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Cecília Prada - os itinerários de uma contista e jornalista

Cecília Prada - foto: Talita Marchao/BBC Brasil


Cecilia Maria do Amaral Prada
assina Cecília Prada (
ficcionista, ex-diplomata de carreira, historiadora, dramaturga, tradutora e jornalista profissional) nasceu em Bragança Paulista (SP), no dia 23 de novembro de 1929. Dentre suas diversas formações estão Letras Neo-Latinas pela Universidade Presbiteriana Mackenzie e Jornalismo pela Fundação Cásper Líbero, ambas em 1951; o curso preparatório à carreira diplomática pelo Instituto Rio Branco, Ministério das Relações Exteriores (MRE/RJ). Fez o curso de Dramaturgia, Direção e Crítica pela The New School for Social Research em parceria com o The Gene Frankel Theater Workshop, em Nova York (EUA), e, por último, mestrado em Literatura Hispano-Americana pela Universidade de São Paulo (USP) em 1983. Fluente em seis línguas, já traduziu mais de 35 livros em inglês, espanhol, francês, italiano e até latim.

Foi diretora da União Brasileira dos Escritores e exerceu a carreira diplomática no cargo de Cônsul, grau terceiro secretário, até novembro de 1958.

Cecília Prada - arquivo da autora
No Jornalismo, começou a carreira ainda com 18 anos, assinando artigos literários e fazendo reportagens para A Gazeta (SP). Em 1956 deixou a profissão de professora de português para seguir a carreira diplomática. Após um longo período a serviço do Itamaraty, em 1972 trabalhou em pesquisas para o jornal O Globo (RJ). Em seguida, atuou como editora de cultura em O Estado de S.Paulo (SP). Ficou lá por um ano.

Em 1976, foi para a revista Visão (SP) como repórter e subeditora de Cultura da publicação. No ano seguinte passou a crítica de Teatro na revista IstoÉ (SP), quando também era membro da Associação Paulista de Críticos de Arte (Apca). Ficou por dois anos na TV Cultura (SP), a convite do professor Antônio Soares Amora, para redigir toda a parte literária do Telecurso de Segundo Grau.

Em 1984 assumiu, no Instituto Universitário Bérgamo (Itália), o cargo de leitora de Literatura e Cultura Brasileira, por ação do Ministério das Relações Exteriores, que na época fazia a divulgação dos grandes escritores brasileiros. Após o retorno ao Brasil, entrou como editora do noticiário internacional da TV Gazeta (SP).

Recebeu diversos prêmios literários: Prêmio Revelação de Autor, em 1978; Menção Honrosa do Prêmio José do Rego de Ficção 1965; Menção Honrosa do Prêmio Governador do Estado de São Paulo 1962; e o Prêmio do 1º Concurso de Contos de A Gazeta, em 1949.

No Jornalismo, foi Prêmio Esso de Reportagem 1980, com a matéria de denúncia Clínica de Repouso Congonhas, publicada pela Folha de S.Paulo, em 1979. Foi a única mulher a ter recebido, sozinha e em âmbito nacional, este prêmio, desde a sua criação, em 1959. Manteve-se nessa posição até o ano de 2001. Até 2012, apenas duas mulheres foram premiadas nessa categoria.

Publicou diversos livros, entre eles: Ponto morto (Edigraf, 1955); O Caos na sala de jantar (Moderna, 1978); A pena e o espartilho (Atalanta, 2007); O país dos homens de gelo (Atlanta, 2007); Estudos de Interiores para uma Arquitetura da solidão (DBA, 2004); Faróis estrábicos na noite (Bertrand, 2009) e Entre o itinerário e o desejo (Socortecci, 2012) e o livro Profissionais da solidão - de estudos literários (Senac 2013).

No período de 1995 a 2012, cerca de 150 artigos assinados por Cecília foram publicados em revistas dos Estados Unidos, Portugal e países escandinavos. Um dos artigos, Primórdios da imprensa no Brasil, foi pauta para entrevista concedida à rede ABC News de Sidney (Austrália), em 2005.

Desde 1997, colabora regularmente com matérias assinadas sobre assuntos culturais, principalmente Literatura Brasileira e História para a revista Problemas Brasileiros, da Federação do Comércio (Fcesp- Sesc/SP).

Em 2020, é publicado o livro 'Nós, que nem ao menos somos deuses', uma antologia com 35 de seus melhores contos, publicação patrocinada pela Academia Campinense de Letras, à qual pertence, em homenagem aos 90 anos de vida e seus 70 anos de dupla atividade cultural, jornalismo e literatura. É também dramaturga, tradutora e autora de 9 livros de jornalismo e crítica literária. Em fevereiro do mesmo ano foi indicada por duas academias de letras como candidata ao Prêmio Nobel de Literatura.

Membro da Academia Campinense de Letras (ACL)

Vive atualmente em Campinas (SP), dedicada à literatura, ao jornalismo e a traduções.
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:: Fonte: Portal dos jornalistasEditora Record (acessado em 3.8.2016) / acrescimentos com informações enviadas pela autora, em 26.2.2021.

" Continuo, apesar da idade que é muita, a ser uma pessoa inquieta, eu queria poder agir, ainda e sempre, como cidadã e intelectual participante – principalmente neste momento histórico em que se impõe “passar o país a limpo”."
- Cecília Prada, em "ALVES, Mayara Herculano. Entrevista: Cecília Prada". in: Leia Mulheres, 18 de fevereiro de 2016.

