, qual a sabedoria e a virtude,
a seu tempo, e não há de durar para sempre.
A cada chamado da vida o coração
deve estar pronto para a despedida e para 
novo começo, com ânimo e sem lamúrias, 
aberto sempre para novos compromissos.
Dentro de cada começar mora um encanto
que nos dá forças e nos ajuda a viver.

Devemos ir contentes, de um lugar a outro,
sem apegar-nos a nenhum como a uma pátria:
não nos quer atados, o espírito do mundo 
– quer que cresçamos, subindo andar por andar.
Mal a um tipo de vida nos acomodamos
e habituamos, cerca-nos o abatimento.

Só quem se dispõe a partir e a ir em frente
pode escapar à rotina paralisante.
É bem possível que a hora da morte ainda
de novos planos ponha-nos na direção:
para nós, não tem fim o chamado da vida...
Saúda, pois, e despede-te, coração!

*

STUFEN
Wie jede Blüte welkt und jede Jugend
Dem Alter weicht, blüht jede Lebensstufe,
Blüht jede Weisheit auch und jede Tugend
Zu ihrer Zeit und darf nicht ewig dauern.
Es muß das Herz bei jedem Lebensrufe
Bereit zum Abschied sein und Neubeginne,
Um sich in Tapferkeit und ohne Trauern
in andre, neue Bindungen zu geben.
Und jedem Anfang wohnt ein Zauber inne,
Der uns beschützt und der uns hilft zu leben.

Wir sollen heiter Raum um Raum durchschreiten,
An keinem wie an einer Heimat hängen,
Der Weltgeist will nicht fesseln uns und engen,
Er will uns Stuf' um Stufe heben, weiten.
Kaum sind wir heimisch einem Lebenskreise
Und traulich eingewohnt, so droht Erschlaffen,

Nur wer bereit zu Aufbruch ist und Reise,
Mag lähmender Gewöhnung sich entraffen.
Es wird vielleicht auch noch die Todesstunde
Uns neuen Räumen jung entgegensenden,
Des Lebens Ruf an uns wird niemals enden ...
Wohlan denn, Herz, nimm Abschied und gesunde!
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

MEIO-DIA ESTIVAL 
              NUMA VELHA CASA DE CAMPO
Tílias e castanheiros seculares
sussurram lentos, respirando o morno vento.
Rebrilha o chafariz e de bom grado
cede ao sopro do ar. Sobre as copas das árvores
os pássaros calam-se quase todos.
Lá fora a rua está quieta ao sol a pino.
Na relva estiram-se cães sonolentos.
Carros de feno chiam na distância quente.

Nós nos sentamos longamente à sombra: velhos,
um livro ao colo, baixando o olhar deslumbrado,
pelo verão docemente embalados,
e intimamente a pensar nos que já se foram
e para os quais não há mais verão nem inverno,
e que contudo pelos átrios e caminhos
ainda os sentimos invisíveis junto a nós
lançando a ponte que liga aqui e o além.

*

SOMMERMITTAG 
               AUF EINEM ALTEN LANDSITZ 
Die Linden und Kastanien hundertjährig
Atmen und rauschen sacht im lauen Wind,
Der Springquell blitzt und wendet sich willfährig
Im Hauch der Lüfte, in den Wipfeln sind
Die vielen Vögel fast verstummt zur Stunde.
Die Straße draußen schweigt im Mittagsbrand,
Verschlafen dehnen sich im Gras die Hunde,
Heuwagen knarren fern durchs heiße Land.

Wir sitzen lang im Schatten, alte Leute,
Ein Buch im Schoß, geblendete Augen senkend,
Freundlich gewiegt vom sommerlichen Heute,
Doch heimlich der Vorangegangenen denkend,
Für die nicht Winter mehr noch Sommer tagen
Und die doch in den Hallen, auf den Wegen
Uns nahe sind und unsichtbar zugegen
Und zwischen Dort und Hier die Brücke schlagen.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

INFORME DO ALUNO
Meu mestre está deitado e silencioso  há dias:
às vezes eu não sei se luta com a dor
ou com o pensamento. Quando eu digo algo,
não me ouve; porém, quando eu me sento e canto,
cerra  os olhos  e escuta como que enlevado,
talvez sábio da mais alta categoria,
talvez criança a quem alegram certos sons,
mas fiel sempre à regra da senda do meio.

Vez por outra levanta a mão adormecida,
qual se empenhasse o lápis e fosse escrevendo.
Mas logo voltam-se de novo para a porta
os olhos dele, com indizível amor,
como se então  ouvisse alados mensageiros
e visse acolhedores os portões do céu
ou as colinas da pátria distante com
palmeiras balançando à brisa da manhã.

Às  vezes temo estar eu doente e não ele,
como se eu fosse o velho, grisalho e apagado,
e aquela a adelgaçada silhueta de alguém,
como as que a luz da aurora vem pintar no muro.
Ele, porém, o Mestre – parece embebido
e prenhe de essência, de realidade e ser:
enquanto eu vou minguando, ele abarca o universo,
a encher o céu, radiante e todo-poderoso.

*

BERICHT DES SCHÜLERS
Mein Lehrer liegt und schweigt schon manche Tage.
Oft weiß ich nicht, ob er mit Schmerzen ringe,
Ob mit Gedanken. Wenn ich etwas sage,
So hört er nicht. Doch wenn ich sitz und singe,
Lauscht er geschlossenen Auges wie entrückt,
Vielleicht ein Wissender des höchsten Grades,
Vielleicht ein Kind, von etwas Klang beglückt,
Doch stets der Regel treu des Mittlern Pfades.

Zuweilen regt er die erstarrte Hand,
Als hielte sie den Schreibestift und schriebe.
Dann wieder ist der Türe zugewandt
Sein Blick mit einer unsagbaren Liebe,
Als hör er Boten nahn auf Engelsflügeln
Und sähe Himmelspforten offen stehn
Oder auf seiner fernen Heimat Hügeln
Wie einst im Morgenhauch die Palmen wehn.

Oft ist mir bang, als sei ich krank statt seiner,
Als war ich selber grau, erloschen, alt
Und jener dünnen Blätterschatten einer,
Wie sie der Morgen an die Mauer malt.
Doch er, der Meister, scheint von Wirklichkeit,
Von Sein, von Wesen ganz getränkt und trächtig.
 Indes ich schwinde, wird er weltenweit
Und füllt die Himmel strahlend und allmächtig.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

PROSA
A um poeta
.
Divertimento algum lhe dá o versejar
com que nós, aprendizes, tanto nos maçamos.
Certo provou também, na sua juventude,
esse agridoce jogo em toda a plenitude.
Não: a arte beletrista da metrificação,
da estrofação, da rima, do encavalgamento,
para ele já não tem mais nenhuma atração.
Acha batida e plena por demais essa rua,
fácil em demasia por essa via e acesso 
ao belo, mesmo que feito com mil cuidados.
Já conhece magias que dão ocultas flores
de efeitos misteriosos sem comparação.

A prosa dele é simples, descerimoniosa, 
cotidiana quase – parece brincadeira
de criança, mas é melhor deixar assim:
pois, a olhar mais de perto, indescritível torna-se
o que antes parecia ingênuo e simples, cria-se
de nonadas um mundo, melodias de alentos
que em aparência vãos e por prazer deslizam
mas que à lembrança voltam com outro sentido
e que preparam novos sempre inesperados.

Por fim uma sentença que lhe sai da pena,
e que com ligeira a princípio saltamos,
torna-se um carrascal com oásis de vogais,
por entre as sílabas sopram ventos e cedros,
raios de lua fazem brilhar golfos de prata,
uma vírgula é trilha entre bosque e jardim,
uma assonância tem acessos de coquete,
e a salvação é um ponto de interrogação.

Como é que ele faz isso, como com palavras
do simples dia-a-dia sem peso e sem posse,
produz uma poesia de tanta magia
em que as sílabas são como pendões ao vento
– isso, amigos, jamais entenderemos bem.
Basta-nos ir olhando, com veneração,
como olhamos o monte e olhamos sobre o arroio
a borboleta azul e as flores, que também 
se entendem tais como se deixam parecer,
mas são milagres para o olho capaz de ver.

*

PROSA
Auf einen Dichter
.
Ihm macht das Verseschreiben kein Vergnügen,
Mit dem wir Schüler uns so gerne plagen.
Auch er genoss zwar einst in Jugendtagen
Dies mühevoll-süsse Spiel in vollen Zügen.
Nein, diese schöne Kunst der Silbenmasse,
Des Reims, des Odenbau's, der Versverschränkung
Lockt ihn nicht mehr zu übender Versenkung,
Zu glatt scheint, zu gebahnt ihm diese Strasse.
Zu leicht scheint ihm auf diesem Weg erreichbar
Das Schöne, sei es auch' mit tausend Mühen.
Er weiss von Reizen, die verborgner blühen,
Von Wirkungen geheim und unvergleichbar.

So schlicht, unfeierlich und fast alltäglich
Geht seine Prosa! Sie ihm nachzuschreiben
Scheint Kinderspiel, doch lass es lieber bleiben.
Denn schaust du näher hin, so wird unsäglich,
Was selbstverständlich schien, aus Nichtigkeiten
Wird eine Welt, aus Atem Melodieen,
Die scheinbar zwecklos und vergnüglich gleiten,
Doch sich auf andre mahnend rückbeziehen
Und neue, nie erwartete vorbereiten.

Am Ende wird ein Schriftsatz seiner Feder,
Den wir zuerst so leichthin überlasen,
Zur Felsenlandschaft mit Vokal-Oasen,
Aus einem Silbenfall rauscht Wind und Ceder,
Ein Mondstrahl lässt voll Silber Golfe blinken
Ein Beistrich öffnet Wald- und Gartenpfade,
Verführerisch scheint eine Assonanz zu winken,
Ein Fragezeichen wirkt wie Glück und Gnade.

Wie er es macht, wie er aus diesen simpeln
Worten des Tages ohne Zwang und Spreizen
Gedichte zaubert voll von tiefen Reizen
Und Silben tanzen lässt gleich wehenden Wimpeln,
Dies, Freunde, werden wir nie recht verstehen.
Uns sei genug, mit Ehrfurcht zuzusehen
So wie wir aufs Gebirg und auf die blauen
Falter am Bach und auf die Blumen schauen,
Die auch, so scheint es, sich von selbst verstehen,
Doch Wunder sind für Augen, welche sehen.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

VIVA, DOM MUNDO!
Em cacos jaz o mundo:
já o amamos demais,
a própria morte agora
não nos assusta mais.

Não xinguemos o mundo 
tão vário e tão selvagem:
velhíssimos encantos
sopram-lhe ainda a imagem.

Com gratidão queremos
retirar-nos do jogo:
deu-nos prazer e dor,
e nos deu muito amor.

Viva, dom Mundo! Sempre
juvenil e direito:
o teu bem e o teu mal
deixam-nos.satisfeitos.

*

LEB WOHL, FRAU WELT
Es liegt die Welt in Scherben,
Einst liebten wir sie sehr,
Nun hat fur uns das Sterben
Nicht viele Schrecken mehr.

Man soll die Welt nicht schmahen,
Sie ist so bunt und wild,
Uralte Zauber wehen
Noch immer um ihr Bild.

Wir wollen dankbar scheiden
Aus ihrem grossen Spiel;
Sie gab uns Lust und Leiden,
Sie gab uns Liebe viel,

Leb wohl, Frau Welt, und schmucke
Dich wieder jung und glatt,
Wir sind von deinem Glucke
Und deinem Jammer satt.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

RELENDO “HEUMOND” 
             E “SCHÖN IST DIE JUGEND”  
Incompreensivelmente estranho e longe
deixa-se ver o país da juventude:
suas estrelas e constelações
já não clareiam mais o meu caminho,
suas fadigas e momentos bons
não passam hoje de canção e lenda 
– nomes e gestos que ainda agora vão
como folhas brincadas pelo vento.

Mas eis que de umas páginas de livros
voltam, ligadas a certas imagens:
tomam forma e parecem aguardar,
cada qual fielmente em seu lugar.

Assim, após anos cheios de mágoa,
capazes de em nós tanto destruir,
o mundo volta a ser o que uma vez
foi: uma lenda que se torna a ouvir.

Empalidecem bem as suas runas,
seus ecos na distância se enfraquecem;
mas, com a sua feiticeira graça,
tem um deslumbramento que não passa.

*

BEIM VIEDERLESEN VON ›HEUMOND‹
       UND ›SCHÖN IST DIE JUGEND‹
Unbegreiflich fremd und ferne
Blickt die Jugendheimat her,
Ihre Sonnen, ihre Sterne
Leuchten meinem Weg nicht mehr,
Ihre Freuden und Beschwerden
Heute Lied und Sage sind,
Ihre Namen und Gebärden
Kaum noch Blätterspiel im Wind.

Aber hier auf Buches Zeilen
Stehen sie zum Bild gebannt,
Warten treulich und verweilen,
Haben Form und halten Stand.

Und nach leidgetränkten Jahren,
Die so vieles uns zerstört,
Wird der Welt, die wir einst waren,
Sage immer noch gehört.

Ihre Runen werden bleicher,
Ihre Töne fern und zart,
Doch sie hat in zauberreicher
Anmut ewige Gegenwart.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

NO CASTELO DE BREMGARTEN
Quem um dia plantou os velhos castanheiros,
quem um dia bebeu a água a esguichar da fonte,
quem um dia dançou no salão enfeitado 
– foram-se todos, esquecidos e enterrados.

Hoje é a nossa vez: para nós brilha o dia
e cantam para nós alegres passarinhos,
sentamo-nos à mesa e sob a luz das velas
brindamos ao dia que é para nós eterno.

Quando nos formos e estivermos esquecidos,
nas árvores altas ainda se há de escutar
o gorjeio do melro e o cântico do vento,
e lá em baixo entre as pedras o rio a espumar.

No vestíbulo, na hora do grito noturno
do pavão, hão de estar aqui outras pessoas:
falarão, louvarão a maravilha da hora,
embandeirados barcos estarão passando,
e o eterno presente há de rir como agora.

*

IM SCHLOSS BREMGARTEN
Wer hat einst die alten Kastanien gepflanzt,
wer aus dem steinernen Brunnen getrunken,
wer im geschmückten Saale getanzt?
Sie sind dahin, vergessen, versunken.

