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Marina Tsvietáieva - poeta russa

Marina Tsvietáieva
Marina Tsvietáieva (Марина Цветаева) poeta e tradutora russa, nasceu em Moscou, em 1892, numa família que poderia ser considerada, hoje, de classe média alta; de pai viúvo, o professor universitário Ivan, casado em segundas núpcias com sua mãe, Maria, uma pianista frustrada, descendente de alemães e poloneses, morta pela tuberculose quando a filha tinha apenas 14 anos. Dela, a menina herdou sua musicalização, seu antimaterialismo e seu interesse pela língua e pelo romantismo germânicos.
Marina sempre levou uma vida extremamente liberal, em todos os sentidos. Casou-se cedo, criou três filhos, manteve dezenas de amantes, nunca escondeu sua bissexualidade e participou ativamente da vida cultural européia, em especial da checa e francesa.
Mas as grandes guerras do século, auxiliadas pela Revolução Russa, acabaram por vencê-la. Entre outras tristezas menores, viu dissolver-se sua família, entre mortes, exílios e prisões. Em 1941, enforcou-se, deixando apenas um bilhete: "Não me enterrem viva: verifiquem bem!". Ninguém compareceu ao funeral. Para Pignatari, seu Poema do fim, presente no livro Marina Tsvietáieva, é o "mais espantoso poema de amor do século" passado.
Marina é o primeiro livro da poeta russa Marina Tsvietáieva lançado no Brasil. Com tradução do poeta e semiota Décio Pignatari a obra apresenta uma autora fundamental na antologia poética russa, que vem sendo cada vez mais reconhecida depois de liberada a divulgação de sua obra.
:: Fonte: Travessa dos editores (acessado em 8.2.2016). 


OBRAS PUBLICADAS NO BRASIL E PORTUGAL
Poesia
Marina Tsvetaeva (1913)
:: Depois da Rússia: 1922-1925. Marina Tsvetaieva. [tradução Filipe Guerra e Nina Guerra]. 1ª ed., Lisboa: Relogio D'agua, 2001. 
:: Marina - Marina Tsvietáieva (Марина Цветаева).. [prefácio, seleção e tradução Décio Pignatari]. edição bilingue. Curitiba: Travessa dos Editores, 2005.
:: Indícios flutuantes: poemas. Marina Tsvetáieva.. [Prefácio e seleção Aurora Fornoni Bernardini]. edição bilingue. 1ª ed., São Paulo: Martins Fontes, 2006. v. 1. 145p.

Prosa
:: O diabo. Marina Tsvetaieva. [tradução Manuel Dias]. 1ª ed., Lisboa: Relogio D'agua, 1994. 

Antologia (participação)
:: Poesia russa moderna. [tradução e comentários de Augusto de Campos, Haroldo de Campos e Boris Schnaiderman]. São Paulo: Editora Brasiliense, 1985.

:: Poesia da recusa. [introdução e tradução Augusto de Campos]. São Paulo: Perspectiva, 2006. 
:: Poetas russos. (Aleksandr Blok | Anna Akhmatova | Boris Pasternak | Bulat Okudjava | Ievgueni Ievtuchenko | Marina Tsvetaieva | Serguei Iessienin | Vladimir Mayakovsky).. [tradução Manuel de Seabra]. 1ª ed., Lisboa: Relogio D'agua, 1995.
:: Poemas russos. [organização Mariana Pithon e Nathalia Campos; vários tradudores]. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2011. Disponível no link. (acessado em 8.2.2016).




POEMAS ESCOLHIDOS DE MARINA TSVIETÁIEVA

Marina Tsvietáieva (1931)
BEIJO NA TESTA
Beijo na testa       –       deleta aflição
                                      imprime afeição
Beijo na testa

Beijo nos olhos    –       deleta pesadelo
                                      imprime desvelo
Beijo nos olhos

Beijo na boca       –       deleta sede e fome
                                      imprime seu nome
Beijo na boca

Beijo na testa       –       deleta memória
                                      e fim da historia
Beijo na testa

(5 de Junho, 1917)


               
В ЛОБ ЦЕЛОВАТЬ
В лоб целовать – заботу стереть.
В лоб целую.
        
В глаза целовать – бессонницу снять.
В глаза целую.

В губы целовать – водой напоить.
В губы целую.
        
В лоб целовать – память стереть.
В лоб целую

(5 июня, 1917)

- Marina Tsvietáieva (Марина Цветаева), em "Marina". [tradução Décio Pignatari]. Curitiba: Travessa dos Editores, 2005.

§

ENCONTRO
Vou chegar tarde ao encontro marcado,
cabelos já grisalhos. Sim, suponho
ter-me agarrado à primavera, enquanto
via você subir de sonho em sonho.

Vou carregar esse amargo – por largo
tempo e muitos lugares, de penedos
a praças (como Ofélia – sem lámurias)
por corpos e almas – e sem medos!

A mim, digo que viva; à terra, gire
com sangue no bosque e sangue corrente,
mesmo que o rosto de Ofélia me espie
por entre as relvas de cada corrente,

e, amorosa sedenta, encha a boca
de lodo – oh, haste de luz no metal!
Não chega este amor à altura do seu
amor ... Então, enterre-me no céu!

(18 de junho de 1923)



СВИДАНЬЕ

На назначенное свиданье
Опоздаю. Весну в придачу
Захвативши - приду седая.
Ты его высоко назначил!

Буду годы идти - не дрогнул
Вкус Офелии к горькой руте!
Через горы идти - и стогны,
Через души идти - и руки.

Землю долго прожить! Трущоба-
Кровь! и каждая капля - заводь.
Но всегда стороной ручьевой
Лик Офелии в горьких травах.

Той, что страсти хлебнув, лишь ила
Нахлебалась! - Снопом на щебень!
Я тебя высоко любила:
Я себя схоронила в небе!

(18 июня 1923)

- Marina Tsvietáieva (Марина Цветаева), em "Marina". [tradução Décio Pignatari]. Curitiba: Travessa dos Editores, 2005.

§

VOCÊ ME AMAVA
Você me amava: as honestas mentiras
pareciam na verdade ter raiz.
Maior que o tempo, que imenso, imensís-
simo (eu cria) um tal amor que aspiras-

se ser tão grande quanto o meu ardor!
Então, sem mais, a mão abana, o amor
se vai, respiro mal, mal digo a mim:
— Eis a verdade do início e do fim.

(1923)


ТЫ, МЕНЯ ЛЮБИВШИЙ
Ты, меня любивший фальшью
Истины — и правдой лжи,
Ты, меня любивший — дальше
Некуда! — За рубежи!

Ты, меня любивший дольше
Времени. — Десницы взмах!
Ты меня не любишь больше:
Истина в пяти словах.

(1923)

- Marina Tsvietáieva (Марина Цветаева), em "Marina". [tradução Décio Pignatari]. Curitiba: Travessa dos Editores, 2005.

§

FIOS TELEGRÁFICOS 

Aos postes cantores
em áreas de fios
– suportes do céu –
envio o pé de
que sou parte,
                        nestes baixos,

vibrante de poste a poste
– alameda de suspiros –
meu telegrama:
                           – ã ã ã ã – mo...

Ouço – peço – (Formulários
não su-portam tal palavra:
– fios são diretos!).

O próprio Atlas
apoiou nesses postes
a raia dos deuses eqüestres...
ao longo dos fios, envio
a televoz: a a a a – deus...

Esta ouvindo! Últimas notas
da minha garganta:
                                Per – dão – Por – deus...
Cordame de navio
em mar de lavouras
– pacíficos e atlânticos –
– sempre mais alto –
as mensagens se fundem
na trama de Ariadne:
                                – Vo o o ! – te...
e os lamentos: Não – vou – dei – xar...

Fios, guardas de aço
das vozes do inferno,
sempre mais distantes,
e ainda pedindo – “Tenham pena!...Piedade!”

Pena ou piedade? (Tal ruído
se distingue no coral dantesco?
O grito, quando a morte chega
– por valas e aterros –
o último): gemido da paixão imortal
de Eurídice – “Que pena,
                                  que...
                                  q...? 

(17 de março de 1923)


ПРОВОДА
1


Вереницею певчих свай,
Подпирающих Эмпиреи,
Посылаю тебе свой пай
Праха дольнего.
                                        По аллее
Вздохов — проволокой к столбу —
Телеграфное: лю — ю — блю…

Умоляю… (печатный бланк
Не вместит! Проводами проще!
Это — сваи, на них Атлант
Опустил скаковую площадь
Небожителей…
                                        Вдоль свай
Телеграфное: про — о — щай…

Слышишь? Это последний срыв
Глотки сорванной: про — о — стите…
Это — снасти над морем нив,
Атлантический путь тихий:

Выше, выше — и сли — лись
В Ариаднино: ве — ер — нись,

Обернись!.. Даровых больниц
Заунывное: не́ выйду!
Это — про́водами стальных
Проводо́в — голоса Аида

Удаляющиеся… Даль
Заклинающее: жа — аль…

Пожалейте! (В сем хоре — сей
Различаешь?) В предсмертном крике
Упирающихся страстей —
Дуновение Эвридики:

Через насыпи — и — рвы
Эвридикино: у — у — вы,

Не у —

(17 марта 1923)

- Marina Tsvietáieva (Марина Цветаева), em "Marina". [tradução Décio Pignatari]. Curitiba: Travessa dos Editores, 2005.