Cecília Prada - foto: Silvia Zamboni/ Folhapress

OBRA DE CECÍLIA PRADA

Conto e novela
:: Ponto morto
Cecília Prada. [prefácio de Lygia Fagundes Telles]. São Paulo: Edigraf, 1955.
:: O Caos na sala de jantar
Cecília Prada. [prefácio de Nádia Battela Gotlib]. São Paulo: Moderna, 1978.
O caos na sala de jantar, de Cecilia Prada
:: Estudos de interiores para uma arquitetura da solidãoCecília Prada. [prefácio de Telê Ancona Lopes]. São Paulo: DBA - Books& Arts, 2004.
:: O país dos homens de gelo
Cecília PradaSão Paulo: Atalanta Editorial, 2007.
:: Faróis estrábicos na noite
Cecília Prada. [prefácio de Alberto da Costa e Silva]. Rio de janeiro: Editora Bertrand, 2009.

Romance autobiográfico
:: Sou mulher, logo, não existo: (autoficção)Cecília Prada. eBook Kindle. amazon, 2016

Crônica
:: Entre o itinerário e o desejo
Cecília PradaSão Paulo: Editora Socortecci, 2012.

Estudos literários
:: Profissionais da solidão. Cecília Prada. São Paulo: Senac, 2013. {reunião de artigos sobre: Mário de Andrade, João Guimarães Rosa, Cecília Meireles, Lúcio Cardoso, Euclides da Cunha, Adalgisa Nery, Gilka Machado, Joaquim Nabuco, João Cabral de Melo Neto, Clarice Lispector, José Lins do Rego, Oswald de Andrade, Marcos Rey, Vinicius de Moraes, Hilda Hilst, Caio Fernando Abreu, Nelson Rodrigues, Lima Barreto, Pedro Nava, Qorpo-Santo, Graciliano Ramos, Antonio Carlos Villaça e Maura Lopes Cançado}.

Reportagem | Jornalismo
:: Menores no Brasil: a loucura nua
Cecília Prada. (reportagem, vencedora do prêmio Esso). São Paulo: Editora Alternativa, 1981; 2ª ed., São Paulo: Editora Atalanta, 1998.
:: A pena e o espartilhoCecília Prada. (mulheres na literatura brasileira). São Paulo: Atalanta Editorial, 2007; 2ª ed., São Leopoldo RS: Editora Unisinos, 2010.
:: Atrás da porta da históriaCecília Prada. São Paulo: Atalanta Editorial, 2007.

Teatro (peças)
:: Central Park Bench Number 33, Flight 207. 1964.
:: Cia. Século XX de Responsabilidade Ltda. 1966.
:: A loucura nua. 1984.
:: A clínica ao lado. 1984.
:: La Pietà. 1986.

Antologia (contos)
:: Nós, que nem ao menos somos deuses. Campinas: Pontes Editores; Academia Campinense de Letras, 2020.

Organização
:: O escritor nas bibliotecas: diálogos e debates. 3 volumes. [organização, transcrição, redação e prefácio Cecília Prada e Nilza Amaral]. São Paulo: Edição Secretaria Municipal de Cultura, 1995-2000.

Artigos e ensaios em revistas e jornais
PRADA, Cecília. A luta de duas escritoras para vencer o preconceito: Adalgisa Nery e Gilka Machado, talento e beleza contra o preconceito. In: Sesc SP, 29.8.2005. Disponível no link. (acessado em 3.9.2021).
PRADA, Cecília. Vozes silenciadas: A sofrida participação feminina no mundo das letras. In: Revista Problemas Brasileiros. Março/Abril. 2004, p. 32–37.