Heut sind wir es, die der Tag bescheint
Und denen die lieben Vögel singen:
Wir sitzen um Tafel und Kerzen vereint,
Trankopfer dem ewigen Heute zu bringen.

Und wenn wir dahin und vergessen sind,
wird immer noch in den hohen Bäumen
die Amsel singen und singen der Wind,
und drunten der Fluss an den Felsen schäumen.

Und in der Halle beim Abendschrei
der Pfauen sitzen andere Leute.
Sie plaudern, sie rühmen wie schön es sei,
bewimpelte Schiffe fahren vorbei,
und es lacht das ewige Heute.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

OUTUBRO 1944
Corre com paixão a chuva,
lança-se a terra em soluços,
fios dágua gorgolejam
rumo ao transbordante mar
há pouco tão transparente. 

Termos sido outrora alegres
e achado graça no mundo,
foi sonho: experimentados,
outonais e encarecidos,
vimos e odiamos a guerra.

Raspado e sem lantejoulas
jaz o mundo, que antes ria;
sopra entre os galhos sem folhas
um vento amargo de morte,
e agadanha-nos a noite.

*

OKTOBER 1944
Leidenschaftlich strömt der Regen,
schluchzend wirft er sich ins Land,
Bäche gurgeln in den Wegen
überfülltem See entgegen,
der noch jüngst so gläsern stand.

Dass wir einmal fröhlich waren
und die Welt uns selig schien,
war ein Traum. In grauen Haaren
steh'n wir herbstlich und erfahren,
leiden Krieg und hassen ihn.

Kahlgefegt und ohne Flitter
liegt die Welt, die einst gelacht;
durch entlaubter Äste Gitter
blickt der Winter todesbitter,
und es greift nach uns die Nacht.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

PROVA TARDIA
Mais uma vez das larguezas da vida
volta o destino rude a constringir-me:
pretende, no aperto e na escuridão,
submeter-me à miséria e à provação.

O que a custo pareço ter obtido 
– calma, sabedoria, um certo tato,
uma vida sem medo e sem remorso:
seriam coisas para mim, de fato?

Ah, cada um desses amáveis dons
me foi como que arrancado das mãos,
um após outro, pedaço a pedaço...
Foram-se os tempos de satisfação!

Montão de cacos e lugar de escombros
foi sempre o mundo e foi a minha vida:
talvez choramingando eu me rendesse,
não fosse esta minha obstinação!

Esta teima, do fundo de minha alma,
em fincar pé, lutar sem desistir;
esta crença em que o atual tormento
há de ceder à claridade antiga.

Esta inflexível e quase insensata
crença infantil que soem ter os poetas
em eternas e inapagáveis luzes
brilhando acima de qualquer inferno.

*

SPÄTE PRÜFUNG
Nochmals aus des Lebens Weiten
Reißt mich Schicksal hart ins Enge
Will in Dunkel und Gedränge
Prüfung mir und Not bereiten.

Alles scheinbar längst Erreichte,
Ruhe, Weisheit, Altersfrieden,
Reuelose Lebensbeichte –
Ward es wirklich mir beschieden?

Ach, es ward von jenem Glücke
Aus den Händen mir geschlagen
Gut um Gut und Stück um Stücke
Aus ist`s mit den heitern Tagen.

Scherbenberg und Trümmerstätte
Ward die Welt und ward mein Leben.
Weinend möcht ich mich ergeben,
Wenn ich diesen Trotz nicht hätte,

Diesen Trotz im Grunde der Seele,
Mich zu stemmen, mich zu wehren,
Diesen Glauben, was mich quäle,
Müsse sich ins Helle kehren,

Diesen unvernünftig zähen
Kinderglauben mancher Dichter
An unlöschbar ewige Lichter,
Die hoch über allen Höhen stehen.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

À ESCUTA
Um som tão doce, um alento tão novo
passa através do dia acinzentado
qual tímido aroma de primavera,
qual adejar de pássaro assustado.
 
Das horas matinais da vida sopram
reminiscências
a tremer e passar
como aguaceiros de prata no mar.
 
De hoje para ontem tudo me parece
distante, e próximo do já esquecido:
com seus contos de fadas, para mim
o passado abre-se como um jardim.
 
Talvez agora acorde meu avô,
transcorridos mil anos de repouso,
e agora fale com a minha voz
e busque no meu sangue algum calor.
 
Talvez lá fora esteja um mensageiro
chegando cada vez mais junto a mim:
talvez eu me veja de novo em casa
ainda antes que este dia chegue ao fim.

*

AUFHORCHEN
Ein Klang so zart, ein Hauch so neu
Geht durch den grauen Tag,
Wie Vogelfllügelflattern scheu,
Wie Frühlingsduft so zag.

Aus Lebens Morgenstunden her
Erinnerungen wehn,
Wie Silberschauer überm Meer
Aufzittern und vergehn.

Vom Heut zum Gestern scheint es weit,
zum lang Vergessnen nah,
Die Vorwelt liegt und Märchenzeit,
Ein offner Garten, da.

Vielleicht ist heut mein Urahn wach,
Der tausend Jahr geruht
Und nun mit meiner Stimme sprach,
Sich wärmt in meinem Blut.

Vielleicht ein Bote draußen steht
Und tritt gleich bei mir ein;
Vielleicht, noch eh der Tag vergeht,
Werd ich zu Hause sein.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

MELANCOLIA
À morte se consagram hoje todas
as que ainda ontem para mim ardiam:
uma por uma, vão caindo as flores
da árvore da melancolia.

Eu as vejo caindo, como cai
a neve em flocos sobre a minha senda:
já não se ouvem passos ressoando,
acerca-se o grande silêncio.

O céu já não tem mais nenhuma estrela,
nem mais o coração nenhum amor:
há silêncio na cinza da distância,
o mundo está velho e sem cor.

Quem é que pode ter o coração
a salvo, neste tempo de porfia?
Uma por uma, vão caindo as flores
da árvore da melancolia.

*

TRAURIGKEIT
Die mir noch gestern glühten,
Sind heut dem Tod geweiht,
Blüten fallen um Blüten
Vom Baum der Traurigkeit.
 
Ich seh sie fallen, fallen
Wie Schnee auf meinen Pfad,
Die Schritte nicht mehr hallen,
Das lange Schweigen naht.
 
Der Himmel hat nicht Sterne,
Das Herz nicht Liebe mehr,
Es schweigt die graue Ferne,
Die Welt ward alt und leer.
 
Wer kann sein Herz behüten
In dieser bösen Zeit?
Es fallen Blüten um Blüten
Vom Baum der Traurigkeit.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

REMINISCÊNCIA
Quem anda sempre a pensar no futuro
com objetivo e sentido  na vida,
a esse cabem a ação e a ambição, 
muito embora a tranqüilidade não.

O melhor mesmo seria viver
numa imperecedoura atualidade
– mas essa graça foi dada à criança
e a Deus, só, com exclusividade.

Tudo quanto é passado, para nós, 
poetas, é consolo e alimento:
conjurar e guardar o conjurado
são nosso ofício de todo momento.

Flori de novo o que havia murchado, 
o ancião ri com jovialidade,
e uma beatifica reminiscência 
guarda tudo com toda a lealdade.

Para em épocas idas e infantis 
podermos mergulhar ainda mais fundo,
para lembrarmo-nos em nossa mãe 
– para isso viemos nós ao mundo.

*

ERINNERUNG 
Wer an die Zukunft denkt, 
Hat Sinn und Ziel fürs Leben, 
Ihm ist das Tun und Streben, 
Doch keine Ruh geschenkt. 

Das Höchste wäre: Leben 
In ewiger Gegenwart. 
Doch diese Gnade ward 
Nur Kind und Gott gegeben.

Vergangenheit, du bist 
Uns Dichtern Trost und Nahrung. 
Beschwörung und Bewahrung 
Das Amt der Dichter ist. 

Verwelktes blüht aufs neue, 
Uraltes lächelt jung; 
Fromme Erinnerung 
Hält ihm in Ehrfurcht Treue. 

In Vor- und Kinderzeit 
Uns innig zu versenken, 
Der Mütter zu gedenken, 
Dazu sind wir geweiht. 
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

EM FACE DA PAZ
Para a festa de comemoração
do armistício na Rádio Basiléia
.
Do pesadelo de ódio e da embriaguez de sangue
acordando, ainda obumbrados e surdos
pelos clarões e ruídos mortíferos da guerra,
a tantos horrores já habituados,
das suas armas e das medonhas tarefas
diárias abrem mão
os cansados guerreiros.

“Paz” soa como o eco
de algum conto de fadas ou sonho de crianças:
“Paz” – e mal a alegrar-se
o coração se arrisca, vendo mais perto a lágrima.

Pobre de nós, humanos,
tão capazes do bem quanto do mal,
entre o deus e o animal! – Como pesava
a dor, hoje a vergonha pesa em nós com a cara no chão.

Mas temos esperança: em nosso peito
vive um ardente anelo
dos milagres do amor.

Irmãos! A nós compete
o retorno ao espírito e ao amor,
e se abrem para todos
os pedidos portões do paraíso!

Sabei querer! Esperar! Amar!
E a terra novamente vos pertencerá.

*

DEM FRIEDEN ENTGEGEN
  Für die Waffenstillstandfeier 
  des Radio Basel
.
Aus Haßtraum und Blutrausch
Erwachend, blind noch und taub
Vom Blitz und tödlichen Lärm des Krieges,
Alles Grauenhafte gewohnt,
Lassen von ihren Waffen,
Von ihrem furchtbaren Tagwerk
Die ermüdeten Krieger

"Friede" tönt es
Wie aus Märchen, aus Kinderträumen her.
"Friede". Und kaum zu freuen
Wagt sich das Herz, ihm sind näher die Tränen.

Arme Menschen sind wir,
So des Guten wie des Bösen fähig,
Tiere und Götter. Wie drückt das Weh,
Drückt die Scham uns heut zu Boden.

Aber wir hoffen. Und in der Brust
Lebt uns glühende Ahnung
Von den Wundern der Liebe.
Brüder! Uns steht zum Geiste,
Steht zur Liebe die Heimkehr
Und zu allen verlorenen
Paradiesen die Pforte offen.

Wollet! Hoffet! Liebet!
Und die Erde gehört euch wieder.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

NOITE EM CLARO
A noite pálida de vento espia,
a lua espera mergulhar na mata.
que é que me força a estar desperto e olhar
em redor, com a dor a me inquietar?

Eu estava dormindo e até sonhando:
que foi que me acordou e assustou tanto,
em meio à noite, como se eu tivesse
esquecido a coisa mais importante?

Melhor seria eu deixar esta casa,
o jardim, a cidade, o país, tudo:
seguir esse chamado, essa palavra
mágica – e sempre mais, seguir o mundo.

*

WACHE NACHT
Bleich blickt die föhnige Nacht herein,
Der Mond im Wald will untergehn.
Was zwingt mich doch mit banger Pein
Zu wachen und hinauszusehn?

Ich hab geschlafen und geträumt;
Was hat mir mitten in der Nacht
Gerufen und so bang gemacht,
Als hätt ich Wichtiges versäumt?

Am liebsten liefe ich vom Haus,
Vom Garten, Dorf und Lande fort
Dem Rufe nach, dem Zauberwort,
Und weiter und zur Welt hinaus.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

RASCUNHO
No junco seco, encanecido ao cair da tarde,
ringe o vento de outono;
esvoaçam gralhas, do salgueiro, terra a dentro.

Sozinho pausa à beira da água um velho:
em seu cabelo sente o vento, sente a noite e a neve que vem perto;
da sua margem de sombra olha a luz do outro lado,
onde entre lago e nuvem uma fímbria
da costa mais afastada em tíbia luz brilha ainda 
– dourado além, feliz como o sonho e a poesia.

Fixo nos olhos mantém o luzido quadro,
pensa na terra natal, lembra-se dos seus tempos,
vê o ouro ir desbotando-se, apagando-se;
volta-se e caminha a esmo
devagar, terra a dentro, entre os salgueiros.

*

SKIZZENBLATT
Kalt knistert Herbstwind im dürren Rohr
Das im Abend ergraut ist;
Krähen flattern vom Weidenbaume landeinwärts.

Einsam steht und rastet am Strande ein alter Mann,
Spürt den Wind im Haar, die Nacht und nahenden Schnee,
Blickt vom Schattenufer ins Lichte hinüber,
Wo zwischen Wolken und See ein Streifen
Fernsten Strandes noch warm im Lichte leuchtet:
Goldenes Jenseits, selig wie Traum und Dichtung.

Fest im Auge hält er das leuchtende Bild,
Denkt der Heimat, denkt seiner guten Jahre,
Sieht das Gold erbleichen, sieht es erlöschen,
Wendet sich ab und wandert
Langsam vom Weidenbaume landeinwärts.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

PAVILHÃO NO INVERNO 
Falso tataraneto de um templo de Adriano,
ilegítimo herdeiro de vilas medicéias,
com ares de lembrança de Versalhes
empoado, sorris
com tuas colunatas e degraus e vasos e volutas,
pouco à vontade numa praia bárbara,
a contemplar uma terra a que não pertences,
a ostentar seduções e encantamentos
que não te assentam bem;
e a neve em torno é fria
através das vidraças que tens em demasia.

Semelhas, com tua pompa de empréstimo,
a infeliz rapariga que na cidade grande 
sorri pelas esquinas com sombra de tristeza
e não é tão bonita como se quer mostrar
e nem tão rica assim com suas jóias falsas
nem tão alegre atrás da pintura do rosto.
Com ela te pareces: algo de ironia
e algo de compaixão por ti respondem.
E a neve em torno é fria
através das vidraças que tens em demasia.

*

PAVILLON. IM. WINTER
Urenkelstiefkind eines hadrianischen Tempels, 
Illegitimer Erbe mediceischer Villen, 
Mit einem Hauch Erinnerung an Versailles 
Gepudert, lächelst du 
Mit deinen Treppen, Säulen, Vasen und Voluten, 
Unheimisch am barbarischen Strand, 
Blickst in ein Land, dem du nicht angehörst, 
Schickst Reize aus und Zauber, 
Die nicht dein eigen sind; 
Und Schnee blickt ringsum kalt 
Durch deine allzuvielen Scheiben.