§

ENSAIO DE CIÚME
Como vai indo com a outra?
Tão fácil, não? — basta um impulso
no remo — com a orla, a minha
imagem se borra, se afasta,

vira ilha flutuante (no céu,
— na água, não!).
                             Alma e alma,
irmãs, sim — mas, amantes, não!
Uma é destino; outra — sem fim!

Que tal viver com tal pessoa
comum — vida sem divindades?
Jogou do trono-olimpo a deusa-
rainha, abdicou — e a coroa

de sua vida, como fica?
Ao despertar, como pagar
o preço de imortal banal-
idade — como? Menos rica?

"Chega de susto e suspeita!
Quero um lar!". Mas... e a vida
só — com uma mulher qualquer —
Você — eleito de uma eleita?

Ah... E a comida? Apetitosa?
Você se queixa quando enjoa?
Depois do topo do Sinai,
Ir conviver com uma à-toa

da parte baixa da cidade,
uma coitada? Gostou da anca?
O açoite-vergonha de Zeus
ainda não vincou-lhe a estampa?

Entre viver e ser, dá para
contar? E como encara
o caro amigo a cicatriz
da consciência-meretriz?

Viver como boneca de gesso
—de feira!? Você me acha cara?
depois de um busto de Carrara,
um susto de papier-mâché?

(O deus que escavei de um bloco
só me deixou os ocos). Enleva
viver com uma igual a mil,
quem já teve a Lilit primeva?

Não lhe matou a fome a boa
bisca, que atendeu aos pedidos?
Como viver com a simplória
que só possui cinco sentidos?

Enfim, por fim...: você é feliz,
no sem-fundo dessa mulher?
Pior, melhor, igual a mim,
nos braços de um outro qualquer?

(1924)


ПОПЫТКА РЕВНОСТИ

Как живется вам с другою,-
Проще ведь?- Удар весла!-
Линией береговою
Скоро ль память отошла

Обо мне, плавучем острове
(По небу - не по водам)!
Души, души!- быть вам сестрами,
Не любовницами - вам!

Как живется вам с простою
Женщиною? Без божеств?
Государыню с престола
Свергши (с оного сошед),

Как живется вам - хлопочется -
Ежится? Встается - как?
С пошлиной бессмертной пошлости
Как справляетесь, бедняк?

"Судорог да перебоев -
Хватит! Дом себе найму".
Как живется вам с любою -
Избранному моему!

Свойственнее и сьедобнее -
Снедь? Приестся - не пеняй...
Как живется вам с подобием -
Вам, поправшему Синай!

Как живется вам с чужою,
Здешнею? Ребром - люба?
Стыд Зевесовой вожжою
Не охлестывает лба?

Как живется вам - здоровится -
Можется? Поется - как?
С язвою бессмертной совести
Как справляетесь, бедняк?

Как живется вам с товаром
Рыночным? Оброк - крутой?
После мраморов Каррары
Как живется вам с трухой

Гипсовой? (Из глыбы высечен
Бог - и начисто разбит!)
Как живется вам с сто-тысячной -
Вам, познавшему Лилит!

Рыночною новизною
Сыты ли? К волшбам остыв,
Как живется вам с земною
Женщиною, без шестых

Чувств?..
Ну, за голову: счастливы?
Нет? В провале без глубин -
Как живется, милый? Тяжче ли,
Так же ли, как мне с другим?

(1924)

- Marina Tsvietáieva (Марина Цветаева), em "Marina". [tradução Décio Pignatari]. Curitiba: Travessa dos Editores, 2005.

§ 

Marina Tsvietáieva (1930)
A MAIAKOVSKI*
                      Jogo na palma da mão
                      sementes de fogo
                      para que Ele              
                     se mostre  numa luz infinita
                     vermelho como o fogo**
                                             – André Biély


Tal como o Chefão Soviético
no Sínodo Pleno:
– Ôi, Serginho!
– Ôi, Mirinho!

– Cansou? – Can-sei.
– Não dava mais? – Nem menos.
– Razões gerais? – Pessoais.
– Tiro na mosca? – Um só...
– Ardeu – Sem dó...

– Feliz? Infeliz?
– Passei, como se diz.
– Não é legal, Serginho!
– Não é legal, Mirinho!
– Você me xingou de tudo,
seu! Voz de baixo
profundo: as pranchas
do palco racharam...
– Melhor deixar pra lá...

– Hom`essa! Tomar um barco
de amor por bote salva-vida!
Foi peça de rabo-de-saia?
– Melhor que a sua gandaia

de vodca. Fuça inchada,
você não mudou nada.
– Não dá certo, Serginho!
– Nem de perto, Mirinho!

– Trabalho limpo, navalha
não faz, criatura.
– Veja: tinha assinatura!
– E ainda goteja...

– Ponha folha de tanchagem.
– e iodo de bandagem?
– Cura dura, Serginho?
– Dura cura, Mirinho!
– E o que se passa na súcia
da Velha Mãe Rússia – Como?
Onde? – Na U-Erre-Esse-Esse,
o que acontece? – Const-rói-se.

Os pais vão parindo,
o sabotadores sabotando,
o editores governando,
o escritores escrevinhando.

Uma nova ponte foi-se:
Obra do martelo-degêlo.
– Sempre a mesma coisa, Serginho!
– Sempre o mesmo, Mirinho!

– E como voam os cantores de pena?
– Muito vivos os poetas-juntos!
Em lugar de ataques,
loas e coroas para os vates
defuntos (encobrindo os saques!).

A minha velha ROSTA,***
em nova plástica de louva ações.
Não há plurais Pasternaks:
ele está só em suas canções.

– Então que tal uma chuvinha
nessa estiagem toda?
Vamos nessa, Mirinho?
– Vamos nessa, Serginho!

– Alguém de lá manda abraço...
– Mas como anda o nosso santo
Alexandre Alexandrovitch Blok?****
– Olhe lá longe: virou anjo!

– E Fiódor Kusmitch – Pelo canal,
atrás das bochechas rosadas.
– E Nicolai Gumíliev?
– No leste, “depor-todo”...

ou “tudo’... Culpado! – (Saco
ensopado, pilhas na carroça).
– A mesma coisa, Serginho?
– A mesma coisa, Mirinho!
– Já que isso é assim,
querido amigo Mirinho,
porque não metendo mãos
à obra, embora sem
mãos!
             – Mas com fins, Serginho,
velho irmão: e vai ser
uma bomba
                     nesse império também!

E em tempos de Nova AurEra.
nascida de nossos ossos,
Vamos encher a caveira, Serginho!
– Vamos encher a caveira, Mirinho!

(1930)


МАЯКОВСКOMY
6

         Зерна огненного цвета
         Брошу на ладонь,
         Чтоб предстал он в бездне света

         Красный как огонь.

Советским вельможей,
При полном Синоде…
— Здорово, Сережа!
— Здорово, Володя!

Умаялся? — Малость.
— По общим? — По личным.
— Стрелялось? — Привычно.
— Горелось? — Отлично.

— Так стало быть пожил?
— Пасс в некотором роде.
…Негоже, Сережа!
…Негоже, Володя!

А помнишь, как матом
Во весь свой эстрадный
Басище — меня-то
Обкладывал? — Ладно

Уж… — Вот-те и шлюпка
Любовная лодка!
Ужель из-за юбки?
— Хужей из-за водки.

Опухшая рожа.
С тех пор и на взводе?
Негоже, Сережа.
— Негоже, Володя.

А впрочем — не бритва —
Сработано чисто.
Так стало быть бита
Картишка? — Сочится.

— Приложь подорожник.
— Хорош и коллодий.
Приложим, Сережа?
— Приложим, Володя.

А что на Рассее —
На матушке? — То есть
Где? — В Эсэсэсере
Что нового? — Строят.

Родители — родят,
Вредители — точут,
Издатели — водят,
Писатели — строчут.

Мост новый заложен,
Да смыт половодьем.
Все то же, Сережа!
— Все то же, Володя.

А певчая стая?
— Народ, знаешь, тертый!
Нам лавры сплетая,
У нас как у мертвых

Прут. Старую Росту
Да завтрашним лаком.
Да не обойдешься
С одним Пастернаком.

Хошь, руку приложим
На ихнем безводье?
Приложим, Сережа?
— Приложим, Володя!

Еще тебе кланяется…
— А что добрый
Наш Льсан Алексаныч?
— Вон — ангелом! — Федор

Кузьмич? — На канале:
По красные щеки
Пошел. — Гумилев Николай?
— На Востоке.

(В кровавой рогоже,
На полной подводе…)
— Все то же, Сережа.
— Все то же, Володя.

А коли все то же,
Володя, мил-друг мой —
Вновь руки наложим,
Володя, хоть рук — и —

Нет.
    — Хотя и нету,
Сережа, мил-брат мой,
Под царство и это
Подложим гранату!

И на раствороженном
Нами Восходе —
Заложим, Сережа!
— Заложим, Володя!

(1930)

- Marina Tsvietáieva (Марина Цветаева), em "Marina". [tradução Décio Pignatari]. Curitiba: Travessa dos Editores, 2005.