Em Antologias (participação)
:: Muito Prazer: contos eróticos femininos(autoras: Cecília Prada - Cristina Queiroz - Judith Grossmann - Márcia Maria Denser - Marina Colasanti - Mônica Campello - Olga Savary - Rachel Jardim - R. C. Colônia - Renata Pallotini - e Sônia Coutinho).. [seleção de Márcia Denser]. Rio de Janeiro: Editora Record, 1982.
:: O prazer é todo meu: contos eróticos femininos. [seleção de Márcia Denser]. Rio de Janeiro: Editora Record, 1985.
:: Los niños marginados en América Latina: una antología de estudios psicosociales. [compilação Anne Bar-Din]. Ciudade Unversitaria: Universidade Nacional Autónoma do México, 1995.
Cecília Prada - arquivo da autora
:: Contos de escritoras brasileiras. (autoras: Adalgisa Nery - Adélia Prado - Carmen Dolores - Cecilia Prada - Clarice Lispector - Dinah Silveira de Queiroz - Edla van Steen - Eneida de Morais - Flávia Savary - Helena Parente Cunha - Heloisa Seixas - Ivana Arruda Leite - Júlia Lopes de Almeida - Julieta de Godoy Ladeira - Lucia Castello Branco - Lygia Fagundes Telles - Márcia Denser - Maria Carpioli - Marilene Felinto - Marina Colasanti - Miriam Mambrini - Nélida Piñon - Nilza Amaral - Olga Savary - Patrícia Galvão (Pagu) - Rachel de Queiroz - Rachel Jardim - Sonia Coutinho - Sônia Peçanha - e Vilma Guimarães Rosa).. [seleção e organização de Lúcia Helena Vianna e Márcia Lígia Guidin]. São Paulo: Martins Fontes, 2003.
:: Quartas histórias: contos baseados em narrativa de Guimarães Rosa(autores: autor: Aleilton Fonseca - Amador Ribeiro Neto - Andre Sant'Anna - Antonio Carlos Jobim - Antonio Carlos Secchin - Antonio Carlos Viana - Ataide Tartari - Bernardo Ajzenberg - Carlos Drummond de Andrade - Carlos Gildemar Pontes - Carlos Ribeiro - Cecilia Prada - Daniel Piza - Deonisio da Silva - Fabricio Carpinejar - Fernando Bonassi - Geraldo Maciel - Godofredo de Oliveira Neto - Graciliano Ramos - Jose Castello - Jose Rezende Junior - Leila Guenther - Luzila Gonçalves Ferreira - Marcelo Carneiro da Cunha - Marcus Accioly - Maria Alzira Brum Lemos - Marilia Arnaud - Mario Chamie - Miguel Sanches Neto - Nelson de Oliveira - Nilto Maciel - Paulo Franchetti - Pedro Salgueiro - e Sonia Maria Van Dijck Lima).. [organização Rinaldo de Fernandes]. Rio de Janeiro: Editora Garamond, 2006.
:: Contos cruéis: as narrativas mais violentas da literatura brasileira contemporânea.. (autores: Ivan Ângelo - Lygia Fagundes Telles - Luiz Vilela - Dalton Trevisan, Caio Fernando Abreu - Domingos Pellegrini - Cecília Prada - Marçal Aquino - Fernando Bonassi - Cíntia Moscovich - Marcelo Coelho - Márcia Denser - Maria Alzira Brum Lemos - Marília Arnaud - Mário Chamie - Miguel Sanches Neto - Moacyr Scliar - Moreira Campos - Nélida Piñon - Nelson de Oliveira - Paulo Ribeiro - Paulo Sandrini - Pedro Salgueiro - Raimundo Carrero - Rinaldo de Fernandes - Roberto Drummond - Rubem Fonseca - Sérgio Fantini - Silviano Santiago - Tércia Montenegro - Wellington Pereira...).. [organização, nota introdutóra e textos de apresentação dos autores de Rinaldo de Fernandes; prefácio Linaldo Guedes]. São Paulo: Geração Editorial, 2006.
:: Cenas da favela: as melhores histórias da periferia brasileira. (autores: Alberto Mussa - Antonio Fraga - Carlos Drummond de Andrade - Carolina Maria de Jesus - Cecilia Prada - Chico Lopes - Fernando Bonassi - Ferrez - Joao Antonio - Joao Anzanello Carrascoza - Joao Batista Melo - Joao Paulo Cuenca - Joca Reiners Terron - Luis Marra - Luiz Ruffato - Lygia Fagundes Telles - Marçal Aquino - Marcelino Freire - Nelson de Oliveira - Paulo Lins - Ronaldo Bressane - Rubem Fonseca - Sergio Fantini - e Wander Piroli).. [organização Nelson de Oliveira]. São Paulo: Geração Editorial, 2007.
:: Capitu mandou flores: contos para Machado de Assis nos cem anos de sua morte. (autores: Lygia Fagundes Telles - Moacyr Scliar - Hélio Pólvora - Cecília Prada - Nelson de Oliveira - André Sant'Anna - Fernando Bonassi - Glauco Mattoso - Ivana Arruda Leite - Andréa del Fuego - Marcelo Coelho - Deonísio da Silva - Daniel Piza - Godofredo de Oliveira Neto - Bernardo Ajzenberg - João Anzanello Carrascoza -Antonio Carlos Secchin - Leila Guenther - Marilia Arnaud - Rinaldo de Fernandes - Raimundo Carrero - Mário Chamie - Aleilton Fonseca - Tércia Montenegro - Maria Valéria Rezende - Maria Alzira Brum Lemos - W. J. Solha - Amador Ribeiro Neto - Carlos Gildemar Pontes - Nilto Maciel - Aldo Lopes de Araújo - Suênio Campos de Lucena - Carlos Ribeiro - Ronaldo Cagiano e Sérgio Fantini).. [organização Rinaldo de Fernandes; ensaios de  Silviano Santiago, Luiz Costa Lima, Pedro Lyra, Regina Zilberman e André Luís Gomes + 10 contos de Machado de Assis]. São Paulo: Geração Editorial, 2008.
:: 50 versões de amor e prazer: 50 contos eróticos por 13 autoras brasileiras. (autoras: Állex Leilla - Ana Ferreira - Ana Miranda - Ana Paula Maia - Andréa del Fuego - Cecília Prada - Juliana Frank - Heloisa Seixas - Leila Guenther - Luísa Geisler - Márcia Denser - Marilia Arnaud - Tércia Montenegro).. [organização Rinaldo de Fernandes]. Coleção Muito Prazer. São Paulo: Geração Editorial, 2012.