Du gleichst in der geliehenen Pracht 
Dem armen Mädchen, das am Straßenrand 
Der Großstadt steht und etwas mühsam lächelt 
Und nicht so schön ist wie es scheinen will, 
Und nicht so reich wie sein gefälschter Schmuck, 
Und nicht so froh wie seine bunte Larve. 
Ihm gleichst du; etwas Spott 
Und etwas Mitleid gibt dir Antwort. 
Und Schnee blickt ringsum fremd 
Und kalt durch deine allzuvielen Scheiben.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

RABISCO NA AREIA
Que encantamento e beleza
sejam brisa e calafrio,
que o delicioso e bom
tenha escassa duração 
– fogo de artifício, flor,
nuvem, bolha de sabão,
riso de criança, olhar
de mulher no espelho, e tantas
outras coisas fabulosas
que, mal se descobrem, somem –
disso, com pena, sabemos.
Ao que é permanente e fixo
não queremos tanto bem:
gemas de gélido fogo,
ouros de pesado brilho,
por não falar nas estrelas
que tão altas não parecem
transitórias como nós
e não calam fundo na alma.
Não: parece que o melhor,
mais digno de amor, se inclina
para o fim, beirando a morte,
e o que mais encanta – notas
de música, que ao nascerem
já fogem, se desvanecem –
são brisas, são águas, caças
feridas de leve mágoa,
que nem pelo tempo de uma
batida de coração
deixam-se reter, prender.
Som após som, mal se tocam,
já se esvaem, vão-se embora.
Nosso coração assim
leal e fraternalmente
se entrega ao fugaz, ao vivo,
não ao seguro e durável.
Cansa-nos o permanente 
– rochas, mundo estelar, jóias –
a nós, transmutantes, almas
de ar e bolhas de sabão,
cingidos ao tempo, efêmeros
a quem o orvalho na rosa,
o idílio de um passarinho,
o fim de um painel de nuvens,
fulgor de neve, arco-íris,
borboleta que esvoaça,
eco de riso que só
de passagem nos alcança,
pode valer uma festa
ou razão de dor. Amamos
o que é semelhante a nós,
e entendemos os rabiscos
que o vento deixa na areia.

*

IN SAND GESCHRIEBEN
Dass das Schöne und Berückende
Nur ein Hauch und Schauer sei,
Dass das Köstliche, Entzückende,
Holde ohne Dauer sei:
Wolke, Blume, Seifenblase,
Feuerwerk und Kinderlachen,
Frauenblick im Spiegelglase
Und viel andre wunderbare Sachen,
Dass sie, kaum entdeckt, vergehen,
Nur von Augenblickes Dauer,
Nur ein Duft und Windeswehen, 
Ach, wir wissen es mit Trauer, 
Und das Dauerhafte, Starre 
Ist uns nicht so innig teuer: 
Edelstein mit kühlem Feuer, 
Glänzendschwere Goldesbarre; 
Selbst die Sterne, nicht zu zählen, 
Bleiben fern und fremd, sie gleichen 
Uns Vergänglichen nicht, erreichen 
Nicht das Innerste der Seelen. 
Nein, es scheint das innigst Schöne,
Liebenswerte dem Verderben
Zugeneigt, stets nah dem Sterben,
Und das Köstlichste: die Töne
Der Musik, die im Entstehen
Schon enteilen, schon vergehen,
Sind nur Wehen, Strömen, Jagen
Und umweht von leiser Trauer,
Denn auch nicht auf Herzschlags Dauer
Lassen sie sich halten, bannen;
Ton um Ton, kaum angeschlagen,
Schwindet schon und rinnt von dannen.
So ist unser Herz dem Flüchtigen,
Ist dem Fließenden, dem Leben
Treu und brüderlich ergeben,
Nicht dem Festen, Dauertüchtigen.
Bald ermüdet uns das Bleibende,
Fels und Sternwelt und Juwelen,
Uns in ewigem Wandel treibende
Wind- und Seifenblasenseelen,
Zeitvermählte, Dauerlose,
Denen Tau am Blatt der Rose,
Denen eines Vogels Werben,
Eines Wolkenspieles Sterben,
Schneegeflimmer, Regenbogen,
Falter, schon hinweg geflogen,
Denen eines Lachens Läuten,
Das uns im Vorübergehen
Kaum gestreift, ein Fest bedeuten
Oder wehtun kann. Wir lieben,
Was uns gleich ist, und verstehen,
Was der Wind in Sand geschrieben.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

CHEIRO DE OUTONO
Mais uma vez é um verão que nos abandona,
agonizando num temporal atrasado:
tranqüila a chuva rumoreja, enquanto um cheiro
amargo e tímido vem do bosque molhado.

Na relva pálida a liliácea se retesa
em meio a grande profusão de cogumelos;
tem-se a impressão de que se esconde e se retrai
o nosso vale, ontem ainda imenso e belo.

Retrai-se e cheira a timidez e a amargura
o mundo, com toda a claridade perdida:
prontos, olhamos o temporal atrasado,
pois acabou-se o sonho de verão da vida!

*

HERBSTGERUCH
Wieder hat ein Sommer uns verlassen,
Starb dahin in einem Spätgewitter.
Regen rauscht geduldig, und im nassen
Walde duftet es so bang und bitter.

Herbstzeitlose starrt im Grase bläßlich
Und der Pilze wucherndes Gedränge.
Unser Tal, noch gestern unermeßlich
Weit und licht, verhüllt sich und wird enge.

Enge wird und duftet bang und bitter
Diese Welt, dem Lichte abgewendet.
Rüsten wir uns auf das Spätgewitter,
Das des Lebens Sommertraum beendet!
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

DIA CINZENTO DE INVERNO
É um dia cinzento de inverno
e sem luz quase em seu lugar:
velho ranzinza, ele não quer
que ninguém lhe venha falar.

Ouve o rio jovem correr
cheio de ímpeto e paixão:
vê nessa forte impaciência
uma inútil ostentação.

Aperta os olhos com desdém,
poupando um pouco mais de luz,
e sobre o rosto cai-lhe a neve
a encobri-lo como um capuz.

O estridular das gaivotas
irrita-lhe o sonho de velho,
tanto quanto na árvore calva
a briga ruidosa dos melros.

Ri-se de todas essas coisas,
em sua imensa presunção 
– e vai deixando cair neve
até chegar a escuridão.

*

GRAUER WINTERTAG
Es ist ein grauer Wintertag, 
still und fast ohne Licht,
Ein mürrischer Alter, der nicht mag, 
daß man noch mit ihm spricht.

Er hört den Fluß, den jungen, 
ziehn voll Drang und Leidenschaft;
Vorlaut und unnütz dünkt sie ihn, 
die ungeduldige Kraft.

Er kneift die Augen spöttisch ein 
und spart noch mehr am Licht,
Ganz sachte fängt er an zu schnei’n, 
zieht Schleier vors Gesicht.

Ihn stört in seinem Greisentraum 
der Möwen grell Geschrei,
Im kahlen Ebereschenbaum 
der Amseln Zänkerei.

All das Getue lächert ihn 
mit seiner Wichtigkeit;
Er schneielet so vor sich hin 
bis in die Dunkelheit.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

SOL DE MARÇO
Embriagada de ardor matinal,
tonteia uma borboleta amarela.
Encolhido e com sono, um homem velho
descansa sentado junto à janela.

Entre as folhas da primavera, um dia
de viagem cantando partiu ele:
de uma porção de ruas a poeira
passou voando sobre os seus cabelos.

Naturalmente as árvores em flor
e as borboletas voando amarelas
parecem hoje as mesmas de outros tempos:
como se o tempo não tocasse nelas.

Os perfumes e as cores, entretanto,
tornaram-se mais finos e mais raros:
fez-se mais fria a luz, e o próprio ar
parece mais difícil respirar.

Como abelha a zumbir, a primavera
baixinho entoa os seus graciosos cantos:
a borboleta adeja em amarelo,
e o céu vibra em cristal de azul e branco.

*

MÄRZSONNE
Trunken von früher Glut
Taumelt ein gelber Falter.
Sitzend am Fenster ruht
Schläfrig gebückt ein Alter.

Singend durch Frühlingslaub
Ist er einst ausgezogen.
So vieler Strassen Staub
Hat sein Haar überflogen.

Zwar der blühende Baum
Und die Falter die gelben
Scheinen gealtert kaum,
Scheinen heut noch dieselben.

Doch es sind Farbe und Duft
Dünner geworden und leerer,
Kühler das Licht und die Luft
Strenger zu atmen und schwerer.

Frühling summt bienenleis
Seine Gesänge, die holden,
Himmel schwingt blau und weiss,
Falter entflattert golden.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

DE CARRO SOBRE O JULIER
Ermo rochoso, finados campos de escombros,
algas de cores como o verde e o cinza e o rubro,
do fundo cinza cresce a pedra alcantilada,
passeiam nuvens por cima das cumeadas,
hostil e frio corta o vento resmunguento,
param as águas nos brejos mudos e cegos,
em muros pálidos ainda há feridas frescas
com sangue escuro e crostas raladas de pedras.
Cansada mas firme e traçada com rigor
estende-se no meio da rua uma linha,
ontem caminho de romeiros e hostes, hoje
gasta por máquinas que ronronam levando
dentro pessoas – todas pensando em salvar-se
do barulhão para o descanso do verão,
só não têm tempo, não, tempo elas não têm não.
Juntos também nos apressamos: ficam longe
lugares como Bivio, Chur, Paris, Berlim...
Vamos às pressas pelas ruas apertadas,
olhando as nuvens por cima das cumeadas,
calhaus de pedra em meio a turvas poças dágua;
o cinza frio ainda nos tenta um arrepio,
porém a máquina arranca-nos inclemente,
daqui e dali, para bem longe. Heroicamente
sobre o fundo de cinza a pedra se desenha.
Nós vamos fugindo e vamos sentindo: “pena...”

*

IM AUTO ÜBER DEN JULIER
Stein-Öde, Trümmerfelder tot,
Dünnfargbige Algen grün, grau, rot,
Felsgipfel steil ins Graue drängend,
Gewölk die Grate überhängend,
Kaltfeindlich scharf der mürrische Wind,
Moorwasserlachen stumm und blind,
An bleichen Wänden frische Wunden
Blutbraun und schorfig, felsgeschunden.
Müd aber streng und scharfgeschnitten
Zieht lang der Straße Band inmitten,
Einst Heer- und Pilgerweg, und jetzt
Von schnurrenden Maschinen abgewetzt
Mit Menschen drin, die alles hätten,
Sich aus dem Lärm ins Sommerglück zu retten,
Nur keine Zeit, nur keine Zeit.
Wir hasten mit, es ist noch weit
Bis Bivio, bis Chur, Paris, Berlin,
Wir hasten auf der hageren Straße hin,
Wir sehen grat-entlang die Wolken ziehn,
Das Steingeröll mit blinden Wasserlachen;
Die graue Kühle will uns schauern machen,
Doch die Maschine reißt uns ohne Gnade
Hinan, hinab, hinweg. Heroisch hart
Ins Grau empor die steile Steinwelt starrt.
Wir fliehen, fliehen, und wir fühlen: "schade..."
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

TEMPESTADE EM JUNHO 
Sol que enferma, montanha que se encolhe,
negra fileira de nuvens de chuva
em forças que rastejam tocaieiras,
pássaros que de susto voam baixo,
sombras de chumbo que cobrem a terra.

Trovão que com estrépito se escuta
a retumbar de quebrada em quebrada  
como um conjunto de sonoros címbalos,
metálicas trombetas de faíscas 
uma após outra varando o aguaceiro.

Chuva que cai em bátegas espessas
com seu frio de prata de cristal
a inflar arroios e a roncar nos rios
com fúria de pranto muito guardado,
e o vale cada vez mais aterrado.

*

GEWITTER IM JUNI
Sonne krankt, Gebirge kauert,
Schwarze Wetterwolkenwand
Mit geduckten Kräften lauert,
Niedrig flattern scheue Vögel,
Graue Schatten übers Land.

Donner, lange schon zu hören,
Poltert lauter los und klingt
Herrlich auf zu Paukenchören,
Draus trompetenhell und golden
Blitz um Blitz den Schwall durchdringt.

Regen stürzt in dichten Güssen
Gläsern, kalt und silberfahlt,
Rennt in Bächen, rauscht in Flüssen
Wild wie lang verhaltenes Schluchzen
Nieder ins erschreckte Tal.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

LUZ DA ALVORADA
Pátria, infância, hora da manhã da vida
muitas vezes perdida e deslembrada:
tardia mensagem me vem de ti,
a reflorir do que mais fundo estava
soterrado no âmago de minha alma 
– ó doce luz, fonte ressuscitada!

Entre o outrora e o agora, a vida toda
que se havia por orgulhosa e rica,
não conta mais: volto a escutar, absorto,
o tão antigo sempre e sempre novo
cantar da fonte dos contos de fadas,
infantis cantinelas olvidadas.

Acima de tudo, com teu clarão
vais removendo o pó e a confusão
e o esforço da ambição irrealizada 
– ó fonte límpida, ó luz da alvorada!

*

LICHT DER FRÜHE
Heimat, Jugend, Lebens-Morgenstunde,
Hundertmal vergessen und verloren,
Kommt von dir mir eine späte Kunde
Hergeweht, so quillt´s aus allen Tiefen,
die verschüttet in der Seele schliefen,
süßes Licht du, Quelle neugeboren!

Zwischen Einst und Heut das ganze Leben,
Das wir oft für stolz und reich gehalten,
Zählt nicht mehr; ich lausche hingegeben
Den so jungen, den so ewig-alten
Märchenbrunnen-Melodien wieder
Der vergessenen alten Kinderlieder.

Über allen Staub und alle Wirre
Leuchtest du hinweg und alle Mühe
Unerfüllten Strebens in der Irre,
Lautre Quelle, reines Licht der Frühe.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

CHUVA DE OUTONO
Chuva, ó chuva de outono:
montanhas com  véus de cinza,
árvores com folhas últimas a descair exaustas.
Entre as janelas com calços espia
com o peso do adeus o ano agonizante.
A tiritar de frio em seu molhado manto,
lá te vais. Na folhagem desbotada
na orla da floresta, tartarugas
e salamandras bêbadas tateiam.
Estrada a baixo
correm e gorgolejam infinitas águas,
até no relvado junto à figueira
juntarem-se em paciente lagoa.
E da torre da igreja sobre o vale
gotejam vacilantes e cansados
dobres de sinos por alguém da aldeia
que foram sepultar.