* A Maiakovski – poema escrito logo após o suicídio do poeta, onde a futura suicida estabelece um diálogo crítico-irônico entre dois suicidas célebres (o outro é Sérgio Iessiênin).  Volódia é tratamento familiar para Vladimir (não temos o correspondente; donde, Mirinho). Iessiênin cortou os pulsos e se enforcou; Maiakovski preferiu o revolver. Construir era uma das palavras-símbolo do novo regime. Aqui, o poema se reporta a um diálogo entre ambos, num encontro ocorrido no alto do monte Davi, na Geórgia. Pouco tempo antes, Maiakovski havia escrito, num poema:

Construa
    sem contemplação!
Para construir,
    não poupe demolição!

Assim teria ocorrido o diálogo:

 – Então, Vladimir, você botaria abaixo esta montanha, só para encenar o seu Mistério bufo?
– Sem dúvida que o faremos, se necessário.

** Há aqui uma alusão ao poema Sin Miedo, de Constantin Balmont (1867-1943), onde se fala do famoso aço temperado das espadas de Toledo, na Espanha. Gravava-se na lâmina, a ouro e a quente, o lema “Sin Miedo”, cujo brilho atravessava séculos.

*** ROSTA – sigla da agência telegráfica e de propaganda, para a qual Maiakóvski produziu cartazes e textos poéticos.

**** Alexandre Alexandrovitch Blok (1880-1921) – um dos grandes nomes do Simbolismo russo, morreu dividido entre suas aspirações místicas e sonhos revolucionários; Fiódor Kusmitch (ou Sologub) (1863-1927), poeta e romancista, cuja mulher se suicidou atirando-se no rio Neva; Nicolai Gumíliev (1886-1921), integrante do movimento poético Acmeísta, primeiro marido de Anna Akhmátova, fuzilado por alegadas ações contra-revolucionárias.


§

SAUDADE
Saudade! Um mal-não-mal, há muito,
em mim, desmascarado:
é indiferente, tanto faz
onde viver-me-em-mim-ao-lado,

se na viela – para casa,
com a sacola – ou na sombria
toca minha – se for minha –
vago catre de enfermaria,

ou no quartel. Pouco importa
se vou ser presa – leão na jaula –
ou posta no olho da rua
pelo dono e senhor da porta.

Sem tino ou rumo – urso perdido –
patas entre placas dançantes –
onde humilhar-me ainda,
por uns tempos – pior que antes?

De minha própria língua-láctea,
vou tresmalhar via e caminho,
pois conta pouco em que idioma
não vai compreender-me um Zinho

que passa – grão-leitor de torres
de papel, em sebos de traças...
Tempos modernos, sei – mas sou
alguém aquém e além das raças! 

Virei de pedra um tronco torto,
torso sobrado em alameda.
Tudo se iguala e arremeda,
– e, mais que tudo e mais que todos,

o que um dia me foi caro,
marcas de mim... tarefas... datas...
foi-se também, também se foram
– alma penada reencarnada!

Tão longe desterrou-me aquela
terra-mãe, que o refinado faro
de um policial, fungando-me a alma,
nem cheiro sentiria dela.

Tudo é-me igual e igual a mim
(“– No templo, é estranha; em casa, estorva”.),
– mas não, talvez, onde sentisse
doce...o amargo fruto da sorva*.

(03 de maio de 1934)


Тоска по родине! Давно
Разоблаченная морока!
Мне совершенно все равно  -
Где совершенно одинокой

Быть, по каким камням домой
Брести с кошелкою базарной
В дом, и не знающий, что - мой,
Как госпиталь или казарма.

Мне все равно, каких среди
Лиц ощетиниваться пленным
Львом, из какой людской среды
Быть вытесненной - непременно  -

В себя, в единоличье чувств.
Камчатским медведем без льдины
Где не ужиться (и не тщусь!),
Где унижаться - мне едино.

Не обольщусь и языком
Родным, его призывом млечным.
Мне безразлично - на каком
Непонимаемой быть встречным!

(Читателем, газетных тонн
Глотателем, доильцем сплетен...)
Двадцатого столетья - он,
А я - до всякого столетья!

Остолбеневши, как бревно,
Оставшееся от аллеи,
Мне всё - равны, мне всё - равно,
И, может быть, всего равнее -

Роднее бывшее - всего.
Все признаки с меня, все меты,
Все даты - как рукой сняло:
Душа, родившаяся - где-то.

Так край меня не уберег
Мой, что и самый зоркий сыщик
Вдоль всей души, всей - поперек!
Родимого пятна не сыщет!

Всяк дом мне чужд, всяк храм мне пуст,
И все - равно, и все - едино.
Но если по дороге – куст
Встает, особенно - рябина...

(3 мая 1934)
 
- Marina Tsvietáieva (Марина Цветаева), em "Marina". [tradução Décio Pignatari]. Curitiba: Travessa dos Editores, 2005.

* Sorva, sorveira (ribina, em russo) – planta nativa de médio porte, de frutos vermelhos e amargos, em cachos, que vão ficando doces no fim, às primeiras nevadas. Símbolo icônico do amor e paixão, na tradição popular.


§

ABRIR AS VEIAS
abro as veias

           brota em botões

ela
         a vida 
         sem cura 
         sem volta 
                            nada segura
o jorro 
                  acorram 
                                 com prato 
                                          cuia 
                                        tigela 
                                      gamela 
                                                     rasos demais! 
                                                                   ela transborda
verte-se na terra escura 
                                 vai 
                                 às raízes 
                                             sem volta 
                                             sem cura 
                                                             eisvai-se
                                                                           ela
                                                                          em versos

(06 de janeiro de 1934)


Вскрыла жилы: неостановимо,
Невосстановимо хлещет жизнь.
Подставляйте миски и тарелки!
Всякая тарелка будет – мелкой,
Миска – плоской.

Через край – и мимо –
B землю черную, питать тростник.
Невозвратно, неостановимо,
Невосстановимо хлещет стих.

(6 января 1934)
- Marina Tsvietáieva (Марина Цветаева), em "Marina". [tradução Décio Pignatari]. Curitiba: Travessa dos Editores, 2005.

§

A FOLHA
Em vôo, revôo, fuga,

                                  disparam,
                        rodopiam,
                                 plainam,
                                            no lajedo,
                                                               as folhas,
que alguém varre, pincela, como quadro de artista,
                                                                           acabado.
pergunto (sem resposta): como
é possível
              (ninguém mais gosta
do meu jeito ou do meu rosto
velho)
           que aquela folha amarela
                                                                  no ramo – só?
lá                                                   exposta
com manchas de zinabre
                                   tenha-se             tentado
                                                     sus-

(20 de setembro de 1936)


Когда я гляжу на летящие листья,
Слетающие на булыжный торец,
Сметаемые - как художника кистью,
Картину кончающего наконец,

Я думаю (уж никому не по нраву
Ни стан мой, ни весь мой задумчивый вид),
Что явственно желтый, решительно ржавый
Один такой лист на вершине - забыт.

(20-е числа сентября 1936)

- Marina Tsvietáieva (Марина Цветаева), em "Marina". [tradução Décio Pignatari]. Curitiba: Travessa dos Editores, 2005.

§

Marina Tsvetaeva (1923)
POEMA DO FIM

1.

Céu de lata e ferrugem.
Indicador em riste - o poste
aponta o nosso lugar:
destino triste

Menos quinze - Pontual?
(A morte não espera). Muito
lento o gesto -
de-co-la-gem do chapéu.

Cada cílio - farpa.
Boca - risco: afeta
sem afeto a larga
reverência teatral.

- No horário, hem?! Friso
falso no tom: alarme:
(coração capta aviso): sinal
que a mente trans-mente?

Mau agouro no céu
escuro: nuvem-ferrugem:
ponto de encontro,
às seis em ponto.

Entre um beijo entre
frio e mudo - em defunto
ou mão de rainha - irrompe
(cotovelos) um transeunte.

Muito estridente o circuito
da sirene, ganido -cão-
ferido (a vida estrila,
segura a alma nos dentes).

Ontem - até a cintura.
Hoje - o corpo apaga todo,
montante: a angústia me
toma, sub-e-sobre-indo-e

uivando em silêncio:
Ah-mor... Ah-mor... mas:
- Deve passar das sete.
Um cinema? (Corte seco):
                     - Para casa!

2.

Vida – confraria de ciganos
festivos... mas – sobre
as cabeças – trovoes –
sabres – relâmpagos:

hora horrificante
que cala e apavora:
toda casa se arrasa
numa palavra: casa!
_________________

Choraminga a criança mimada,
perdida: “Minha casa!”.
Mal faz um ano – e já:
– “Meu!” – “Minha!” – “Dá!”.

Caro irmão-devassidão,
calafrio em brasa:
todos saltam pelos muros,
mas você: prisão em casa!
_________________

Morde o freio: para o alto! :
o cavalo rompe a amarra.
– Onde a casa? – Logo
ali, a poucos passos.

Houve a casa na montanha.
– Mais alto? – No topo,
com janela na mansarda:
– “É só do sol da tarde

que ele arde?” – ou da minha
vida, só viva em arte?
Que é casa? – Ora, viver fora,
na noite.
               (A quem se apela

para as perdas e penas
de dores gelo-roxas?),
– Você pensa demais.
Já é hora. – E eu: é...