Traduções realizadas por Cecília Prada (*)
Cecília Prada - arquivo da autora
:: Um chute na rotina – Os quatro papéis essenciais do processo criativo, de Roger Von Oech. [tradução Cecília Prada; ilustrações Claudia Scatamacchia]. São Paulo: Cultura Editores Associados, 1994.
:: Ciência e vida civil no Renascimento italiano, de Eugénio Garin. [tradução Cecília Prada]. São Paulo: Editora UNESP, 1996.
:: A cidade polifônica: ensaio sobre a antropologia da comunicação urbana, de Massimo Canevacci. [tradução Cecília Prada]. São Paulo: Studio Nobel, 1997.
:: O valor das emoções (Valuing emotions), de Michael Stocker e Elizabeth Hegeman. [tradução Cecília Prada]. São Paulo: Editora Palas Athena, 2001.
:: Arte Grega, de Mark D. Fullerton. [tradução Cecília Prada]. São Paulo: Odysseus, 2002.
:: Joseph Campbell - vida e obra - a jornada do herói, de  Phil Cousineau. biografia. [organização e tradução Cecília Prada]. São Paulo: Editora Ágora, 2003.
:: A sabedoria de Carl Jung (The wisdow of Carl Jung), de Edward Hoffman. [tradução Cecília Prada]. São Paulo: Editora Palas Athena, 2005. 
:: Sujeito Medieval/Moderno: texto e governo na idade media (Subject medieval/modern), de Peter Haidu. [tradução de Andre Vieira, Cecilia Prada e Marcelo Rouanet]. Coleção Ideias. São Leopoldo RS: Editora Unisinos, 2006.
:: A conquista da abundância: uma historia da abstração versus a riqueza do ser (Conquest of abundance: a tale abstration versus the richness of being), de Paul Feyerabend. [tradução Cecília Prada e Marcelo Rouanet]. Coleção Filosofia e ciência. São Leopoldo RS: Editora Unisinos, 2006.
:: Arquimedes: uma porta para a ciência (Archimedes and the door of science), de Jeanne Bendick. [tradução Cecília Prada; coordenação Marcelo Gleiser]. Coleção Imortais da Ciência. São Paulo: Odysseus, 2ª ed., 2006.
:: Eu, Claudio (I, Claudius), de Robert Graves. [tradução Cecília Prada]. São Paulo: Editora A Girafa, 2007.
:: Isaac Babel: contos escolhidos (The collected stories of Isaac Babel), de Isaac Babel. [tradução Cecília Prada]. São Paulo: Editora A Girafa, 2008.
:: Amo Paris: minha Paris do sabor em 200 endereços, de Alain Ducasse. [tradução Cecília Prada]. São Paulo: Editora SENAC, 2011.
:: Compreender o mundo (comprendre le monde), de Pascal Boniface. [tradução Cecília Prada]. São Paulo: Editora SENAC, 2011. 
:: Do cinematografico ao televisivo (De lo cinematografico a lo televisico: metalevision, lenguaje & temporalidad), de Mario Carlon. [tradução Cecília Prada]. São Leopoldo RS: Editora Unisinos, 2012.
:: O livro das coisas perdidas (The book of lost things), de John Connolly. [tradução Cecília Prada]. Rio de Janeiro: Editora Bertrand Brasil, 2012.
:: A nova arte, de Gregory Battcock. [tradução de Cecilia Prada e Vera de Campos Toledo]. Coleção Debates. São Paulo: Editora Perspectiva, 2ª ed., 2013.
:: Um longo caminho (A long long way), de Sebastian Barry. [tradução Cecília Prada]. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2014.
:: O último verão, de Cesarina Vighy. [tradução Cecília Prada]. Rio de Janeiro: Editora Bertrand Brasil, 2014.
:: A perfeita ordem das coisas (The perfect order of things), de David Gilmour. [tradução Cecília Prada]. Selo Jardim dos livros. São Paulo: Geração Editorial, 2014.
:: O uso da poesia e o uso da crítica (The user of poetry and the use of criticism), de T. S. Eliot. [tradução Cecília Prada]. São Paulo: Editora É Realizações, 2015.
:: A imaginação liberal, de Lionel Trilling. [tradução Cecília Prada]. São Paulo: Editora É Realizações, 2015. 
(*+ 35 livros traduzidos (de 1972 a 2016) de diversas áreas, principalmente de literatura, filosofia e história.

"O sentido que a gente hoje quer dar para essa gente antiga que não falava muito, dizem. Que tudo, nas suas vidas, era cor de silêncio e mistério, e no abafado e triste viviam, comiam e dormiam, pariam, morriam - sem que muito se soubesse."
- Cecília Prada, do conto "Ponto do nunca-mais". no livro 'Estudos de interiores para uma arquitetura da solidão'. São Paulo: DBA  Artes Gráficas, 2004. 


Cecília Maria Prada - arquivo pessoal da autora

FORTUNA CRÍTICA DE CECÍLIA PRADA

ALVES, Mayara Herculano. Entrevista: Cecília Prada. in: Leia Mulheres, 18 de fevereiro de 2016. Disponível no link. (acessado em 3.8.2016).
COELHO, Nelly Novaes (org.). Dicionário crítico de escritoras brasileiras: 1711-2001. São Paulo: Escrituras Editora, 2002.
CORDEIRO, Mariana Sbaraini. A maternidade: destino e carga. in: Pontos de Interrogação n. 1 - Revista do Programa de Pós-Graduação em Crítica Cultural - Vol. 2, n. 1, jan./jun. 2012. Disponível no link. (acessado em 3.8.2016).
COSTA E SILVA, Alberto da.. Invenção do desenho: Ficções da memória. Rio de Janeiro: Editora Nova Fronteira, 2011.
COUTINHO, Afrânio; SOUSA, J. Galante de (org). Enciclopédia de literatura brasileira. Rio de Janeiro: MEC/FAE, 1990.
LIMA NETO, Francisco. Cecília Prada: Uma mulher à frente de seu tempo. In: Correio Popular, 26 de janeiro de 2020. Disponível no link. (acessado em 3.9.2021).
MACHADO, Cibelle Rodrigues. A violência como apagamento do indivíduo nos contos "La Pietá" e "Têmpera", de Cecília Prada. (Monografia Graduação em Letras). Faculdade Estadual de Filosofia, Ciências e Letras de Paranaguá, FAFIPAR, 2011.
MARCHAO, Talita. A ex-diplomata de quase 90 anos que luta há décadas para ser readmitida no Itamaraty. In: BBC Brasil, 26 de outubro de 2019. Disponível no link. (acessado em 3.9.2021).
MOURA, Lúcia. Conto de Cecília Prada. in: bonde, 17.10.2011. Disponível no link. (acessado em 3.8.2016).
OLIVEIRA, Gessiani dos Santos. Emancipação feminina em contos de Cecília Prada. (Monografia Graduação em Letras). Faculdades Integradas de Naviraí (MS), 2012.
OMURA, Guilian Scorsim. O Casamento nos Contos "Têmpera" e "A Chave na Fechadura", de Cecília Prada. (Monografia Graduação em Letras). Faculdade Estadual de Filosofia, Ciências e Letras de Paranaguá (PR), FAFIPAR, 2011.
SEPULVEDA, Cida. Sabedoria literária. A força da linguagem de Cecilia Prada nasce da memória e da poesia de uma escritora que não faz concessões […]. in: Rascunho, edição 114, janeiro de 2012. Disponível no link. (acessado em 3.8.2016).
SÜSSEKIND, Flora (org.). Vozes femininas: gênero, mediações e práticas da escrita. Rio de Janeiro: 7letras: Fundação Casa Rui Barbosa, 2003.
TRINDADE, Fábio. Embaixador e jornalista tomam posse na Academia Campinense. in: Correio Popular, 29.9.2015. Disponível no link. (acessado em 4.8.2016).
WANDELEY, Maria Cavendish. Mulheres: Prosa de ficção no Brasil 1964-2010. Rio de Janeiro: Ibis Libris, 2011.
XAVIER, Elódia. Tudo no feminino: a mulher e a narrativa brasileira contemporânea. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1991. 