Aflige-te, meu caro, 
não pelo seu vizinho sepultado,
nem pela dádiva do verão longo,
mas sim pelo festim da juventude!
Tudo perdura em piedosa lembrança:
em palavra ou imagem ou canção as coisas vão ficando 
sempre prontas para o ritual do retorno,
com renovada e nobre vestimenta.
Ajuda a confirmar e a transformar,
e em crédula alegria o coração em flor
verás desabrochar!

*

REGEN IM HERBST  
O Regen, Regen im Herbst, 
Grau verschleierte Berge, 
Bäume mit müde sinkendem Spätlaub! 
Durch beschlagene Fenster blickt 
Abschiedsschwer das krankende Jahr. 
Fröstelnd im triefenden Mantel 
Gehst du hinaus. Am Waldrand 
Tappt aus entfärbtem Laub 
Kröte und Salamander trunken, 
Und die Wege hinab 
Rinnt und gurgelt unendlich Gewässer, 
Bleibt im Grase beim Feigenbaum 
In geduldigen Teichen stehn. 
Und vom Kirchturm im Tale 
Tropfen zögernde, müde 
Glockentöne für Einen vom Dorf. 
Den sie begraben. 

Du aber traure, Lieber,  
Nicht dem begrabenen Nachbarn, 
Nicht dem Sommerglück länger nach 
Noch den Festen der Jugend! 
Alles dauert in frommer Erinnerung, 
Bleibt im Wort, im Bild, im Liede bewahrt, 
Ewig bereit zur Feier der Rückkehr 
Im erneuten, im edlern Gewand. 
Hilf bewahren du, hilf verwandeln, 
Und es geht dir die Blume 
Gläubiger Freude im Herzen auf. 
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

LAMENTAÇÃO E CONSOLO
Aquela luz, que tão suave antigamente
ardia nos quartos da nossa juventude,
não está mais em parte alguma. Nós, que quando
moços e moças, a conhecemos e amamos,
vêmo-la murcha e apodrecida sobre túmulos.

A luz que hoje tão fria e tão penetrante 
se vê nas ruas, e com tanta profusão
flameja e brilha por cima da multidão,
é diferente de todas as outras luzes
que nas cidades de nossa infância existiam:
e também outras são as vielas e praças
tão novas, tão abertas, tão cheias de pedras.

Também o que depois das guerras foi ficando
– velhas e amigas vilas e aldeias natais –
fita com olhos diferentes e assustados:
gemem e roncam impacientes motores,
e em tal tumulto igreja e cemitério
mostram-se velhos, intimidados, perdidos
aos olhos frios e aflitos dos motoristas.

Porém a chuva, quando em chão de primavera
cai de mansinho ou na folhagem do verão
sussurra e tine e cheira como antigamente, 
e o movimento silencioso da serpente
que ouve e fareja com a angulosa cabeça,
ou a secreta tristeza da meia-lua
quando se eleva misteriosa e furtiva
sobre as ameias das serras anoitecidas,
e o salgueiral estremecendo ao vento sul...
Ah, e o profundo ardor das montanhas na noite,
e o acanhado açafrão a florir primeiro 
– são como sempre, não se lhes quebrou o encanto:
como há tempos, quando, naquele naufragado
mundo, amigáveis nos saudavam e falavam
a encher-nos a alma de consolo e de alegria,
falam-nos hoje ainda, e dão ao coração
– de quem os anos vê voarem como os dias –
resposta igual à luz da vela e do lampião 
que iluminavam as noites da nossa infância.

*

KLAGE UND TROST
Jenes Licht, das einst in den Stuben
Unserer Jugend am Abend so sanft gebrannt,
Ist nirgend mehr. Und die wir gekannt
Und geliebt als hübsche Mädchen und Buben,
Sind hingewelkt und in Gräbern vermodert.

Das Licht, das heut über den Straßen
So kühlgrell und so über die Maßen
Verschwenderisch gleißt und lodert,
Ist anders als alle Lichter waren
In den Städten unserer Kinderzeit,
Und anders geworden sind Plätze und Gassen,
So neu, so steinern, so breit.

Auch was die Kriege übrig gelassen,
Städtchen und Dörfer heimatlich vertraut,
Aus andern, erschreckten Augen schaut,
Es dröhnt und stöhnt von ungeduldigen Motoren,
Kirche und Friedhof stehn im Gewühl
Altgeworden, verschüchtert, verloren,
Die Leute am Steuer blicken versorgt und kühl. 
Aber der Regen, wenn er in Frühlingserde
Leise sinkt oder ins Sommerlaub rauscht,
Klingt und riecht noch wie einst, und der lautlosen Natter Gebärde, 
Wenn sie mit eckigem Köpfchen wittert und lauscht,
Oder des halben Mondes heimliche Trauer,
Wie er so fremd und verstohlen sich hebt
Über der nächtlichen Berge zackige Mauer,
Und der Weide Gezweig, wenn es im Föhnwind bebt,
O und der Abendberge inniges Glühen
Oder der ersten Krokus schüchternschelmisches Blühen
Sind noch wie immer, ihr Zauber ist ungebrochen.
Wie sie vor Zeiten in jener versunkenen Welt
Uns begrüßt und freundlich zu uns gesprochen
Und uns die Seele mit Trost und Freude erhellt,
Sprechen sie heut noch und geben Antwort dem Herzen,
Dem die Jahre wie Tage vorüber fliehn,
Gleich dem Lampenschein und dem sanften Schimmer der Kerzen,
Der die Abende unsrer Kindheit beschien.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

NECROLÓGIO 
Ao meu querido amigo H. C. Bodmer, 
no dia de sua morte: 28 de maio de 1956.
.
Tu te foste tão cedo, amigo meu!
Estéril se resseca à minha volta o espaço que foi uma vez um bosque: 
velha árvore esquecida, fiquei só.

Poucos te conheciam, e nenhum por inteiro:
oculta sob a máscara leviana
do cavaleiro, bebedor, oficial, mecenas 
– vivia tua secreta e radiante realeza.
 
Que por trás dessa austera pose senhorial
tivesses humildade, abnegação, aptidão para amar
o grandioso, o sagrado – só os amigos
do círculo mais intimo sabiam: um saber
que guardávamos como precioso segredo.

Salve, impetuoso e indômito!
Fielmente conservo a imagem do teu cavalheirismo.
E longamente, na devastada colina,
contemplo o ermo lugar
onde um dia talvez tua coroa quiseras descansar.

*

NACHRUF
Meinem lieben Freunde H. C. Bodmer an seinem
Todestage, dem 28.Mai 1956
.
O Freund, daß du so früh gegangen bist!
Kahl dorrt um mich der Raum, der Wald einst war.
Vergessener alter Baum, steh ich allein.

Dich kannten wenige, und keiner ganz.
Verborgen unter flotter Maske
Des Reiters, Zechers, Offiziers, Mäzens
Lebte dein Strahlendes, dein heimliches Königtum.
 
Und daß du hinter straffer Herrenmiene
Hingabe hegtest, Demut, Liebeskraft
Fürs Große, Heilige, war Freunden nur
Des innern Kreises kund, ein Wissen,
Das wir als kostbares Geheimnis bargen.

Leb wohl, du Stürmischer, Unbändiger!
Dein Bild bewahr ich treu, das ritterliche.
Und lang am kahlgeschlagenen Hang
Betracht ich die verödete Stelle,
Ob der sich deine Krone einst gewiegt.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

VIANDANTE EM FIM DE OUTONO
Através de galhos nus da floresta
Primeira neve cai branca do ar cinzento
E pias e pias. Quão silencioso o mundo estava!
Nenhuma folha que sussurra, nenhum pássaro nos galhos,
Apenas branco e cinza e silêncio, silêncio.

O andarilho também, as luas verdes e coloridas
Vagou com sons e cantos,
Tornou-se burro e cansado de alegria
Cansado de caminhar, cansado de músicas.
Ele estremece das alturas cinzas frias
Sopra sobre ele e afunda silenciosamente
E se a neve afundar ...

Ainda fala da primavera distante
E memória murcha da felicidade do verão
Com imagens de sopro pálidas:
Pétalas de cereja brilhando através de um azul,
Um belo azul brilhante -
Com delicados tremores nas asas pendurados na haste
Uma jovem mariposa marrom e dourada.
Fora da noite úmida da floresta no verão
Desejando canção de pássaro longa ...
O andarilho acena para as lindas imagens:
Como foi legal! E algumas coisas ainda tremulam
daquela vez, brilha e sai:
Um olhar doce e sombrio dos olhos do amor.
Uma tempestade noturna, raios e tempestades nos juncos -
Uma música de flauta de uma janela estranha da noite.
Um rugido alto na floresta da manhã ...

A neve afunda e afunda. The Wanderer
Ouça o canto dos pássaros e a flauta.
O batimento cardíaco que soou uma vez:
Ó belo mundo, como você se calou!
Ele passa inaudivelmente pelo branco macio
Para a pátria, os há muito esquecidos
Quem agora chama com gentil compulsão,
Em direção ao vale, o Erlenbach,
O mercado, a casa do velho pai,
A parede de hera atrás da qual a mãe
O pai e os ancestrais descansam.

Nenhum farfalhar de folhas, nenhum pássaro nos galhos ...

*

WANDERER IM SPÄTHERBST 
Durch kahlen Waldes Astgeflecht
Sinkt weiß aus grauen Lüften erster Schnee
Und sinkt und sinkt. Wie ward die Welt so stumm!
Kein Blatt das rauscht, kein Vogel im Gezweig,
Nur Weiß und Grau und Stille, Stille.

Der Wandrer auch, der grün und bunte Monde
Durchwanderte mit Laute und Gesang,
Ist stumm geworden und der Freude müd,
Des Wanderns müd, der Lieder müd.
Ihn schauert, aus den kühlen grauen Höhn
Weht Schlaf ihn an, und leise sinkt
Und sinkt der Schnee...

Noch spricht aus fernem Frühling her
Und hingewelktem Sommerglück Erinnerung
Mit blaß verwehenden Bildern:
Kirschblütenblätter schleiernd durch ein Blau,
Ein holdes lichtes Blau –
Mit zartem Flügelzittern hängt am Halm
Ein junger Falter braun und gold –
Aus laulicht feuchter Sommerwaldnacht
Sehnsüchtig langgezognes Vogellied...
Der Wandrer nickt den lieben Bildern zu:
Wie war das schön! Und manches flattert noch
aus jenem Einstmals auf, glänzt und erlischt:
Ein dunkelsüßer Blick aus Liebesaugen –
Ein Nachtgewitter, Blitz und Sturm im Schilf –
Ein Flötenlied aus fremdem Abendfenster –
Ein greller Häherschrei im Morgenwald...

Es sinkt und sinkt der Schnee. Der Wandrer
Lauscht Vogelruf und Flöte nach.
Den einst erklungenen, herzbewegenden:
O schöne Welt, wie bist du so verstummt!
Unhörbar geht er hin durchs weiche Weiß
Der Heimat zu, der langvergeßnen,
Die jetzt mit sanften Zwange ruft,
Dem Tale zu, dem Erlenbach,
Dem Markt, dem alten Vaterhaus,
Der Efeumauer, hinter der die Mutter,
Der Vater und die Ahnen ruhn.

Kein Blatt das rauscht, kein Vogel im Gezweig…
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

O ANCIÃO E AS MÃOS
Penosamente ele faz o percurso
da sua longa noite:
espera, escuta e vela.
Diante dele sobre a coberta repousam
ambas as mãos: a direita e a esquerda
hirtas, nodosas, cansadas serventes 
– e ele ri
baixo, para não as acordar.

Infatigáveis mais que a maioria
trabalharam bastante,
quando em pleno vigor.
Muito haveria ainda por fazer,
mas as obedientes companheiras
quereriam agora descansar e retornar ao pó.
Para serventes,
estão cansadas e ressecadas.

Baixo, para não as acordar,
o senhor ri-se delas:
a longa caminhada da existência
parece agora curta, embora longo
o percurso de uma noite... E mãos de crianças,
mãos de adolescentes, mãos de adulto,
no entardecer, no fim,
olham-se assim.

*

DER ALTE MANN UND SEINE HÄNDE
Mühsam schleppt er sich die Strecke
Seiner langen Nacht,
Wartet, lauscht und wacht.
Vor ihm liegen auf der Decke
Seine Hände, Linke, Rechte,
Steif und hölzern, müde Knechte,
Und er lacht
Leise, daß er sie nicht wecke.

Unverdrossener als die meisten
Haben sie geschafft,
Da sie noch im Saft.
Vieles wäre noch zu leisten,
Doch die folgsamen Gefährten
Wollen ruhn und Erde werden.
Knecht zu sein,
Sind sie müde und dorren ein.

Leise, daß er sie nicht wecke,
Lacht der Herr sie an,
Langen Lebens Bahn
Scheint nun kurz, doch lang die Strecke
Einer Nacht... Und Kinderhände,
Jünglingshände, Männerhände
Sehn am Abend, sehn am Ende
So sich an.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

UM SONHO 
Salões timidamente atravessados,
mil semblantes estranhos...
Uma depois da outra, devagar
as luzes se enfraquecem:
no lusco-fusco que a tudo acinzenta
e encobre no matiz crepuscular,
um rosto me parece familiar,
e a memória do amor vai descobrindo
que conhece um e outro
dos rostos ainda há pouco  tão estranhos.
Ouço nomes chamados
de pais, irmãos, companheiros,
até de heróis, mulheres e poetas,
que eu amei quando moço.
Mas nenhum, entre tantos,
me concede um olhar:
como as chamas das velas,
dissipam-se no nada,
deixando para trás, no coração 
– ecos de poesias esquecidas –
lamento e escuridão
em torno dos contidos
dias de sonho e lenda
alguma vez vividos.