3.

Amurada, beira-rio: à água
me aferro: jardins
suspensos de Semíramis
sobre a água-placa turva.

Na água – franja de aço
de lâmina de morgue –
me seguro – parapeito – como
diva à partitura, ou cego ao muro.

Sem resposta, sua frieza
sem ouvido, mesmo se me
inclino para matar
de vez à sede. Presa à

pedra-beiral, sonâmbula. Não
temo o rio (nasci náiade!):
– “Dá-me o braço, namorado
fiel...” – Os mortos são

fies, mas escolhem
gaveta... À esquerda,
a morte; você à direita,
meu lado meio torto.

Fachos de luz na margem!
Risos como guisos de pandeiros
baratos... – Precisamos... (Tremo.
Será que teremos coragem?).

4.

Névoa loira, eflúvios
de gás e babados, de fumos
e hálitos – e mais que tudo:
falação interminável.
Cheiro de quê? Pressa,
lengalengas, bolinas,
parcerias, maracutaias,
e a poeira do salão.

Pais de família solteiros
exibem anéis, rapazes
rapaces, no riso e no sarro,
faturam varejo e atacado,
mesmo com rabos presos:
negociatas comerciais,
e poeira de salão.

(Ameaço meia-volta: Isso aí,
nossa casa? – Não sou a dona!)
Este, em cima do talão
de cheques; aquele, de uns
dedinhos de pelica; um outro
pisa furtivo um pezinho
e verniz: casamentos,
conveniências – e, também,
a poeira do salão.

À janela, uma dentada
de prata: a cruz de Malta,
signo do amor: beliscos,
amassos, petiscos (de
ontem, não estranhe
o cheirinho azedo: boca
livre!), mais tramóias
comerciais – e poeira do salão

Curta demais a corrente?
Aço, nada! – É platina!
Papos tripos remoem
pescocinhos-vitelas
de açúcar, diabinhos
revoluteiam no gás
dos bicos-lampeões: desastres
comerciais – com o pó-pólvora
de Berthold Schwartz*
                               – gênio
defensor de seu povo.
– Acho que precisamos
conversar... – Teremos coragem?

5.

Os lábios tremem. (Traduzo:
não vai falar primeiro).
– Você já não me ama? – Mas, claro...
– Não ama! – Ora, não?!... Mas

sentindo um vazio. (O olhar
de águia vaga pelo ar).
– Meu Deus – isso é casa?
– Casa do meu coração. – Literatice!

Carne regada a sangue,
o amor – ou você acha
que é papo em roda
de mesa, por uma horinha

...e logo pra casa, como
esses cavalheiros e damas?
Amor quer dizer...
                           – Igreja?
– Mais pra cicatriz, ferida...
                                - Exposta

a olhares de criados
e bêbados? (Resposta
à parte: Amor – arco
tenso / acordo rompido).

Amor quer dizer – liame,
não nós desfeitos, distâncias
de bocas e vidas (“Sem mau
olhado”, pedi, na hora íntima,

quase no topo do monte
e da paixão) – fumaça,
agora, e re-cor-(da)-ções
que jogo no fogo – de graça!

A boca (risinho) – Não:
(risquinho emm concha pálida,
cálculo) – Tudo numa cama
para dois.
                 – Ou cova para um.

ao que parece. Tamboliram
os dedos: – Não é mover
montanhas! – Amor, ou seja...
– Meu. – Entendo. Conclusão?
__________________

Rufar dos dedos, em
crescendo (patíbulo e praça).
– Vamos indo. Teria mais graça:
– Para a morte!”. Tão mais simples!

Chega de trecos baratos – rimas,
trilhos, hotéis, plataformas.
– O amor quer dizer: vida.
– Os antigos davam outro
                                   nome...

                                – Então?
                                  O punho agarra
um peixe de pano: lenço.
...Vamos? – O seu caminho?
– Bala! Trilho! Veneno! (penso).

– Morte, por ora, sem planos!
– Vida! (Chefe romano, olhos
de águia pela milícia
dizimada :) – Chegou a hora.

6.

Eu não queria isso, as-
sim. (Em silencio: Ouça:
Querer é dos corpos, mas
agora somos almas – mais

nada...). E não disse
adeus. (Quando o trem parte,
a vez é da mulher:
a ela, um brinde, a taça).

Ou não passa de pesadelo?
Ouvil mal? Cortesmente,
o mentiroso cede à amante
a honra de sangue da ruptura,

como um buquê. Ou
falou, mesmo, sílaba a
sílaba: Vamos dizer adeus?
Assim, en passant,

como um lenço que cai,
num lance emocional?
Soberana insolência: na mão
do vencido, a espada vencedora,

troféu da derrota. (Mais forte,
Em meus ouvidos, o zumbido:
`Não rompe, finge “ser rompido”).
– Código de honra com todas?

Não negue! Vingança
digna de Lovelace,
gesto de alto desprendimento,
que desprende a pele

da amante. (Riso escarninho: o
da morte). Gesto em frente!
Desejo, nem sombra,
que sombra já somos.

Um prego, ainda (melhor: parafuso,
que o caixao é de chumbo):
– Um último desejo.
– Diga. – Nem uma palavra

sobre nós... sobre mim,
aos que venham depois. (Dizem,
na maca, os feridos: ó primavera!):
– Posso pedir o mesmo?

– E um anelzinho, de lembrança?
– Não. (Falso olhar de espanto,
ausente. Gravasse-me
no coração – ah!, sim,

anel-eu em seu dedo. Ah... sem
enredo: engula). Insinuante:
– Um livro, então? – Como às outras?
Nunca! E nem pense em escrever

Livros...
_______________

Agora nada de choro
           nada de choro
           choro     agora

Nas tribos de pescadores
erreantes – bebe-se
sem choro e em coro.

Folgança – sem choro,
Pagança – sem choro,
Dissover – sem choro
a pérola no copo!
Sem choro – gire o globo!

Então, quem vai sou eu? Olho
de esguelha: Arlequim joga
um osso – desdenhoso
gesto – a Colombina,

por sua fidelidade.
Última deixa. Cai o pano.
Antes, uma bala
no coração: mais caloroso

e limpo. Cravo os dentres
nos lábios: nada de choro.
O duro no tenro – sem choro!
Na confraria de errantes:
Morrer – sem choro !
Queimar – sem choro !

Na confraria de errantes;
Ocultar-se o corpo
em cinzas e coro!

– Eu, princesa? Dar a saída?
Jogo de xadrez? Para o cada-
falso, cede-me o passo.
– Rápido.

                   Não me olhe! Trate
(Em torrentes escorrem. Como
empurrá-las para dentro
dos olhos?) de não

olhar!!!
           Voz normal:
– Vamos, querido,
vou chorar.
__________________

Ia esquecendo! Entre cofres
vivos (Comerciante e Filhos),
fulge a nuca loira:
centeio, trigo, milho.

Na pele fogosa se revogam
os mandamentos do Sinai;
na crina-tosão se escondem
arcas de gozos.

Para todos, abunda em dons
a mãe-natura, nem sempre avara.
Caçadores dessas sendas loiras
dos trópicos, há trilhas de volta?

Vulgaridade suarenta
em nudez grudenta,
adultério de ouro
em auras lúbrico-ridentes.

Não é mesmo? Olhar
roçagante, cada cílio fisga.
Mais que tudo, o torso-rebenque
peludo se contorce.

O gesto de arrancar a roupa!
Como comer e beber. (Pelo rictus-riso,
você pode salvar-se!).

Assim está bem? Irmãoirmãnente,
aliados aliançantes? Ri
antes de enterrar!
(Depois, quem ri sou eu!)

7.

Amurada. A úl-ti-ma.
(Solto a mão? – Separados!
Dou a mão? Não!
Desconhecidos soldados).

Beira-rio. Pranto. Lambo,
alheia, mercúrio salgado,
sem lua de Salomão que
prateie as lag-

Poste. Socar a testa.
Até sangrar. Esmigalhar.
Cúmplices no crime, lado
a lado (vítima: o Amor).

Mas, como? Um par de amantes
separados? Dormir com outros?
– Veja, o futuro está
lá em cima. – Abano a cabeça.

Dormir! – Amantes num tapete...
– Dormir! – Passos sem ritmo
ou compasso. Peço: dê o braço!
Condenados na estrada?!

Choque! Sua alma-braço
toca no meu: descarga
em coluna e costelas: febre
elétrica: mão na alma!

Me colo. Tudo irisado pelas
lágrimas: curtina de contas.
Amurada sem fim (nem vejo).
Ah, sim, a ponte, e:
                            – Então, pronta!

– Aqui? (Coche e estribo).
Mirada calma pra cima...
– Até sua casa... Pela
última vez!

8.

Úl-ti-ma-pon-te (não solto
a mão). A última, últi-
ma pedra-ponte entre
terra, água e céus.

Apalpo moedas: cambiá-las,
ouro por sombras, pagar
o barqueiro Caronte, Le-
tes letal – som –

brias moedas na mão
de sombra, sons secos
sem ecos tocam sombras
(mãos) – caem nas covas:
papoulas aos mortos!