Como escreve?
"Às vezes alguém me conta uma coisa, eu quero escrever, mas não vem a forma – é essencial que venha a forma, definida e inapelável. Levo anos às vezes com u ma ideia, sem saber como a vou escrever...
Exemplos concretos:  para meu conto mais famoso, La Pietà, houve o fato real que me foi contado pela própria “Damiana” (que era uma massagista), e eu me senti muito emocionada porque tocou na  minha terrível experiência de perda de bebê. Só que eu não sabia como escreveria isso. Até que um dia, quando aconteceu o episódio da destruição da estátua da Pietà de Michelangelo em Roma, eu passei por uma banca e vi uma matéria na Tribuna da Imprensa, e aí me veio a solução: intercalar os dois episódios, e contrastá-los. Quanto ao outro famoso conto A Casa-uma travessia, que é o meu predileto, foi construído inteiramente em cima de um material de minha casa da infância, redescoberto  em período de terapia. Só que eu não sabia como formatá-lo. Uma noite acordei, acendi a luz, peguei um pedaço de papel e uma caneta e tracei a planta baixa da casa da infância. Estava solucionada a forma."
- Cecília Prada, em "Mulheres: Prosa de ficção no Brasil 1964-2010", de Maria Cavendish Wandeley. Rio de Janeiro: Ibis Libris, 2011 | reproduzido em 'Tiro de letra'. 


La Pietà, de Michelangelo - Basílica São Pedro - Vaticano (Roma Itália)

LA PIETÀ

Cidade do Vaticano (21) – “La Pietà”, a primeira escultura religiosa do Renascimento italiano, famosa em todo o mundo e venerada no Vaticano por fiéis e milhões de peregrinos, foi  parcialmente destruída...
Olhou para a barriga, sorriu. De manhã tão cedo. O ônibus da Rocinha sacolejava. Tinha deixado o café pronto para quando o João acordasse, no barraco.
Contanto que nasça bem. Vai ser um menino. João, também. Ou Francisco, que nem meu pai. O ônibus sacode, dá uma dor aqui, tanta pedra, estrada ruim, não vai chegar nunca lá embaixo? Bobagem, faz mal não. A cunhada Maria sofreu até desastre da Central, de sete meses. E o menino nasceu.
      
 ....parcialmente destruída. O ato de vandalismo ocorreu às nove horas da manhã, diante da multidão que fazia fila diante da célebre obra que....

No  hospital do Instituto uma fila enorme de mulheres de barriga avançando para o mundo, as mulheres, as mulheres todas e suas barrigas, tristes barigas, as mulheres se debruçando em suas barrigas. Na seção que tinha um nome esquisito. Damiana soletrava a custo, “gi-ne-co-lo-gi-a...obs-te....”

...que é uma das mais célebres expressões da cultura humana.
     
O médico gritou:
       - Você aí, não está ouvindo? Avança logo que tenho mais o que fazer. Tira a roupa.
       Tira a roupa. Tira a calça. Anda. Deita. Levanta. Tira a calça.
        A enfermeira gorda sacudiu-a:
        - Tira tudo.
        O toque doeu. Ela deu um gemido. Bruto. Que nem o João, quando queria ela deixava mas pensava vai fazer mal prô menino...Abria a perna. Deixava. O João. O médico. Estripada, pensou. De perna aberta prô mundo, sua puta.
        - Levanta, o que tá pensando?
        - Elas pensam que a gente tem o dia todo. Não vai ser fácil não, vou dizendo logo. Se sentir dor, venha logo. De carro. Se puder. Onde mora?
        - Na Rocinha.
        - Hum! ..Mande entrar a seguinte.

 O pavoroso atentado abalou profundamente os meios artísticos, religiosos, culturais. Sua Santidade, que acabava de regressar de Castel Gandolfo....
      
 Foi atacada pelas costas. Sentiu a pancada forte, assalto, pensou, virou, viu o irmão, os olhos vermelhos, tinha bebido de novo, avançava novamente de mão aberta.
          - Tônio!
         Rolou com a bofetada.
         - Toma, sua puta, foi casar com negro, eu disse que ainda te pegava, sua puta sua vaca sua sem-vergonha, toma!
         - Tônio...o menino...
         Toma, toma e toma, soco descendo nas costas, ai, na barriga não, Tônio, tem piedade, meu Deus.
        Ele armou a mão novamente. Armou o pé. Bêbado. A gente começava a correr, dos barracos.
       - Desgraçado, batendo em mulher prenhe.
       - Segura ele.
       - Vaca, tu nunca prestou, casada com aquele negro!
       - Segura, ele mata ela.
       O João mata ele. Me mata. Se ficar sabendo.
       - Leva depressa para o Pronto Socorro, a criança pode nascer.
       Os solavancos do caminhão muito pior que o ônibus mas vai levando vou chegar logo em tudo brutalidade bruto bruto tudo, os homens, o mundo. Seu menino, seu menino alí...Ai, tá doendo, morreu, não, tá mexendo, meu Deus, ai meu Deus, o que eu mais queria, o menino...
        - Não chora não, dona. Já  estamos chegando. Aquele desgraçado devia mais era morrer.

O  autor do atentado, um húngaro chamado Lazlo Toth, era geólogo e residia na Austrália. Já tinha morado antes na Itália, tendo sido expulso pelas autoridades por.....