*

EIN TRAUM
Säle, bang zu durchwandern,
Hundert fremde Gesichter…
Langsam, eins nach dem andern,
Werden blasser die Lichter.
Da, wie ihr Schimmer ergraut
Und zu Dämmrung erblindet,
Scheint mir ein Antlitz vertraut,
Liebesgedächtnis findet
Eins um andre bekannt
Die zuvor fremde Gesichter.
Namen hör ich genannt:
Eltern, Geschwister, Gespielen,
Helden auch, Frauen und Dichter,
Die ich als Knabe verehrt.
Aber keines der vielen
Einen Blick mir gewährt.
Gleich den Flammen der Kerzen
Schwinden sie weg ins Nichts,
Lassen im trauernden Herzen
– Klänge vergeßnen Gedichts –
Dunkel zurück und Klage
Um die zu Traum und Sage
Eingedämmerten Tage
Einst genossenen Lichts.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

ANTIGA IMAGEM DE BUDA
EM RUÍNAS NUM BARRANCO
DE BOSQUE JAPONÊS
Amolecido e gasto entre oferendas
de muitas chuvas e geadas, verdes 
de limo as faces  e as pálpebras grossas 
caídas – fitas em silêncio a meta:
o des-ser voluntário e o vir-a-ser 
no Todo em transmutação sem limites.
Teu gesto desfigurado ainda lembra
a nobreza de tua real missão,
e já procura, em humo e lodo e terra,
em forma livre, a própria perfeição:
será amanhã raiz, folha em sussurro,
água a espalhar a pureza do céu,
crespidão de capim ou alga ou hera 
– imagens do que é vário no Uno eterno.

*

URALTE BUDDHA-FIGUR 
IN EINER JAPANISCHEN WALDSCHLUCHT 
VERWITTERND
Gesänftigt und gemagert, vieler Regen
Und vieler Fröste Opfer, grün von Moosen
Gehn deine milden Wangen, deine großen
Gesenkten Lider still dem Ziel entgegen,
Dem willigen Zerfalle, dem Entwerden
Im All, im ungestaltet Grenzenlosen.
Noch kündet die zerrinnende Gebärde
Vom Adel deiner königlichen Sendung
Und sucht doch schon in Feuchte, Schlamm und Erde,
Der Formen ledig, ihres Sinns Vollendung,
Wird morgen Wurzel sein und Laubes Säuseln,
Wird Wasser sein, zu spiegeln Himmels Reinheit,
Wird sich zu Efeu, Algen, Farnen kräuseln, -
Bild allen Wandels in der ewigen Einheit.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

RAPAZOTE
Quando me castigam
eu fico calado:
vou dormir chorando 
e acordo curado.

Quando me castigam
dizem “o pequeno”;
eu não choro mais
e vou dormir rindo.

Morrem os mais velhos 
– os avós, os tios –
mas eu vou ficando
sempre por aqui.

*

KLEINER KNABE
Hat man mich gestraft,
Halt ich meinen Mund,
Weine mich in Schlaf,
Wache auf gesund.

Hat man mich gestraft,
Heißt man mich den Kleinen,
Will ich nicht mehr weinen,
Lache mich in Schlaf.

Große Leute sterben,
Onkel, Großpapa,
Aber ich, ich bleibe
Immer, immer da.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

NOITE EXAUSTA
Morde o vento da noite
uma queixa abafada
pelas folhas. No pó
caem gotas pesadas.

Nos rostos muros brotam
musgos e samambaias.
Anciãos silenciosos
se agacham nos umbrais.

Mãos retorcidas pousam
sobre os joelhos duros,
entregues ao descanso
enquanto vão murchando.

Enormes gralhas voam
por sobre o cemitério.
Samambaias e musgos
nos rasos morros medram.

*

MÜDER ABEND
Abendwindes Lallen
Klagt erstickt im Laub,
Schwere Tropfen fallen
Einzeln in den Staub.

Aus den mürben Mauern
Moos und Farne quellen,
Alte Leute kauern
Schweigend auf den Schwellen.

Krumme Hände lasten
Still auf steifen Knien,
Geben sich dem Rasten
Und Verwelken hin.

Überm Friedhof flügeln
Krähen schwer und groß.
Auf den flachen Hügeln
Wuchert Farn und Moos.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

JOVEM NOVIÇO 
           NUM MOSTEIRO ZEN – I
A mansão de meu pai levanta-se no sul
entre o calor do sol e o ar do mar azul:
de noite estou sonhando, às vezes, com meu lar,
e as lágrimas me molham para me acordar.

Será que os meus colegas percebem também
o que há comigo? Assustam-me com seu desdém.
Idosos monges roncam como uns animais;
só eu. Yu Wang, esfrio-me e não durmo mais.

Um dia, um dia eu ainda pego o meu bastão,
calço as sandálias, e não fico aqui mais não:
por um milhar de milhas peregrinarei
de volta ao lar e à sorte que eu mesmo deixei.

Mas quando o mestre fita o olhar de tigre em mim
a penetrar-me, o meu destino eu vejo enfim:
sinto-me todo ardendo e todo me gelando,
envergonho-me, tremo, fico e vou ficando.

*

JUNGER NOVIZE 
IM ZEN-KLOSTER – I
Meines Vaters Haus im Süden steht, 
Sonne wärmt es sanft und Seeluft weht. 
Von der Heimat träum ich manche Nacht, 
Naß von Tränen bin ich oft erwacht. 

Wittern meine Kameraden schon. 
Wie mir ist? Mir bangt vor ihrem Hohn. 
Alte Mönche schnarchen sanft wie Tiere, 
Ich allein, Yü Wang, bin wach und friere. 

Einmal, einmal nehm ich meinen Stab, 
Binde die Sandalen, reise ab, 
Tausend Meilen pilgre ich zurück 
In die Heimat, ins verlassne Glück. 

Aber wenn des Meisters Tigerblick 
Mich durchbohrt, erkenn ich mein Geschick, 
Spüre Glut und spüre Eis im Leibe, 
Zittre, schäme mich und bleibe, bleibe. 
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

JOVEM NOVIÇO 
        NUM MOSTEIRO ZEN – II
Seja tudo ilusão e fantasia,
permanecendo a verdade indizível:
entretanto, a montanha me contempla
com seu contorno bem reconhecível.

Cervo e corvo, rosa rubra e lilás,
azul de mar e mundo variegado:
se te concentras, tudo se desfaz
no grande Uno amorfo e inominado.

Recolhe-te ao mais fundo do teu ser
e assim aprende a ver, aprende a ler!
Concentra-te... e o mundo faz-se aparência.
Concentra-te... e a aparência faz-se essência.

*

JUNGER NOVIZE 
                 IM ZEN-KLOSTER – II
Ist auch alles Trug und Wahn
Und die Wahrheit stets unnennbar,
Dennoch blickt der Berg mich an
Zackig und genau erkennbar.

Hirsch und Rabe, rote Rose,
Meeresblau und bunte Welt:
Sammle dich – und sie zerfällt
Ins Gestalt – und Namenlose.

Sammle dich und kehre ein,
Lerne schauen, lerne lesen!
Sammle dich – und Welt wird Schein.
Sammle dich – und Schein wird Wesen.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

LEJ NAIR
(Pequeno lago negro do bosque 
de Engadin sobre o Surlej)
.
Detrás de rígidas trancas de pedra
que as margaridas tentam suavizar,
há um negro espelho d`água para as nuvens 
e a floresta e a montanha retratar.

A sombra azul e uma fresca umidade
enchem toda a baixada; e então parece
que, do lago para o clarão da neve 
nos altos cumes, seu silêncio cresce.

Vale a baixo, com a sonenta chuva,
deslizam preguiçosos fios d`água; 
em cima da lama e dos seixos pardos
branqueiam velhos esqueletos de árvores.

Olha fixo o pinhal e espalha sombras
o lariço; ainda há pouco tão vivaz, 
o vento agora hesita e busca exausto
um lugar onde se deitar em paz.

*

LEJ NAIR
Kleiner schwarzer Waldsee 
im Engadin über Surlej 
.
Hinter strengem Felsenriegel, 
Den die Weidenrosen mildern, 
Dehnt sich dunklen Wassers Spiegel, 
Wolken, Wald und Berg zu schildern.

Schwarze Bläue, kühle Feuchte 
Füllt die Mulde satt, ihr Schweigen 
Scheint vom See hinauf zur Leuchte 
Frischen Gipfelschnees zu steigen.

Talwärts mit verschlafenem Rieseln 
Träge Wasserfäden schleichen, 
Über Schlamm und braunen Kieseln 
Alte Baumgerippe bleichen. 

Arve starrt und Lärche schattet, 
Selbst der Wind, noch eben rege, 
Zögert jetzt und sucht ermattet, 
Wo er sich zur Ruhe lege.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

LOUIS SUTTER* 
A pintar quadros lindos e perfeitos,
a tocar no violino sonatas sem defeito 
e lindas – a Kreutzer, à Primavera –
aprendi, já faz tempo, quando jovem
corria para o mundo aberto e claro:
eu era moço, era louvado e era amado...
Mas certa vez me olhou pela janela,
a rir com a maxila descarnada,
a Morte – e o coração
gelou dentro de mim, gelou a mim
e me gela ainda hoje. Eu escapei,
vaguei de um lado para outro,
mas me pegaram e me puseram fechado
ano após ano. Da minha janela,
por entre as grades, ela me arregala os olhos
e arregalada ri. Me conhece. Ela sabe.
Em papel grosso às vezes pinto homens,
pinto mulheres, pinto Jesus Cristo,
Adão e Eva, o Gólgota,
não perfeitos, não lindos, mas sentidos.
Com tinta e sangue eu pinto, com verdade,
e a verdade é terrível.
Recubro a folha, risca sobre risca,
mais alta, mais grudada, cinza, prata, preta,
e as pontas dos hieróglifos
deixo encresparem-se espalhados feito musgo,
crepitarem como granizo seco, afilarem-se em espinhas de peixe,
cinzentos véus, redes de linhas finas, teias de aranha,
vento na relva, trança de raízes, caligrafias,
rabisco dez mil linhas em blocos e mais blocos,
lisas, inchadas, arrepiadas,
em plumas flamejantes, empinadas, esquivas,
poupo aos rabiscos os corpos de neve,
jogo Jesus no chão
sob o fardo da cruz, voejam pássaros
como espectros num matagal de sonho, flores em flocos
a rir aflitas entre ervas murchas.
Eu às vezes esqueço,
eu às vezes conjuro tanta angústia,
eu às vezes escuto de distantes
anos de sombra, muitos anos, música:
sonata a Kreutzer... Mas na janela
sei que, nas minhas costas,
riem de mim.
Mas quem me conhece, quem sabe – é Ela.
-----
* Louis Sutter, músico e pintor, viveu de 1871 a 1942, foi dileto aluno do violinista Ysaye. 
Acometido de tifo, passou as últimas décadas de sua vida num sanatório, onde fazia 
desenhos com uma fúria genial, como se pode ver por sua obra publicada, muito depois 
que ele morreu, pela editora Mermod, de Lausanne (Nota de H. Hesse).

*

LOUIS SOUTTER
Schöne korrekte Bilder malen,
Schöne Sonaten tadellos geigen,
Frühlings- und Kreutzersonate
Lernt ich einst und war jung,
Lief in die offene lichte Welt,
War jung, wurde gelobt, wurde geliebt …
Aber einmal sah mir durchs Fenster
Lachend mit kahlen Kiefern
Der Tod herein, und das Herz
Fror mir im Leibe, fror mir,
Friert mir noch heut. Ich floh,
irrte hin, irrte her.
Aber sie fingen mich, sperrten mich ein,
Jahr um Jahr. Durch mein Fenster
Hinter dem Gitter glotzt er,
Glotzt und lacht. Er kennt mich. Er weiß.

Männer male ich oft auf raues Papier,
Male Weiber, male den Jesus Christ,
Adam und Eva, Golgatha,
Nicht korrekt, nicht schön, sondern richtig
Mal ich mit Tinte und Blut, male wahr. Wahrheit ist schrecklich.
Aber ich decke mein Blatt mit Strich an Strich,
Loser, dichter, grau, silbern, schwarz,
Lasse die Züge der Hieroglyphen
Wollig wuchern wie Moos,
Prasseln wie trockener Hagel, kämmen wie Fischgeripp,
Schleiere grau Netze aus Liniendünn, Spinnweb,
Wind im Gras, Wurzelgeflecht, Kalligraphie,
Kratze Lage um Lage zehntausen Striche,
Glatte, schwellende, haaresträubende,

Fedrig geflammte, stehende, fliehende,
Spare aus ihrem Gekräusel schneeweißen Leib,
Drücke den Jesus zu Boden
Mit Kreuzes Last. Vogelgeflatter
Geistert durch Traumgehölz, flockige Blumen
Lachen traurig aus welkem Gekräut.
Manchmal vergeß ich,
Manchmal bann ich die Angst,
Manchmal hör ich aus Fernen
Dunkler Jahre, vieler Jahre, Musik,
Kreutzersonate … Aber am Fenster
Weiß ich, in meinem Rücken,
Jenen stehen und lachen.
Er kennt mich. Er weiß.
----
Auf dem Manuskriptblatt fand sich folgende Notiz von Hermann Hesse: 
Louis Soutter, Maler und Musiker, lebte von 1871 bis 1942; als Maler und Violinist akademisch ausgebildet, Lieblingsschüler von Ysaye, übte wechselnd beide Berufe aus. Nach einem schweren Typhus erholte er sich nie wieder, die beiden letzten Jahrzehnte lebte er in einer Anstalt interniert. Dort zeichnete er die wilden genialen Blätter, die der Lausanner Verlag Mermod lang nach seinem Tod herausgab. 
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

UMA VEZ, HÁ MIL ANOS
Inquieto e com vontade de viajar,
ao acordar de um sonho esfacelado,
ouço dentro da noite a melodia
que os meus bambus estão a sussurrar.

Em vez de me aquietar, de me deitar,
eu me sinto arrancar dos velhos trilhos
a me precipitar, a ir pelo ar
em vôo picado rumo ao infinito.

Uma vez, há mil anos, existiu
uma terra natal e um jardim onde
no canteiro onde se enterravam pássaros
a neve enrijecia os açafrões.

Quisera eu me estender em vôo de pássaro,
além do desterro que me enclausura,
até  lá – até aqueles tempos cujo
ouro até hoje para mim fulgura.

*

EINST VOR TAUSEND JAHREN
Unruhvoll und reiselüstern
Aus zerstücktem Traum erwacht
Hör ich seine Weise flüstern 
Meinen Bambus in der Nacht.

Statt zu ruhen, statt zu liegen
Reißt michs aus den alten Gleisen
Weg zu stürzen, weg zu fliegen
Ins Unenedliche zu reisen.

Einst vor tausend Jahren gab es
Eine Heimat, einen Garten,
Wo im Beet des Vogelgrabes
Aus dem Schnee die Krokus starrten.