Boa parte dos amantes
vive de paixão – não
de esperança – ponte-
paixão, espécie de entre,

passagem eventual. Quem-
tinha o ninho em seu
flanco e costela, que distraio
 – e agarro! – triz de raio!

Sem braços, sem pernas
– que o digam meus ossos
prensados nos seus – parte
que sinto viva em mim:

parte ouvido, parte eco
– e nela eu grudo,
como a clara à gema, como
à pele o esquimó

– mais do que siameses!
Mãe ! – não dizia você àquela
que tudo esquecia e le-va-va-
Vo-cê no andor do ventre? – Nem ela, 

por tê-lo dentro, o tinha
mais junto do que o tenho!
Você não entende isso?
A-mal gamada! Aconteci

a dois, ao deitar-
me no seu peito. Soltar?
Jamais! Jogar-me. Largar
a mão? De nenhum jeito.

Ninguém pode arrancar-me
de junto do seu corpo!
Ponte não é marido – é
amante – puro passar adiante

que nos dá vida (os corpos – sacos
de ração no rio).
Meagarrocarrapato:
Arranque-me à unha, aos nacos!

Hera, ostra, carrapato:
Inumano, ser sem deus,
jogar-me fora assim, como coisa – a mim,

que sempre desprezei
as coisas desse falso
mundo de coisas. Diga:
é sonho. É noite... Amanhã,

o Expresso... Roma?
Granada? Nem, quero saber,
enquanto emerjo de Himalaias
de mantas de plumas!

No oco escuro e fundo,
que o sangue aquece, escute
esta carne-flanco
mais leal que um poema.

Quentinho, por hoje? Amanhã,
quem vai estar de serviço?
Estou delirando. Mas diga, sim?,
que a ponte não vai acabar,

que nunca terá fim...
                            ...fim.

Aqui? – Infantil e entojado,
o gesto. – Então? – Estou
grudada. Só-mais-
um-pouquinho. Última vez!

9.

Uivante sirene de usina,
ou grito de alarme, eis
o segredo que as mulheres calam
ante amigos e esposos,

aquele de Eva e da Árvore:
Não passo de animal
desventrado a lâmina
de fogo na pele e na alma!

Vai-se por um furo
– vapor, fumo – a vã
heresia chamada alma,
lívida tísica cristã!

Apliquem cataplasma
– não na alma sem mulher,
mas na mulher sem alma,
que queria viver. Já não quer.
__________________

Eu não queria (Perdão!):
Clamor de ventre aberto
No corredor da morte,
eles aguardam (talvez

ao xadrez) pelo pelotão,
às quatro da matina, riem do
“olho” na porta, vigilante:
peões no tabuleiro, à toa.

Quem joga? Deuses do bem? Bandidos?
Olho do guarda na abertura:
ressoa o túnel vermelho. Passos.
Ergue-se a tranca.

Fumo quebra-peito (Cospe):
– Chegou a hora (Cospe).
Do corredor xadrez
direto para o fosso,

sangrento. Pela lucarna,
a pupi(lua) vigilante
..........................................
Quando olho para o lado,
como você está distante!

10.

Vozerio. Emoção. Nossa voz:
– Nosso café!
Nossa catedral! Nossa Ilha!
Casal de há pouco. Madrugada.

Saído da turba sonâmbula
para o ofício da missa!

Coisas azedas da feira
aos sonolentos, na primavera...
O café, zurrapa
de água e aveia.

(Com aveia se esfria
o sangue dos garanhões).
Da Árabia, nem cheiro,
mas da Arcádia, sim, o aroma

daquele café...

E como nos serria,
abancando-se ao lado,
no seu saber amanhecido
de amante já passada.

a solícita patroa,
a dizer: Não murche – viva
para o desvario sem grana
– os bocejos do amor!

Sorrisos – para a juventude,
Sorrisos – para os risos sem siso!
Sorrisos – para o humor
...e os rostos sem rugas.

Sobretudo – para a mocidade,
e para as paixões (não daqui!).
– de onde, então? – De outra parte.
– De onde? – De onde viajam

para este café sombrio
Túnis e albornozes ( de onde ela
sorria para esperanças e corpos
em roupas sem moda ou estação.

Meu bem, sem cenas:
só mais uma ferida, ao ver
como, à saída, acenava
a dona da espelunca, na sua

coifa holandesa, engomada...).

Não lembro bem, não sei, como
fomos levafs da festa
para a nossa rua – que não é nossa
– ou nossa de um nós que já não somos!

Vai o sol nascer no poente?
Vai Davi renegar Jeová?
E nós, aqui?... – Se-par-ado.
Não me diz coisíssima alguma

essa ultrassupersemsentidíssima palavra:
se-pa-ra-ção. E eu – uma entre cem?
Nove letras... quantos sons?
E além deles? Mudo mundo afora?

Ora! Isso se diz em sérvio?
Ou croata? É piada checa? Se-pa-ra-
são ou é? Supersupraultrahiperabsurdíssima
sandice asnática! Um som mono-

polífono, que fura o tímpano
até dos sons dos sonos dos sonhos!
Se-pa-ra-som – russo não é!
Sem-fem-nem-masculino!

E nem divino! Parelas de ovelhas
olhando-se alheias, a mascar?
Se-pa-ra-ção – em que língua se acha,
se o sentido não há?

No soar – só um rascar
de serrote de quem ferra no sono.
Se-pa-ra-ção – gemido gêmeo
de um cisne-rouxinol transmental

de Khliébnikov...**
                            Vem do nada?
Água do lago a evaporar-se no
ar? Mãos dadas – sinto, sim.
Mas separadas – choque e trovão

na cabeça – encapeda-se o mar
contra a cabana, nos confins
da Oceania...
                     Íngremes ladeiras.
Se)parar(se – calvário e gólgota

abaixo. Pés pesados de
pesares e dores – e palmas
voltadas aos cravos. Contrassenso!
Separar – dividir. Separar-se
implica UM dividido em UM.
Imossivel: somamosum.

11.

Perder tudo num lan-
ce só, seco: Rien ne va
plus. Bairros, subúrbios,
dias: fim dos dias,

findas caricias (leia: pedras).
Nós dois, dias, casas

vazias (Mães velhas,
meus respeitos) – vazias,
não vagas, onde há ação
(que não há no vazio).

(Quanto às vilas, em parte
vagas – melhor queimá-las!).

Cuidado, não se agite
(o corte da ferida!).
Subúrbios, subúrbios
– suturas rompidas.

O amor – (sem inchaço
retorico) – é sutura.

Sutura – não curativo.
Sutura – não armadura.
Sutura: costura-se o morto
-euemvocê – à seputura.

(Tempo, incisão, pontos:
firmes ou frouxos?)

Por fim, amigo – vai-se
a costura! Estilhaços!
Estrondos! Mas sem gangrena
– menos pena – a fratura!

Sem infecção: sob os pespontos,
vida vermelha nas veias!

Quem rompe primeiro
não perde poder.
Bairros, suburvios – frentes
e frontes de ruptura.

Nos bairros – saltam miolos!
(Na periferia – forcas).

Nada perde quem rompe
e parte ao raiar do dia.
Costurei-lhe uma vida
à noite, não rematei de dia.

Ficou torta, não me culpe.
Subúrbio: suturas rompidas.

Almas desalinhavsdas
– marcas por toda parte.
Bairro, subúrbio:
expansões do ódio.

Dá para ouvir o destino:
botas chapinham na lama.
Amigo, sinta a minha mão
que cose apressada.

O fio vivo, como cortá-lo?
Úl-ti-mo lampejo!
__________________

Aqui? Súplice, olhar
de seres interiores: 
– Não posso ir à montanha
pela úl-ti-ma vez?!

12.

Colinas. Crinas
de chuva nos olhos.
Para além dos bairros
o subúrbio, onde

estamos: não é nosso!
Cidade-madrasta:
Adiante? Ao nada!
fincados aqui: morrer.

Um campo. Uma cerca.
Um irmão. Uma irrmã.
A vida é um bairro:
construa no suberbio!

Meus senhores, a causa
está perdida. É inútil.
Um mundo de subúrbios!
Onde as caidades?

A chuva irrompe
com fúria. Nós, rompen-
do de pé. Só três
meses – e um confronto destes!
Estaria Jeová afim
de um jabá de Jó?
Bem. Não deu certo.
No subúrbio: você e mim.

Fora, fora! Para além
das muralhas da cidade
e da vida, onde é vetado
viver! Bairro judeu.

E não é marca de eleição
ser um judeu errante?
Basta não ser infame
para sofrer um pogrom.

A vida vice graças
aos renegados, aos seus judas!
Quer viver? Escolha a ilha
dos morféticos – ou o próprio
inferno – não a vida-carneira
para traidores e carrascos.

Pisoteio a minha “carte de séyour!
na vida. Rio. Zombo. Vingo

o escudo de Davi, os corpos
amontoados, que os alogozes
ainda aviltam: “Os judeus
não querem viuver...”.

Gueto de eleitos – além
do fosso. Não há piedade
no mais cristão dos mundos:
todos os poetas são judeus!

13.

Faca a afiar-se em pedra,
vassoura a varrer serragem:
O que é que sinto nas mãos?
Uma coisa de pelos – molhados!