Seu irmão. Seu próprio irmão. Não queria que casasse com preto. Nem com ninguém. Tinha ciúme, sempre tinha, de qualquer namorado. Queria ela pra ele só, pegava ela de noite quando era menina, pegava, ela tinha medo e deixava, era puta era puta tinha dormido com o próprio irmão Deus castigava abria a perna pro João pro médico, não valia nada, mas tinha o menino, sempre tinham dito a Damiana tem um jeito com criança, seus sorrizinhos, seus narizinhos, úmidos bichinhos.
        O médico do Pronto Socorro era mocinho, não tinha cara ruim que nem o do hospital do Instituto. Mocinho assim, ia entender de barriga grande?
      -Parece... Não. Acho que não aconteceu nada. Quantos meses?
      - Sete.
      - Não. Não tem sangramento. Dores?
      - Nas costas. No braço. Tá tudo moído.
      - Isso é das pancadas que levou. Deu parte?
      - Fugiu. Não sei quem era.
      - Levou na barriga?
        Ela não sabia direito. Tinha caído. O médico olhou para a enfermeira. Depois disse:
      - Faça os curativos, dê um calmante forte. Olha, você vai para casa e fica muito quietinha, ouviu?
        Uma ruga em sua testa..
      - Procure ficar deitada. Mas não fique preocupada não, o seu bebê vai nascer direitinho. Se sentir alguma coisa...
      - O senhor faz o parto?
         O sextanista riu.
      - Não. Só dou plantão aqui.
        Pôs a mão no ombro dela.
      - Fique sossegada. Coitadinha. Fique sossegada. O bebê vai nascer bem.
        Ele não tinha aberto ela pelo meio estripada como os outros. Não tem sangramento. Ele olhou, tocou. De leve. Tinha homem que tocava de leve, com jeito, nem doía. Tinha. Mas não era para ela. Abaixou a cabeça, entrou no caminhão.
       - Tá tudo bem, podemos voltar. O senhor é muito bom.
        - Não é nada não, dona. Pobre tem de ajudar o outro.  Eu pegava aquele desgraçado que fez isso e matava.

O  desalmado concentrou a sua fúria assassina na figura da Santíssima Virgem, cujo braço esquerdo demoliu completamente.

       Uma dor bem dentro dela, parecia, bem no coração. O médico bonito tinha sorrido, era homem da praia do Leblon ou de Ipanema, decerto tinha namorada magrinha de biquini roxo. Passou a mão no rosto picado de varíola.
       O pontapé, ele tinha perguntado, o pontapé não, acho que não, senão o menino tava morto. Que sorte o pontapé não pegou. Uma vez, ela tinha onze anos. Ele pegava  ela de noite ela não tinha coragem de dizer para a mãe, ele disse que matava se ela contasse. A primeira vez tinha doído muito ela tinha sangrado. Não tem sangramento. Ela tinha sangrado – sentada na cama, o sangue correndo. Onze anos. O sangue era quente. Era a primeira vez que tinha pensado o sangue, como o sangue é quente, meu Deus. Não conta que eu te mato. Deixava. Se abrindo. Puta. Uma vez pensou que parece que gostava. Pensou isso e ficou batendo a cabeça na parede. Fez um galo. A mãe dizia:
       - Essa menina é doida.
       Só com ela acontecia, decerto. Não prestava. Uma noite ele tinha dado um pontapé nela, tava caindo de bêbado, sua puta, tinha dito. Ela tinha onze anos.
       Não se preocupe, viu, coitadinha, não vai acontecer nada, minha filha. Tinha dito assim, minha filha. Bem devagarinho. Modos de gente rica educada falar. Grudou as mãos  no assento até ficarem roxas.
       - Tá sentindo alguma dor, dona?
       - Não. Não. Tô bem. Tô só pensando.
       - Melhor não pensar.
         Melhor não pensar. Minha filha....Fique bem quietinha, ouviu? Se sentir alguma coisa... Um modo de falar. De sorrir para ela. Um modo de falar que tava doendo mais dentro dela, parecia, que os socos do irmão, os tapas na cara que levava do João, também.

 Em seguida o energúmeno atacou o rosto da Santa Virgem, quebrando o nariz e os olhos.

 Entrou no barraco devagarinho, o João estava emborcado , tinha bebido também, quem sabe? Deitou devagarinho, com medo. Uma dor funda, vontade de chorar dolorida, Deus, ah Deus meu, existia Deus? Deus castigava assim? Ela, o João, o menino...Mas o menino se mexia dentro dela...Fique quietinha, ouviu? Ficou quietinha, ouvindo, na noite. Uma asa dentro dela se mexia , seu menino – carícia vinda de dentro. Ficou olhando o teto, muito parada, olhar fixo. Esperando. Tinha medo de dormir, tinha medo que o menino...Os olhos ardiam, esperando. Esperando.
   
  (Passos, passos. Que vinham – que cresciam de todos os lados. Energúmenos de punhos erguidos. Uma enorme vaga. Fúria assassina. De todos os cantos da terra. Um martelo. Enorme martelo erguido, vinha.
       Na noite da antecâmara  pontifícia, um grito foi ouvido.
       O Primeiro Camareiro olhou para o Segundo Camareiro – Sua Santidade devia estar se debatendo com um pesadelo.) .      