Vogelschwingen möcht ich breiten
Aus dem Bann, der mich umgrenzt,
Dort hinüber zu den Zeiten,
Deren Gold mir heut noch glänzt.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

RASCUNHADO NUMA NOITE DE ABRIL
Que existam cores:
azul, amarelo, branco, vermelho e verde!
Que existam sons:
soprano, baixo, trompa, oboé!
Que existam línguas:
vocábulos, versos, rimas,
delicadeza de acordes,
marcha e dança de sintaxes!
Quem com tais jogos brincou,
quem seus encantos provou,
terá sempre a sorrir-lhe e a encaminhá-lo
o coração e os sentidos.

O que amaste e desejaste,
o que sonhaste e viveste,
faz parte do teu saber:
foi deleite ou sofrimento?
Lá-bemol, sol-sustenido,
mi-bemol, ré-sustenido:
pode isolá-los o ouvido?

*

NACHTS IM APRIL NOTIERT
O dass es Farben gibt:
Blau, Gelb, Weiss, Rot, und Grün!
O dass es Töne gibt:
Sopran, Bass, Horn, Oboe!
O dass es Sprache gibt:
Vokabeln, Verse, Reime,
Zärtlichkeiten des Anklangs,
Marsch und Tänze der Syntax!
Wer ihre Spiele spielte,
Wer ihre Zauber schmeckte,
Ihm blüht die Welt, 
Ihm lacht sie und weist ihm
Ihr Herz, ihren Sinn.

Was du liebtest und erstrebtest,
Was du träumtest und erlebtest,
Ist dir noch gewiss,
Ob es Wonne oder Leid war?
Gis und As, Es oder Dis – 
Sind dem Ohr sie unterscheidbar?
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

CANTO MÍNIMO
Poesia de arco-íris,
magia de luz morrendo,
felicidade em música diluída,
paixão no rosto da Virgem,
êxtase amargo da vida...

Flores batidas pela tempestade,
grinaldas postas sobre sepulturas,
alegria que não dura,
estrela que cai no escuro:
véu de beleza e de luto
sobre a voragem do mundo.

*

KLEINER GESANG
Regenbogengedicht,
Zauber aus sterbendem Licht,
Glück wie Musik zerronnen,
Schmerz im Madonnengesicht,
Das eins bittere Wonne...

Blüten vom Sturm gefegt,
Kränze auf Gräber gelegt,
Heiterkeit ohne Dauer,
Stern, der ins Dunkel fällt.
Schleier von Schönheit und Trauer
Über dem Abgrund der Welt.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

§§

RANGER DE GALHO RACHADO
Já todo em lascas o galho
ano após ano pendente,
seco ao vento a ranger o seu cantar,
sem folhas e sem cascas,
calvo e encardido de tanto viver,
farto de tanto morrer:
Duro e tenaz retine o seu cantar,
obstinado retine, com seu temor interno,
mais um verão,
ainda mais um inverno.

*

KNARREN EINES GEKNICKTEN ASTES 
Splittrig geknickter Ast, 
Hangend schon Jahr um Jahr, 
Trocken knarrt er im Wind sein Lied, 
Ohne Laub, ohne Rinde, 
Kahl, fahl, zu langen Lebens, 
Zu langen Sterbens müd. 
Hart klingt und zäh sein Gesang, 
Klingt trotzig, klingt heimlich bang 
Noch einen Sommer, 
Noch einen Winter lang.
- Hermann Hesse, no livro "Andares: antologia poética". [tradução e prólogo de Geir Campos]. Nova Fronteira, 1976. 

****

  • Hermann Hesse - escritor e pintor alemão

AFORISMOS - CITAÇÕES - EXCERTOS


DEMIAN – HERMAN HESSE 


"Queria apenas tentar viver aquilo que brotava espontaneamente de mim. Porque isso me era tão difícil?"
- Hermann Hesse, 'epígrafe' do livro "Demian" [tradução Ivo Barroso]. Record, 2015.

§§

"Mas cada homem não é apenas ele mesmo; é também um ponto único, singularíssimo, sempre importante e peculiar, no qual os fenômenos do mundo se cruzam daquela forma uma só vez e nunca mais. Assim, a história de cada homem é essencial, eterna e divina, e cada homem, ao viver em alguma parte e cumprir os ditames da Natureza, é algo maravilhoso e digno de toda a atenção."
- Hermann Hesse, no livro "Demian" [tradução Ivo Barroso]. Record, 2015.

§§

"Não creio ser um homem que saiba. Tenho sido sempre um homem que busca, mas já agora não busco mais nas estrelas e nos livros. Começo a ouvir os ensinamentos que meu sangue murmura em mim."
- Hermann Hesse, no livro "Demian" [tradução Ivo Barroso]. Record, 2015.

§§

"A vida de todo ser humano é um caminho em direção a si mesmo, a tentativa de um caminho, o seguir de um simples rastro. Homem algum chegou a ser completamente ele mesmo; mas todos aspiram a sê-lo, obscuramente alguns, outros mais claramente, cada qual como pode." 
- Hermann Hesse, no livro "Demian" [tradução Ivo Barroso]. Record, 2015.

§§ 

"Pela primeira vez saboreei a morte. Tinha um gosto amargo. Pois a morte é nascimento, é angústia e medo ante uma renovação aterradora."
- Hermann Hesse, no livro "Demian" [tradução Ivo Barroso]. Record, 2015.

§§

"De um modo geral, não se deve temer a ninguém. Quando temos medo a alguém é porque demos a esse alguém algum poder sobre nós"
- Hermann Hesse, no livro "Demian" [tradução Ivo Barroso]. Record, 2015.

§§

"Hoje sei muito bem que nada na vida repugna tanto ao homem do que seguir pelo caminho que o conduz a si mesmo"
- Hermann Hesse, no livro "Demian" [tradução Ivo Barroso]. Record, 2015.

§§

"Todos os homens vivem esses momentos difíceis. Para os de nível médio, este é o ponto da existência em que surge a maior oposição entre o avançar da própria vida e o mundo em derredor, o ponto em que se torna mais duro conquistar o caminho que conduz à frente. São muitos os que unicamente esta vez passam na vida por aquele morrer e renascer que é o nosso destino, somente esta vez, quando tudo o que chegarmos a amar quer abandonar-nos e sentimos de repente em nós a solidão e o frio mortal dos espaços infinitos. E há muitos também que se embaraçam para sempre nesses escolhos e permanecem a vida toda agarrados a um passado sem retorno, ao sonho do paraíso perdido, o pior e o mais assassino de todos os sonhos."
- Hermann Hesse, no livro "Demian" [tradução Ivo Barroso]. Record, 2015.

§§

"Quando um animal ou um homem orienta toda a sua atenção e toda a sua força de vontade para determinado fim, acaba por consegui-lo. O mesmo acontece com o que antes dizíamos. Se observarmos uma pessoa com suficiente atenção, Acabaremos por saber mais da pessoa do que a própria pessoa"
- Hermann Hesse, no livro "Demian" [tradução Ivo Barroso]. Record, 2015.

§§

"Vejo que pensas mais do que podes exprimir. Mas vejo também que nunca viveste completamente aquilo que pensas, e isso não é bom. Somente as idéias que vivemos é que têm valor. Percebeste que o "mundo permitido" era apenas a metade do mundo, e trataste de ocultar a outra metade, como fazem os religiosos e os professores. Jamais o conseguirás! Ninguém o consegue, a partir do momento em que haja começado a pensar."
- Hermann Hesse, no livro "Demian" [tradução Ivo Barroso]. Record, 2015.

§§

"— As palavras engenhosas não têm qualquer valor, absolutamente nenhum. Só conseguem afastar-nos de nós mesmos. E afastar-se de si mesmo é um pecado. É preciso que se saiba encerrar-se em si mesmo, como a tartaruga."
- Hermann Hesse, no livro "Demian" [tradução Ivo Barroso]. Record, 2015.

§§
.
"Uma vaga desilusão foi debilitando e esfumando meus sentimentos e minhas alegrias habituais; o jardim já não tinha perfume, o bosque não mais me atraía, o mundo se estendia ao meu redor como um saldo de trastes velhos, insípido e desencantado; os livros eram papel; a musica, ruído. Exatamente como a árvore do outono ao perder suas folhas que lhe caem ao redor, sem senti-lo e quando a chuva, a geada e o sol lhe resvalam pelo tronco, enquanto a vida se retira para o mais íntimo e recôndito de si mesma. Não morre. Espera."
- Hermann Hesse, no livro "Demian" [tradução Ivo Barroso]. Record, 2015.

§§

"A parte de minha vida que tive de arrancar às potências sombrias ofereci-a em sacrifício aos poderes luminosos. Meu fim não era o prazer, mas a pureza; não a felicidade, mas a espiritualidade e a beleza."
- Hermann Hesse, no livro "Demian" [tradução Ivo Barroso]. Record, 2015.

§§

"... o acaso não existe. Quando alguém encontra algo de que verdadeiramente necessita, não é o acaso que tal proporciona, mas a própria pessoa; seu próprio desejo e sua própria necessidade a conduzem a isso."
- Hermann Hesse, no livro "Demian" [tradução Ivo Barroso]. Record, 2015.

§§

"Creio que a música me agrada por sua completa ausência de moralidade. Todo o resto é moral, e procuro algo que não o seja." 
- Hermann Hesse, no livro "Demian" [tradução Ivo Barroso]. Record, 2015.

§§

"Desde criança sempre me agradava contemplar as formas estranhas da natureza, não como observador que investiga, mas abandonando-me apenas ao seu encanto peculiar, à sua profunda e complexa linguagem. As longas raízes das árvores, os veios coloridos das pedras, as manchas de óleo sobrenadando na água, as fendas dos cristais, todas as coisas desse gênero tiveram desde muito para mim um singular encanto, como também a água e o fogo, a fumaça, as nuvens, o pó, e sobretudo as luminosas máculas que via movendo-se ao fechar os olhos."
- Hermann Hesse, no livro "Demian" [tradução Ivo Barroso]. Record, 2015.

§§

"Uma mesma divindade indivisível atua sobre nós e a Natureza, e se o mundo exterior desaparecesse, qualquer um de nós seria capaz de reconstruí-lo, pois a montanha e o rio, a árvore e a folha, a raiz e a flor, todas as criaturas da Natureza estão previamente criadas em nós mesmos, provêm de nossa alma, cuja essência é a eternidade, essência que escapa ao nosso conhecimento, mas que se faz sentir em nós como força amorosa e criadora." 
- Hermann Hesse, no livro "Demian" [tradução Ivo Barroso]. Record, 2015.

§§

"— Sempre achamos que são demasiadamente estreitos os limites de nossa personalidade! Atribuímos à nossa pessoa somente aquilo que distinguimos como individual e divergente. Mas cada um de nós é um ser total do mundo, e da mesma forma como o corpo integra toda a trajetória da evolução, remontando ao peixe e mesmo a antes, levamos em nossa alma tudo o quanto desde o princípio está vivendo na alma dos homens. Todos os deuses e todos os demônios que já existiram, quer entre os gregos, os chineses ou os cafres, todos estão conosco, todos estão presentes, como possibilidades, desejos ou caminhos. Se toda a humanidade perecesse, com exceção de uma só criança medianamente dotada, esse menino sobrevivente tornaria a encontrar o curso das coisas e poderia criar tudo de novo: deuses, demônios e paraísos, mandamentos e proibições, antigos e novos Testamentos."
- Hermann Hesse, no livro "Demian" [tradução Ivo Barroso]. Record, 2015.

§§

"— Há muita diferença entre levarmos simplesmente o mundo em nós mesmos e conhecê-lo. Um louco pode expor ideias que lembrem as de Platão e um colegial devoto pode criar em sua imaginação profundas conexões mitológicas que aparecem nas doutrinas dos gnósticos ou de Zoroastro. Mas sem sabê-lo! E enquanto não sabe, é uma árvore ou uma pedra, ou quando muito um animalzinho. Não creio que se possam considerar homens todos esses bípedes que caminham pelas ruas, simplesmente porque andam eretos ou levem nove meses para vir à luz. Sabes muito bem que muitos deles não passam de peixes ou de ovelhas, vermes ou sanguessugas, formigas ou vespas. Todos eles revelam possibilidades de chegar a ser homens, mas só quando vislumbram e aprendem a levá-las em parte à sua consciência é que se pode dizer que possuem uma..."
- Hermann Hesse, no livro "Demian" [tradução Ivo Barroso]. Record, 2015.

§§

"... perdia-me naquela música estranha e íntima, ensimesmada e como absorta em seus próprios sons, que sempre me faziam bem e me predispunham a dar razão ás vozes de minha alma."
- Hermann Hesse, no livro "Demian" [tradução Ivo Barroso]. Record, 2015.

§§

"Quando te ocorrer de novo algo verdadeiramente insensato e pecaminoso, quando sentires a tentação de matar alguém ou cometer alguma obscenidade monstruosa, pensa que é Abraxas quem devaneia assim em teu interior! O homem a quem quiseres matar nunca será este ou aquele; esses não passam de disfarces. Quando odiamos um homem, odiamos em sua imagem algo que trazemos em nós mesmos. Também o que não está em nós mesmos nos deixa indiferentes."
- Hermann Hesse, no livro "Demian" [tradução Ivo Barroso]. Record, 2015.

§§

"A única realidade é aquela que se contém dentro de nós, e se os homens vivem tão irrealmente é porque aceitam como realidade as imagens exteriores e sufocam em si a voz do mundo inteiro. Também se pode ser feliz assim; mas quando se chega a conhecer o outro, torna-se impossível seguir o caminho da maioria. O caminho da maioria é fácil, o nosso é penoso. Caminhemos."
- Hermann Hesse, no livro "Demian" [tradução Ivo Barroso]. Record, 2015.

§§

"A maioria das pessoas vive também em sonhos, mas não nos próprios, e aí é que está a diferença."
- Hermann Hesse, no livro "Demian" [tradução Ivo Barroso]. Record, 2015.

§§

"... todo homem tinha uma "missão", mas ninguém podia escolher a sua, delimitá-la ou administrá-la a seu prazer. Era errôneo querer novos deuses, era completamente errôneo querer dar algo ao mundo. Para o homem consciente só havia um dever: procurar-se a si mesmo, afirmar-se em si mesmo e seguir sempre adiante o seu próprio caminho, sem se preocupar com o fim a que possa conduzi-lo."
- Hermann Hesse, no livro "Demian" [tradução Ivo Barroso]. Record, 2015.