Ora, onde as gêmeas
viris – Secura e Dureza?
Pela mão me escorre
uma não-chuva salgada!

E agora? Quais charmes
e encantos? Em seus domínios –
água! Olhos de diamante
escorrendo pelas palmas

das mãos, fim do fim
do naufrágio. Carícias, carinhos
pela cara, como as lágrimas
por entre os dedos:

Orgulho nosso – esse
das Marininhas polacas,
quando outros olhos polacos
– de águia! – viram água...

Você chorando, meu bem-
perdição? Perdão: ! Vái
ficando grosso esse gosto
de sal na concha da mão!

É duro o choro de amigo
– paulada na cabeça!
Chore também com outras – e lave
a honra que perdeu comigo!

Peixes do mes-mo-rar
– para cima! Pálidas
conchinhas num selinho
como lábios sem vida.
__________________

Hoje, sono
de choro,
sabor losna.
Qual o gosto
ao despertar?

14.

Trilha de carneiros –
descida. Cidade – ruídos.
Três putinhas vindo
e rindo. Das lágrimas.

Riem de tudo – como
ao meio-dia, quebrando
as ondas do mar
                        – em coro –

do choro sem decoro
do homem na chuva.
Olhos, feridas de água!
Pérolas de vergonha
no escuro de bronze.
Primeiras e últimas,
derrame-as por mim
– minha coroa do fim!

Não baixo os olhos – fixos
através do aguaceiro: Cravem
os olhos em nós, bonecas
de Venus! Olhem algo

que liga mais forte
do que o transe e a transa!
O Cântico dos Cânticos
nos cede a palavra

dos pássaros sem nome.
Salomão se inclina e saúda
nosso prântico a dois,
que escorre para além do sonho!
__________________

Na névoa vazia
das ondas da noite
de Praga, em silêncio,
sem traços, recurvo,
                           você, nau,
                                            naufraga.

1

В небе, ржавее жести,
Перст столба.
Встал на назначенном месте,
Как судьба.

- Без четверти. Исправен?
- Смерть не ждет.
Преувеличенно низок
Шляпы взлет.

В каждой реснице - вызов.
Рот сведен.
Преувеличенно низок
Был поклон.

- Без четверти. Точен?
Голос лгал.
Сердце упало: что с ним?
Мозг: сигнал!

---------------------------

Небо дурных предвестий:
Ржавь и жесть.
 Ждал на обычном месте.
Время: шесть.

Сей поцелуй без звука:
Губ столбняк.
Так государыням руку,
Мертвым - так...

Мчащийся простолюдин
Локтем - в бок.
Преувеличенно нуден
Взвыл гудок.

Взвыл, как собака взвизгнул,
Длился, злясь.
(Преувеличенность жизни
В смертный час.)

То, что вчера - по пояс,
Вдруг - до звезд.
(Преувеличенно, то есть:
Во весь - рост.)
Мысленно: милый, милый.
- Час? Седьмой.
В кинематограф, или? -
Взрыв: "домой!"

2

Братство таборное, -
Вот куда вело!
Громом на голову,
Саблей наголо!

Всеми ужасами
Слов, которых ждем,
Домом рушащимся -
Слово: дом.

----------------------------

Заблудшего баловня
Вопль: домой1
Дитя годовалое:
"Дай" и "мой"!

Мой брат по беспутству,
Мой зноб и зной,
Так из дому рвутся,
Как ты - домой!

-----------------------------

Конем, рванувшим коновязь -
Ввысь - и веревка в прах.
- Но никакого дома ведь!
- Есть, в десяти шагах:

Дом на горе. - Не выше ли?
- Дом на верху горы.
Окно под самой крышею.
- "Не от одной зари

Горящее?" - Так сызнова
Жизнь? - простота поэм!
Дом, это значит: из дому
В ночь.
             (О, кому повем

Печаль мою, беду мою,
Жуть, зеленее льда?..)
- Вы слишком много думали. -
Задумчивое: - Да.

3

И - набережная. Воды
Держусь, как толщи плотной.
Семирамидины сады
Висячие - так вот вы!

Воды - стальная полоса
Мертвецкого оттенка -
Держусь, как нотного листа
Певица, края стенки -

Слепец... Обратно не отдашь?
Нет? Наклонюсь - услышишь?
Всеутолительницы жажд
Держусь, как края крыши

Лунатик...
                    Но не от реки
Дрожь - рождена наядой!
Руки держаться, как руки,
Когда любимый рядом -

И верен...
                 Мертвые верны.
Да, но не всем в каморке...
Смерть с левой, с правой стороны -
Ты. Правый бок, как мертвый.

Разительного света сноп.
Смех, как грошовый бубен.
"Нам с вами нужно бы..."
                                          (Озноб.)
..."Мы мужественны будем?"

4

Тумана белокурого
Волна - воланом газовым.
Надышано, накурено,
А главное - насказано!
Чем пахнет? Спешкой крайнею,
Потачкой и грешком:
Коммерческими тайнами
И бальным порошком.
Холостяки семейные
В перстнях, юнцы маститые...
Нащучено, насмеяно,
А главное - начитано!
И крупными, и мелкими,
И рыльцем, и пушком.
...Коммерческими сделками
И бальным порошком.

Серебряной зазубриной
В окне - звезда мальтийская!
Наласкано, налюблено,
А главное - натискано!
Нащипано...(Вчерашняя
Снедь - не взыщи: с душком!)
...Коммерческими шашнями
И бальным порошком.

Цепь чересчур короткая?
Зато не сталь, а платина!
Тройными подбородками
Тряся, тельцы - телятину
Жуют. Над шейкой сахарной
Черт - газовым рожком.
...Коммерческими крахами
И неким порошком -
Бертольда Шварца....
                          Даровит
Был - и заступник людям.
- На с вами нужно говорить.
Мы мужественны будем?

5

Движение губ ловлю.
И знаю - не скажет первым.
- Не любите? - Нет, люблю.
- Не любите? - но истерзан,

Но выпит, но изведен.
(Орлом озирая местность):
-Помилуйте, это - дом?
- Дом в сердце моем. - Словесность!

Любовь, это плоть и кровь.
Цвет, собственной кровью полит.
Вы думаете - любовь -
Беседовать через столик?

Часочек - и по домам?
Как те господа и дамы?
Любовь, это значит...
                              - Храм?
Дитя, замените шрамом

На шраме! - Под взглядом слуг
И бражников? (Я, без звука:
"Любовь, это значит лук
Натянутый лук: разлука".)

- Любовь, это значит - связь.
Все врозь у нас: рты и жизни.
(Просила ж тебя: не сглазь!
В тот час, сокровенный, ближний,

Тот час на верху горы
И страсти. memento - паром:
Любовь - это все дары
В костер - и всегда задаром!)

Рта раковинная щель
Бледна. Не усмешка - опись.
- И прежде всего одна
Постель.
               - Вы хотели пропасть

Сказать? - Барабанный бой
Перстов. - Не горами двигать!
Любовь, это значит...
                            - Мой.
Я вас понимаю. Вывод?

--------------------------

перстов барабанный бой
Растет. (Эшафот и площадь.)
-Уедем. - А я: умрем,
Надеялась. Это проще.

Достаточно дешевизн:
Рифм, рельс, номеров, вокзалов...
-Любовь, это значит: жизнь.
- Нет, иначе называлось

У древних...
                    - Итак? -
                                      Лоскут
Платка в кулаке, как рыба.
- Так едемте? - Ваш маршрут?
Яд, рельсы, свинец - на выбор!
Смерть - и никаких устройств!
- Жизнь! - полководец римский,
Орлом озирая войск
Остаток.
              - Тогда простимся.

6

- Я этого не хотел.
Не этого. (Молча: слушай!
Хотеть, это дело тел,
А мы друг для друга - души

Отныне...) - И не сказал.
(Да, в час, когда поезд подан,
Вы женщинам, как бокал,
Печальную честь ухода

Вручаете...) - Может, бред?
Ослышался? (Лжец учтивый,
Любовнице, как букет
Кровавую честь разрыва

Вручающий...) - Внятно: слог
За слогом, итак - простимся,
Сказали вы? (Как платок
В час сладостного бесчинства

Уроненный...) - Битвы сей
Вы цезарь. (О, выпад наглый!
Противнику - как трофей,
Им отданную же шпагу

Вручать!) - Продолжает. (Звон
В ушах...) - Преклоняюсь дважды:
Впервые опережен
В разрыве. - Вы это каждой?

Не опровергайте! Месть,
Достойная Ловеласа.
Жест, делающий вам честь,
А мне разводящий мясо

От кости. - Смешок. Сквозь смех -
Смерть. Жест (Никаких хотений
Хотеть - это дело тех,
А мы друг для друга - тени

Отныне...) Последний гвоздь
Вбит. Винт, ибо гроб свинцовый.
- Последнейшая из просьб.
- Прошу. - Никогда ни слова

О нас...никому из ...ну...
Последующих. (С носилок
Так раненые - в весну!)
- О том же и вас просила б.

Колечко на память дать?
- Нет. - Взгляд, широко разверстый
Отсутствует. (Как печать
На сердце твое, как пестень

На руку твою...Без сцен!
Съем.) Вкрадчивое и тише:
- Но книгу тебе? - Как всем?
- Нет, вовсе их не пишите.