 A dor chegou de repente. Como um grito, enorme vaga erguendo-se dentro dela, no seu ventre. Quando tudo estava assim parado. A dor chegando dentro do sono de calmante. Partindo-a. Enorme machado caindo sobre ela.
      - João!... O menino....
        Iam descendo o morro. Não tinha mais ônibus, naquela hora. Barranco. Morro. Feito de tantos pequenos morros. Pedra. Tanta pedra. O morro é duro. O morro era contra ela. O mundo. Áspero. É a vida. Que nem sangue escorrendo quente na perna. Que sentia. A pedra dura o morro duro sempre descendo subindo sempre sempre, pedra doendo na sola fina do sapato, vida de pobre.
       Numa curva da estrada viram o mar de repente, lá embaixo espalhado, espelho. Quieto dormia, o mar?
       Ia clareando quando chegaram no Leblon.
      - Agora a gente pega um taxi. Dez cruzeiros deve dar.
       Fizeram sinal. O motorista ia parando. Olhou para eles e acelerou. Outro, num carro verde e grande, todo lustroso, passou de longe, virando para olhá-los, ela toda curvada, a dor tomando-a. Pobre não ajuda pobre. Ninguém tem pena. Motorista de taxi não era pobre, que nem eles.
        Um fusca azul parou.
      - É prá já, dona? Entra que a gente dá um jeito.
        Tem gente boa. Tem gente muito boa, ainda.
         O mar via-se de longe, uma pontuação alí no fim de cada quadra, azul parado calminho, assim de manhãzinha. Azul é cor de menino. Cidade tão cedo. Onde está a gente da cidade? Dormindo, acordando. Meu filho vai nascer, pobrezinho. Acho que o bruto acertou o pontapé, não sei bem, caí, não vi mais nada. Ou foi sôco, só. Mas tá vivo e se mexendo. Às vezes é alarme falso. Não quero que chegue nunca no hospital. Meu filho é só meu. Por enquanto está aqui, guardadinho. Só meu. Não deixo sair.
       Praia de Botafogo. O mar é cinza parado.
       Praia do Flamengo. Verde a palmeira, o mar lá longe no aterro parece tão verde em cada lugar o mar é diferente isto dentro de mim esta dor quando vem é uma onda é como uma onda, eu vou sentindo ela subir vai me afogar, eu o menino o João o táxi, tudo afogado. Morto. Vem vindo. O mar vermelho. O mar pode ser vermelho. Vermelho e quente como sangue.

...Finalmente um jovem bombeiro lançou-se  sobre o iconoclasta , tomando-lhe o martelo. Petrificada diante do horroroso atentado à cultura humana, e presa de repentino terror, a multidão fugiu diante do ato blasfematório. Algumas mulheres desmaiaram, outras soluçavam e gritavam.
  
Cecília Prada - arquivo da autora
   ...um túnel de dor, parecia, onde mulheres gritavam e gemiam nas enfermarias, quantas mulheres, pareciam sozinhas jogadas no mundo para dar à luz, que nem ela. As batas de um branco encardido. No branco, a dor. Num canto uma menina, quanto anos, treze? Parecia onze. Imóvel. Tinha morrido? Mas os olhos se abriam e fixavam o teto , e quando a dor vinha era como uma coisa concreta viva que a menina de olhos parados estivesse vendo, monstro que vinha se formando em si, dentro dela, enorme. Menina—onze anos? Deve ter sido estupro.
        ... seguindo no corredor, seguindo a sua própria dor, e a das outras, difícil andar, a enfermeira abriu uma sala, umas doze camas, tira a roupa, dores regulares, perguntava. Tira a roupa. Tira tudo. Veste essa camisola, espera, deita, espera, espera, espera.
         Ninguém com ela. Sozinha.
         Entrou um médico, mal-humorado.
      - Mais uma. O movimento vai ser daqueles, hoje.
         Ela não tinha culpa, queria dizer para o médico. Não tinha culpa de ter vindo naquele dia, desculpasse, não queria dar trabalho.
         Levantaram o lençol, ela abriu as pernas, dócil. Fechou os olhos.
         A porta, cada vez que abriam, trazia intervalado um grito longo e feio, pontuando o branco. A menina? – pensou. Animal. Porco sangrado. Vida. Suja. Feia.          
      - Cesariana. Quanto antes, melhor. Providencie.
          Saíram. A porta que se abria. O grito, pontuação vermelha, no branco.
         Damiana ergueu-se no cotovelo, olhou o relógio: eram sete horas e quinze minutos. Da manhã.
        
A preciosíssima  estátua foi encomendada a Michelangelo em 1498 pelo cardeal Jean Villiers de Lagrolaye, que desejava instalá-la na Igreja dos Franceses, em Roma.         

Mar. Que vinha, enorme, se formando onda. Vagalhão agora crescendo...
          ( ...longe, na Itália, um martelo).
         ...mar vermelho, nas suas cadeiras cinta apertando, uma dor enorme, às vezes acabava brusca, ficava muito tempo sem nada, tinham esquecido dela?
          Resvalava no branco.  O tempo passava, tinham esquecido? Deviam saber mais do que ela, não tinha coragem de perguntar. Enfermeiras entravam, saíam, voltavam. A porta, o grito longe, vozes. Tinham esquecido dela sozinha, o João lá fora que estava fazendo, também não podia falar se falasse o João matava ela, culpava ela mais o irmão, puta, o sangue escorrendo quente na perna de onze anos, a menina que ia parir, fazia tanto tempo, tudo fazia tanto tempo...
       O relógio do corredor marcava: três horas. Da tarde.
       A enfermeira levantou o lençol, examinou, a outra sacudiu os ombros:
      - Não sei, disse que era cesariana e foi embora...
      Dentro da dor grande as outras menores, o corpo doído surrado, um corpo que ardia todo, parecia, um corpo que nos dezessete anos tinha vindo num sofrimento, numa dor só, parecia, barranco sujeira sangue pisado lama dezessete anos , quantos anos mais...

A  veneranda  imagem conta, pois, 474 anos. Para o trabalho da sua restauração os peritos trabalharão com as medidas exatas tiradas de uma cópia da estátua, feita há 30 anos. Ao encomendar a obra, o cardeal escolheu um tema que era praticamente desconhecido até então na arte religiosa. As únicas representações plásticas de uma mãe chorando o seu filho...

...nasceria mulato? Nasceria? Sete meses – apalpava a barriga, asa leve, ainda vivia, não precisava ser operada? .. O mundo todo era um menino chamado Cesário, ia chamar Cesário por causa da cesariana, sete meses também cria. Criado com muito mingau. E o seu leite ia ser forte...

...de uma mãe chorando o seu filho morto datavam da antigüidade clássica, como as estátuas de Vênus e de Adonis, e de Mennon.