§§

"O verdadeiro ofício de cada um era apenas chegar até si mesmo. Depois, podia acabar poeta ou louco, profeta ou criminoso. Isso já não era coisa sua, e além de tudo, em última instância, carecia de todo alcance. Sua missão era encontrar seu próprio destino, e não qualquer um, e vivê-lo inteiramente até o fim. Tudo o mais era ficar a meio caminho, era retroceder para refugiar-se no ideal da coletividade, era adaptação e medo da própria individualidade interior."
- Hermann Hesse, no livro "Demian" [tradução Ivo Barroso]. Record, 2015.

§§

"Mas sempre haverei de ter em meu redor algo que considere santo e belo, música de órgão e mistério, símbolo e mito."
- Hermann Hesse, no livro "Demian" [tradução Ivo Barroso]. Record, 2015.

§§

"— A comunidade — continuou dizendo — é uma coisa muito bela. Mas o que vemos florescer agora não é a verdadeira comunidade. Essa surgirá, nova, do conhecimento mútuo dos indivíduos e transformará por algum tempo o mundo. O que hoje existe não é comunidade: é simplesmente o rebanho. Os homens se unem porque têm medo uns dos outros e cada um se refugia entre seus iguais: rebanho de patrões, rebanho de operários, rebanho de intelectuais... E por que têm medo? Só se tem medo quando não se está de acordo consigo mesmo. Têm medo porque jamais se atreveram a perseguir seus próprios impulsos interiores. Uma comunidade formada por indivíduos atemorizados com o desconhecido que levam dentro de si. Sentem que já periclitaram todas as leis em que baseiam suas vidas, que vivem conforme mandamentos antiquados e que nem sua religião nem sua moral são aquelas de que ora necessitamos."
- Hermann Hesse, no livro "Demian" [tradução Ivo Barroso]. Record, 2015.

§§

"Todos os homens estão prontos a fazer o impossível quando seus ideais estão ameaçados; mas quando se anuncia um novo ideal, um novo impulso de crescimento, inquietante e talvez perigoso, todos se acovardam."
- Hermann Hesse, no livro "Demian" [tradução Ivo Barroso]. Record, 2015. 

§§

"Pois havia muitos homens, e alguns deles morreram a meu lado, para os quais era evidente que o ódio e a fúria, a matança e a destruição não se achavam ligados aos objetos. Não; os objetos, bem como os fins, eram puramente casuais. Os sentimentos primordiais, inclusive os mais violentos, não iam contra o inimigo; sua obra sangrenta era apenas uma irradiação do interior, da alma dissociada e dividida, que queria enfurecer-se e matar, aniquilar e morrer, para nascer de novo. Uma ave gigantesca rompia a casca. A casca era o mundo, e o mundo havia de cair feito em pedaços."
- Hermann Hesse, no livro "Demian" [tradução Ivo Barroso]. Record, 2015.

§§

***


O LOBO DA ESTEPE – HERMAN HESSE 

"...o olhar do Lobo da Estepe penetrava todo o nosso tempo, toda a afetação, toda a ambição, toda a vaidade, todo o jogo superficial de uma espiritualidade fabricada e frívola. Ah! lamentavelmente o olhar ia mais fundo ainda, ia além das simples imperfeições e desesperanças de nosso tempo, de nossa espiritualidade, de nossa cultura. Chegava ao coração de toda a Humanidade; expressava, num único segundo, toda a dúvida de um pensador, talvez a de um conhecedor da dignidade e sobretudo do sentido da vida humana."
- Hermann Hesse, no livro "O Lobo da Estepe". [tradução Ivo Barroso]. Record, 1955.


****



FORTUNA CRÍTICA DE HERMANN HESSE 

ALMEIDA, Mariana Silva Campos de.. Uma Análise de Debaixo das Rodas de Hermann Hesse: os acréscimos pelo tradutor (Dissertação Mestrado em Estudos da Tradução). Universidade Federal de Santa Catarina, Centro de Comunicação e Expressão, UFSC, 2011. Disponível no link. (acessado em 26.12.2023).
AMORIM, Victor Hugo de Oliveira Casemiro Pereira de.. O traço de tinta, o quadro e a narrativa: Rosshalde de Hermann Hesse E Água Viva de Clarice Lispector. In: Anais do XV Congresso Internacional da Abralic, Rio de Janeiro, 2017. v. 3. p. 4330-4339.
AVILA COLLA, Rodrigo. Hermann Hesse. In: Debates em Educação, v. 14, p. 612-617, 2022.
BACKES, Marcelo. Hermann Hesse mistura fábula e autobiografia com tom piegas. In: Folha de S. Paulo, Ilustrada, 1 de maio de 2010. Disponível no link. (acessado em 26.12.2023).
BAROSSO, Ivo. Hermann Hesse, o homem e o lobo. In: Gaveta do Ivo, 25.3.2011. Disponível no link. (acessado em 26.12.2023).
BAROSSO, Ivo. Du musst dein leben ändern — Tens que mudar tua vida. In: Gaveta do Ivo, 24.4.2014. Disponível no link. (acessado em 26.12.2023).
BAROSSO, Ivo.  Ainda O 'Demian'. In: Gaveta do Ivo - Poesia & Tradução, 29.4.2014. Disponível no link. (acessado em 26.12.2023).
BAROSSO, Ivo. Ainda (E sempre) o Demian. In: Gaveta do Ivo - Poesia & Tradução, 12.12.2015. Disponível no link. (acessado em 26.12.2023).
BAROSSO, Ivo. O meu Demian. In: Gaveta do Ivo - Poesia & Tradução, 18.12.2015. Disponível no link. (acessado em 26.12.2023).
BARRETO, Matheus Jacob. Hermann Hesse: conversas sobre o seu 'O lobo da estepe'. In: Jornal Olhar Conceito, Cuiabá - Mato Grosso, 11 maio 2015.
BEAUREPAIRE, Luiz Guilherme de.. Sidarta (resenha).  In: Sobre Bons livros para ler, 17 agosto 2020. Disponível no link. (acessado em 5.1.2024).
BEZERRA, Lorena Karla Costa; FONSECA, Ailton Siqueira de Sousa. A construção do eu em Demian de Hermann Hesse. In: III Semana de Humanidades Da FAFIC/UERN, 2016. Mossoró-RN: Edições UERN, 2016. v. 1. p. 9-13.
BONACORCI, Ricardo. Livros: Demian - A primeira grande obra de Hermann Hesse. In: Bonas Histórias, 23 de abril de 2017. Disponível no link. (acessado em 2.1.2024).
BOTTMANN, Denise. hermann hesse traduzido no brasil. In: não gosto de plágio, 28 de junho de 2015. Disponível no link (acessado em  26.12.2024).
BOTTMANN, Denise. o problema da crítica de fontes: um exemplo de hermann hesse no brasil. In: não gosto de plágio, 28 de junho de 2015. Disponível no link. (acessado em  26.12.2023).
BRASIL, Bruno. Centenário | Sidarta, de Hermann Hesse: uma libertação de si mesmo. In: BN Brasil Digital, 30 de setembro de 2022. Disponível no link. (acessado em 5.1.2024).
BRINK, Christi M. K.. A Obra de Hesse no Brasil. In: O Estado de S. Paulo, São Paulo, 30 mar. 1980. Suplemento Cultural: Letras, p. 11-12. 
CAVALCANTI, Carlos André Macedo; BATISTA SEGUNDO, João Florindo. O budismo em Siddhartha, de Hermann Hesse. In: 3º Simpósio Nordeste da ABHR, 2020, João Pessoa. Anais do 3º Simpósio Nordeste da ABHR - Religião, Direitos Humanos e Laicidade: Resistências, Diversidades e Sensibilidades. João Pessoa: Fogo Editorial, 2020. v. 1. p. 473-502.
CASTELLO, José. O jogo das contas de vidro. In: Rascunho, edição 262, fevereiro 2022. Disponível no link. (acessado em 5.1.2023).
CARANDELL, José Maria. Conhecer Hermann Hesse e sua obra. Porto: Ulisseia, 1965.
CARVALHO, Bernardo. Só para loucos. In: Folha de S. Folha, 13 de maio 2000. Disponível no link. (acessado em 5.1.2024).
COELHO, Rafael Senra; SILVA, Teresinha Vânia Zimbrão da.. O lobo e o mago: uma leitura da caminhada espiritual de Hermann Hesse a Paulo Coelho. In: Desenredo (PPGL/UPF), v. 11, p. 9-21, 2015. Disponível no link. (acessado em 2.1.2024).
COSTA, Flávio Moreira. Roteiro para conhecer Hermann Hesse. In: Folha de S. Paulo, São Paulo, 20 novembro, 1976.
CUNHA, Luiz Gonzaga de Medeiros Bezerra da.. A interpretação psicanalítica da obra Narciso e Goldmund de Hermann Hesse. In: I Congresso Científico da UnP, 1999, Natal. I Congresso Científico da UnP, 1999.
DIOGO, Maria Fernanda; KONZEN, José Otto. A ambiguidade no processo formativo burguês: uma leitura da obra Demian, de Hermann Hesse. In: Anais da XIII Reunião Científica da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação - eixo Sul. Blumenau: ANPED, 2020. Disponível no link. (acessado em 13.1.2024).
DW. Há 50 anos morria Hermann Hesse, o escritor amado e subestimado. In: Deutsche Welle - DW, 9.8.2012. Disponível no link. (acessado em 1.1.2024).
DW. Influência de Hermann Hesse para além da Alemanha é forte. In: Deutsche Welle - DW, 3.4.2012. Disponível no link. (acessado em 1.1.2024).
DW. 1946: Hermann Hesse recebe o Nobel de Literatura. In: Deutsche Welle - DW, s/data. Disponível no link. (acessado em 1.1.2024).
ENNE, Ana Lucia Silva. O Defensor do indivíduo: Hermann Hesse e o processo de massificação nas primeiras décadas do século XX. In: Alceu (PUCRJ), Rio de Janeiro, v. 5, n.10, p. 94-115, 2005. Disponível no link. (acessado em 5.1.2024).
FERRARI, Márcio. Filosofia e memória em contos de Hermann Hesse. In: Valor Econômico, 27.11.2021. Disponível no link. (acessado em 27.12.2023).
FINOTTI, Ivan. Como no livro original, filme "Lobo da Estepe" é para raros. In: Folha de S. Paulo, Ilustrada, 13 de setembro de 2009. Disponível no link. (acessado em 5.1.2024).
FORSTER, Gabrielle da Silva. O lobo da estepe: uma escritura selvagem. In: Revista Criação & Crítica, v. 9, p. 111-127, 2012. Disponível no link. link. (acessado em 2.1.2024).
FOTOS. Martin Hesse fotografiert seinen Vater Hermann Hesse. In: MartinHesse-fotografiert. Disponível no link. (acessado em 27.12.2023).
FRANKEL, Roy David. Ser quem se é: a experiência de uma existência autêntica em Heidegger, Hesse e Clarice. (Dissertação Mestrado em Letras). Universidade do Estado do Rio de Janeiro, UERJ, 2015. Disponível no link. (acessado em 26.12.2023).
FRANKEL, Roy David. Quando não utilizar dados biográficos na análise literária: Uma discussão baseada na Analítica existencial de Martin Heidegger e no romance O lobo da estepe de Hermann Hesse. In: Revista Criação & Crítica, v. 1, p. 53-65, 2014. 
FRANKEL, Roy David. O caminho é sempre seu: uma leitura de Sidarta, de Hermann Hesse. In: Em Tese (Belo Horizonte. Impresso), v. 21, p. 203-219, 2015.
FRANKEL, Roy David; KRAUSE, Gustavo Bernardo. Aprendizagens: a experiência metafísica em Clarice e Hesse. In: Revista Terceira Margem, v. 1, p. 107-137, 2015. Disponível no link. (acessado em 26.12.2023).
GOMES, Marcio dos Santos. Budismo - A verdadeira Viagem de Hermann Hesse ao Oriente. In: Semana de estudo Anglo-Germânicos, 1993, Rio de Janeiro. Caderno de Letras. Rio de Janeiro: UFRJ, 1993. v. 9.
GONÇALVES FILHO, Antônio. Em 'Knulp', Hermann Hesse retrata andarilho que dialoga com nossos tempos. In: Estadão, 9.4.2020. Disponível no link. (acessado em 1.1.2024).
GONÇALVES, Jivago Araújo Holanda Ribeiro. Literatura e Filosofia em diálogo: limiares da modernidade em "Demian", de Hermann Hesse, à luz de Nietzsche. (Dissertação Mestrado em Letras). Universidade Federal do Piauí, UFPI, 2018.
GOPALAKRISHNAN, Manasi. "Sidarta" de Hermann Hesse completa 100 anos. In: Deutsche Welle - DW, 15.9.2022. Disponível no link. (acessado em 5.1.2024).
GUERRA, Anselmo. Das Glasperlenspiel: música, matemática e cultura entrelaçados na visão de
Hermann Hesse. In: Música em Contexto, Brasília, vol. 7 - nº. 1, 2013 - p. 124-143. Disponível no link. (acessado em 5.1.2023).
LAMAS, Carlos José Einicker; EVENHUIS, Neal L.; COURI, Márcia Souto. Descriptions of the spermathecae and male genitalia of the species of Crocidium Loew described by Hesse (Diptera, Bombyliidae, Crocidiinae). In: Zootaxa (Auckland), v. 45, p. 1-12, 2002. Disponível no link. (acessado em 2.1.2024).
LAMAS, Carlos José Einicker. Descrição da terminália masculina e espermateca das espécies de Crocidium descritas por Hesse, 1963 (Diptera, Bombyliidae, Crocidiinae). In: XXIV Congesso Brasileiro de Zoologia, 2002, Itajaí - SC. Livro de resumos do XXIV Congresso Brasileiro de Zoologia, 2002.
LEOPOLDO, Raphael Novaresi. Nos meandros da ficção e da realidade: alguns aspectos comuns entre castálicos e beneditinos em O Jogo das Contas de Vidro. In: Teoliterária, V. 2 - N. 3 - 2012.
LIMA, Marilene Felinto Barbosa de.. Autobiografia de uma escrita de ficção. (Dissertação Mestrado em Psicologia Clínica). Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, PUC SP, 2019. Disponível no link. (acessado em 26.12.2023).
LIMBERG. Michael. Hermann Hesse - literatur. [Bibliografia]. In: Hermann Hesse, 27.jahrgang, 2020. Disponível no link. (acessado em 2.1.2024).
LIMOLI, Loredana; COSTA, E. D. B. . As estruturas narrativas no conto Augusto, de Hermann Hesse. In: CELLIP, 2001, Maringá. Anais do CELLIP. Curitiba: UFPR, 2000.
MARQUES, Nara. O jogo dos mestres. (Dissertação Mestrado em Letras / Teoria Literária). Universidade Federal de Santa Catarina, 1998. Disponível no link. (acessado em 5.1.2024).
MENEZES, Frederico Lucena de.. Hermann Hesse: o personagem que se fez autor. Brasília: LGE, 2007.
MORAES, Natasha Mastrangelo Silva de.. "Só para Loucos": A figuração do indivíduo na obra de Hermann Hesse. (Dissertação Mestrado em História Social). Universidade Federal do Rio de Janeiro, UFRJ, 2019.
MORAIS, João Francisco Regis de.. Fernando Pessoa e Hermann Hesse - as forças metafísicas. In: Reflexão, Campinas, n.2, 1976.
MUSEU. Museum Hermann Hesse - Montagnola / tour virtual. Disponível no link. (acessado em 27.12.2023).
NEUMANN, Gerson Roberto. Hermann Hesse. In: Léa Masina. (Org.). Guia de Leitura: 100 autores que você precisa ler. Porto Algre - RS: L&PM, 2007, v. 636, p. 115-116.
OLIVEIRA, Luizir de; GONÇALVES, Jivago Araújo Holanda Ribeiro.. O que significa bildung para aqueles que rejeitam a modernidade? Notas comparativas entre Hermann Hesse, Robert Musil e Thomas Mann. In: Israel Alves Corrêa Noletto; Jivago Araújo Holanda Ribeiro Gonçalves. (Org.). Ensaios sobre teoria e crítica literária. 1ª ed., Teresina: Instituto Federal do Piauí, 2020, v. , p. 11-27.
OLIVEIRA, Maria Laura; RANIERE, Édio. A busca da autenticidade da experiência em um personagem de Hermann Hesse. In: Psicopatologia Fenomenológica Contemporânea, v. 3, p. 57-72, 2014. Disponível no link. (acessado em 13.1.2024).
PERCY, Allan. Hermann Hesse para desorientados. Editora Sextante, 2013.
PINHEIRO, Lucilia Lúbia de Sousa. Demian, de Hermann Hesse: a dualidade luz e sombra. In: Patricia Cezar da Cruz. (Org.). Littera: Literaturas, Percepções, Expectativas. 1ª ed., São Carlos: Pedro & João Editores, 2020, v. , p. 55-64.
PINHEIRO, Samuel Lopes. 100 anos de Sidarta de Hermann Hesse. In: Cetrans Inter@tivo, São Paulo, Brasil, 22 set. 2022.
PIHEL, Ruslana. Uma Proposta de Tradução de Contos de Fadas de Hermann Hesse num Modelo de Edição Bilingue. (Dissertação Mestrado em Tradução). Universidade de Lisboa - Faculdade de Letras, 2013. Disponível no link. (acessado em 26.12.2023).
REDONDO, Tercio Loureiro. Hermann Hesse. In: O Casulo, São Paulo, p. 16 - 16, 1 abr. 2008. 
RECH, Pedro Eloi. O Jogo das contas de vidro. Hermann Hesse. In: Blog do Pedro Eloi, 27 de outubro de 2016. Disponível no link. (acessado em 5.1.2024).
REZENDE, Carolina Anglada de.. HH: animalidade e subjetividade em Herberto Helder e Hermann Hesse. (Monografia Graduação em Letras). Universidade Federal de Minas Gerais, UFMG, 2013.
SANTOS, Mariana da Silva. Leitura multimodal da obra Demian, de Herman Hesse, e do videoclipe Blood Sweat and Tears, do grupo sul-coreano BTS, em uma turma do ensino médio da IFMS-AQ. (Tese Doutorado em Letras). Universidade Estadual de Maringá, UEM, 2023.
SANTOS, Maria Manuela de Sousa Marques Pinto dos.. Hermann Hesse em Portugal - 1978 - Apontamentos sobre a sua tradução e recepção; Versão portuguesa dos últimos parágrafos do capítulo final de 'Ele e o Outro'. In: Manuela, s/data. Disponível no link. (acessado em 1.1.2024).
SANTOS, Taitson Alberto Leal dos. Solo para Flauta a Hermann Hesse. In: A Tribuna Piracicabana, Piracicaba - SP, 17 jan. 2002.
SELIGMANN-SILVA, Márcio Orlando. 'Hesse e o desejo de ser mágico' [Harmann Hesse, A infância do mago, Rio de Janeiro: José Olympio, 2010]. In: Sabático, O Estado de S.Paulo,  1 de maio de 2010, p. S7. O Estado de S.Paulo, São Paulo, p. S7 - S7, 1 maio 2010.
SCHENKEL, Klara Maria. Da infância do Mágico à gênese do Lobo: a mitologia de Harry Haller em O Lobo da Estepe, de Hermann Hesse. (Tese Doutorado em Letras). Universidade Federal da Paraíba, UFPB, 2018.
SCHMITT, Elise. O dualismo em "O lobo da estepe" de Hermann Hesse. In: Travessias (Unioeste. Online), v. 9, p. 9, 2010.
SKALINSKI JUNIOR, Oriomar. Hermann Hesse e o lobo esquizoanalítico. In: Anais do I Congresso internacional de psicologia e V Semana de Psicologia. Maringá, 2003. v. 1.
SOARES, Nara Marques. O jogo dos mestres. (Dissertação Mestrado em Letras). Universidade Federal de Santa Catarina, UFSC, 1998.
SOETHE, Paulo Astor. Thomas Mann: entre o corpo e o espírito; Hermann Hesse: revolta interior; Elias Canetti: a língua internacional. In: Cadernos EntreLivros: Panorama da Literatura Alemã, São Paulo, p. 66 - 71, 1 jul. 2008.
SOUSA, Raylane Marques; CHAGAS, Eduardo Ferreira. O método narrativo de Hermann Hesse e o tratamento das ideias de Nietzsche. In: Revista Dialectus, v. 1, p. 246-261, 2019. Disponível no link. (acessado em 2.1.2024).
SOUZA, João Paulo Francisco de.. Um lobo nos trópicos: a recepção crítica de Hermann Hesse no Brasil (1935-2005).. (Dissertação Mestrado em Letras). Universidade Estadual Paulista, UNESP, 2007. Disponível no link. (acessado em 26.12.2023)
SOUZA, João Paulo Francisco de.. Hermann Hesse nos cadernos culturais d’o Estado de S. Paulo. In: UNESP – FCLAs – CEDAP, v.2, n.1, 2006 p. 2. Disponível no link. (acessado em 26.12.2023). 
SOUZA, Luiz Eduardo da Silva e.; DELGADO, Victor Tinoco. O Percurso de Sidarta e o Problema da Identidade: um estudo transdisciplinar do romance de Hermann Hesse. In: Psicologia USP (Impresso), v. 19, p. 213-234, 2008. Disponível no link. (acessado em 2.1.2024).
STEIERNAGEL, Daiane Raquel; BORGES, Samantha de Oliveira; HAISKI, Vanderléia de Andrade. O conflito do sujeito moderno: entre homem, lobo e mil vozes em ‘O lobo da Estepe’, de Hermann Hesse. In: Revlet- Revista Virtual de Letras, v. 9, p. 475-494, 2017.
SILVA, Marcos. Schopenhauer e Nietzsche: Os Lobos de Hesse na Estepe da Filosofia. In: Caderno de Resumos da XXVI Semana de Iniciação Cientifica da UFRJ, 2004.
TADA, Elton Vinicius Sadao. A coragem da fé no professor de teologia Gustav de Hermann Hesse. In: Correlatio (Online), v. 12, p. 101, 2013.
THEOBALD, Pedro; MALLMANN, Guilherme Scherer. Beatrice, um arquétipo junguiano - O processo de individuação em Demian, de Hermann Hesse. In: Téssera, v. 1, n. 2, p. 86–104, 2019. Disponível no link. (acessado em 2.1.2024).
VIEIRA, Luiz Renato. Consagrados e Malditos: os intelectuais e a editora Civilização Brasileira. Brasília: Thesaurus Editora, 1998. 
ZWEIG, Stefan. Jogos de espelhos: Hermann  Hesse. In: O Mundo Insone e outros ensaios. de Stefan Zweig [tradução Kristina Michahelles; organização e textos adicionais Alberto Dines]. Rio de Janeiro: Zahar, 2013.
------------------------------
Notícias sobre Hermann Hesse em suplementos literários e jornais - disponíveis na Biblioteca Nacional - Brasil (BN Digital) 
:: Em 20 de outubro de 1962, Anatol Rosenfeld aborda a obra de Hermann Hesse no Suplemento Literário do jornal O Estado de S. Paulo.
:: Na edição de 24 de maio de 1969, momento em que o romance Sidarta explodia no mundo contracultural, o Suplemento Literário publica poemas de seu autor.
:: Em 4 de outubro de 1969, Rosenfeld volta a falar de Hermann Hesse, dessa vez focando sua popularidade naquele tempo.
:: No ano seguinte, Alfredo Lage inicia uma série de artigos sobre Hesse em “busca da sabedoria”, ainda pelo Suplemento Literário.
:: Na revista Manchete, em 1970, hippies brasileiros aparecem em destaque: leitores de Hermann Hesse, afinal: link 1 e link 2.
:: Em 1972, Manchete volta a abordar Hesse como “guru” da “crise do Ocidente”: link 1 - link 2 - link 3 - link 4.
:: Em 1977, Suplemento Literário trata do centenário de Hermann Hesse, em texto de Erwin Theodor, em meio a ilustrações do autor alemão: link 1 - link 2
:: A obra de Hermann Hesse no Brasil é especificamente tratada em artigo de Christl Brink para o Suplemento, em 30 de março de 1980: link 1 - link 2
------
Fonte: BRASIL, Bruno. Centenário | Sidarta, de Hermann Hesse: uma libertação de si mesmo. In: BN Brasil Digital, 30 de setembro de 2022. Disponível no link. (acessado em 5.1.2023).