Книг...

--------------------------

Значит, не надо.
Значит, не надо.
Плакать не надо.

В наших бродячих
Братствах рыбачьих
Пляшут - не плачут.

Пьют, а не плачут.
Кровью горячей
Платят - не плачут.

Жемчуг в стакане
Плавят - и миром
  Правят - не плачут.

- Так я ухожу? - Насквозь
Гляжу. Арлекин, за верность,
Пьеретте своей - как кость
Презреннейшее из первенств

Бросающий: честь конца,
Жест занавеса. Реченье
Последнее. Дюйм свинца
В грудь: лучше бы, горячей бы

И - чище бы...
                    Зубы
Втиснула в губы.
Плакать не буду.

Самую крепость -
В самую мякоть.
Только не плакать.

В братствах бродячих
Мрут, а не плачут.
Жгут, а не плачут.

В пепел и в песнях
Мертвого прячут
В братствах бродячих.

- Так первая? Первый ход?
Как в шахматы, значит? Впрочем,
Ведь даже н аэшафот
Нас первыми просят...
                                  - Срочно

Прошу, не глядите! - Взгляд -
(Вот-вот уже хлынут градом! -
Ну как их загнать назад
В глаза?!) - Говорю, не надо

Глядеть!!!

Внятно и громко,
Взгляд в вышину:
- Милый, уйдемте,
Плакать начну!

---------------------------

Забыла! Среди копилок
Живых (коммерсантов - тож)
Белокурый сверкнул затылок:
Маис, кукуруза, рожь!

Все заповеди Синая
Смывая - менады мех! -
Голконда волосяная,
Сокровищница утех -

(Для всех!) Не напрасно копит
Природа, не сплошь скупа!
Из сих белокурых тропик,
Охотники, - где тропа

Назад? Наготою грубой
Дразня и слепя до слез -
Сплошным золотым прелюбом
Смеющимся пролилось.

- Не правда ли? - Льнущий, мнущий
Взгляд. В каждой реснице - зуд.
- И главное - эта гуща!
Жест, скручивающий в жгут.

О рвущий уже одежды - жест!
 Проще, чем пить и есть -
Усмешка! (Тебе надежда,
Увы, на спасенье есть!)

И - сестрински или братски?
Союзнически: союз!
- Не похоронив - смеяться!
(И, похоронив, смеюсь.)

7

и - набережная. Последняя.
Все. Порознь и без руки,
Чурающимися соседями
Бредем. - Со стороны реки -

Плач. Падающую соленую
Ртуть слизываю без забот:
Луны огромной Соломоновой
Слезам не выслал небосвод.

Столб. Отчего бы лбом не стукнуться
В кровь? Вдребезги бы, а не в кровь!
Страшащимися сопреступниками
Бредем. (Убитое - Любовь.)

Брось! Разве это двое любящих?
В ночь? Порознь? С другими спать?
- Вы понимаете, что будущее -
Там? - Запрокидываюсь вспять.

- Спать! - Новобрачными по коврику...
- Спать! - Все не попадаем в шаг,
В такт. Жалобно: - Возьмите под руку!
Не каторжники, чтоб так!..

Ток. (Точно мне душою - на руку
Лег! - На руку рукою.) Ток
Бьет, проводами лихорадочными
Рвет, - на душу рукою лег!

Льнет. Радужное все! Что радужнее
Слез? Занавесом, чаще бус,
Дождь. - Я таких не знаю набережных
Кончающихся. - Мост, и:
                                         - Ну-с?

Здесь? (Дроги поданы.)
Спокойных глаз
Взлет. - Можно до дому?
В последний раз!

8

последний мост.
(Руки не отдам, не выну!)
Последний мост,
Последняя мостовина.

Вода и твердь.
Выкладываю монеты.
Деньга за смерь,
Харонова мзда за Лету.

Монеты тень.
В руки теневой. Без звука
Монеты те.
Итак, в теневую руку

Монеты тень.
Без отсвета и без звяка.
Монеты - тем
 С умерших довольно маков.

Мост.

---------------------------

Благая часть
 Любовников без надежды:
Мост, ты как страсть:
Условность: сплошное между.

Гнезжусь: тепло,
Ребро - потому и льну так.
Ни до, ни по:
Прозрения промежуток!

Ни рук, ни ног.
Всей костью и всем упором:
Жив только бок,
О смежный теснюсь которым.
Вся жизнь - в боку!
Он - ухо и он же - эхо.
Желтком к белку
Леплюсь, самоедом к меху

Теснюсь, леплюсь,
Мощусь. Близнецы Сиама,
Что - ваш союз?
Та женщина - помнишь: мамой

Звал? - все и вся
Забыв, в торжестве недвижном
Тебя нося,
Тебя не держала ближе.

Пойми! Сжились!
Сбылись! На груди баюкал!
Не - брошусь вниз!
Нырять - отпускать бы руку

Пришлось. И жмусь,
И жмусь...И неотторжима.
Мост, ты не муж:
Любовник - сплошное мимо!

Мост, ты за нас!
Мы реку телами кормим!
Плющом впилась,
Клещом: вырывайте с корнем!

Как плющ! как клещ!
Безбожно! Бесчеловечно!
Бросать, как вещь,
Меня, ни единой вещи

Не чтившей в сем
Вещественном мире дутом!
Скажи, что сон!
Что ночь, а за ночью утро,

Экспресс и Рим!
Гренада? Сама не знаю,
Смахнув перин
Монбланы и Гималаи.

Прогал глубок:
Последнею кровью грею.
Прослушай бок!
Ведь это куда вернее

Стихов...Прогрет
Ведь? Завтра к кому наймешься?
Скажи, что бред!
Что нет, и не будет мосту
Конца...
             - Конец

-------------------------------

-Здесь? - Детский, божеский
Жест. - Ну-с. - Впилась.
- Еще немножечко:
В последний раз!

 9

Корпусами фабричными, зычными
И отзывчивыми на зов...
Сокровенную, подъязычную
Тайну жен от мужей и вдов

От друзей - тееб, подноготную
Тайну Евы от древа - вот:
Я не более, чем животное,
Кем-то раненое в живот.

Жжет.. Как будто бы душу сдернули
С кожей! Паром в дыру ушла
Пресловутая ересь вздорная
Именуемая душа.

Христианская немочь бледная!
Пар! Припарками обложить!
Да ее никогда и не было!
Было тело, хотело жить,

Жить не хочет.

---------------------------

Прости меня! Не хотела!
Вопль вспоротого нутра!
Так смертники ждут расстрела
В четвертом часу утра

За шахматами... Усмешкой
Дразня коридорный глаз.
Ведь шахматные же пешки!
И кто-то играет в нас.

Кто? Боги благие? Воры?
Во весь окоем глазка -
Глаз. Красного коридора
Лязг. Вскинутая доска.

Махорочная затяжка.
Сплев, пожили, значит сплев.
...По сим тротуарам в шашку
Прямая дорога: в ров

И в кровь. Потайное око:
Луны слуховой глазок...
.........................................
И покосившись сбоку:
- Как ты уже далек!

10

Совместный и сплоченный
Вздрог. - Наша молочная!

Наш остров, наш храм,
Где мы по утрам -

Сброд! Пара минутная! -
Справляли заутреню.

Базаром и закисью
Сквозь-сном и весной...
Здесь кофе был пакостный -
Совсем овсяной!

(Овсом своенравие
Гасить в рысаках!
Отнюдь не Аравией -
Аркадией пах

Тот кофе...

Но как улыбалась нам,
Рядком усадив,
Бывалой и жалостной -
Любовниц седых

Улюбкою беержной:
Увянешь! Живи!
Безумью, безденежью,
Зевку и любви -

А главное - юности!
Смешку - без причин,
Усмешке - без умысла,
Лицу - без морщин, -

О, главное - юности!
Страстям не по климату!
Откуда-то дунувшей,
Откуда-то хлынувшей

В молочную тусклую:
- Бурнус и Тунис! -
Нажеждой и мускулам
Под ветхостью риз...

(Дружочек, не жалуюсь:
Рубец на рубце!)
О, как провожала нас
Хозяйка в чепце

Голландского глаженья....

--------------------------

Не довспомнивши, не допонявши,
Точно с праздника уведены...
- Наша улица! - Уже не наша...
- Сколько раз по ней!.. - Уже не мы...

 - Завтра с западу встанет солнце!
- С Иеговой порвет Давид!
- Что мы делаем? - Расстаемся.
- Ничего мне не говорит

Сверхбессмесленнейшее слово:
Расстаемся. - Один из ста?
Просто слово в четыре слога
За которыми пустота.

Стой! По-сербски и по-кроатски,
Верно? Чехия в нас чудит?
Расставание. Расставаться...
Сверхестественнейшая дичь!

Звук, от коего уши рвутся,
Тянутся з апредел тоски...
Расставание - не по-русски!
Не по-женски! Не по-мужски!

Не по-божески! Что мы - овцы,
Раззевавшиеся в обед?
Расставание - по-каковски?
Даже смысла такого нет.