 ... e sua mãe tinha tido leite forte para os filhos. Era o que tinha salvado eles, nem todos, alguns. Filho de pobre é assim, tem de ser de porção, senão não cria. Que nem gado. Filho de rico  nasce dois, três, cria tudo...
       (Martelo.
          - no ponto preciso em que a energia se transforma em gesto: um grito. Olhou a velha beata se ajoelhando diante da estátua, ela tinha bigode, lei é schiffosa teve vontade de gritar, viu de relance o gesto do guia estendendo disfarçado a mão para a gorjeta do americano...
         num gesto seco levantou a mão : armada)

 De repente o gritou chegou, e era mais forte do que tudo, ela fechada, no grito, na dor, na dor iniludível, ali, precisa, ela fechada em sua  própria barriga, o quarto sem janelas, só portas, quatro portas, uma confluência de todos os caminhos do mundo, ela estripada mundialmente universalmente Damiana estripada, estuprada, mar vermelho explodindo dentro dela, a dor explodida, me acudam.
          Chegaram as enfermeiras, aguenta é assim mesmo, faz caminho, alguém disse “ respira” como quem atira uma toalha, respirar como?
          ( Mar.
             Mar-te-lo
             Mar-te-lo.
             O braço. O nariz. Os olhos cegos. Agora. Es-ti-lha-ça-dos).

 A notícia correu célere pela Itália, como um rastilho de pólvora, suscitando incrível emoção. O Santo Padre correu à Basílica e dirigiu-se até o célebre grupo escultórico, diante do qual se ajoelhou, afogando lágrimas.
        
 ...estilhaçada em mil pedaços, a sua dor que era o mundo e quem era que assim gritava, ao longe, mas era ela, era ela gritando, não grita, aguenta, disseram, quem? O quê? Outra voz, “ não vive”, alguém tinha dito ‘não vive”, quem? o quê? Quando? O grito, a sala desventrada, portas abertas todas ela puta aberta o irmão pegava o soco o grito o barraco faz frio faz calor faz sangue...

...afogando lágrimas. Depois, já serenado, interessou-se pelo autor do delito: “ É  realmente louco ou simula loucura?”...

...empurravam levando para onde não sabia mais, o grito, essa pessoa que gritava o tempo todo e que devia ser ela, aquela dor era impossível, não existia, e uma voz disse “não compreendo... não fizeram...” machado, enorme, martelo, martelando assim na  barriga.....” cesariana?”
     
 Preocupou-se logo o Sumo Pontífice em saber se os danos eram irreparáveis. O especialista em restaurações do Vaticano, o eminente Professor Deoclécio Redig de Campos, que é brasileiro, disse que todos os cinquenta fragmentos das partes danificadas serão recolhidos e catalogados e que...
      
...esquartejada, porco sangrado, animal, amarravam suas pernas, suas mãos, uma cruz, ela era uma cruz.

...a estátua será reparada: “Temos os fragmentos do braço e do nariz. Para o olho será muito mais difícil”.

...respira, respira fundo, estreito túnel onde vou, onde vou morrer? Respira que a dor passa, a pessoa tinha deixado de gritar ou gritava mais longe, um pano no nariz, respira, tudo mais longe, o teto abaixando, respira, “acho que é tarde demais”.

 “De qualquer modo o grupo perdeu sua integridade original. Como reunir de novo os fragmentos miúdos de mármore, e inclusive a sua poeira?” – perguntou o perito mundial Giulio Carlo Argan.

...respira fundo, fórceps, não sei, criança prematura, posição difícil....

“La Pietà”  foi a única obra que Michelangelo firmou, porque considerou que se aproximara da perfeição que sempre procurou, diz a lenda. A História, porém.....

... uivo rouco retomado, tudo tem que acabar, não é possível...

 ... afirma que o artista só a assinou por ter sido a estátua atribuída a outro escultor.
        
           - Agora. Faça força.
         - Vamos, um pouco mais. Só isso. Agora.
         Para fora .Cuspido. Parido – enfim. A dor parada, ela olhou. Dependurado pelos pés como um franguinho ensanguentado, um franguinho assassinado, o seu...
         
Pegou então de um cinzel e esculpiu seu nome...
          
.... o seu menino, o médico sacudia, batia com força, cinzento e inerme o menino permanecia, não bata no meu menino, tão pequenino, não bata no meu menino, no meu menininho, no meu filhinho, não bata, não bata em mim, não me machuquem, não machuquem meu filhinho....

...seu nome bem visível no peito da Virgem : MICHELANGELO BUONARROTI  FECIT.

 E então trouxeram. Eles reunidos, o médico, as enfermeiras, trouxeram: o seu menino. O seu menino morto. Um pedacinho de carne a mais, com manchas de sangue pisado no rosto. Trouxeram o menino. A enfermeira, ao colocá-lo nos seus braços, virou a cabeça para o lado.

O grupo  está  talhado num só bloco de mármore de Carrara e mede 1,74 m de altura por 1,94 m de largura.

Nos braços rígidos, sem embalo, o filho, ela, ambos, para sempre fixos, duros – pedra. Para sempre.


E o escultor Giacomo Manzu, autor da Porta dos Mortos de São Pedro, inaugurada em 1964 por Sua Santidade o Papa Paulo VI, ao saber do nefando crime, prorrompeu em soluços: “É  o atentado mais grave contra a civilização e a cultura que se cometeu até agora. O mundo exige um castigo exemplar para o culpado.”
- Cecília Prada, o conto "La Pietà". no livro 'Estudos de interiores para uma arquitetura da solidão'. São Paulo: DBA  Artes Gráficas, 2004.


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COMO CITAR:
FENSKE, Elfi Kürten (pesquisa, seleção, edição e organização). Cecília Prada - os itinerários de uma contista e jornalista. Templo Cultural Delfos, setembro/2021. Disponível no link. (acessado em .../.../...).
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** Página atualizada em 3.9.2021.
* Página publicada originalmente em AGOSTO/2016.




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