****


FILMES BASEADOS E INSPIRADOS NA OBRA DE HERMANN HESSE

Longa-metragens
:: O clamor da juventude / Zachariah. Direção: George Englund (1971)
:: Siddhartha. Direção: Conrad Rooks (1972)
:: O Lobo da Estepe / Steppenwolf. Direção: Fred Haines (107 min. / ano: 1974)
:: Narciso e Goldmund / Narziss und Goldmund. Direção: Stefan Ruzowitzky | Roteiro: Stefan Ruzowitzky e Robert Gold (110 min. / ano: 2020)
Curta-metragens
:: Eu, Sidarta. Direção: Walter Daguerre (15 min. / ano: 2012)
Documentários
:: Hermann Hesse's Long Summer. Direção: Werner Weick (1997)  
:: Hermann Hesse. Blazing Summe, Direção: Heinz Bütler (Suíça, 2020)

****


PINTURAS - AQUARELAS DE HERMANN HESSE


  • Hermann Hesse - Kubistisches Haus 29. Juli 1922

  • Hermann Hesse - Landschaft im Tessin. 1924

  • Hermann Hesse - Landschaft. 1919

  • Hermann Hesse - Carona mit Wiegand, 1927

  • Hermann Hesse - Dorf mit Campanile, 9.8.1928, Aquarell

  • Hermann-Hesse - Choupana, 1927

  • Hermann Hesse - Árvores vermelhas, vilarejo, montes azuis, 1919

  • Hermann Hesse - Rosa Haus und Türme, 1919

  • Hermann Hesse - Monte Veritá

  • Hermann-Hesse - Bosco-Luganese, 10 de agosto de 1923 (grafite-aquarela- caneta)

  • Hermann Hesse - Häusergruppe ,July 2, 1929

  • Hermann Hesse, Abendlicht, 1925 

  • Hermann-Hesse - Colina com-terraços, 21 de setembro de 1926 (grafite-aquarela-e-giz)

  • Hermann-Hesse - Árvores com casas, 1922

  • Hermann Hesse - Tessiner Landschaft., 1924

  • Hermann Hesse - Aquarell Nr. 347 SigTh-AQ HA Tessiner Dorf mit Reben,1922

  • Hermann Hesse - Aquarell Nr. 229 SigTh-AQ HA Pflanzen und Bäume 27. August 1922

  • Hermann Hesse - Tessiner Landschaft, 1922


© Pesquisa, seleção, edição e organização: Elfi Kürten Fenske
© Seleção e organização dos poemas: José Alexandre da Silva


© Direitos reservados ao autor/e ou seus herdeiros

=== === ===
© Pesquisa, seleção, edição e organização: Elfi Kürten Fenske
© Seleção e organização dos poemas: José Alexandre da Silva


© Direitos reservados ao autor/e ou seus herdeiros

=== === ===
Trabalhos sobre o autor 
Caso, você tenha algum trabalho não citado e queira que ele seja incluído - exemplo: livro, tese, dissertação, ensaio, artigo - envie os dados para o nosso "e-mail de contato", para que possamos incluir as referências do seu trabalho nesta pagina. 

Erros ou atribuições incorretas
:: Caso você encontrar algum erro nos avise através do nosso "e-mail de contato" para que possamos consertar e atualizar as informações;
:: Contribua para que as informações do Templo Cultural Delfos estejam sempre corretas;
:: Primamos pelo conteúdo e a qualidade das informações aqui difundidas;
:: Valorizamos o autor, a obra, o leitor, o patrimônio e a memória cultural da humanidade.

Conteúdo, textos, fotos, caricaturas, charges, imagens e afins
:: Sem identificação: nos ajude a identificar o autor, fontes e afins.
:: Autor(a): caso não concorde com a utilização do seu trabalho entre em contato.
COMO CITAR:
FENSKE, Elfi Kürten (pesquisa, seleção, organização e edição). Hermann Hesse - escritor e pintor alemão. In: Templo Cultural Delfos, janeiro/2024. Disponível no link. (acessado em .../.../...).
____
** Página atualizada em 13.1.2024.
Postagem original de JANEIRO 2024


Direitos Reservados © 2024 Templo Cultural Delfos

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Agradecemos a visita. Deixe seu comentário!

COMPARTILHE NAS SUAS REDES