Даже звука! Ну просто полый
Шум, - пилы, например, сквозь сон.
Расставание - просто школы
Хлебникова соловьиный стон

Лебединый...
                   Но как же вышло?
Горячо высохший водоем -
Воздух! Руку о руку слышно.
Расставаться - ведь это гром

На голову...Океан в каюту!
Океании крайний мыс!
Эти улицы слишком круты:
Расставаться - ведь это вниз,

Под гору...Двух подошв пудовых
Вздох...Ладонь, наконец, и гвоздь!
Опрокидывающий довод:
Расставаться - ведь это врозь,

Мы же - срошиеся...

11

Разом проигрывать -
Чище нет!
Загород, пригород:
Дням конец.

Негам (читай - камням),
Дням, и домам, и нам.

Дачи пустующие! Как мать
Старую - так же чту их.
Это ведь действие - пустовать:
Полое не пустует.

(Дачи, пустующие на треть,
Лучше бы вам сгореть!)

Только не вздрагивать,
Рану вскрыв.
Загород, загород,
Швам разрыв!

Ибо - без лишних слов
Пышных - любовь есть шов.

Шов, а не перевязь, шов - не щит.
- О, не проси защиты! -
Шов, коим мертвый к земле пришит,
Коим к тебе пришита.

(Время покажет еще каким:
Легким или тройным!)

Так или иначе, друг - по швам!
Дребезги и осколки!
Только и славы, что треснул сам:
Треснул, а не расползся!

Что под наметкой - живая жиль
Красная, а не гниль!

О, не проигрывает -
Кто рвет!
Загород, пригород:
Лбам развод.

По слободам казнят
Нынче, - мозгам сквозняк!

О, не проигрывает, кто прочь -
В час, как заря займется.
Целую жизнь тебе сшила в ночь
Набело, без наметки.

Так не кори же меня, что вкривь.
Пригород: швам разрыв.

Души неприбраннные -
В рубцах!...
Загород, пригород...
Яр размах

Пригорода. Сапогом судьбы,
Слышишь - по глине жидкой?
...Скорую руку мою суди,
Друг, да живую нитку

Цепкую, как ее не канай!
Последний фонарь!
---------------------------

Здесь? Словно заговор -
Взгляд. Низших рас -
Взгляд. - Можно на гору?
В последний раз!

12

Частою гривою
Дождь в глаза. - Холмы.
Миновали пригород.
За городом мы,

Есть, - да нету нам!
Мачеха - не мать!
Дальше некуда.
Здесь околевать.

 Поле. Изгородь.
Брат стоим с сестрой.
Жизнь есть пригород. -
За городом строй!

Эх, проиранное
Дело, господа!
Все-то - пригороды!
Где же города?!

Рвет и бесится
Дождь. Стоит и рвем.
За три месяца
Первое вдвоем!

И у Иова,
Бог, хотел взаймы?
Да не выгорело:
За городом мы!

-------------------------

За городом! Понимаешь? За!
Вне! Перешед вал!
Жизнь, это место, где жить нельзя:
Еврейский квартал...

Так не лостойнее ль во сто крат
Стать вечным жидом?
ибо для каждого, кто не гад,
Еврейский погром -
Жизнь. Только выкрестами жива!
Иудами вер!
На прокаженные острова!
В ад! - всюду! - но не в
Жизнь, - только выкрестов терпит, лишь
Овец - палачу!
Право -на-жительственный свой лист
Ногами топчу!

Втаптываю! За Давидов щит! -
Месть! - В месиво тел!
Не упоительно ли, что жид
Жить - не захотел?

Гетто избранничеств! Вал и ров.
ощады не жди!
В сем христианнейшем из миров
Поэты - жиды!

13

Так ножи вострят о камень,
Так опилки метлами
Смахивают. Под руками
Меховое, мокрое.

Где ж вы, двойни:
Сушь мужская, мощь?
Под ладонье -
Слезы, а не дождь!

О каких еще соблазнах -
Речь? Водой - имущество!
осле глаз твоих алмазных,
Под ладонью льющихся -

Нет пропажи
Мне. Конец концу!
Глажу - глажу-
Глажу по лицу.

Такова у на, Маринок,
Спесь, у нас, полячек-то.
После глаз твоих орлиных,
Под ладонью плачущих...

Плачешь? Друг мой!
Все мое! Прости!
О, как крупно,
Солоно в горсти!

Жестока слеза мужская:
Обухом по темени!
Плачь, с другими наверстаешь
Стыд, со мной потерянный.

Одинакового
Моря - рыбы! Взмах:
...Мертвой раковиной
Губы на губах.

------------------------

В слезах.
Лебеда -
На вкус.
- А завтра
Когда
Проснусь?

14

Тропою овечьей -
Спуск. Города там.
Три девки навстречу
Смеются. Слезам

Смеются, - всем полднем
Недр, гребнем морским!
Смеются!
                 - недолжным,
Позорным, мужским.

Слезам твоим, видным
Сквозь дождь - в два рубца!
Как жемчуг - постыдным
На бронзе бойца.

Слезам твоим первым,
Последним, - о, лей! -
Слезам твоим - перлам
В короне моей!

Глаз явно не туплю.
Сквозь ливень - перюсь.
Венерины куклы,
Вперяйтесь! Союз

Сей более тесен,
Чем влечься и лечь.
Самой Песней Песен
Уступлена речь

Нам, птицам безвестным
Челом Соломон
Бьет, ибо совместный
Плач - больше, чем сон!

---------------------------

И в полые волны
Мглы - сгорблен и равн -
Бесследно - безмолвно -
Как тонет корабль.

(1924)

- Marina Tsvietáieva (Марина Цветаева), em "Marina". [tradução Décio Pignatari]. Curitiba: Travessa dos Editores, 2005.


* Berthold Schwartz – fabricante de pólvora.

** Velemir Khliébnikov (1885-1922) – fundador do Futurismo russo, mestre de Maiokóvski, criador da linguagem metalógica ou transmental, constituída de neologismos criados a partir de raízes da língua russa.



§


Marina Tsvetaeva, by Anna
FORTUNA CRÍTICA DE MARINA TSVETÁIEVA
ALMEIDA, Paula Costa Vaz de.. A caminho do Absoluto: a poética e a vida literária de Marina Tsvetáieva através de sua prosa. (Doutorado em Literatura e Cultura Russa). Universidade de São Paulo, USP, 2014.

ALMEIDA, Paula Costa Vaz de.. O meu Púchkin de Marina Tsvetáieva: tradução e apresentação. (Dissertação Mestrado em Literatura e Cultura Russa). Unversidade de São Paulo, USP, 2008. Disponível no link. (acessado em 8.2.2016).
ALMEIDA, Paula Costa Vaz de.. O "Meu Púchkin" de Marina Tsvetáieva e a essência do ensaio. In: VI Encontro de Pós-graduandos da FFLCH/USP, 2011, São Paulo. V Encontro de Pós-graduandos da FFLCH/USP. São Paulo: Serviço de Artes Gráficas FFLCH, 2011.
BERNARDINI, Aurora Fornoni. Indícios flutuantes em Marina Tsvetáieva. (Livre-docência em Letras). Universidade de São Paulo, USP, 1978. 
BERNARDINI, Aurora Fornoni. Uma vida em chamas - (artigo sobre a obra de Marina Tsvetáieva). Cult (São Paulo), v. 10, p. 18-21, 2007. 
BERNARDINI, Aurora Fornoni. Les femmes modernes - Marina Tsvetáieva e Nathalie Clifford Barney. Revista Sibila, São Paulo - S.P., 10 abr. 2007.  
BERNARDINI, Aurora Fornoni. Marina Tsvetáieva, poetisa russa: esboço de vida e obra. in: periódicos, USP. Disponível no link. (acessado em 8.2.2016).
BERNARDINI, Aurora Fornoni. Marina Tsvetáieva: dois Poemas- duas precursoras russa. [tradução]. Rio de Janeiro: Editora Sete, 2001. 
CAREGARO, Raquel Arantes Toledo. Uma aventura: o teatro de Marina Tsvetáieva. Tradução e apresentação. (Dissertação Mestrado em Literatura e Cultura Russa). Universidade de São Paulo, USP, 2015.
COSTA, Verônica de Araújo. Marina Tsvetáeva e a musicalidade do poema. (Dissertação Mestrado em Letras). Universidade Federal do Rio de Janeiro, UFRJ, 2013.


Marina Tsvietáieva
OUTRAS REFERÊNCIAS E FONTES DE PESQUISA
:: Cultura Pará
:: amediavoz (espanhol)
:: Truca/pt
 
© Obra em domínio público

© Pesquisa, seleção e organização: Elfi Kürten Fenske em colaboração com José Alexandre da Silva



=== === ===

Trabalhos sobre o autor:
Caso, você tenha algum trabalho não citado e queira que ele seja incluído - exemplo: livro, tese, dissertação, ensaio, artigo - envie os dados para o nosso "e-mail de contato", para que possamos incluir as referências do seu trabalho nesta pagina.

Como citar:
FENSKE, Elfi Kürten; SILVA, José Alexandre da.. (pesquisa, seleção, edição e organização). Marina Tsvietáieva - poeta russa. Templo Cultural Delfos, fevereiro/2016. Disponível no link. (acessado em .../.../...).
____
** Página atualizada em 8.2.2016.



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